NO CAMPO, INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL JÉ É CAPAZ DE CONTROLAR HERBICIDAS E PREVER MUDANÇAS CLIMÁTICAS

 Robô da Solinftec usa sensores para detectar saúde da lavoura

No campo, inteligência artificial já é capaz de controlar herbicidas e prever mudanças climáticas

Ferramentas de IA aplicadas ao agronegócio são tendências de produção mais sustentável

Por 

Carolina Nalin

30/11/2023 04h30  Atualizado há 4 meses

Imagine o desafio de um agricultor que possui 5 mil hectares de terra e precisa monitorar o processo de produção de uma cultura em meio às intempéries. Ou ainda a dificuldade enfrentada por um gestor público que necessita prever o tempo e mapear locais de risco para conter deslizamentos de terra ou ondas de calor.

Graças à inteligência artificial, gerenciar cenários complexos assim ganhou assertividade. Do campo à cidade, a IA se tornou uma aliada das organizações para enfrentar os principais desafios de sustentabilidade do século XXI, como mudanças climáticas, gestão de recursos e desenvolvimento sustentável.

E a expectativa de impacto dessas ferramentas é alta. Relatório encomendado pela Microsoft aponta que a IA poderá contribuir com US$ 5,2 trilhões para a economia mundial, além de reduzir as emissões de gases de efeito estufa em até 4% e criar 38,2 milhões de novos empregos globalmente até 2030.


A Usina Caeté, empresa produtora de etanol e cana-de-açúcar em Alagoas e São Paulo, investiu na criação de uma central de inteligência agrícola em 2020, além de sensores e sistemas de IA para otimizar o processo produtivo. E o resultado foi uma economia de R$ 3,5 milhões em logística.

A companhia utiliza a Alice, uma plataforma de IA que trabalha na nuvem e faz recomendações para a tomada de decisão. A assistente virtual identifica o transbordo (caçamba anexada a um trator que recebe a cana) mais próximo da colhedora. Quando sua capacidade lota, o sistema define via geolocalização o caminho a ser feito pelo operador de máquina até a usina. Depois, aciona outro equipamento próximo.

Com a tecnologia, a IA diminuiu o tempo de motor ocioso e levou a uma economia de R$ 1 milhão em combustível de 2020 para 2021.

Os ganhos só foram possíveis a partir das soluções da startup brasileira Solinftec, que cria ferramentas inteligentes para o agronegócio. Além da Alice, a empresa desenvolveu o robô Solix AG Robotics que funciona com energia solar e pode ser integrado à plataforma de IA.

A máquina é capaz de percorrer uma plantação inteira em busca de uma erva daninha e as trata de forma individual, reduzindo em até 95% o uso de herbicidas na produção. Já à noite, o Solix Hunter (outra versão do robô) “caça” insetos usando eletricidade e feixes de luz e eleva a produtividade.

— O produtor consegue ver tudo em tempo real. Hoje você não consegue fazer gestão sem tecnologia — diz Emerson Crepaldi, diretor de operações da Solinftec na América do Sul.

A um clique de distância, produtores rurais no Sul do Brasil hoje conseguem saber o momento ideal para plantar, colher, fertilizar e pulverizar. A “salvação da lavoura” veio com as soluções da Ignitia, uma climatech que trabalha com análise de dados climáticos e modelagem preditiva avançada.

A empresa obtém informações geradas pelo modelo do Centro Europeu de Meteorologia e aplica uma camada de inteligência artificial sobre os dados, de forma a compreender padrões sobre climas tropicais.

Assim, a companhia fornece aos produtores informações precisas e hiperlocalizadas sobre o clima, que podem ser adaptada tantos para uma multinacional quanto para um pequeno produtor.

Os insights auxiliam na programação do plantio, aplicação de fertilizantes e herbicidas, por exemplo. Os dados chegam via plataforma, app, SMS ou WhatsApp.

—Tudo isso traz não só benefício econômico, mas também um impacto positivo como a redução de produtos químicos aplicados nas culturas — diz João Rodrigo de Castro, diretor regional para América Latina da Ignitia.

O setor público também já usa a tecnologia em prol da sustentabilidade. Na cidade de Pindamonhangaba (SP), a prefeitura firmou parceria com a startup iNeeds para aprimorar o serviço da Defesa Civil. Para isso, começou a mapear áreas de risco e a monitorar informações coletadas por sensores de temperatura e umidade. A IA cruza dados e o app da prefeitura dispara alertas aos cidadãos sobre o tempo.

— A tecnologia dá ao prefeito condições de gerenciar melhor os desafios de uma cidade. Treinamos a IA com aprendizado profundo de máquina. Quanto mais dados, melhor será a assertividade ao longo do tempo — diz Danilo Velloso, secretário de tecnologia, inovação e projetos de Pindamonhangaba.

A Sipremo é outra startup que tem auxiliado o setor público e privado com soluções de IA. O foco é criar previsões do impacto de eventos nas operações de clientes.

Na carteira estão entes públicos e empresas privadas de setores como mineração, seguros, finanças, florestal, siderurgia e logística. Todas são grandes instituições que enfrentam impactos da variabilidade climática em sua cadeia de valor.

A IA da Sipremo é treinada com dados públicos e privados, nacionais e internacionais. Segundo Gabriel Savio, CEO da startup, há casos de empresas que reduziram os custos em 40% com o uso da ferramenta, enquanto outras aumentaram sua produtividade em mais de 50%. Há ainda uma melhoria de quase 60% na agilidade do processo de tomada de decisão:

— Há ainda os benefícios ambientais, nos quais contribuímos para a redução das emissões de gases na atmosfera e a diminuição do consumo de combustíveis, graças à assertividade que a tecnologia proporciona.

Especialista em inovação e sustentabilidade, Alexandre Carrasco, consultor do Ethos Serviços (unidade do Instituto Ethos que ajuda empresas a desenvolver soluções de sustentabilidade), avalia que é possível as empresas conciliarem ganhos financeiros com ambientais.

O que não se pode, diz ele, é apostar na tecnologia só pensando no ganho econômico. Diante das mudanças climáticas, é preciso adotar uma postura pró-ativa:

— É preciso falar: “Não vou ter lucro por dois anos até alcançar net zero” (zero emissões de gases poluentes). Ou então: “Vou ampliar investimentos de inovação para poder mitigar impacto social”, por exemplo. Os esforços são insuficientes no mundo hoje e isso requer que as empresas repensem a forma de agir. Se o lucro for o direcionador, talvez não dê tempo.


Fonte:https://oglobo.globo.com/economia/tecnologia/noticia/2023/11/30/no-campo-inteligencia-artificial-ja-e-capaz-de-controlar-herbicidas-e-prever-mudancas-climaticas.ghtml

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