“Sabemos que, à medida que as pessoas crescem, elas têm maior probabilidade de ter um câncer. Mas ainda há muito que não se sabe sobre como o envelhecimento realmente muda a biologia do câncer”, diz Xueqian Zhuang, pesquisadora do Centro de Câncer Memorial Sloan Kettering (MSK), nos Estados Unidos, em nota.
Zhuang é a primeira autora de um novo estudo, publicado na revista científica Nature, que decidiu analisar por que, ao chegar nas últimas décadas da vida, a idade deixa de ser um fator de risco e passa a ser um fator protetivo contra o câncer. Os pesquisadores descobriram que “as células envelhecidas perdem sua capacidade de renovação e, portanto, do crescimento descontrolado que ocorre no câncer”, explica a autora.
Para realizar o trabalho, os cientistas utilizaram camundongos geneticamente modificados para serem suscetíveis a um modelo de câncer de pulmão que é comum entre humanos e responde por 7% das mortes oncológicas no mundo. Os animais demoraram dois anos para chegar ao equivalente a cerca de 70 anos na idade humana.
De forma intrigante, eles observaram que, conforme iam envelhecendo ainda mais, os camundongos aumentaram a produção de uma proteína chamada NUPR1, que é utilizada pelas células do pulmão para funcionarem quando há um quadro de deficiência de ferro. Isso aconteceu embora não houvesse falta do nutriente, explica Zhuang:
“Na verdade, as células que estão envelhecendo têm mais ferro, mas, por motivos que ainda não compreendemos totalmente, elas funcionam como se não tivessem o suficiente”.
Por atuarem como se estivessem com falta de ferro, as células pulmonares dos animais começaram a perder a sua habilidade de se regenerar. E como essa capacidade está diretamente ligada ao risco de câncer, já que é durante essas divisões que ocorrem as mutações genéticas, os camundongos mais velhos desenvolveram menos tumores do que os outros mais jovens.
Após a descoberta, os cientistas decidiram testar se esse efeito protetor poderia ser revertido ao intervir no mecanismo ligado ao ferro. Eles conseguiram de fato interromper essa redução no risco, induzindo novos tumores, após fornecerem mais quantidades do nutriente ao animal ou reduzirem os níveis da NUPR1 nas suas células.
“O que nossos dados sugerem em termos de prevenção do câncer é que os eventos que ocorrem quando somos jovens são provavelmente muito mais perigosos do que os eventos que ocorrem mais tarde. Portanto, evitar que os jovens fumem, se bronzeiem ou sofram outras exposições carcinogênicas óbvias é provavelmente ainda mais importante do que pensávamos”, explica Tuomas Tammela, também autor do novo estudo e pesquisador no MSK.
Além disso, o novo trabalho pode abrir um caminho inesperado para o tratamento de doenças além do câncer. Ao perceberem que o ferro pode melhorar a habilidade de regeneração das células pulmonares, os responsáveis pelo estudo apontam que o nutriente pode servir como terapia para indivíduos com lesões no órgão.
“No momento, milhões de pessoas, especialmente após a pandemia da Covid-19, vivem com função pulmonar insuficiente porque seus pulmões não se curaram totalmente de uma infecção ou por algum outro motivo. Nossos experimentos em camundongos mostraram que a administração de ferro pode ajudar os pulmões a se regenerarem, e temos maneiras realmente boas de fornecer medicamentos diretamente aos pulmões - como inaladores para asma”, diz Tammela.
No entanto, essa estratégia precisaria ser cuidadosa já que essa adição extra de ferro seria uma faca de dois gumes: ao mesmo tempo que melhora a regeneração das células pulmonares, reverte a proteção natural contra o câncer que se vê entre os muito idosos. “Portanto, esse tipo de abordagem pode não ser adequada para pessoas com alto risco de desenvolver câncer”, acrescenta o pesquisador.
Fonte:https://oglobo.globo.com/saude/noticia/2024/12/05/risco-de-cancer-diminui-radicalmente-apos-os-80-anos-e-nova-pesquisa-ajuda-a-explicar-o-porque.ghtml
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