O COTIDIANO NOS VERSOS DE ADÉLIA PRADO
31/07/2020 Domingo
Na minha cidade, nos domingos de tarde,
as pessoas se põem na sombra com faca e laranjas.
Tomam a fresca e riem do rapaz de bicicleta,
a campainha desatada, o aro enfeitado de laranjas:
‘Eh bobagem!’
Daqui a muito progresso tecno-ilógico,
quando for impossível detectar o domingo
pelo sumo das laranjas no ar e bicicletas,
em meu país de memória e sentimento,
basta fechar os olhos:
é domingo, é domingo, é domingo
Adélia Luzia Prado de Freitas nasceu em Divinópolis, Minas Gerais, onde vive até hoje. Escreveu seus primeiros versos em 1950, aos 15 anos, no período que seguiu o falecimento de sua mãe. Apesar de escrever desde jovem, foi aos 40 anos que publicou seu primeiro livro de poesia. Filósofa, professora, contista, escritora e poeta, talvez o segredo e também principal ensinamento de Adélia seja descobrir cada um o seu tempo e vivificar as coisas simples da vida.
Foto: Nélio Rodrigues
"Deus é mais belo que eu. E não é jovem. Isto sim, é consolo."
SOBRE A OBRA
De escrita simples, na forma de escrever e no conteúdo, a obra de Adélia vai trazer o aspecto da religiosidade, desligado de pregação ou moralismos. O luto, a memória da infância e o afeto pela cidade natal são outros elementos que também fazem parte de sua escrita. Adélia respira o lugar geográfico e o lugar psíquico e os coloca para fora, em verso. Os acontecimentos ordinários do dia-a-dia são verdadeiras joias para a poeta mineira. Essa vai ser a atmosfera de sua obra, que trata ainda do feminino sob diferentes faces – o próprio feminino, a sexualidade e os papeis sociais, culturais e históricos da mulher.
Em Com licença poética, ela literalmente pede licença ao seu grande mestre, Carlos Drummond de Andrade, e parafraseia um de seus conhecidos poemas, fazendo uma espécie de antítese ao Poema de sete faces.
Com licença poética, interpretado por Marília Gabriela para a Revista Bravo!
“O que interessa mesmo é a sua vidinha, porque você não tem mais que ela, você não tem mais do que as vinte e quatro horas do dia, ninguém tem mais do que isso. E é nessa experiência pequenininha, miserável, limitada, carente, que eu vou dar uma resposta ao absurdo da minha existência e do mundo.” (trecho de entrevista)
Com formato e linguagem livres, os versos de Adélia vão abusar do coloquialismo e da oralidade, associando a sua obra ao modernismo brasileiro.
“A poesia da mineira percorre dois caminhos muito importantes: de um lado o cotidiano, olhando para a simplicidade da vida e das coisas com as quais a vida dialoga; de outro, a metafísica, esse esforço de compreender o sobrenatural [no sentido cristão do termo] a partir do pensamento abstrato. Esses dois caminhos se cruzam o tempo todo em sua obra, fazendo com que a complexidade do metafísico ganhe imagens do cotidiano, e a vida ‘comum’ seja compreendida em toda a sua extensão. Adélia escreve em versos brancos e livres, numa atitude prosaica que lembra muitas vezes a obra de Alberto Caeiro, heterônimo de Fernando Pessoa, mas mantendo a força das imagens”, Fernando Brum, Doutor em Letras (UFRGS).
CURIOSIDADES
Revelada por Drummond em uma crônica no Jornal do Brasil em 1975, o poeta dizia que São Francisco de Assis estava ditando poemas para uma dona de casa da pacata cidade de Divinópolis, em Minas Gerais.
Outros grandes poetas inspiraram Adélia Prado, principalmente aqueles a quem chama de Santíssima Trindade: João Guimarães Rosa, Clarice Lispector e Carlos Drummond de Andrade. A esse último, a poeta agradece pelo uso de versos livres (que não possuem métrica) e versos brancos (que não possuem rima), pois, afinal, a poesia é ritmo.
PREMIAÇÕES
- A obra O coração disparado, de 1977, rendeu para autora o Prêmio Jabuti de Poesia em 1978.
- Em 2007, recebeu o Prêmio ABL de Literatura Infantojuvenil, pelo seu primeiro livro infantil, Quando eu era pequena (2006).
- Adélia, em 2014, foi condecorada pelo Governo Brasileiro com a Ordem do Mérito Cultural.
- A autora recebeu duas vezes o Prêmio Alphonsus de Guimaraens da Biblioteca Nacional, pelas obras Duração do dia (2010) e Poesia reunida (2016).
DICAS:
Conheça mais sobre o pensamento da autora no especial feito pela Assembleia de Minas Gerais, em 2018. Na entrevista, Adélia fala sobre sua obra, religiosidade, o feminino e o momento político do Brasil. Clique aqui para assistir!
Adélia Prado fala sobre sua obra, feminismo e o momento político do Brasil (2018)
Domingo
Na minha cidade, nos domingos de tarde,
as pessoas se põem na sombra com faca e laranjas.
Tomam a fresca e riem do rapaz de bicicleta,
a campainha desatada, o aro enfeitado de laranjas:
‘Eh bobagem!’
Daqui a muito progresso tecno-ilógico,
quando for impossível detectar o domingo
pelo sumo das laranjas no ar e bicicletas,
em meu país de memória e sentimento,
basta fechar os olhos:
é domingo, é domingo, é domingo
Adélia Luzia Prado de Freitas nasceu em Divinópolis, Minas Gerais, onde vive até hoje. Escreveu seus primeiros versos em 1950, aos 15 anos, no período que seguiu o falecimento de sua mãe. Apesar de escrever desde jovem, foi aos 40 anos que publicou seu primeiro livro de poesia. Filósofa, professora, contista, escritora e poeta, talvez o segredo e também principal ensinamento de Adélia seja descobrir cada um o seu tempo e vivificar as coisas simples da vida.
Foto: Nélio Rodrigues
"Deus é mais belo que eu. E não é jovem. Isto sim, é consolo."
