AS ARMADILHAS DOS REALCIONAMENTOS EM TEMPOS DE PANDEMIA: FEAR OF DATING AGAIN,GHOSTING E CURVING

 

Em um relacionamento complicado (Foto: Getty Images)

Em um relacionamento complicado (Foto: Getty Images)

 As armadilhas dos relacionamentos em tempos de pandemia: Fear of dating again, ghosting e curving

Não tem saída fácil quando o assunto é se relacionar (ou tentar) durante o isolamento social. Conversamos com especialistas em relações amorosas para nos guiar pelos possíveis caminhos do amor

Muito tempo junto, muito tempo sozinha... Não bastassem todos os desafios de viver durante uma pandemia, tivemos ainda que lidar com mudanças inesperadas na área da vida campeã de consultas ao horóscopo: os relacionamentos amorosos. Nenhum Mercúrio retrógrado, porém, foi tão perturbador quanto a missão de enfrentar a si mesma ou o outro sem direito a pausa.

Com alguma falta, todo mundo sofreu, seja de carinho, seja de privacidade. E, há 15 meses, buscamos, conscientemente ou não, uma maneira nunca antes explorada de supri-la: casamento, apps de relacionamentos, separação, webdates, ex’s e novos padrões de se relacionar – quem foi que inventou o ghosting pelo amor da deusa?

As desculpas, os dramas e o caminho dos tijolos amarelos para tapar o buraco que o isolamento social deixou em nosso coração – e no dos nossos crushes – desvendamos a seguir. Spoiler, como canta o maior hino dos saudosos karaokês: contanto que saibamos amar, estaremos vivos. Sobreviveremos, talvez com algumas sequelas.

It's a match!

Lembra da época em que você se achava too cool para criar um perfil em aplicativos de namoro? Era como se o fato de estar 100% online para conhecer pessoas novas fosse um atestado de desespero. Enquanto isso, as DM’s no Instagram bombando com desconhecidos reagindo com foguinho nos Stories, paquera muito menos eficiente.

Bem, por aqui, qualquer preconceito que podemos ter carregado já foi esquecido. Fazemos parte do grupo que contribuiu para o aumento de pessoas que normalizaram ter um perfil em um app como o Inner Circle, que viu o número de cadastros subir 209% entre março de 2020 e março de 2021, em relação ao ano anterior. “Existia um sentimento de que os apps eram só para quem tinha sobrado, mas, com a pandemia, as opções de conhecer alguém cessaram, e a galera povoou os aplicativos”, analisa a terapeuta individual e de casal, Dra. Louise Madeira.

No começo, existia uma urgência em lidar com a carência e fugir da solidão. As conversas por chamada de vídeo aumentaram em 988% no Inner Circle, e o pessoal se abriu para os encontros virtuais. O que deu espaço para projetos como o Love Is In The Cloud, da designer de experiências Isabella Nardini e da cocriadora Roberta Tannus, surgirem. “O objetivo é gerar uma faísca de conexão através de sensações como frio na barriga, encantamento, frescor do novo e a expansão”, explica Isabella.

relacionamento (Foto: Getty Images)

relacionamento (Foto: Getty Images)

A experiência surgiu em abril de 2020 e funciona assim: durante uma hora e meia, um grupo selecionado de pessoas de diferentes idades, cidades e estilos, se juntam em uma vivência guiada de dates às cegas via Zoom. Cada um tem a chance de ter oito encontros de cinco minutos com outra pessoa. Ao final, contatos são trocados e o desenrolar da paquera fica por conta dos participantes [saiba tudo sobre o Speed Dating]. “Tem um casal que se conheceu na edição de maio de 2020 e está namorando até hoje. Por outro lado, sei também daqueles que ficaram de web-namoro por três meses e terminaram sem nunca terem se encontrado pessoalmente”, conta Isabella.

Mais de um ano depois, ficou evidente que, ainda que vivamos no mesmo cenário pandêmico, as intenções de busca por parceiros são divergentes: há quem só queira um respiro em meio ao caos e alguém para conversar, ao passo que outros estão à procura de um relacionamento sério. “É inegável que está todo mundo sensível e carente. Entretanto, para algo vingar, tem que vir recheado de muita disposição. E disposição tem sido algo raro de encontrar em meio a tanta exaustão. Todos têm buscado atenção, mas nem todos têm conseguido entregá-la”, conclui Isabella.

Os baixos níveis de estamina geral explicam a fadiga de seguir nesse namorinho virtual, e também o aparecimento de novos padrões tóxicos de relacionamento, que se perpetuam em benefício da distância física. “Antes, conhecer alguém digitalmente era só o início. Com a pandemia, as pessoas demoram muito nessa etapa e quem não se encontrou tem uma urgência de transformar essa relação digital em pessoal. Quando isso não acontece, se cansam”, avalia dra. Louise. E é nesse feeling, também conhecido como bode, que os seguintes comportamentos se tornaram cada vez mais comuns.

