A ARTE DE DECIFRAR OS RÓTULOS DOS VINHOS

 

A arte de decifrar rótulos (Foto: Ilustrações Nik Neves)

(Foto: Ilustrações Nik Neves)

  • TEXTO SERGIO CRUSCO | ILUSTRAÇÕES NIK NEVES
 ATUALIZADO EM 


Você já ficou feito pateta diante de uma prateleira de vinhos sem entender o emaranhado de nomes, siglas, denominações de origem e outros termos indecifráveis? Quem dera todos os rótulos fossem organizados como os do Novo Mundo (tudo o que não é Europa)! Afinal, é mais ou menos moleza saber que o vinho de nome tal é da safra 2013 e foi produzido no Chile com a uva Cabernet Sauvignon. A má notícia (já damos logo de cara para você não ficar com a falsa ideia de que esse texto vai resolver sua vida para sempre) é que saber decifrar certos rótulos do Velho Mundo, sobretudo os franceses, requer um bom tempo de pesquisa, de degustações e de dinheiro investido. “As aulas sobre rótulos são as mais longas e cansativas do curso de sommelier. E o pior, ficamos sem beber nada. Só vamos aprender mesmo, na prática, quando tivermos de lidar com 30 rótulos diferentes de uma só vez”, diz o sommelier Gabriel Raele, do wine bar paulistano Bardega.

Mas algumas dicas aplainam o caminho e servem de localizador para que você saiba ao menos se situar na barafunda de letrinhas de um rótulo três compliqué. Há nomenclaturas que indicam que tipo de bebida a garrafa pode conter – se é seca ou doce, jovem ou envelhecida. Nenhuma delas, porém, é selo de garantia de qualidade do vinho, nem mesmo a denominação de origem, como explica Gabriel. “O selo só indica que o vinho foi feito naquela determinada região, de acordo coma legislação específica de cada local, regras que variam muito a cada país.”

Espanha

Na terra de Almodóvar, os vinhos são classificados pela denominação de origem, que vai desde Vinos de Calidad con Indicación Geográfica (VCIG ouVC) até Vino de Pago (VP – vinhos elaborados e engarrafados em região específica). Se o nome da uva não vier no rótulo da frente, procure-o no contrarrótulo. Os vinhos espanhóis mais comuns são chamados de Vino de Mesa e, acima deles, estão os Vinos de La Tierra.

No caso dos tintos, é essencial entender a classificação por passagem pela madeira e envelhecimento, para saber se pretende comprar um vinho mais fresco ou bem encorpado. Geralmente vem escrito no rótulo:

Joven – quase sem ou com nenhuma passagem por madeira, mais fresco e frutado.
Crianza – 2 anos de maturação, mínimo de 6 meses em barrica.
Reserva – pelo menos 3 anos de maturação, mínimo de 18 meses em barrica.
Gran Reserva – 5 anos de maturação, 24 meses em barrica e 36 meses na garrafa. São mais encorpados.

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Alemanha

Além de constar a região produtora e, de modo geral, trazer o nome das uvas, os rótulos dos vinhos alemães mais qualificados vêm com as siglas QbA (Qualitätswein
bestimmter Anbaugebiete) e os superiores QmP (Qualitätswein mit Prädikat).
Para acertar nos brancos (grande especialidade do país), dê atenção às palavras que definem o nível de dulçor de cada rótulo:

Trocken – seco.
Kabinett – levemente doce.
Spätlese – ainda mais doce.
Auslese – um grau acima.
Beernauslese e Trockenbeernauslese – vinhos feitos com uvas ultramaduras, de dulçor extremo.
Eiswein – também bastante doces, são produzidos com uvas congeladas.

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Itália

Os vinhos italianos são classificados por região e qualidade. Para entendê-los melhor, é preciso ter certa intimidade com o estilo de vinho fabricado em cada região (Chianti, Barolo, Brunello de Montalcino etc.). As indicações de origem mais comuns são:

DOCG (Denominazione di Origine Controlatta e Garantita) – é a mais alta classificação.
DOC – classificação mais genérica para vinhos considerados de qualidade e feitos de acordo com as regras específicas de estilo da cada região.
IGP (Indicazione Geografica Protetta) – nomenclatura criada pela União Europeia em substituição à IGT, destina-se a vinhos superiores.
Vino d’Italia (antigo Vino da Tavola) – o vinho mais comum e barato do país.


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Portugal

Os vinhos de Portugal são classificados de acordo com as regiões demarcadas. Em linhas gerais, estas são as características das áreas reconhecidas:

Setúbal – a uva Moscatel, que rende vinhos adocicados, é a estrela da região.
Dão – tintos frutados e brancos refrescantes. A região é o lugar de excelência da uva Touriga Nacional.
Bairrada – notável pela produção de espumantes.
Douro – uma das regiões mais celebradas, destaca-se pela produção de vinhos complexos e vinhos do Porto, envelhecidos em Vila Nova de Gaia.
Madeira – a ilha é famosa pelo estilo de vinho fortificado que leva seu nome.
Vinhos Verdes – lar dos vinhos brancos leves, ácidos, frutados e florais, perfeitos para o calor.

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França

Segundo Gabriel Raele, a aura de esnobismo que envolve o vinho francês começa pelo mistério em decifrar seus rótulos. Eles geralmente recebem o nome da vinícola, quase nunca um“nome fantasia”, e ainda mais raramente o tipo de uva usado. Para piorar, as regras de classificação variam a cada região.

Grand Cru, na Borgonha, é a classificação máxima, seguida pelos vinhos Premier Cru. Em Bordeaux, a coisa se inverte: os Premier Cru vêm em primeiro lugar, seguidos pelos Grand Cru. Outra: dentro de uma mesma propriedade, cada pedaço de terra pode ter qualificações diferentes – vamos supor, as parreiras a leste podem originar vinhos mais nobres que as situadas a oeste. Percebe o enrosco?

Acontece que o francês conhece “de nascença” seus vinhos típicos, e sabe o que esperar de cada um – sobretudo o parisiense, acostumado a degustar bebidas de vários pedaços do país. Comparando grosseiramente, é como para o brasileiro ouvir a palavra “acarajé” e relacioná-la à Bahia, “churrasco” ao Rio Grande do Sul, “tacacá” ao Pará.

Como entender essas regras tão particulares requer tempo, estudo e muitas provas. Uma boa “cola” vem do livro Atlas Mundial do Vinho (ed. GloboEstilo):

Appellation d’Origine Contrôlée (AOC) – vinhos de excelência com origem geográfica, composição de casta e métodos de produção regulados.
Indication Géographique Protégee (IGP) – substitui aos poucos o Vin de Pays: vinhos feitos de variedades de uva não tradicionais de uma região.
Vin de France – denominação que substitui o Vin de Table (vinho de mesa), são vinhos com pouco potencial de guarda, menos nobres.
Coteaux de (Côtes de) – encostas de morros.
Cru – terreno, pedaço específico de terra.
Cru Classé – pedaço de terra que se sobressai por determinada classificação importante.
Cave (coopérative) – adega cooperativa.
Domaine – propriedade vinícola, em geral de menor escala; nome que substitui château, na Borgonha.
Millésime – ano da safra.
Mis (en bouteille) au château/domaine/à la proprieté – vinho engarrafado e produzido na fazenda.
Supérieur – teor alcoólico levemente superior.
Vieilles vignes – antigas videiras (em tese, resultam vinhos mais densos).

Fonte:https://revistacasaejardim.globo.com/Casa-e-Comida/Reportagens/Bebidas/noticia/2016/08/arte-de-decifrar-os-rotulos-dos-vinhos.html

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