MULHERES MADURAS AINDA GOSTAM DE SEXO?

  

Grace and Frankie (Foto: Reprodução)

Cena da série Grace and Frankie, da Netflix (Foto: Reprodução)

Mulheres maduras ainda gostam de sexo?

"A representação dos brasileiros como “campeões do sexo” parece produzir uma sensação de miséria sexual", diz a antropóloga Mirian Goldenberg em sua coluna para a Vogue Brasil

Acho estranho o uso do “ainda” na pergunta, como se o fato de envelhecer tornasse todas as mulheres assexuadas e invisíveis, como se elas sofressem uma espécie de “morte simbólica” no amor e no sexo. Busco responder classificando as respostas das mulheres de mais de 50 anos que tenho pesquisado nos últimos anos.

Um primeiro grupo continua fazendo sexo. Elas sempre gostaram de sexo e procuram todos os recursos disponíveis no mercado para continuarem tendo prazer na cama. São mulheres que fazem sexo quando querem, tanto com parceiros fixos quanto com eventuais – os aplicativos de paquera facilitaram o sexo casual. Elas também gostam muito de brinquedinhos sexuais.

Um segundo grupo não quer mais fazer sexo. Algumas usam a velhice como desculpa, mas a verdade é que elas acreditam que já cumpriram suas obrigações como mulher. Confessam que (quase) nunca tiveram prazer com os seus parceiros. Muitas são ou foram casadas e, com mais idade, decidiram se aposentar do sexo e aproveitar o tempo para realizar outras atividades. Para elas, o desejo pode estar associado a outros prazeres, e não exclusivamente ao sexo.

Um terceiro grupo quer continuar fazendo sexo, mas não com o atual parceiro. Neste caso, a questão que mais pesa não é a falta de desejo, e sim a falta de tesão pelo marido. O que parece ser determinante para o fim do desejo sexual é o fato de ter tido experiências sexuais pouco prazerosas com o parceiro e também o desgaste da relação. Algumas têm uma vida sexual ativa e prazerosa com amantes bem mais jovens, como mostrei no meu livro Por que Homens e Mulheres Traem?

Um quarto grupo gosta, mas não faz sexo quando quer. São mulheres que têm vergonha do próprio corpo, culpa, cansaço, falta de tempo, de oportunidade, de coragem, de iniciativa e, principalmente, falta de um companheiro.

Um quinto grupo não gosta, mas faz sexo mesmo sem ter vontade. São mulheres que têm medo de dizer não, e que se sentem pressionadas a corresponder às expectativas do parceiro. Muitas fingem que gozam apenas para satisfazer o marido ou namorado.

As mulheres que pesquisei, de diferentes gerações, disseram que os principais problemas no casamento são: falta de compreensão, de carinho, de cuidado, de atenção, de escuta, de conversa, de intimidade, de reconhecimento, de reciprocidade, de respeito, de admiração, de fidelidade, de confiança, de segurança, de liberdade e inúmeras outras faltas. Pouquíssimas responderam "falta de sexo".

Muitas confessaram que não sentem mais tesão, que não conseguem atingir o orgasmo com o parceiro, que perderam a libido, que têm medo de falar sobre o que gostam na cama, que têm vergonha do próprio corpo, que se tornaram invisíveis e que estão frustradas sexualmente. Afirmaram que falta vontade, tempo, energia e disposição para o sexo, já que se sentem exaustas, estressadas, deprimidas, insatisfeitas e angustiadas com problemas pessoais, familiares e profissionais. Na interminável lista de obrigações que precisam cumprir todos os dias, o sexo parece ter se tornado para muitas apenas mais uma obrigação que rouba alguns minutos do sono.

Algumas pesquisas afirmam que o brasileiro é o povo mais ativo sexualmente do mundo, já que faz sexo 145 vezes por ano. Só perderia para os gregos, que fazem 164 vezes por ano. Outras dizem que o brasileiro dedica mais tempo ao sexo do que os demais povos: em média 21 minutos, enquanto a média mundial seria 18. Só perderia para a Nigéria, onde o tempo médio é de 24 minutos. Também seria campeão, na América Latina, em número de parceiros sexuais ao longo da vida: uma média de doze contra dez nos nossos vizinhos. E por aí vai: o brasileiro faz sexo, em média, três vezes por semana; o brasileiro é o povo mais infiel do mundo e inúmeras outras.

Apesar da fama de país tropical, onde supostamente viveriam brasileiros obcecados por sexo, tenho encontrado uma enorme insatisfação sexual nas minhas pesquisas. A representação dos brasileiros como “campeões do sexo” parece produzir uma sensação de miséria sexual. Muitas mulheres se sentem distantes dessa performance idealizada em termos de qualidade e de quantidade. A força dessa representação pode provocar a sensação de insatisfação e de fracasso até mesmo em mulheres que poderiam ter uma vida sexual considerada satisfatória.

O mito sobre o sexo campeão do mundo, quando comparado com a realidade das mulheres que pesquisei, parece estar escondendo, ou até mesmo produzindo, a sensação de inadequação e de frustração sexual em muitas brasileiras.

Fala-se muito sobre liberdade sexual, mas, na realidade, muitas brasileiras estão insatisfeitas com suas vidas sexuais. Com a ambiguidade dos nossos desejos e com o imperativo de uma performance ativa e diversificada, o sexo tanto pode ser um grande prazer quanto uma verdadeira prisão.

Fonte:https://vogue.globo.com/sua-idade/a-bela-velhice/noticia/2021/09/mulheres-maduras-ainda-gostam-de-sexo.html



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