AS EXPERIÊNCIAS FÍSICAS DE ARTE VÃO DEIXAR DE EXISTIR?

 

As experiências físicas de arte vão deixar de existir? (Foto: Divulgação)

As experiências físicas de arte vão deixar de existir? (Foto: Divulgação)

As experiências físicas de arte vão deixar de existir?

Luiza Adas, especialista em arte, analisa o surgimento de iniciativas digitais em museus e galerias - e quais os impactos tais novidades provocam no setor

Com o crescimento do uso das redes sociais, existe uma preocupação cada vez maior de que as experiências digitais substituam as presenciais. Isso porque o avanço das tecnologias vem trazendo, para diferentes áreas do saber, inovações que tornam possível nos engajarmos com pessoas independentemente de onde estivermos. Se, por um lado, essas plataformas permitem com que possamos aprender e interagir de forma customizada por pessoas e instituições, por outro, elas acabam criando ainda mais barreiras para convivermos na “vida real”.


No caso das artes, este movimento não é diferente: ferramentas vêm sendo desenvolvidas para que possamos, por meio do digital, conhecer artistas, visitar exposições e contemplar obras. Sendo assim, será que, no longo prazo, as experiências físicas serão substituídas pelas experiências digitais?

Apesar do receio existente por parte de grupos mais tradicionais das artes, é inegável considerar que tais meios auxiliaram artistas e instituições a ampliarem seu alcance, no que diz respeito à visibilidade, disseminação de ideias, conceitos e reflexões. Durante a pandemia vimos o quanto as redes sociais ajudaram a área artística a se expandir. Um exemplo disso foi a criação do meu próprio projeto, Museu do Isolamento, considerado hoje o primeiro museu brasileiro criado e pensado nas redes sociais, cujo objetivo é dar visibilidade a artistas de todos os cantos do Brasil. Hoje, mais de 1500 artistas já foram divulgados e mais de 137 mil pessoas têm acesso a produções independentes que ajudaram pequenos artistas a se projetar na cena artística nacional.

É claro que, por conta da pandemia, o processo de digitalização das artes foi acelerado. Foram muitas as feiras, galerias, artistas, coletivos e espaços que tiveram que rever suas práticas, a fim de se consolidarem e se relacionarem com suas comunidades no ambiente digital. Apesar disso, a pandemia não foi o único motivo que fez com que esta área se expandisse. Com as novas gerações crescendo, tais mercados precisam se adaptar a fim de que seus novos públicos consumidores e apreciadores passem a se interessar por todo o universo que engloba as artes visuais. Um exemplo disso é como o mercado vem se articulando para vender arte em formato de NFTs e o aumento do número de exposições digitais que vem surgindo em diferentes plataformas.

NFTs: como obras digitais poderão ser expostas ao público (Foto: Divulgação/Leme NFT)

Fotografia digital da série 'Tudo que é sólido...' (2020), de João Angelini (Foto: Divulgação/Leme NFT)

E por mais que pensemos que não, essa realidade está muito mais próxima de nós do que imaginamos. Você provavelmente conhece o Minecraft como um jogo onde os usuários podem construir seus próprios mundos, mas o que você talvez não saiba é que o mundo das artes visuais vem se apropriando desse joguinho para criar exposições digitais. Você já ouviu falar em metaverso?

Metaverso é o nome usado para denominar um ambiente virtual imersivo, coletivo, em que as pessoas podem interagir de forma customizada. O Minecraft funciona como uma tela em branco. Lá você basicamente precisa minerar elementos para construir espaços, como casas e cidades. Dentro do jogo é possível colocar imagens, voz e criar bate-papos para que você converse com pessoas ao redor do mundo. Ou seja, o jogo funciona como uma espécie de metaverso. Por conta disso, nos últimos anos a procura pela plataforma por parte do mundo da arte cresceu de forma considerável. Museus e instituições vêm criando exposições interativas dentro deste espaço como uma forma de se aproximar das novas gerações.

Aqui no Brasil um bom exemplo desse uso é o projeto "MAM no Minecraft", uma ação desenvolvida pelo Museu de Arte Moderna de São Paulo que visa reproduzir o espaço do museu dentro do jogo, para apresentar obras, desenvolver atividades de mediação e jogos pedagógicos para o público jovem, a partir do acervo digitalizado do museu.

As experiências físicas de arte vão deixar de existir? (Foto: Divulgação)

No jogo educativo criado pelo MAM-SP, além de visitar o museu, é possível construir ou reconstruir obras de arte e aprender sobre a história da arte brasileira por meio de atividades lúdicas e virtuais (Foto: Leonardo Sang)

Mas com todos esses avanços, será que as experiências físicas vão deixar de ter sua importância? Os mais recentes eventos que tivemos nas artes nos apontam que, definitivamente, não. Na última SP-Arte, no final de semana, os ingressos esgotaram. A exposição imersiva do Van Gogh que abriu na última quarta-feira (6) no Rio de Janeiro, já começou com bilhetes esgotados. As aberturas das exposições nos tradicionais museus de arte estão cheias.

Embora exista, de fato, um aumento no desenvolvimento de atividades culturais e artísticas nos meios digitais, fica mais do que evidente que precisamos do contato físico para podermos vivenciar e experimentar a arte de maneira mais profunda. O que sim, deve acontecer, é que as experiências digitais servirão de forma complementar às vivências físicas. Ao meu ver, portanto, não devemos temer o avanço da arte no digital, pelo contrário: devemos enxergá-la como uma aliada na busca pela democratização do acesso à arte para aqueles que, a princípio, não tem a possibilidade de se deslocar para conhecer acervos, obras e artistas.

É claro que, mesmo com o avanço da presença da arte digital, museus e instituições ainda têm um caminho longo para se tornarem mais acessíveis e convidativas ao público. Ainda existem barreiras físicas e sociais que impedem com que pessoas tenham acesso a esses ambientes (ainda que virtuais). Apesar disso, devemos também tentar enxergar a tecnologia como uma forma de expansão para dialogar com diferentes pessoas, gerações e realidades.

Fonte:https://casavogue.globo.com/Colunas/Arte-em-prosa/noticia/2022/04/experiencias-fisicas-de-arte-vao-deixar-de-existir.html


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