SOBRE A OBRA
De escrita simples, na forma de escrever e no conteúdo, a obra de Adélia vai trazer o aspecto da religiosidade, desligado de pregação ou moralismos. O luto, a memória da infância e o afeto pela cidade natal são outros elementos que também fazem parte de sua escrita. Adélia respira o lugar geográfico e o lugar psíquico e os coloca para fora, em verso. Os acontecimentos ordinários do dia-a-dia são verdadeiras joias para a poeta mineira. Essa vai ser a atmosfera de sua obra, que trata ainda do feminino sob diferentes faces – o próprio feminino, a sexualidade e os papeis sociais, culturais e históricos da mulher.
Em Com licença poética, ela literalmente pede licença ao seu grande mestre, Carlos Drummond de Andrade, e parafraseia um de seus conhecidos poemas, fazendo uma espécie de antítese ao Poema de sete faces.
Com licença poética, interpretado por Marília Gabriela para a Revista Bravo!“O que interessa mesmo é a sua vidinha, porque você não tem mais que ela, você não tem mais do que as vinte e quatro horas do dia, ninguém tem mais do que isso. E é nessa experiência pequenininha, miserável, limitada, carente, que eu vou dar uma resposta ao absurdo da minha existência e do mundo.” (trecho de entrevista)
Com formato e linguagem livres, os versos de Adélia vão abusar do coloquialismo e da oralidade, associando a sua obra ao modernismo brasileiro.
“A poesia da mineira percorre dois caminhos muito importantes: de um lado o cotidiano, olhando para a simplicidade da vida e das coisas com as quais a vida dialoga; de outro, a metafísica, esse esforço de compreender o sobrenatural [no sentido cristão do termo] a partir do pensamento abstrato. Esses dois caminhos se cruzam o tempo todo em sua obra, fazendo com que a complexidade do metafísico ganhe imagens do cotidiano, e a vida ‘comum’ seja compreendida em toda a sua extensão. Adélia escreve em versos brancos e livres, numa atitude prosaica que lembra muitas vezes a obra de Alberto Caeiro, heterônimo de Fernando Pessoa, mas mantendo a força das imagens”, Fernando Brum, Doutor em Letras (UFRGS).
CURIOSIDADES
Revelada por Drummond em uma crônica no Jornal do Brasil em 1975, o poeta dizia que São Francisco de Assis estava ditando poemas para uma dona de casa da pacata cidade de Divinópolis, em Minas Gerais.
Outros grandes poetas inspiraram Adélia Prado, principalmente aqueles a quem chama de Santíssima Trindade: João Guimarães Rosa, Clarice Lispector e Carlos Drummond de Andrade. A esse último, a poeta agradece pelo uso de versos livres (que não possuem métrica) e versos brancos (que não possuem rima), pois, afinal, a poesia é ritmo.
PREMIAÇÕES
- A obra O coração disparado, de 1977, rendeu para autora o Prêmio Jabuti de Poesia em 1978.
- Em 2007, recebeu o Prêmio ABL de Literatura Infantojuvenil, pelo seu primeiro livro infantil, Quando eu era pequena (2006).
- Adélia, em 2014, foi condecorada pelo Governo Brasileiro com a Ordem do Mérito Cultural.
- A autora recebeu duas vezes o Prêmio Alphonsus de Guimaraens da Biblioteca Nacional, pelas obras Duração do dia (2010) e Poesia reunida (2016).
DICAS:
Conheça mais sobre o pensamento da autora no especial feito pela Assembleia de Minas Gerais, em 2018. Na entrevista, Adélia fala sobre sua obra, religiosidade, o feminino e o momento político do Brasil. Clique aqui para assistir!
Adélia Prado fala sobre sua obra, feminismo e o momento político do Brasil (2018)
Em Poesia Reunida (2016), encontram-se todos os poemas de Bagagem, O coração disparado, Terra de Santa Cruz, O pelicano, A faca no peito, Oráculos de maio, A duração do dia e Miserere. O livro também traz textos de Carlos Drummond de Andrade e Affonso Romano de Sant’Anna e posfácio de Augusto Massi. Disponível para compra em formato e-book na Amazon e Kobo.
Fonte:https://institutoling.org.br/explore/o-cotidiano-nos-versos-de-adelia-prado
Em Poesia Reunida (2016), encontram-se todos os poemas de Bagagem, O coração disparado, Terra de Santa Cruz, O pelicano, A faca no peito, Oráculos de maio, A duração do dia e Miserere. O livro também traz textos de Carlos Drummond de Andrade e Affonso Romano de Sant’Anna e posfácio de Augusto Massi. Disponível para compra em formato e-book na Amazon e Kobo.
Fonte:https://institutoling.org.br/explore/o-cotidiano-nos-versos-de-adelia-prado
A poesia de Adélia Prado
Foto: Jackson Romanelli / Sempre um Papo
Cabelos brancos, um vestido preto com um discreto casaco claro estampado de flores. Um par de óculos de grau com delicados aros de metal e sapatos vermelhos como quem chega para dar um recado de amor. Assim entrou no palco principal do Palácio das Artes, em Belo Horizonte, em março, a escritora mineira Adélia Prado, aplaudida de pé por uma plateia que ocupou todos os 1.705 lugares do teatro apenas para ouvi-la.
Foram palmas de boas-vindas e gratidão por todos os versos que Adélia escreveu. Palavras que dizem respeito à nossa mineiridade, ao nosso sentimento universal e à força dos símbolos e crenças que habitam em nós.
A ocasião era especial: naquela noite se comemorava os 45 anos do Grande Teatro do Palácio das Artes, os 30 anos do projeto “Sempre Um Papo”, responsável pela presença da escritora, além dos 40 anos de carreira de Adélia, que lançava o livro “Poesia Reunida”. A obra agrega todos os seus poemas contidos nos livros “Bagagem”, “O Coração Disparado”, “Terra de Santa Cruz”, “O Pelicano”, “A Faca no Peito”, “Oráculos de Maio”, “A Duração do Dia” e “Miserere”.
São versos que dizem respeito ao universo de uma escritora de 80 anos, que nasceu em Divinópolis, no centro-oeste de Minas, filha do ferroviário João do Prado Filho e de Ana Clotilde Corrêa. E que, desde a infância, mostrou talento com as palavras.