Ghosting

Cadê o(a) crush que estava aqui até ontem trocando memes e planejando um encontro dentro dos protocolos? Se você não sofreu com o ghosting, termo usado quando o contatinho evapora da sua vida sem mais nem menos, conhece alguém que sofreu ou, quem sabe, não foi você mesma o fantasma. “Virtualmente, tão fácil quanto aparecer na vida de alguém, é desaparecer. Seja porque o papo desgastou, seja porque no mar de opções da internet, acabou encontrando outro mais promissor. A privação do encontro dá a falsa sensação de que nunca se esteve presente de fato. A pessoa que some justifica a si própria de que sua ausência só seria sentida em favor da sua presença. E, como ela nunca apareceu, também não sumiu”, explica a terapeuta.

Quem é deixado no limbo, por sua vez, se alimenta de ansiedade e culpa, tentando entender o que fez de errado – história que rendeu até livro, Copo Vazio, de Natalia Tiemerman. Resposta: nada. O comportamento é consequência desse novo paradigma de se relacionar, e não deixa de ser uma falta de cuidado com o sentimento do outro – a tal da responsabilidade afetiva.

Curving

O famoso “chove não molha”: responde um dia, some dois, volta como se nada, faz planos e desiste… Mas nunca desaparece, como no ghosting. Em sua experiência, Isabella Nardini identificou a galera que tende a reproduzir isso: “Em meio a tanta incerteza, tem pessoas mais reticentes em correr o risco de se entregar emocionalmente a um desconhecido e optam por seguir com flertes eternos à espera de um mundo mais definido”. É crime? Não. Mas também não é legal alimentar as esperanças de algo que, no fundo, não vai acontecer. Vamos de alinhar expectativas?

relacionamento (Foto: Getty Images)

(Foto: Getty Images)

#MeuCasal

Pelos Stories dos casais que sextaram o ano inteiro com vinhozinho e Netflix, pode parecer que a vida foi mais tranquila, né? Quem conseguiu driblar as armadilhas do cotidiano e encontrou um equilíbrio entre partilha e privacidade realmente arrasou. O contexto foi positivo também para os ~ficantes~ que acabaram engatando em um namoro sério sem muita enrolação em prol da segurança – e do amor, claro. Não foi o seu caso? Acontece. Não à toa, o Brasil registrou recorde de divórcios em 2020, segundo levantamento do Colégio Notarial do Brasil.

Ninguém estava programado para essa rotina diferenciada e a longa lista de conflitos que veio no pacote. Para citar alguns: o sentimento de ameaça quando os cuidados são distintos perante à pandemia, o julgamento diante do trabalho alheio, o acúmulo de tarefas domésticas por uma das partes – com filhos então, xiii –, o excesso de presença que culmina na diminuição da libido, infidelidades virtuais, enfim, a saturação geral da nação.

Mesmo diante de tanto sofrimento na vida lá fora, muitos optaram pelo fim do relacionamento e um desgaste psicológico a menos na conta. A dra. Louise alerta para uma tendência pouco lírica. Com o relaxamento do isolamento social e acesso a um leque ampliado de opções de prazer, é provável que os términos continuem a crescer. A turma que recorreu ao “oi, sumido” e voltou com o ex também é grande. “É tudo tão incerto no futuro, que a pessoa retorna o apego ao passado. Mesmo aquilo que não era legal, pelo menos é familiar”, ela fala. “Não necessariamente, esse casal vai fazer planos daqui para frente, mas para a pandemia está bom.” P.S.: Desculpas se criamos expectativas de romance no início deste bloco.

relacionamento (Foto: Getty Images)

(Foto: Getty Images)

F.O.D.A. (Fear of Dating Again)


“A pandemia trouxe manias, uma delas é a de solidão. ‘Minha vida está um saco, não tem nada acontecendo, mas, pelo menos, está tudo organizado. Será que vale a pena desestruturá-la para colocar alguém incerto no meio?’” Boom! Obrigada, dra. Louise, por explodir a nossa mente.

fear of dating again, em português “medo de namorar de novo”, é real. E não estamos falando do receio de baixar a guarda dos hábitos de higiene adquiridos – que também é bem real. Acontece que, durante todo esse tempo, as queixas de solidão lá do começo vêm sendo tratadas. “É possível que tenhamos reformulado o conceito de carência e descoberto que ela não mata”, fala a terapeuta.

Quer dizer que vamos ficar sozinhas? Não necessariamente. Contudo, aprendemos a ficar bem nessa posição e, por isso, as relações se tornam mais seletivas, daí o temor. “Não é medo de se relacionar, é medo de sofrer”, dra. Louise faz questão de lembrar. Principalmente no começo da retomada de vida, em um cenário onde todos estejamos vacinados. A esperança, porém, é que a perspectiva do encontro seja maior que o medo. E é nisso que escolhemos acreditar. We will survive.

Fonte:https://revistaglamour.globo.com/Amor-Sexo/noticia/2021/06/fear-dating-again-ghosting-e-curving-armadilhas-dos-relacionamentos-em-tempos-de-pandemia.html



Comentários