LUTO Enterro das vítimas do assassino
que matou 12 pessoas na noite de Ano Novo, em Campinas
A era do ódio
Crimes motivados por intolerância fazem cair a máscara da cordialidade
do brasileiro. O que se vê é a face de uma nação com raiva, capaz de apoiar
assassinatos, avessa ao diálogo e aberta ao confronto
Camila Brandalise e Débora
Crivellaro
06.01.17 - 18h00
“…Não tenho medo de morrer ou
ficar preso, na verdade já estou preso na angústia da injustiça, além do que eu
preso, vou ter 3 alimentações completas, banho de sol, salário, não precisarei
acordar cedo pra ir trabalhar, vou ter representantes dos direito humanos
puxando meu saco, também não vou perder 5 meses do meu salário em impostos. No
Brasil, crianças adquirem microcefalia e morrem por corrupção, homens babacas
morrem e matam por futebol, policiais e bombeiros morrem dignamente pela
profissão, jovens do bem (dois sexos) morrem por celulares, tênis, selfies e
por ídolos, jornalistas morrem pelo amor à profissão, muitas pessoas pobres
morrem no chão de hospitais para manter políticos na riqueza e poder! A justiça
brasileira é igual ao Lewandowski, (um marginal que limpou a bunda com a
constituição no dia que tirou outra vadia do poder) um lixo! Filho, não sou
machista e não tenho raiva das mulheres (essas de boa índole, eu amo de
coração, tanto é que me apaixonei por uma mulher maravilhosa, a Kátia). Tenho
raiva das vadias que se proliferam e muito a cada dia se beneficiando da lei
vadia da penha…”
“O indivíduo
que matou em Campinas deveria compartilhar essas opiniões na rede e
receber apoio de pessoas fracas e frustradas”
Leandro Karnal, historiador, sobre Sidnei Ramis de Araújo (à esq., com o filho que ele também assassinou)
Leandro Karnal, historiador, sobre Sidnei Ramis de Araújo (à esq., com o filho que ele também assassinou)
A carta, que destila raiva e
intolerância por diversos setores da sociedade, foi encontrada após a chacina
ocorrida na noite de Ano Novo, em Campinas, no interior de São Paulo. Foi
escrita por Sidnei Ramis de Araújo, de 46 anos, que executou 12 pessoas de uma
mesma família, sendo nove mulheres. O filho de 8 anos a quem ele se dirige no
texto também foi morto pelo pai. A justificativa para a matança que chocou o
País foi o fato de Araújo estar impedido de conviver com o menino, após decisão
da Justiça. Inconformado com a atitude da “vadia”, como chamava a ex-mulher,
Isamara Filier, 41 anos, decidiu executá-la sumariamente, assim como todas as
suas parentes presentes na celebração. Mais um crime de feminicídio, atitude
apoiada por muitas pessoas nas redes sociais, como pode ser observado no quadro
com comentários da pagina 64. Mas Araújo não vociferou apenas contra as
mulheres. Critica ainda a legislação que pune homens que agridem companheiras,
como se eles estivessem agindo corretamente, fala contra presos, defensores de
direitos humanos e Judiciário, numa narrativa vertiginosa e carregada de ódio.
Uma semana antes, na noite do dia
25, o ambulante Luiz Carlos Ruas, conhecido como Índio, 54 anos, foi espancado
até a morte dentro do metrô de São Paulo por Alipio dos Santos e Ricardo do
Nascimento porque tentou defender uma travesti dos ataques dos dois. Poucos
dias antes, Débora Soriano de Melo foi espancada e estuprada por Willy Gorayeb
Liger em um bar na zona leste de São Paulo. Ele confessou tê-la matado com um
taco de beisebol após uma discussão e está preso. Não há um único dia sem que
um crime pavoroso ocorra no País. Mas apenas esses três relatados acima,
ocorridos nas últimas semanas, mostram que o Brasil vive tempos de cólera.
Em algum momento do processo
histórico brasileiro nos reconhecemos como o povo da cordialidade, da alegria,
do samba. Mas essa construção social tem perdido força à medida que o discurso
de ódio se prolifera, seja nas conversas no ônibus, nas mesas de bar ou nos
comentários nas redes sociais. O que se vê são xingamentos, embates, críticas
vazias, ironias e provocações. “A verdade é que somos uma sociedade
extremamente violenta, são 50 a 60 mil homicídios por ano”, afirma a socióloga
Wânia Pasinato, especialista em violência de gênero. “Além disso, aceitamos a
violência em sua forma mais seletiva. 95% das vítimas são negros e jovens e 10%
são mulheres.” Para o filósofo e professor de ética e filosofia política da
Universidade de São Paulo, Renato Janine Ribeiro, entramos num estado de
anomia, de falta de regras, em que a sociedade abre espaço para atitudes
extremas. “Há uma propagação do ódio. Não passamos um dia sem um crime motivado
por esse sentimento”, afirma.