Histórias de vida e carreira suficientes para fazer com que toda a plateia fizesse um silêncio respeitoso para ouvi-la. Levados pelo sotaque mineiro da autora, que nos remete a alguém querido, que lê para nós uma poesia na varanda de casa, foi possível ouvir palavras de amor, fé e cuidado a respeito de nós mesmos e do nosso modesto cotidiano. Mais do que isso, ter a oportunidade de encerrar a noite, com um pedido delicado de Adélia para que trocássemos os autógrafos e selfies por uma oração do Pai-Nosso, como pedido de proteção para o Brasil nesse momento de crise, e que deixou a escritora com a voz embargada. Em uníssono, a oração universal encerrou o evento, em que foi possível ouvir Adélia Prado recitando... Adélia Prado.
Cabelos brancos, um vestido preto com um discreto casaco claro estampado de flores. Um par de óculos de grau com delicados aros de metal e sapatos vermelhos como quem chega para dar um recado de amor. Assim entrou no palco principal do Palácio das Artes, em Belo Horizonte, em março, a escritora mineira Adélia Prado, aplaudida de pé por uma plateia que ocupou todos os 1.705 lugares do teatro apenas para ouvi-la.
Foram palmas de boas-vindas e gratidão por todos os versos que Adélia escreveu. Palavras que dizem respeito à nossa mineiridade, ao nosso sentimento universal e à força dos símbolos e crenças que habitam em nós.
A ocasião era especial: naquela noite se comemorava os 45 anos do Grande Teatro do Palácio das Artes, os 30 anos do projeto “Sempre Um Papo”, responsável pela presença da escritora, além dos 40 anos de carreira de Adélia, que lançava o livro “Poesia Reunida”. A obra agrega todos os seus poemas contidos nos livros “Bagagem”, “O Coração Disparado”, “Terra de Santa Cruz”, “O Pelicano”, “A Faca no Peito”, “Oráculos de Maio”, “A Duração do Dia” e “Miserere”.
São versos que dizem respeito ao universo de uma escritora de 80 anos, que nasceu em Divinópolis, no centro-oeste de Minas, filha do ferroviário João do Prado Filho e de Ana Clotilde Corrêa. E que, desde a infância, mostrou talento com as palavras.
Histórias de vida e carreira suficientes para fazer com que toda a plateia fizesse um silêncio respeitoso para ouvi-la. Levados pelo sotaque mineiro da autora, que nos remete a alguém querido, que lê para nós uma poesia na varanda de casa, foi possível ouvir palavras de amor, fé e cuidado a respeito de nós mesmos e do nosso modesto cotidiano. Mais do que isso, ter a oportunidade de encerrar a noite, com um pedido delicado de Adélia para que trocássemos os autógrafos e selfies por uma oração do Pai-Nosso, como pedido de proteção para o Brasil nesse momento de crise, e que deixou a escritora com a voz embargada. Em uníssono, a oração universal encerrou o evento, em que foi possível ouvir Adélia Prado recitando... Adélia Prado.
Confira, a seguir, algumas frases marcantes na carreira da escritora. Entre elas, algumas destacadas durante sua apresentação no Palácio das Artes:
Cotidiano
“Tudo isso que nós cremos e nos faz felizes, se trata de mistério.”
“Fazer um pão, ou qualquer outra tarefa simples, nos devolve simbolicamente o prazer de existir.”
“As coisas mais corriqueiras nos dominam. Isso não pode!”
Ser mulher
“Vai ser coxo na vida é maldição pra homem. Mulher é desdobrável. Eu sou.”
Vida
“Viver a vida com sentido, com significado, é que nos torna cada vez mais humanos.”
“A vida cotidiana já é heroica e nós temos que aceitar. Eu vou dar birra com Deus? Seja pobre, seja rico.”
Depressão
“A ausência de significados é a depressão.”
Chuva
“Só melhoro quando chove.”
Sociedade
“Nossa civilização padece de símbolos. Está tudo igual. Os ritos religiosos estão banalizados.”
“Estamos padecendo de deficiência de atenção. Nós não olhamos para o outro.”
“Eu preciso me modificar para que eu veja o outro.”
“Como vou querer paz no mundo com uma guerra no coração?”
Beleza
“Ainda assim, a vida é maior, o direito de nascer e morar num caixote à beira da estrada. Porque um dia, e pode ser um único dia em sua vida, um deserdado daqueles sai de seu buraco à noite e se maravilha. Chama seu compadre de infortúnio: vem cá, homem, repara se já viu o céu mais estrelado e mais bonito que este! Para isso vale nascer.”
“A beleza é um dos valores mais consoladores que existem.”
Convivência
“Se você não pode tocar uma pessoa, mude seu olhar por essa pessoa.”
“Às vezes vou pregar lá na África e deixo meu pessoal aqui faminto de amor.”
Poesia
“A poesia ajuda porque ela repercute dentro de mim, fala a nossa alma.”
“A poesia é o rastro de Deus nas coisas.”
“Deus de vez em quando me tira a poesia. Olho para uma pedra e vejo uma pedra mesmo.”
Mar
“Quem carrega o mar nos seus limites tem carinho com o mar.”
“Para o desejo do meu coração, o mar é uma gota.”
Fé
“Tanto o poema, quanto a oração, exigem algo maior que precisa da minha aceitação.”
“Carl Jung dizia que devolvia seus pacientes para sua religião de origem: a semente da nossa vida simbólica.”
“A Bíblia é um livro de experiências profundas e humanas.”
“Eu não dou conta de aguentar minha velhice se eu não tiver uma fé.”
Deus
“Deus não é um fato teológico. Ele é para as pessoas uma experiência.”
“Quanto mais você descobre, mais o universo se alarga. Isso é Deus.”
“Perdoar Deus significa dizer: ‘Eu aceito, eu digo sim para a vida, para o meu corpo’.”
Velhice
“Hoje, temos a ideologia da juventude perpétua, que passa por remédios, ginásticas, plásticas e pelo desespero final, porque nada responde à nossa profunda fome humana, que é de ordem espiritual.”
Cidade natal
“Alguns personagens de poemas são vazados de pessoas da minha cidade, mas espero estejam transvazados no poema, nimbados de realidade. É pretensioso? Mas a poesia não é a revelação do real? Eu só tenho o cotidiano e meu sentimento dele. Não sei de alguém que tenha mais. O cotidiano em Divinópolis é igual ao de Hong Kong, só que vivido em português.”
