O Altar Budista e a prática devocional
BY ADMIN23/05/2019
A
prática do altar é uma forma de alimentarmos a mente com o Dharma, de a
nutrirmos com boas qualidades, de estabelecermos uma conexão emocional e
enraizarmos a prática em nós.
O que representa? É idolatria?
Um altar budista representa principalmente as 3 Jóias (Buda, Dharma e Sangha) e o nosso potencial de nos tornarmos num Buda. Existe muita simbologia no altar que nos comunica e nos relembra determinados aspetos do Caminho.
Não se trata de endeusar ou de idolatria. Nós somos influenciados pelas coisas com as quais contactamos. A prática do altar é uma forma de alimentarmos a mente com o Dharma, de a nutrirmos com boas qualidades, de estabelecermos uma conexão emocional e enraizarmos a prática em nós. É um treino da mente. É uma forma de treinar generosidade e outras qualidade. É um meio hábil para a prática budista.
Conforme diz Ven Narada:
“Os Budistas não adoram imagens esperando favores espirituais ou terrenos, mas prestam reverência ao que elas representam.
Um Budista consciente, oferecendo incenso e flores a uma imagem, se faz sentir expressamente a si mesmo na presença de Buddha em vida, e assim, ganha inspiração da sua personalidade nobre e respira profundamente da sua compaixão ilimitada. Tenta seguir o nobre exemplo de Buddha.”
Lama Gyurme afirma que:
“Quando somos adolescentes às vezes gostamos de ter imagens dos nossos heróis. Para uns poderão ser heróis de música, do desporto, ou mesmo de um certo ativismo; que de alguma forma recordam que há certas qualidades excepcionais que temos como seres humanos.
Podemos dizer que ao ter este altar com as representações do corpo, fala e mente iluminados, nos recordam da nossa verdadeira natureza, nos recordam que somos muito mais que meramente as ideias que convencionalmente temos sobre nós.”
Antigamente a maioria das pessoas eram analfabetas, não havia os livros como agora nem um acesso fácil a professores. A prática do altar era uma das formas das pessoas terem os ensinamentos presentes.
Apesar de hoje os tempos serem outros, a prática do altar continua a ser relevante e a ter a sua utilidade. Mas claro que o praticante não é obrigado a ter um altar e a fazer esse tipo de prática, há quem se sinta mais inclinado à pratica devocional e quem se sinta menos.
Nós somos seres ritualísticos, são vários os rituais presentes no nosso dia a dia, fazemos rituais de tal forma automáticos que na maioria das vezes nem percebemos. Por exemplo: Cantar os parabéns a alguém, dar um aperto de mão (expressando amizade e mostrando uma mão vazia de armas), etc.
O altar serve para a prática budista e não tem como objetivo a decoração ou as pessoas passarem uma imagem de si mesmas para os outros, por isso quando se monta um altar ou se usa objetos budistas é importante refletir sobre a motivação, se não pode acabar se transformando em materialismo espiritual. Muitas pessoas até montam um altar com o “Buda gordo” (que na realidade nem é o Buda), colocam uma moeda e colocam o “Buda” de costas para a porta para dar sorte; isso é superstição e não tem nada haver com o budismo e do ponto de vista budista não serve para nada.
Um altar budista, assim como qualquer material budista, pelo que representam devem ser tratados com respeito.
Como se originou o Altar Budista?
Monge Genshõ refere que:
“Na verdade, não haviam estátuas de Budas, nos altares, durante os 300 primeiros anos da história do budismo. Ninguém se atrevia a colocar uma estátua de Buda num altar, o que se colocavam eram impressões de pés ou uma árvore, porque ele havia se iluminado embaixo de uma árvore e diziam: “ele passou por aqui”.
