'SEXO E PRAZER ERA UMA COMBINAÇÃO IMPROVÁVEL, ATÉ QUE VEIO A MACONHA' E TAMBÉM SÉRUNS À BASE DE CBD PROMETEM AMENIZAR DORES DURANTE O SEXO

 

Crônicas do prazer (Foto: Bárbara Quintino)

Crônicas do prazer (Foto: Bárbara Quintino)

  • Natacha Cortêz
 Atualizado em 

Estamos em 2022 e não faltam estudos comprovando os efeitos benéficos da Cannabis na saúde humana. Ansiedade, insônia, dores crônicas, epilepsia, implicações do câncer, Alzheimer, Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT), esclerose múltipla e fibromialgia são apenas algumas das condições que podem encontrar nas substâncias extraídas da planta da maconha alívios e surpreendentes respostas. Ora, se a Cannabis consegue agir tratando as mais severas enfermidades, o que pode fazer com nosso funcionamento sexual? Essa é a pergunta que os pesquisadores se esforçam para responder agora. E vão além: há pesquisas que já demonstram que a Cannabis pode ter um componente de gênero na sua ação no organismo humano. Em outras palavras: há fortes indícios de que a maconha bate diferente no sexo das mulheres cisgênero.

A maconha

“Sofri com vaginismo a maior parte da minha vida sexual. Na verdade, desde a minha primeira vez, a penetração foi sentida como uma violência. Sexo e prazer era uma combinação improvável, que só me rendeu frustração e dor. Até que veio a maconha e a resposta do meu corpo foi: 'Existe luz no fim do túnel.'” O depoimento é da maquiadora Raquel Dias, de 33 anos, que passou a fumar maconha por conta de um ex-namorado.

“Ele fumava antes de dormir, e isso ajudava demais na insônia que tinha. Um dia propôs que a gente fumasse antes do sexo. Ele tinha certeza que eu ficaria mais relaxada. Foi impressionante. Não só relaxei como o meu corpo amorteceu, ficou solto, e a minha pele ultra sensível. Senti prazer como nunca antes, mesmo sendo penetrada, que foi o que mais me pegou. O meu vaginismo não aconteceu naquela noite. Isso foi transformador em mim.”

Raquel só sentiu isso tudo graças ao Sistema Endocanabinoide (SEC), explica a psiquiatra e mestranda em neurociência Mariana Muniz. É por causa dele que o tetrahidrocanabinol (THC) e o canabidiol (CBD), as principais substâncias extraídas da Cannabis, podem agir. Presente em todo o organismo humano de maneira abundante, o SEC é formado por moléculas produzidas pelo próprio corpo, muito semelhantes às contidas na planta da maconha, e por receptores que possibilitam a ligação de umas às outras.

“A ciência tem mostrado que o SEC parece ter um importante papel quando falamos de prazer sexual das mulheres. Na periferia do nosso corpo, ele modula a liberação e a resposta dos hormônios sexuais femininos, como o estrogênio e a progesterona. Já a nível central, em regiões cerebrais responsáveis pelo desejo e satisfação sexual, pode interagir com outros elementos neuroquímicos envolvidos com o interesse e prazer sexual, como a dopamina, noradrenalina, serotonina, prolactina e ocitocina”, diz Luzia Sampaio, farmacêutica, neurocientista e consultora científica da HempMeds, companhia que trabalha exclusivamente com desenvolvimento e venda de produtos de Cannabis para fins medicinais.

De acordo com Luzia, estudos que buscaram separar a resposta de acordo com o gênero dos analisados descreveram que a percepção da Cannabis é de fato maior nas mulheres, as deixando menos ansiosas, mais desinibidas e com maior sensibilidade ao toque. “Isso acontece possivelmente por conta da influência dos hormônios sexuais femininos.” Ainda segundo Luzia, outras pesquisas mostraram que, após um estímulo sexual (masturbação ou filmes eróticos, por exemplo), os níveis de endocanabinóides – e então, seja nos corpos das mulheres ou dos homens – aparecem alterados, corroborando a hipótese de que o SEC tem uma importante correlação com estímulo e prazer sexuais.