Laranjas dominicais
“Na minha cidade, nos domingos de tarde, as pessoas se põem na sombra com faca e laranjas. Tomam a fresca e riem do rapaz de bicicleta, a campainha desatada, o aro enfeitado de laranjas: ‘Eh bobagem!’ . Daqui a muito progresso tecno-ilógico, quando for impossível detectar o domingo pelo sumo das laranjas no ar e bicicletas, em meu país de memória e sentimento, basta fechar os olhos: é domingo, é domingo, é domingo.”
Carreira
“Quando eu tenho uma carreira, posso estar triste ou alegre que tenho de trabalhar. Com a arte não é assim. O estatuto é dela.”
Compaixão
“Não tem ética nem salvação maiores do que estender a mão e doar o seu tempo. Quando estou escutando uma pessoa, tenho que escutar mesmo. Você não precisa dar esmola ao pedinte. Nem sempre a gente dá. Mas, olhe para ele, olhe-o nos olhos. Faça com que se sinta gente. Essa compaixão é a compaixão de Cristo, que chegou ao ponto de dizer: ‘Eu morro por vocês, eu me entrego’.”
Amor
“Amor pra mim é ser capaz de permitir que aquele que eu amo exista como tal, como ele mesmo.”
“O Cântico dos Cânticos, que faz parte da Bíblia, era proibido. As freiras não podiam ler. O erótico é aquilo que tem vitalidade.”
“A gente prega sobre o amor, mas o amor é coisa que se vive na poeira. É no encardido da vida que a gente prova as coisas. Quem não quer enfrentar está perdendo o tesouro da vida, porque é ali que sou provado. E a minha vidinha não tem diferença alguma da vida da Rainha da Inglaterra, porque ela é feita de cotidianos. Isso tira a pose de qualquer pessoa. Como é que eu posso ficar ‘posuda’ diante do outro, se somos todos farinha do mesmo saco? Somos humanos e temos que nos reconhecer nessa humanidade, no sentimento primeiro.”
QUEM É ELA
Formada em Magistério e Filosofia, somente aos 40 anos, e cinco filhos depois, ela conseguiu lançar seu primeiro livro - “Bagagem”. A história desta obra começa quando Adélia envia, ainda na década de 1970, carta e originais de seus novos poemas ao poeta e crítico literário Affonso Romano de Sant'Anna, que os submete à apreciação de Carlos Drummond de Andrade. Em 1975, Drummond sugere a Pedro Paulo de Sena Madureira, da Editora Imago, que publique o livro de Adélia, cujos poemas lhe pareciam "fenomenais". O ano era 1976 e começava aí, publicamente, a carreira de uma das mais importantes escritoras vivas do Brasil, que teve seus textos também adaptados para o teatro. Entre eles, destaque-se o espetáculo “Dona Doida”, baseado no poema de mesmo nome e que foi protagonizado pela atriz Fernanda Montenegro, entre as décadas de 1980 e 1990.
ONDE ENCONTRAR O LIVRO? HTTP://GOO.GL/EXSVWB
Assista ao vídeo completo do "Sempre um Papo" com Adélia Prado:
Texto publicado originalmente na Revista Ecológico.
Cotidiano
“Tudo isso que nós cremos e nos faz felizes, se trata de mistério.”
“Fazer um pão, ou qualquer outra tarefa simples, nos devolve simbolicamente o prazer de existir.”
“As coisas mais corriqueiras nos dominam. Isso não pode!”
Ser mulher
“Vai ser coxo na vida é maldição pra homem. Mulher é desdobrável. Eu sou.”
Vida
“Viver a vida com sentido, com significado, é que nos torna cada vez mais humanos.”
“A vida cotidiana já é heroica e nós temos que aceitar. Eu vou dar birra com Deus? Seja pobre, seja rico.”
Depressão
“A ausência de significados é a depressão.”
Chuva
“Só melhoro quando chove.”
Sociedade
“Nossa civilização padece de símbolos. Está tudo igual. Os ritos religiosos estão banalizados.”
“Estamos padecendo de deficiência de atenção. Nós não olhamos para o outro.”
“Eu preciso me modificar para que eu veja o outro.”
“Como vou querer paz no mundo com uma guerra no coração?”
Beleza
“Ainda assim, a vida é maior, o direito de nascer e morar num caixote à beira da estrada. Porque um dia, e pode ser um único dia em sua vida, um deserdado daqueles sai de seu buraco à noite e se maravilha. Chama seu compadre de infortúnio: vem cá, homem, repara se já viu o céu mais estrelado e mais bonito que este! Para isso vale nascer.”
“A beleza é um dos valores mais consoladores que existem.”
Convivência
“Se você não pode tocar uma pessoa, mude seu olhar por essa pessoa.”
“Às vezes vou pregar lá na África e deixo meu pessoal aqui faminto de amor.”
Poesia
“A poesia ajuda porque ela repercute dentro de mim, fala a nossa alma.”
“A poesia é o rastro de Deus nas coisas.”
“Deus de vez em quando me tira a poesia. Olho para uma pedra e vejo uma pedra mesmo.”
Mar
“Quem carrega o mar nos seus limites tem carinho com o mar.”
“Para o desejo do meu coração, o mar é uma gota.”
Fé
“Tanto o poema, quanto a oração, exigem algo maior que precisa da minha aceitação.”
“Carl Jung dizia que devolvia seus pacientes para sua religião de origem: a semente da nossa vida simbólica.”
“A Bíblia é um livro de experiências profundas e humanas.”
“Eu não dou conta de aguentar minha velhice se eu não tiver uma fé.”
Deus
“Deus não é um fato teológico. Ele é para as pessoas uma experiência.”
“Quanto mais você descobre, mais o universo se alarga. Isso é Deus.”
“Perdoar Deus significa dizer: ‘Eu aceito, eu digo sim para a vida, para o meu corpo’.”
Velhice
“Hoje, temos a ideologia da juventude perpétua, que passa por remédios, ginásticas, plásticas e pelo desespero final, porque nada responde à nossa profunda fome humana, que é de ordem espiritual.”