As estátuas de Buda só aparecem depois do chamado “Período Gandhara”, e este período aconteceu na região que hoje engloba o Afeganistão. Ela era um reino grego, e como os gregos haviam invadido a Índia e dominaram aquela região, os gregos influenciaram o budismo para que o budismo produzisse estátuas, e as primeiras estátuas de Buda são gregas. Nariz grego, feitio grego, etc. Então, a existência da estatuária budista, é uma influência do ocidente grego sobre o budismo, assim como a existência do estoicismo na filosofia grega tem uma influência do budismo.
Essa conexão cultural entre o budismo oriental, o oriente e o ocidente normalmente é ignorada, porque nós na faculdade estudamos uma história que isola o oriente, é como se ele não existisse, e toda a história partisse da Grécia e de Roma, é a chamada “História Eurocêntrica”. E ninguém sabe quase nada aqui do que aconteceu na Índia, na China e no Japão, nesses séculos anteriores, quando nós sabemos que a civilização chinesa é mais antiga que a civilização grega, mais antiga que a civilização romana, só não é mais antiga que a civilização egípcia e babilônica.
Então, o que representa o altar para nós? É só um mecanismo de lembrança, porque as pessoas gostam de altares. Nós precisamos realmente de altares? Não, não precisamos de altares. Nós reverenciamos a lembrança do seu ensinamento e a verdade de que nós somos homens como ele, porque ele tem a água na frente dele porque morreu desidratado, mas morreu porquê? Porque comeu em casa de um ferreiro, passou muito mal, teve um enfarto agudo do mesentério, e teve uma diarréia sanguinolenta. Eu sempre pergunto nas minhas primeiras palestras: “vocês já tiveram diarréia?” Então vocês são como Buda! Vocês podem se iluminar.” – Excerto do artigo “Qual a bengala a que você está agarrado?” (blog Pico da Montanha)
Elementos de um Altar Budista e a sua simbologia
Os elementos que compõem um altar budista, a sua simbologia e a forma de praticar, varia de tradição para tradição.
Num altar pessoal por vezes as pessoas não seguem integralmente o estilo tradicional ou formal, retirando alguns elementos e adicionando outros que consideram importantes e inspiradores. Mas a forma de montar o altar vai depender também de como a pessoa está a seguir o budismo e do aconselhamento do professor ou professora espiritual.
Alguns dos seguintes elementos, todos, ou até mais, estão presentes num altar típico:
- Imagem de Buda: É a imagem principal. Deve ficar centrada e mais elevada que todas as outras. Normalmente é uma estátua mas também pode ser um fotografia do Buda. Representa o Buda histórico, os mestres iluminados, os ensinamentos, as boas qualidades do Buda e o potencial de nos tornamos num Buda.
- Imagens de Bodhisatvas: Na tradição Mahayana e Vajrayana também é comum a estátua ou fotografia de Bodhistatvas. Um Bodhistatva é um ser com um certo grau de iluminação e o que representa varia. Por exemplo: Avalokiteshvara, que em tibetano se chama de Chenrezig, em chinês de Guanyin e em japonês de kannon, é a Bodhistatva que representa a compaixão. Já o Bodhistatva Manjusri, representa a sabedoria e inteligência. O panteão de Bodhistatvas é vasto.
- Imagens de outros mestres: É comum incluir no altar uma estátua ou fotografia do mestre da linhagem, fotografia do mestre que se segue ou outros mestres inspiradores.
- Flores: As flores podem ser naturais ou artificiais. Representam a impermanência, pois belas folhas surgem mas com o passar do tempo caiem e a sua beleza perece. Lembram-nos da vida cíclica no Samsara, do nascimento, velhice e morte; instigam à paciência e ao esforço para o progresso espiritual.
- Vela: Pode ser uma vela artificial. Representa uma mente desperta, a iluminação. É a luz da sabedoria que ilumina na escuridão; é a luz que dissipa a ignorância.
- Incenso: Representa o perfume do Dharma, a virtude e as boas ações; representa os ensinamentos do Buda a espalharem-se por todas as direções; representa a realidade absoluta. O seu aroma torna o ambiente propício à calma e introspeção.