Crônicas do prazer (Foto: Bárbara Quintino)

Crônicas do prazer (Foto: Bárbara Quintino)

O sexo

Mônica Guimarães, de 35 anos, é professora do Ensino Fundamental. Sua história com a maconha começou pelo preconceito. “Em todos os lugares pelos quais eu transitava, a maconha era lida como droga maléfica que precisava ser combatida.  E ponto. Passei a reproduzir o que ouvia até ter contato com uma amiga pesquisadora, com pós-doc em educação, premiada no exterior e que fumava todos os dias depois do trabalho. Além de ser incongruente, o fato de a mulher mais foda que conheço fumar 'droga' todo dia era motivo para eu me questionar muito.”

Mônica foi se aproximando da amiga e pôde ressignificar as ideias que tinha a respeito da maconha. Um dia, ela também quis fumar e decidiu que faria isso com a amiga que lhe apresentou a erva. “Foi uma delícia, bateu bem em mim, fiquei solta, dançamos pela sala e rimos de tudo. A gente estava numa fase muito íntima da nossa amizade, dividíamos tudo uma com a outra, amávamos ficar juntas. Nesse dia em que fumei, quis desesperadamente beijá-la. Era como se o meu corpo não pudesse se segurar, queria colocar as minhas mãos no pescoço dela, bagunçar o cabelo, tocar os ombros, segurar pela cintura. Para a minha sorte, ela também quis tudo isso. A maconha me deu a coragem de me jogar em cima dela, mas também de liberar o meu desejo, até então latente, escondido de mim mesma.”

Mônica e a amiga transaram naquele dia. Por horas. “Não é que sem a maconha a gente não teria feito, mas gosto de dizer que foi o nosso catalisador, que por causa dela fiquei desinibida e fogosa de um jeito que nunca havia ficado antes.”

Crônicas do prazer (Foto: Bárbara Quintino)

Crônicas do prazer (Foto: Bárbara Quintino)

As mulheres

Os efeitos da Cannabis – do relaxamento, passando pela sonolência, até às sensações mais lúdicas e prazerosas – podem ser obtidos via oral ou inalatória (vulgo, fumando mesmo). Há ainda produtos lubrificantes criados para serem aplicados diretamente na vulva e vagina, que combinam óleo de coco e Cannabis. São usados para intensificar o prazer sexual, aumentando a duração e a intensidade de orgasmos – mas ainda sem estudos publicados que comprovem a eficácia. Importante: lubrificantes à base de óleo só podem ser usados com preservativos de poliuretano. Óleos em geral danificam o látex das camisinhas.

A designer de joias Juliana Nalim, de 28 anos, quis testar um lubrificante depois de ver uma thread no Twitter sobre esse tipo de produto. Optou pelo XapaXana, um óleo à base de Cannabis vendido na internet. “Age através da absorção da mucosa vaginal, com isso deixa a região muito mais sensível aos toques. Deve ser aplicado uma hora antes do ato sexual. A mucosa irá absorver o produto”, diz o site do produto.

Juliana relata aqui sua experiência: “Curto comprar sex toys e lubrificantes para usar na masturbação, é um jeito de investir no meu prazer. Quando vi a thread, corri para comprar o produto, sabia que ia gostar. Sou uma entusiasta de tudo que tem maconha, meu corpo sempre amou os efeitos dela, fico mais animada, mas ao mesmo tempo relaxada. Precisava saber como a minha vagina ia receber um óleo à base de Cannabis. E foi melhor do que a expectativa, porque é muito diferente de outros lubrificantes que já usei. Primeiro porque o efeito não é só proporcionado pela textura e a sensação do óleo na pele. A mucosa fica ultra sensível, levemente dormente e vai rolando uma excitação meio inexplicável. Tive um orgasmo usando esse óleo que foi inesquecível, mais longo, potente. Recomendo que toda mulher teste.”

A pesquisadora Eliana Rodrigues, coordenadora do curso de Cannabis Medicinal da UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo), acrescenta dizendo que os poucos estudos realizados a respeito da Cannabis e a sexualidade apontam ainda para as ações bifásicas da planta no funcionamento sexual das pessoas. Ou seja, são esperados efeitos afrodisíacos e antiafrodisíacos, a depender do momento, dosagem e perfil de quem consome. A maconha pode deixar você mais sensível e a fim de transar – especialmente quando ingerida em quantidades baixas – ou provocar o efeito oposto, cair num sono profundo, por exemplo. Seu conselho para quem quer experimentar a combinação maconha e sexo, seja por via oral, inalatória ou através de lubrificantes, é ir muito aos poucos e sentindo como o corpo reage. Aqui, também sugerimos: faça sempre em condições seguras, sem misturar com outras substâncias e, se acompanhada, ao lado de quem você confia.