Cidade natal
“Alguns personagens de poemas são vazados de pessoas da minha cidade, mas espero estejam transvazados no poema, nimbados de realidade. É pretensioso? Mas a poesia não é a revelação do real? Eu só tenho o cotidiano e meu sentimento dele. Não sei de alguém que tenha mais. O cotidiano em Divinópolis é igual ao de Hong Kong, só que vivido em português.”
Laranjas dominicais
“Na minha cidade, nos domingos de tarde, as pessoas se põem na sombra com faca e laranjas. Tomam a fresca e riem do rapaz de bicicleta, a campainha desatada, o aro enfeitado de laranjas: ‘Eh bobagem!’ . Daqui a muito progresso tecno-ilógico, quando for impossível detectar o domingo pelo sumo das laranjas no ar e bicicletas, em meu país de memória e sentimento, basta fechar os olhos: é domingo, é domingo, é domingo.”
Carreira
“Quando eu tenho uma carreira, posso estar triste ou alegre que tenho de trabalhar. Com a arte não é assim. O estatuto é dela.”
Compaixão
“Não tem ética nem salvação maiores do que estender a mão e doar o seu tempo. Quando estou escutando uma pessoa, tenho que escutar mesmo. Você não precisa dar esmola ao pedinte. Nem sempre a gente dá. Mas, olhe para ele, olhe-o nos olhos. Faça com que se sinta gente. Essa compaixão é a compaixão de Cristo, que chegou ao ponto de dizer: ‘Eu morro por vocês, eu me entrego’.”
Amor
“Amor pra mim é ser capaz de permitir que aquele que eu amo exista como tal, como ele mesmo.”
“O Cântico dos Cânticos, que faz parte da Bíblia, era proibido. As freiras não podiam ler. O erótico é aquilo que tem vitalidade.”
“A gente prega sobre o amor, mas o amor é coisa que se vive na poeira. É no encardido da vida que a gente prova as coisas. Quem não quer enfrentar está perdendo o tesouro da vida, porque é ali que sou provado. E a minha vidinha não tem diferença alguma da vida da Rainha da Inglaterra, porque ela é feita de cotidianos. Isso tira a pose de qualquer pessoa. Como é que eu posso ficar ‘posuda’ diante do outro, se somos todos farinha do mesmo saco? Somos humanos e temos que nos reconhecer nessa humanidade, no sentimento primeiro.”
QUEM É ELA
Formada em Magistério e Filosofia, somente aos 40 anos, e cinco filhos depois, ela conseguiu lançar seu primeiro livro - “Bagagem”. A história desta obra começa quando Adélia envia, ainda na década de 1970, carta e originais de seus novos poemas ao poeta e crítico literário Affonso Romano de Sant'Anna, que os submete à apreciação de Carlos Drummond de Andrade. Em 1975, Drummond sugere a Pedro Paulo de Sena Madureira, da Editora Imago, que publique o livro de Adélia, cujos poemas lhe pareciam "fenomenais". O ano era 1976 e começava aí, publicamente, a carreira de uma das mais importantes escritoras vivas do Brasil, que teve seus textos também adaptados para o teatro. Entre eles, destaque-se o espetáculo “Dona Doida”, baseado no poema de mesmo nome e que foi protagonizado pela atriz Fernanda Montenegro, entre as décadas de 1980 e 1990.
ONDE ENCONTRAR O LIVRO? HTTP://GOO.GL/EXSVWB
Assista ao vídeo completo do "Sempre um Papo" com Adélia Prado:
Texto publicado originalmente na Revista Ecológico.
Adélia Prado: Espírito em Corpo de Mulher
Nestes últimos tempos de violência contra as mulheres, pela onda crescente de notícias sobre horror, tortura e morte, sofremos sinais de tragédia, de prantos e lutos, a ensombrecer-nos os dias.
Atrevo-me, neste contexto, a dizer que a escritora brasileira Adélia Prado inspirou este meu pequeno texto, no sentimento divino das mais comuns circunstâncias da nossa humana condição. Mulher casada, professora primária, mãe de cinco filhos, moradora na pequena cidade de Divinópolis, no Estado de Minas Gerais, Adélia Prado foi de repente, aos 40 anos, a grande revelação na literatura brasileira do século XX, quando Carlos Drummond de Andrade a distinguiu e nomeou, em uma das suas crónicas do Jornal do Brasil.
“Adélia é lírica, bíblica, existencial, faz poesia como faz bom tempo: está à lei, não dos homens, mas de Deus,” escreveu Drummond. Impressionado o editor, naquele mesmo ano de 1976 era publicado com sucesso imenso, o primeiro livro “Bagagem”. Tive a sorte de viver esse raro momento, de acompanhar e de poder ler a obra de Adélia Prado. Em épocas lineares ou complexas por que passei, desde aí mantenho os seus livros ao alcance da mão.
Em verso e prosa, Adélia descobriu a mistura entre as pequenas tarefas de casa, as pessoas que a rodeiam, as coisas e os bichos, o sentir e o pensar, o silêncio da dúvida, a presença de Deus imediata e consciente, na inteireza da sua história de mulher. No romance Cacos para um Vitral, há esse seu olhar sobre o mundo de dentro e de fora, há o sentido espiritual da vida, há a expressão do estado puro de sensualidade, na experiência jubilosa da alegria.
Vamos, assim, seguindo o percurso de Glória, a personagem principal desta história, quase real em tão perfeita ficção.
A mulher, em discurso interior que ganha voz e exclama : “Muitos anos mais tarde, muitos anos mesmo, num instante de graça, surpreendeu-se tão absolutamente em si mesma que não tinha mais a consciência de si, um momento em que escrevia. Sentiu-se visitada de Deus! Então é assim que se é! Eu também sou, possuo um ser perceptível aos outros e não há perigo de que me desintegre em fragmentos de areia. Que belo dia foi aquele de sua epifania. Glória lembrava-se e agradecia de novo, tinha um ser. Era ela mesma um ser.”
A mulher que descobre e afirma a sua fé com firmeza: “Quando dois se amam ninguém é devedor, porque o amor cobre a multidão dos pecados e eleva os humildes e abate os poderosos de seus tronos. Glória viu que recitava o Magnificat, por puro gosto literário, o que nela era também uma forma de rezar, sua melhor forma, talvez .”