- Livro/sutra budista: Representa os ensinamentos budistas.
- Stupa: Representa a mente de um Buda, o estado búdico. O altar com um Stupa é mais utilizado pelo budismo tibetano.
- Sino: O sino ou outro objeto que produza som, como o gongo, serve para pontuar o ritmo da recitação de sutras; também representa a impermanência, pois o som que emite é efêmero, não pode ser capturado nem guardado. Assim como na vida, tudo muda, é impossível “congelar” ou manter algo sempre igual, sem nenhuma deterioração ou mudança. O som que o sino emite também se mistura com outros sons, representa por isso a vacuidade, a interdepêndencia e a não substancialidade.
- Água: O Buda morreu desidratado devido à doença que padecia, por isso com a água também queremos dizer: “se eu estivesse lá eu lhe daria água.” Lembra-nos que somos humanos como ele, sujeitos à doença, velhice e morte; e se ele despertou, nós também podemos despertar. A água também simboliza a purificação do karma negativo e das ilusões. No budismo tibetano geralmente são utilizadas 7 pequenas tigelas com água, a cada uma é atribuído um significado; nas outras tradições normalmente se utiliza apenas uma tigela ou pote de água.
- Comida: Pode ser arroz, fruta, frutos secos, bolinhos, ou qualquer outro tipo de comida vegetariana. Simboliza a mente clara e estável e o precioso néctar do caminho que leva à iluminação.
Outros itens relacionados com o Dharma podem ser colocados num altar, tais com: Mala (algo parecido com um rosário de contas), vajra, etc.
É de evitar colocar no altar coisas como chaves, canetas, recados, carteira, telefone, etc. A única excepção talvez possa ser um relógio para marcar o tempo de meditação, caso seja utilizado um e não haja um local mais apropriado para colocá-lo.
Na parede pode-se colocar imagens relacionadas com o Dharma, como thangkas, entre outras. Não deve ser colocado coisas que não tenha relação com o Dharma.
O mínimo para o altar é imagem de Buda, não sendo obrigatório, os outros elementos são adicionados conforme a tradição do budismo e a inclinação do praticante. O altar deve ser uma fonte de inspiração, deve estar bonito, limpo e arrumado.
Onde colocar um altar pessoal?
Isso depende das circunstâncias e possibilidades de cada um. O melhor é num lugar nobre e/ou local de prática.
O praticante tem a possibilidade de construir um edifício só para o altar? Excelente! Mas a maioria de nós não está nessas circunstâncias. Então se possível numa divisão da casa exclusiva para o altar; se não, na sala; se não, no quarto. Em situações em que o praticante vive com outras pessoas e o altar exposto é um problema, até pode ter escondido dentro por exemplo de um armário. Talvez o único local onde não se deve mesmo colocar o altar seja o WC, mas cada um deve colocar no local conforme as suas possibilidades. E também é possível ter mais que um altar, por exemplo um na sala e um no quarto.
O altar normalmente fica situado numa altura acima da cintura, na direção dos olhos ou até mais elevado, mas também nem sempre é assim.
A pratica do altar / prática devocional (puja)
Budismo Theravada: Puja na prática do Dhamma | Ajahn Mudito
(a partir do minuto 27:20)
Mais informações (link externo): Cânticos e instruções para a prática (Web Suddhavari)
Fonte:https://olharbudista.com/2019/05/23/o-altar-budista-e-a-pratica-devocional/
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Budismo Zen: Como é um altar Budista? | Monja Coen
Mais informações (link externo): Altar de Buda – Butsudan (Web Sotozen)
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Budismo Tibetano: A Prática do Altar | Alessandra Pizzigatti
Mais informações (link externo): A prática do altar, por Padma Dorje (Youtube Tendrel)
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Artigos e Palestra complementar (links externos):
- Adoradores de Ídolos? – 1, 2, 3, 4 (No Que Os Buddhistas Acreditam)
- Edificações religiosas – Ajahn Mudito (YouTube)
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