Fonte:https://revistamarieclaire.globo.com/Sexo/noticia/2022/07/sexo-e-prazer-era-uma-combinacao-improvavel-ate-que-veio-maconha.html

 (Foto: Mariana Simonetti)

(Foto: Mariana Simonetti)



  • Natália Eiras
  • Colaboração para Marie Claire
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Depois de uma cirurgia para a retirada de pólipos endometriais, Carolina*, de 34 anos, passou a sentir dor durante o sexo, especialmente na penetração. Por conta do profundo desconforto, evitava ter relações sexuais. Numa consulta ginecológica realizada neste ano, ouviu que poderia lidar com o problema usando um sérum à base de canabidiol (CBD), uma das substâncias presentes na Cannabis, a planta da maconha. Funcionou. "É o que tem me ajudado a transar quase sem dor. O produto não tirou completamente o incômodo, mas se antes eu sentia no nível oito, agora é dois. Voltei a ter prazer no sexo”, ela conta.

Dor durante o sexo faz parte da vida de uma parcela considerável das mulheres. Dados de 2019 do Programa de Estudos em Sexualidade (ProSex) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) mostram que 18% das brasileiras sentem incômodos físicos nas relações íntimas. E a falta de libido é outro sintoma também comum: um levantamento realizado pela Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo por meio do Cresex (Centro de Referência e Especialização em Sexologia) do hospital estadual Pérola Byington em 2013 aponta que a falta ou diminuição do desejo sexual afetam 48,5% das mulheres que procuram auxílio médico por conta de disfunções sexuais.

Causadas por motivos que vão desde endometriose até ansiedade e estresse pós-traumático, as dores podem inibir uma parte natural da saúde sexual e das interações afetivas de qualquer pessoa.

Em março deste ano, entrou em vigor a resolução RDC 327/2019 da Anvisa, que libera a comercialização de fármacos à base de Cannabis em farmácias de todo o Brasil. O órgão também simplificou a importação desses itens. Essas decisões abriram o mercado para séruns e óleos como o Íntima (R$ 169) e o XES Sensual, que, usados na região vaginal, prometem aumentar a libido e diminuir a sensação de dor durante penetração.

“Há estudos que dizem que o CBD tem uma ação tanto analgésica quanto antiinflamatória, então ele pode ser um aliado no tratamento de doenças como vulvodínia (dor ou desconforto na região da vulva) e dispareunia (dor intensa durante ou após a penetração)”, diz a ginecologista Lilian Fiorelli.

Usado minutos antes do sexo, um produto à base da planta da maconha diminuiria a sensação de dor, mas não a sensibilidade da região. Antes da liberação deles, Lilian receitava anestésicos como a lidocaína, que até tiravam a dor, mas também o prazer. Além disso, o CBD também tornaria o sexo mais prazeroso ao aumentar a circulação de sangue na região, o que ajudaria pacientes que sofrem com a falta de libido. Ainda assim, as pesquisas por enquanto são muito recentes e podem ser contraditórias.

Porém, seja em caráter experimental ou não, é importante lembrar que o composto não é a cura de todos esses problemas. Ele é apenas parte do tratamento. Quem sofre com as dores deve continuar fazendo o acompanhamento médico para que a causa delas ou a falta de líbido seja tratada devidamente. “E nem sempre esses produtos tiram a dor completamente, depende muito da paciente, mas faz parte do processo a gente ir quebrando essas barreiras. Porque, com a analgesia a paciente se sente mais preparada. Tem um aspecto psicológico nisso também. A partir do momento ela tem uma relação sexual prazerosa, cria-se uma lembrança positiva”, completa a ginecologista.

Aqui, os relatos de Carolina e outras duas mulheres que deram uma chance ao canabidiol.