A mulher no dom pleno da sua sensualidade: “Ao abraço da paz o homem virou-se e pegou na mão de Glória e bem explicitamente: “A paz de Cristo esteja com a senhora”. Um homem belo, piedoso, feliz, pegava sua mão com força e lhe desejava a paz. Há pessoas cujos corpos nos apelam. No futuro se poderá fazer sem escândalo o que desejei fazer agora, pensou ela, tocar o homem, reter sua mão, à toa, só porque é bom, porque o sangue gosta. Dentro da igreja ou não.”
Um sabor em espírito de mulher, na prosa de Adélia Prado. Aqui e em modo de ponto final, a sua evocação de Guimarães Rosa: “Ele dizia que a gente tem de escrever com a barriga. Ou é a vida que se está escrevendo, ou é nada”.
QUEM É A GRANDE POETA MINEIRA NORTEADA PELA FÉ CRISTÃ E PERMEADA PELO ASPECTO LÚDICO EM SUA BELA OBRA?
Adélia Luzia Prado de Freitas (Divinópolis, 13 de dezembro de 1935), mais conhecida como Adélia Prado, é uma poetisa, professora, filósofa, romancista e contista brasileira ligada ao Modernismo.
Sua obra retrata o cotidiano com perplexidade e encanto, norteados pela fé cristã e permeados pelo aspecto lúdico, uma das características de seu estilo único.[1] Em 1976,enviou o manuscrito de Bagagem para Affonso Romano de Sant'Anna, que assinava uma coluna de crítica literária no Jornal do Brasil. Admirado, acabou por repassar os manuscritos a Carlos Drummond de Andrade, que incentivou a publicação do livro pela Editora Imago em artigo do mesmo periódico.[2]
Professora por formação, ela exerceu o magistério durante 24 anos, até que a carreira de escritora tornou-se a atividade central. Em termos de literatura brasileira, o surgimento da escritora representou a revalorização do feminino nas letras e da mulher como ser pensante, tendo-se em conta que Adélia incorpora os papéis de intelectual e de mãe, esposa e dona-de-casa.
Biografia
Adélia Luzia Prado Freitas nasceu em Divinópolis, Minas Gerais, no dia 13 de dezembro de 1935,[3] filha do ferroviário João do Prado Filho e de Ana Clotilde Corrêa. Leva uma vida pacata naquela cidade do interior: inicia seus estudos no Grupo Escolar Padre Matias Lobato e mora na rua Ceará.
No ano de 1950, falece sua mãe. Tal acontecimento faz com que a autora escreva seus primeiros versos. Nessa época conclui o curso ginasial no Ginásio Nossa Senhora do Sagrado Coração.
No ano seguinte, inicia o curso de Magistério na Escola Normal Mário Casassanta, que conclui em 1953. Começa a lecionar no Ginásio Estadual Luiz de Mello Viana Sobrinho em 1955.
Em 1958 casa-se, em Divinópolis, com José Assunção de Freitas, funcionário do Banco do Brasil S.A. Dessa união nasceriam cinco filhos: Eugênio (em 1959), Rubem (1961), Sarah (1962), Jordano (1963) e Ana Beatriz (1966).
Antes do nascimento da última filha, a escritora e o marido iniciam o curso de Filosofia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Divinópolis.
Em 1972, morre seu pai e, em 1973, forma-se em Filosofia. Nessa ocasião envia carta e originais de seus novos poemas ao poeta e crítico literário Affonso Romano de Sant'Anna,que os submete à apreciação de Carlos Drummond de Andrade.
Em 1975, Drummond sugere a Pedro Paulo de Sena Madureira, da Editora Imago, que publique o livro de Adélia, cujos poemas lhe pareciam "fenomenais". O poeta envia os originais ao editor daquele que viria a ser Bagagem. No dia 9 de outubro, Drummond publica uma crônica no Jornal do Brasil chamando a atenção para o trabalho ainda inédito da escritora. O livro é lançado no Rio, em 1976, com a presença de Antônio Houaiss, Raquel Jardim, Carlos Drummond de Andrade, Clarice Lispector, Juscelino Kubitschek, Affonso Romano de Sant'Anna, Nélida Piñon e Alphonsus de Guimaraens Filho, entre outros.
O ano de 1978 marca o lançamento de O coração disparado, que é agraciado com o Prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro.
Estréia em prosa no ano seguinte, com Soltem os cachorros. Com o sucesso de sua carreira de escritora , vê-se obrigada a abandonar o magistério, após 24 anos de trabalho. Nesse período ensinou no Instituto Nossa Senhora do Sagrado Coração, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Divinópolis, Fundação Geraldo Corrêa — Hospital São João de Deus, Escola Estadual são Vicente e Escola Estadual Matias Cyprien, lecionando Educação Religiosa, Moral e Cívica, Filosofia da Educação, Relações Humanas e Introdução à Filosofia. Sua peça, O Clarão, um auto de natal escrito em parceria com Lázaro Barreto, é encenada em Divinópolis.
Em 1980, dirige o grupo teatral amador Cara e Coragem na montagem de O Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna. No ano seguinte, ainda sob sua direção, o grupo encenaria A Invasão, de Dias Gomes. Publica Cacos para um vitral. Lucy Ann Carter apresenta, no Departament of Comparative Literature, da Princeton University, o primeiro de uma série de estudos universitários sobre a obra de Adélia Prado.
Em 1981, lança Terra de Santa Cruz.
De 1983 a 1988, exerce as funções de Chefe da Divisão Cultural da Secretaria Municipal de Educação e da Cultura de Divinópolis, a convite do prefeito Aristides Salgado dos Santos.
"Os componentes da banda" é publicado em 1984.
Participa, em 1985, em Portugal, de um programa de intercâmbio cultural entre autores brasileiros e portugueses, e em Havana, Cuba, do II Encontro de Intelectuais pela Soberania dos Povos de Nossa América.
Fernanda Montenegro estréia, no Teatro Delfim - Rio de Janeiro, em 1987, o espetáculo Dona Doida: um interlúdio, baseado em textos de livros da autora. A montagem, sob a direção de Naum Alves de Souza, fez grande sucesso, tendo sido apresentada em diversos estados brasileiros e, também, nos EUA, Itália e Portugal.
