'POCKETING': CONHEÇA O NOVO TIPO DE RELACIONAMENTO QUE NÃO INCLUI O PARCEIRO NA SUA VIDA SOCIAL

  

'Pocketing': conheça o novo tipo de relacionamento que não inclui o parceiro na sua vida social.
'Pocketing': conheça o novo tipo de relacionamento que não inclui o parceiro na sua vida social. FreePik

Por Gabriela Origlia, La Nacion

 

Em tempos em que rapidamente se cria uma palavra para definir um comportamento, “pocketing” descreve aqueles relacionamentos nos quais um não quer incluir o outro em seu convívio social, muito menos expor fotos do casal nas suas redes sociais. Não se trata de dispensar a tão famosa “apresentação oficial" de décadas atrás. Trata-se de fingir diretamente que a relação não existe. É como delimitar o relacionamento apenas ao campo virtual e guardar a outra pessoa no bolso — como se faz com o celular.

Psicólogos e sexólogos admitem que está se normalizando a conduta de avançar a relação no campo sexual mas não no emocional. Os especialistas reconhecem que os aplicativos de namoro e os vínculos gerados a partir do mundo virtual alimentam esses comportamentos. O “pocketing” pode ser uma forma de buscar proteção no nível emocional, enquanto — em alguns casos — também há evasão do compromisso que implica ter um vínculo afetivo.

— A questão é que a relação sexual não é satisfatória. É fácil dar match no Tinder e depois aparecerem a contradição, as dificuldades. As consultas de pacientes que me procuram por conta deste assunto estão aumentando exponencialmente. Eles apresentam crises de casal, de ansiedade, depressão. São dificuldades de vínculo, em geral — diz a sexóloga e psicóloga Silvia Aguirre.

Na sua opinião, existe uma “certa obrigação” de ter uma vida sexual ativa e, em muitos casos, de ter contato com outra pessoa:

— É o mandato social da época, e isso em si é bom, é uma necessidade humana que permanece e é um indicador saudável se o que as pessoas desejam está sendo alcançado. Mas nem sempre isso acontece. Nesses encontros, repete-se um roteiro sexual normativo, repete-se a fórmula mesmo quando ela não funciona.

Há cada vez mais casos de pessoas que dizem ter dificuldades em estabelecer ligações “reais”, que não ficam satisfeitas mesmo quando têm relações sexuais que diziam ser o que queriam. Os especialistas relatam que a comunicação “instantânea” das redes sociais é aplicada aos vínculos. E isso nem sempre funciona.

Para a psicóloga Paula López , o imediatismo é o denominador comum do contato e do não contato, a depender da situação.

— Muita coisa começa no mundo virtual e tende para o emocional, por exemplo, quando a pessoa quer ser ouvida, acompanhada. Do outro lado, quando se marca um encontro presencial, o casal não conversa e o foco fica todo na atração física. A necessidade é rapidamente satisfeita, mas não se tolera realizar todo um processo com o outro — analisa López.

Questionada sobre o que seria esse processo, ela aponta que ele começa quando o outro passa a demandar suas necessidades:

— Não há tolerância. Estamos no imediatismo e isso acontece em adolescentes e adultos. Eles vão de um melhor amigo para outro, não exercitam o que chamamos de “tolerância à frustração”.

Há quem diga que faz o “pocketing” com “boas intenções”, com a ideia de que “aquilo que ninguém sabe, ninguém estraga”.

As descrições dos psicólogos estão de acordo com o que o sociólogo Zygmunt Bauman conceituou como “amor líquido”, um vínculo frágil. Associou-o ao fugaz, à necessidade de satisfazer uma necessidade momentânea e depois abandoná-la. Bauman, inclusive, não a limita às relações com os outros, mas até consigo mesmo. “A liquidez do amor-próprio”, sintetizou.

A 'ditadura do prazer'

Para a psicóloga, sexóloga e especialista em vínculos Gladys Larocca, atualmente sabe-se muito sobre como se fazer sexo, mas ainda há um grande tabu sobre o assunto. No entanto, ela pondera que muitas pessoas estão se relacionando sexualmente de uma maneira indiretamente “forçada” e reforça que isso causa “muito estrago”.

— Não é forçado quando estamos em conexão com nosso desejo, mas se for confundido por desejos externos, e o que está na moda, perde-se o eixo, a autenticidade. Existe uma ditadura do prazer e nos perdemos quando seguimos qualquer tipo de ditadura — diz.

López sustenta que há um fator que tem sido muito descontextualizado e o vê como consequência das práticas pseudopsicológicas que focam nas suas necessidades e deixam o outro de lado:

— Se estou em um relacionamento e não quero mais, devo ser responsável, perceber a vulnerabilidade do outro e a minha. Não é só buscar uma saída rápida para o término, e evitar o vínculo.

A dificuldade em estabelecer e manter vínculos com “maior profundidade” é cada vez maior e isso ocorre por causa do individualismo, indica Aguirre. E ela está convencida de que a pandemia “jogou contra”, pois maximizou os medos e também o sentimento de solidão.

— O século passado teve como prioridade o modelo do relacionamento permanente, dos papéis estereotipados e rígidos, do casal heterossexual em primeiro plano. Esse modelo perde validade. Outros tipos de relacionamento ocorrem junto com o aprofundamento do individualismo — afirma.

Ela enfatiza que sua descrição não vai contra a liberdade ou o prazer sexual.

— Deve-se pensar o que você faz por querer e o que faz por medo. Vemos dificuldades importantes, contradições entre o que está sendo feito e o que se está procurando.

Por sua experiência no consultório, ela diz que existem diferenças entre homens e mulheres. Eles curtem o perfil e logo partem para o próximo, visando a multiplicidade de parceiras, e não querem ficar presos nesses vínculos. Já elas buscam maior estabilidade, embora entrem na dinâmica da multiplicidade esperando encontrar um elo mais estável.


Fonte:https://oglobo.globo.com/saude/bem-estar/noticia/2023/01/pocketing-conheca-o-novo-tipo-de-relacionamento-que-nao-inclui-o-parceiro-na-sua-vida-social.ghtml


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