“É como se eu tivesse ganhado uma outra vida”
Laura*, 37, comerciante, de Joaçaba (SC)

“Tenho endometriose profunda e sempre tive muita dor. Sentia cólica, tinha problemas com intestino e dor na relação. Era uma dor bem incômoda, tanto profunda como na parte superficial. Era horrível. Algo que era para ser prazeroso, era doloroso. Essa dor existiu desde o início da minha vida sexual. Já teve dias que não tive relações por causa da dor. Era incapacitante. Sou casada há cinco anos e meu marido sempre teve muita paciência, sempre buscou comigo tentar resolver isso. Se não fosse o companheirismo dele, talvez tudo teria ido por água abaixo. Há três meses fiz a cirurgia para a endometriose e comecei a usar um sérum com CBD. E assim, senti uma boa melhora. Ainda sinto um pouco de dor, mas é outra coisa. Ele ajuda a relaxar a região e até aumenta o prazer. Agora a gente tem colhido os frutos de tudo isso, agora que podemos viver de verdade a relação. Falo agora que consigo aproveitar a nossa relação sexual porque foi um caminho com bastante sofrimento. Faz apenas três meses, então tende a melhorar ainda mais. É como se eu tivesse ganhado uma outra vida. Parece que faltava alguma coisa, mas agora me sinto bem mais realizada.”

“A falta de libido era incapacitante. [O produto] resolveu o meu problema”
Camila*, 31, designer, de São Paulo (SP)
“Sou muito ansiosa, então fui procurar ajuda médica. Ao começar a tomar antidepressivos para tratar a ansiedade, vi a minha sexualidade mudar.​ ​Foi impactante, não tinha libido nenhuma. Era difícil para entrar no clima. Meu marido vinha e eu sentia cócegas, não vontade de fazer sexo. Ficava frustrada porque às vezes queria ter a relação, porque isso afeta de uma forma ou outra, e não conseguia da mesma forma que antes dos antidepressivos. E ficava mal porque sentia que a culpa era minha, ficava me sentindo desconfortável. Isso me incomodava muito, porque mexe com a gente. Estava faltando algo. Ficávamos até quatro semanas sem ter relações por isso. Até que meu próprio psiquiatra receitou o produto com CBD.
Fiz todo o procedimento, demorou um pouco, mas o produto chegou. Passo alguns minutos antes de ter relação. Ele dá um geladinho e até me ajuda na sensibilidade na hora da relação. Para mim, resolveu o meu problema. Não fico mais sem isso. Gosto muito mesmo. Finalmente voltei a me sentir mais normal novamente”.

“Voltei a ter prazer no sexo”
Carolina, 34, médica, de São Paulo (SP)
“Depois de fazer uma cirurgia para retirada de pólipo endometrial, comecei a sentir dor durante o sexo. Uma sensação profunda. Nunca havia sentido nada do tipo. Comecei a evitar ter relações sexuais, porque sentia muito desconforto. Tentava ter o mínimo de penetração que podia. Eu me sentia impotente, tinha exatamente essa sensação.
Isso começou a impactar o meu relacionamento, então, procurei ajuda médica. O diagnóstico foi de dispareunia, que pode ter causas psicológicas. Ela me orientou a lidar com isso usando lubrificantes e óleo de coco, mas não funcionou para mim. Por isso, ela falou para eu experimentar um sérum com CBD. É o que tem me ajudado a ter relações sexuais novamente. Ele não tirou completamente a dor, mas se eu sentia no nível oito, agora é dois. Sinto um incomodo, mas nada como antes. Passo um pouco antes da penetração, o que é o suficiente para melhorar minha qualidade de vida. Ele até aumenta a sensibilidade da região. Voltei a ter prazer no sexo.”

Quem pode comprar e como comprar
Por mais que a venda tenha sido liberada pela Anvisa, produtos à base de CBD não são exatamente acessíveis em qualquer farmácia. A compra, por enquanto, ocorre em caráter de excepcionalidade. O médico deve fazer um diagnóstico e, caso detectada a necessidade desse tipo de tratamento, é feita uma receita controlada.

Como muito dos produtos só podem ser adquiridos por importação, há um passo adicional para quem vai mandar trazê-los de fora. Nestes casos, é necessário acessar o portal gov.br, preencher um formulário de autorização de importação excepcional de produtos à base do canabidiol e esperar que um laudo seja emitido. Apenas com o documento em mãos, é possível fazer a compra do produto.

Mesmo antes da liberação de produtos com CBD, havia no mercado informal óleos que levavam maconha na composição. Porém, os especialistas não indicam esse tipo de produto. “Porque não há controle nenhum do que pode estar na composição”, diz Lilian Fiorelli.

Fonte:https://revistamarieclaire.globo.com/Amor-e-Sexo/noticia/2020/10/novidade-no-mercado-seruns-base-de-cbd-prometem-amenizar-dores-durante-o-sexo.html


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