Apresenta-se, em 1988, em Nova York, na Semana Brasileira de Poesia, evento promovido pelo Comitê Internacional pela Poesia. É publicado A faca no peito.
Participa, em Berlim, Alemanha, do Línea Colorada, um encontro entre escritores latino-americanos e alemães.
Em 1991 é publicada sua "Poesia Reunida".
Volta, em 1993, à Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Divinópolis, integrando a equipe de orientação pedagógica na gestão da secretária Teresinha Costa Rabelo.
Em 1994, após anos de silêncio poético, sem nenhuma palavra, nenhum verso, ressurge Adélia Prado com o livro "O homem da mão seca". Conta a autora que o livro foi iniciado em 1987, mas, depois de concluir o primeiro capítulo, foi acometida de uma crise de depressão, que a bloquearia literariamente por longo tempo. Disse que vê "a aridez como uma experiência necessária" e que "essa temporada no deserto" lhe fez bem. Nesse período, segundo afirmou, foi levada a procurar ajuda de um psiquiatra.
Estréia, em 1996, no Teatro Sesi Minas, em Belo Horizonte, a peça Duas horas da tarde no Brasil, texto adaptado da obra da autora por Kalluh Araújo e pela filha de Adélia, Ana Beatriz Prado.
São lançados Manuscritos de Felipa e Oráculos de maio. Participa, em maio, da série "O escritor por ele mesmo", no ISM-São Paulo. Em Belo Horizonte é apresentado, sob a direção de Rui Moreira, O sempre amor, espetáculo de dança de Teresa Ricco baseado em poemas da escritora.
Adélia costuma dizer que o cotidiano é a própria condição da literatura. Morando na pequena Divinópolis, cidade com aproximadamente 200 000 habitantes, estão em sua prosa e em sua poesia temas recorrentes da vida de província, a moça que arruma a cozinha, a missa, um certo cheiro do mato, vizinhos, a gente de lá.
Cronologia
- 1950: Escreve os primeiros versos, após a morte da mãe.
- 1951: Inicia o curso de Magistério na Escola Normal Mário Casassanta.
- 1953: Conclui o Magistério
- 1955: Começa a lecionar no Ginásio Estadual Luiz de Mello Viana Sobrinho.
- 1958: Casa-se com José Assunção de Freitas.
- 1959: Nasce o primeiro filho, Eugênio
- 1961: Nasce o filho Rubem
- 1962: Nasce a filha Sarah
- 1963: Nasce o filho Jordano
- 1966: Nasce a filha Ana Beatriz
- 1972: Morre o pai
- 1973: Forma-se em Filosofia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Divinópolis e neste mesmo ano os poemas são lidos por Carlos Drummond de Andrade
- 1975: Publica o primeiro livro Bagagem, após indicação de Drummond à Editora Imago. Em seguida, Drummond publica uma crônica no Jornal do Brasil destacando o trabalho ainda inédito de Adélia.
- 1976: Lança Bagagem no Rio de Janeiro, com a presença de Juscelino Kubitschek, Carlos Drummond de Andrade, Clarice Lispector, Affonso Romano de Sant'Anna, Nélida Piñon, dentre outros.
- 1978: Lança O Coração Disparado, com o qual recebe o Prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro.
- 1979: Lança a primeira prosa, Soltem os Cachorros
- 1980: Dirige a montagem de Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna pelo grupo de teatro amador Cara e Coragem.
- 1981: Publica Cacos para um Vitral e Terra de Santa Cruz; neste mesmo ano é apresentado, no Departamento de Literatura Comparada da Universidade de Princeton, Estados Unidos, o primeiro de uma série de estudos sobre a obra.
- 1983-1988: Exerce as funções de Chefe da Divisão Cultural da Secretaria Municipal de Educação e da Cultura da cidade natal.
- 1984: Publica Os Componentes da Banda
- 1985: Participa de um programa de intercâmbio cultural entre autores brasileiros e portugueses, realizado em Portugal, e do II Encontro de Intelectuais pela Soberania dos Povos de Nossa América, em Cuba
- 1987: Estréia do espetáculo Dona Doida: um Interlúdio, baseado em textos de livros da autora, encenado por Fernanda Montenegro, no Teatro Delfim, no Rio de Janeiro.
- 1988: Publica A Faca no Peito e participação na Semana Brasileira de Poesia em Nova Iorque
- 1991: Publica Poesia Reunida
- 1994: Publica O Homem da Mão Seca
- 1996: Estréia da peça Duas Horas da Tarde no Brasil, adaptada da obra da autora pela filha Ana Beatriz Prado e por Kalluh Araújo, no Teatro Sesi Minas, em Belo Horizonte
- 1999: Publica Oráculos de Maio e Manuscritos de Felipa
- 2000: Estréia do monólogo Dona da Casa, adaptação de José Rubens Siqueira para Manuscritos de Felipa
- 2005: Publica Quero Minha Mãe
- 2006: Morre o irmão, Frei Antonio do Prado, OFM
- 2010: Lança A duração do dia
- 2011: Lança Carmela Vai à Escola
- 2014: É condecorada pelo governo brasileiro com a Ordem do Mérito Cultural.
Silêncio poético
A literatura brasileira, além de ser fortemente marcada pela presença de Adélia Prado, também foi marcada por um período de silêncio poético no qual a escritora "emudeceu sua pena". Depois de O Homem da Mão Seca, de 1994, Adélia ficou cinco anos sem publicar um novo título, fase posteriormente explicada por ela mesma como "um período de desolação. São estados psíquicos que acontecem, trazendo o bloqueio, a aridez, o deserto". Oráculos de Maio, uma coletânea de poemas, e Manuscritos de Felipa, uma prosa curta, marcaram o retorno, ou a quebra do silêncio. Rubem Alves refere-se a esses silêncios em A Festa de Babette.
