“Tive anorexia, bulimia e, hoje, 20 quilos mais gorda, aprendi a gostar de mim”
A influenciadora Dora Figueiredo, 25 anos, passou a vida preocupada com o corpo. Aos 12, decidiu que um dia colocaria silicone nos seios. Aos 15, começou a fazer dietas para emagrecer. Em 2018, solteira depois de uma separação, se viu no fundo do poço e entendeu que precisava de tratamento. Começou a cuidar da depressão e da ansiedade, e finalmente admitiu para si mesma que tinha compulsão alimentar. Hoje, com 20 quilos a mais, ela diz que se sente feliz e inspira outras mulheres a aprenderem a se amar
"As histórias com os corpos das mulheres são marcos desde a infância. A gente mal menstrua e já chega uma sequência de coisas para você fazer e 'se tornar mulher de verdade'. Eu, com 12 anos, lendo uma revista feminina, decidi que precisava colocar silicone. A condição era: se até os 14 eu não tiver peito, topo a cirurgia. Comecei a juntar dinheiro para isso e, aos 21, realmente coloquei os implantes. Cresci repetindo a máxima: 'Tenho que me sentir desejada pelos homens, e faço o que for preciso para isso acontecer'.
Quando mais nova, era realmente magra e, na época, não ter curvas era meu grande problema. Fui crescendo, ganhando altura, e entrei numa paranoia de que eu não podia engordar de jeito nenhum. Achava que, se acontecesse, seria o fim da minha vida. As minhas referências vinham das revistas e novelas: para onde eu olhava, só tinha mulher muito magra. Aos 14, comecei a ter dismorfia corporal, ou seja, não me via como era. O que eu enxergava no espelho era alguém duas, três vezes, maior. Hoje, quando olhos fotos da minha adolescência, lembro, claramente, daquele sentimento. E veja só: eu pesava 50 quilos, com 1,70 de altura.
Aos 15, já fazia as dietas mais loucas. Comecei a tomar anticoncepcional, engordava um pouco e fazia a dieta da sopa. Com a moda do detox, passava quatro dias só tomando suco e não conseguia sair da cama, de tão fraca que ficava. Na minha cabeça, não podia passar dos 60 quilos. Parecia uma meta de vida, a coisa mais importante. Chegava aos 58 quilos e pensava: ‘Tenho emagrecer’. E aí fazia mais e mais dietas absurdas. Nesse momento, passei a procurar por blogs sobre anorexia e bulimia. Queria saber o que aquelas mulheres tão magras faziam para se manter daquele jeito.
A esse cenário, se juntaram depressão e ansiedade. Vivi um relacionamento abusivo e minha condição piorou muito. Porque meu ex falava o tempo todo que eu estava engordando. Depois que a relação terminou, me dei conta: ou me matava ou começava a olhar para mim de uma maneira mais carinhosa. Estava no fundo do poço. Foi ele que terminou comigo, num dos piores momentos da minha. Mas foi depois disso que consegui me curar e perceber o quanto a minha felicidade dependia da percepção de um homem. Então, priorizei minha saúde mental e me afastei das pessoas tóxicas com quem convivia. E percebi que me havia podado a vida inteira, me moldado pelos homens e para os homens. Assim, aos poucos, fui mudando. E, dessa vez, era por mim. Passei a falar dos transtornos alimentares na terapia.
Hoje, me olho no espelho com carinho. Mas foi uma batalha dura para chegar a esse momento. De tratamentos psicológico, psiquiátrico, de tomar cuidado as minhas escolhas, de pensar em mim com prioridade. Parei de ir a lugares que me faziam mal, de seguir pessoas que me faziam mal, de conversar com gente que me falava sobre dieta. Me afastei da maioria das pessoas que eu conhecia, simplesmente porque precisava fazer isso. Consegui fazer em um ano o que não consegui a vida inteira: me curar do transtorno alimentar. Mas só consegui porque estava solteira.
Claro que, sendo uma influenciadora, as pessoas começaram a comentar meu ganho de peso. No começo, perguntavam se eu estava grávida. Juro que cheguei a acreditar que estava, porque as pessoas diziam aquilo com tanta convicção que eu até duvidava. Comecei a ficar neurótica, fiz até aquele teste de farmácia.
Depois, fui entendendo o momento que meu corpo precisava passar, sem me restringir. Estou sendo acompanhada por uma nutricionista, que sempre fala: ‘Quem tem tendência ou já teve compulsão alimentar, tem que tomar muito com cuidado com dietas, porque elas podem desencadear um novo transtorno’.
Minha mãe, que sempre ficava angustiada quando me via magra demais, me apoiou muito nessa fase. Quando cheguei a um peso mais indicado para a minha altura, ela ficou feliz. Meus seguidores também me apoiaram. A verdade é que, depois de um tempo, com os comentários do tipo: ‘Ver o seu corpo me deixa bem com o meu corpo’, passei a me sentir bem também dentro dele. Sem planejar, acabei inspirando outras mulheres a buscar tratamento. Exercício foi outra coisa que tive que ressignificar. Sempre exagerei, mas para emagrecer. Em 2019, voltei a fazer atividade física sem pressão. Dentro da academia, passei a escolher um espaço onde me sentisse segura sem me sentir observada e passei a frequentar grupos de corrida.
Agora, peso 73 quilos e me sinto feliz. Muito feliz. Consegui diminuir a compulsão alimentar e acabei com o efeito sanfona. Mais para a frente talvez emagreça ou engorde, mas isso não é mais um caos na minha vida. Nem balança tenho mais em casa, me peso de vez em nunca. Olho para o meu corpo e acho lindo, maravilhoso. Tem as coisas que não gosto e nunca vou gostar? Tem. Coisas que vão mudar e coisas que vão ficar como está. E tudo bem."
Fonte:https://revistamarieclaire.globo.com/EuLeitora/noticia/2020/01/tive-anorexia-bulimia-e-hoje-20-quilos-mais-gorda-aprendi-gostar-de-mim.html
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