1 de 5 TRISTEZA A
travesti Raíssa, defendida por Luiz Carlos Ruas, que acabou morto: crime de
ódio motivado por transfobia
2 de 5 Alípio dos
Santos
3 de 5 CRIMINOSOS
Os assassinos do ambulante Luiz Carlos Ruas, Ricardo do Nascimento prisão após
comoção popular
4 de 5
5 de 5 BRUTALIDADE
Luiz Carlos Ruas, o Índio foi morto dentro de uma estação de metrô a socos e
pontapés
A chacina em Campinas é carregada
de misoginia. Antes de ser morta, a vítima havia feito cinco boletins de
ocorrência contra o ex-marido por agressão e violência. A ironia é que, mesmo
assim, a lei Maria da Penha, que ele critica em sua carta, não foi posta em
prática, já que mesmo com tantas denúncias nenhum processo de investigação foi
aberto contra ele. Em outro bárbaro crime de feminicídio também na noite de Ano
Novo, em Minas Gerais, Renata Rodrigues Aureliano foi incendiada pelo
ex-companheiro que exigia retomar o relacionamento. Diante da negativa, jogou
gasolina nela e a incendiou na frente do filho de 9 anos. Renata morreu por
falência múltipla de órgãos. A vítima também já havia registrado um boletim de
ocorrência contra Jeferson Diego Caetano da Costa. Na quarta-feira 4, um homem
de 43 anos foi detido em Jaboticabal (SP) depois de postar mensagens no
Facebook dizendo que iria invadir o Fórum para matar duas juízas e uma
promotora envolvidas em uma disputa judicial que ele travava com a ex-mulher pela
guarda do filho. Nas mensagens, dizia repetir o que aconteceu em Campinas.
“Há uma guinada conservadora que
reforça a intolerância”, afirma a socióloga Wânia Pasinato. Quando se tratam de
crimes motivados por preconceito, há vários grupos sociais que são alvo, além
das mulheres, como negros, gays e transexuais. “Isso acontece porque o ódio
busca o que pareça mais fraco”, afirma o historiador e professor da
Universidade Estadual de Campinas Leandro Karnal. Além disso, quando há uma
parcela social que legitima essas ações, que culpa o outro pelos próprios
problemas, o sentimento fica ainda mais perigoso. “O indivíduo que matou em
Campinas deveria compartilhar essas opiniões na rede e receber apoio
de outras pessoas também fracas e frustradas. Lentamente, ele percebeu que
havia base para fazer algo.”
De onde vem a raiva?
Para a psicóloga Mafoane Odara, do Instituto Avon, o discurso do politicamente correto também pode estar travestido de violência. “Em uma pesquisa as pessoas dizem que só se pode acabar com o machismo pela educação, mas 50% dos homens e 33% das mulheres afirmam que jamais dariam uma boneca para o filho brincar.” Para mudar, é preciso afincar as políticas de segurança e de disseminação da tolerância e cobrar dos gestores públicos medidas adequadas e punições efetivas. Mas a mudança pode começar também nos pequenos universos individuais. Para Karnal, o ódio sempre vem acompanhado de sentimentos comuns a todos: medo, dor e frustração. A diferença é a capacidade de cada um em gerenciar limites. Ou desenvolvemos essa habilidade ou, parafraseando Gandhi, será olho por olho, e o Brasil acabará cego.
Ecos da intolerância
Os assustadores comentários em portais de notícias sobre a chacina em Campinas mostram que muitas pessoas compartilham do ódio
“É um discurso coerente de uma pessoa
que foi levada ao limite. Quem aqui pode afirmar que não faria o mesmo se
tivesse seu filho tirado de si com uma acusação falsa de abuso?”
(Thiago S.)
“Esse cara foi movido pelo desespero. Talvez a mulher tenha feito o que é muito comum em finais de relacionamento: atacar a honra de um homem por meio de mentiras e fofocas. Essa história não tem um vilão só não.”
(Ulysses N.)
“O nome desse desequilíbrio chama-se: injustiça. Está na hora de rever os direitos civis e de família.”
(Eduardo G.)
“Não se deve afrontar a honra de um homem!”
(Paulo S.)
“Enquanto o feminismo continuar incentivando as mulheres a se separarem, humilharem seus maridos e tirarem deles o que eles mais amam (seus filhos) continuarão sendo assassinadas. ”
(André A.)
“Se a mulher fosse submissa, andasse de burca e não tivesse pedido o divórcio, isso não teria acontecido.”
(Alex O.)
(Thiago S.)
“Esse cara foi movido pelo desespero. Talvez a mulher tenha feito o que é muito comum em finais de relacionamento: atacar a honra de um homem por meio de mentiras e fofocas. Essa história não tem um vilão só não.”
(Ulysses N.)
“O nome desse desequilíbrio chama-se: injustiça. Está na hora de rever os direitos civis e de família.”
(Eduardo G.)
“Não se deve afrontar a honra de um homem!”
(Paulo S.)
“Enquanto o feminismo continuar incentivando as mulheres a se separarem, humilharem seus maridos e tirarem deles o que eles mais amam (seus filhos) continuarão sendo assassinadas. ”
(André A.)
“Se a mulher fosse submissa, andasse de burca e não tivesse pedido o divórcio, isso não teria acontecido.”
(Alex O.)
Denúncias e mortes
90 mil
queixas de violência contra mulher foram recebidas por mês pelo Ligue 180 em 2016. Houve um aumento de 52% em relação a 2015
queixas de violência contra mulher foram recebidas por mês pelo Ligue 180 em 2016. Houve um aumento de 52% em relação a 2015
133%
Foi o aumento no número de relatos de violência doméstica e familiar se comparados os dados do ano passado
Foi o aumento no número de relatos de violência doméstica e familiar se comparados os dados do ano passado
11 mil
Boletins de ocorrência são registrados por mês somente no Estado de São Paulo
Boletins de ocorrência são registrados por mês somente no Estado de São Paulo
390
Mulheres são assassinadas por mês no Brasil, o equivalente a 13 por dia
Mulheres são assassinadas por mês no Brasil, o equivalente a 13 por dia
Em 35,1%
dos casos de feminicídios, os agressores são parceiros ou ex-parceiros
dos casos de feminicídios, os agressores são parceiros ou ex-parceiros
Fonte:http://istoe.com.br/era-do-odio/
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