Influência
Citaram a autora como uma influência tanto o escritor brasileiro Rubem Alves[4][5][6] como o moçambicano Mia Couto.[7]
Lista de obras
Poesia
- Bagagem, Imago - 1975
- O Coração Disparado, Nova Fronteira - 1978
- Terra de Santa Cruz, Nova Fronteira - 1981
- O Pelicano, Rio de Janeiro - 1987
- A Faca no Peito, Rocco - 1988
- Oráculos de Maio, Siciliano - 1999
- Louvação para uma Cor
- A duração do dia, Record - 2010
- Miserere, Record - 2013
Prosa
- Solte os Cachorros, contos, Nova Fronteira - 1979
- Cacos para um Vitral, Nova Fronteira - 1980
- Os Componentes da Banda, Nova Fronteira 1987
- O Homem da Mão Seca, Siciliano - 1990
- Manuscritos de Filipa, Siciliano - 1994
- Quero minha mãe - Record - 2000
- Quando eu era pequena - 2009
- Filandras, Record - 2018
Antologia
- Mulheres & Mulheres, Nova Fronteira - 1978
- Palavra de Mulher, Fontana - 1979
- Contos Mineiros, Ática - 1984
- Poesia Reunida, Siciliano - 1991 (Bagagem, O Coração Disparado, Terra de Santa Cruz, O Pelicano e A Faca no Peito).
- Antologia da Poesia Brasileira, Embaixada do Brasil em Pequim - 1994.
- Prosa Reunida, Siciliano - 1999
Balé
- A Imagem Refletida - Ballet do Teatro Castro Alves - Salvador - Bahia - Direção Artística de Antônio Carlos Cardoso. Poema escrito especialmente para a composição homônima de Gil Jardim.
- Cacos Para um Vitral - Rose Ballet Escola de Dança - Divinópolis - MG - Direção Artística: Mírian Lopes e Yan Lopes. Espetáculo baseado em referência dos poemas da escritora.
Parcerias
- A Lapinha de Jesus (em parceria com Lázaro Barreto) - Vozes - 1969
- Caminhos de Solidariedade (em parceria com Lya Luft, Marcos Mendonça e outros) – Gente - 2001.
Obras traduzidas
- Para o inglês
- Adélia Prado: Thirteen Poems. Tradução de Ellen Watson. Suplemento do The American Poetry Review, jan/fev 1984.
- The Headlong Heart (Poesias de Terra de Santa Cruz, O coração Disparado e Bagagem). Tradução de Ellen Watson, New York, 1988, Livingston University Press.
- The Alphabet in the Park (O Alfabeto no Parque). Tradução de Ellen Watson, Middletown, CT USA, Wesleyan University Press, 1990.
- Ex-Voto (Ex-Voto). Tradução de Ellen Doré Watson, North Adams, MA, USA, Tupelo Press, 2013.
- Para o espanhol
- El Corazón Disparado (O Coração Disparado). Tradução de Cláudia Schwartz e Fernando Noy, Buenos Aires, Leviatan, 1994.
- Bagagem. Tradução de José Francisco Navarro Huamán. México, Universidade Ibero-Americana, a sair.
Participação em antologias
- Assis Brasil (org.). A Poesia Mineira no Século XX. Imago, 1998.
- Hortas, Maria de Lurdes (org.). Palavra de Mulher, Fontoura, 1989.
- Sem Enfeite Nenhum. In Prado Adélia et al. Contos Mineiros. Ática, 1984.
Leituras adicionais
Teses e dissertações
- MOLITERNO, Isabel de Andrade. A poesia e o sagrado: traços do estilo de Adélia Prado. USP, 2002. (Dissertação de Mestrado).
- CANALLE, Cecilia. Fundamentos filosóficos da poética de Adelia Prado: subsídios antropológicos para uma filosofia da educação. USP, 1996. (Dissertação de Mestrado).
- OLIVIERI, Rita, PhD.Poesia e oralidade na obra de Adélia Prado.
- OLIVEIRA, Claudilis da Silva. Epifanias do real: o olhar lírico de Adélia Prado. UEFS, 2004. (Dissertação de Mestrado).
- BALBINO, Evaldo. Saudade de D(eu)s: escrita, mística e desejo em Adélia Prado e Santa Teresa de Jesús. Belo Horizonte: Faculdade de Letras da UFMG, 2005 (Tese, Doutorado em Literatura Comparada).
- BALBINO, Evaldo. Entre a santidade e a loucura – o desdobramento da mulher na bagagem poética de Adélia Prado. Belo Horizonte: Faculdade de Letras da UFMG, 2001 (Dissertação, Mestrado em Literatura Brasileira).
Periódicos
- BALBINO, Evaldo. "A poética do desdobramento: tradição literária masculina e ruptura na 'bagagem' de Adélia Prado". Poesia Sempre. v.13, p.24 - 51, 2005.
- BALBINO, Evaldo. "Entre a santidade e a loucura: o desdobramento da mulher na bagagem poética de Adélia Prado". Em Tese (Belo Horizonte). v.6, p.181 - 186, 2003.
- BALBINO, Evaldo. "Entre a província e o litoral: a bagagem poética de Adélia Prado". Revista do Centro de Estudos Portugueses (UFMG). v.22, p.275 - 296, 2002.
- BALBINO, Evaldo. "Alberto Caeiro e Adélia Prado: do visível ao transcendente na imanência". In: Literaturas ibero-afro-americanas: ensaios críticos. 1 ed.Goiânia : Editora da Puc Goiás, 2010, v.1, p. 149-162.
- BALBINO, Evaldo. "Luís de Camões e Adélia Prado: do epos renascentista ao não-lugar da poesia". In: Literaturas ibero-afro-americanas. 1 ed.Goiânia : Editora da PUC Goiás, 2010, v.1, p. 175-190.
- BALBINO, Evaldo. "A dilatação do prazo comunicativo: metáfora, erotismo e subversão em Adélia Prado". In: Olhares críticos: estudos de literatura e cultura ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2009, p. 70-81.
- BALBINO, Evaldo. "Leituras sobre D(eu)s: Mística e subjetividade em Santa Teresa d’Ávila e Adélia Prado". In: X Congresso Internacional da Associação Brasileira de Literatura Comparada (Abralic), 2006, Rio de janeiro. Lugares dos discursos – X Congresso Internacional ABRALIC. Rio de janeiro: UERJ, 2006.
- BALBINO, Evaldo. "O público e o privado em Adélia Prado: uma janela aberta para o mundo". In: IX Seminário Nacional Mulher e Literatura, 2001, Belo Horizonte. IX Seminário Nacional Mulher e Literatura. Belo Horizonte: 2001.
Comentários
Postar um comentário