
Teoricamente o sumo sacerdote de todos os cultos no Egito era o faraó. Nos relevos dos templos é sempre ele que aparece exercendo as funções sacerdotais, pois sua presença era considerada indispensável, ainda que simbolicamente. Na prática, o rei delegava as obrigações diárias do cargo aos homens que eram designados para isso nos templos em todo o país. Dessa maneira, a função de sumo sacerdote ou primeiro profeta, cuja designação era feita pelo soberano, era um posto da mais alta importância, tanto religiosa quanto politicamente. Agindo em nome do faraó, o sumo sacerdote tinha mais contato com a estátua de culto da divindade do que qualquer outra pessoa do complexo do templo ao qual servia. É bem provável que apenas ao sumo sacerdote fosse permitido ficar frente a frente com a imagem do deus no santuário.No Império Antigo (c. 2575 a 2134 a.C.) todas as principais posições eram ocupadas por um pequeno grupo de pessoas, sobretudo irmãos, filhos e tios do monarca reinante. Como sacerdotes estes homens exerceram importante papel na estrutura dos templos, mas provavelmente não trabalharam em tempo integral nessa função. Durante o Império Médio (c. 2040 a 1640 a.C.) os sacerdotes do escalão superior continuaram participando dos conselhos de estado no palácio real e claramente tiveram influência política. No decorrer da XVIII dinastia (c. 1550 a 1307 a.C.) a riqueza dos maiores templos cresceu dramaticamente em função do sucesso militar alcançado no exterior. O templo de Amon em Karnak recebeu o grosso dessas novas fontes de renda e seu sumo sacerdote tornou-se cada vez mais poderoso pela quantidade da riqueza e da mão-de-obra que passou a controlar.
Diante de um governo forte, o grande poder do sumo sacerdote de Amon em Karnak não causava problemas. Quando o soberano se enfraquecia, surgiam as dificuldades. No final de seu reinado, Ramsés III (c. 1194 a 1163 a.C.) renunciou ao controle das finanças das propriedades do deus Amon. Documentos da época de Ramsés V (c. 1156 a 1151 a.C.) revelam que aquelas terras não estavam mais sujeitas as cobranças reais e que seus ocupantes estavam isentos do serviço militar compulsório e dos trabalhos para o Estado. De maneira geral os faraós da XX dinastia (c. 1196 a 1070 a.C.) foram ineficazes em suas gestões e se fecharam no palácio do delta nilótico. Os egípcios do sul, sentindo-se abandonados, buscaram uma nova liderança que acabaram encontrando em Herihor, sumo sacerdote de Amon em Tebas. Quando reinava ainda Ramsés XI (c. 1100 a 1070 a.C.), o último faraó da XX dinastia, Herihor conseguiu se atribuir a titulatura real. Inscrições no Templo de Khons em Karnak mostram o nome dele dentro de cartuchos e a adoção que fez de todos os títulos reais, inclusive o epíteto de Touro Vitorioso, o título raro de Grande Governante do Egito e até mesmo Filho de Amon, assim evocando para si a descendência divina. Esse sumo sacerdote teve incrível poder econômico e militar. Durante o reinado de Ramsés XI controlou o país, na prática, desde sua fronteira sul em Assuão até Heracleópolis, ao norte, próximo do Faium. Apesar disso, jamais reivindicou soberania total sobre o Egito.
Na foto acima vemos Roma-Roy, um sumo sacerdote de Amon que exerceu suas funções durante os reinados de Ramsés II (c. 1290 a 1224 a.C.) e Merneptah (c. 1224 a 1214 a.C.).
As SacerdotisasAs SacerdotisasAs SacerdotisasAs SacerdotisasAs SacerdotisasAs SacerdotisasAs SacerdotisasAs SacerdotisasAs SacerdotisasAs Sacerdotisas
|

O historiador Maurice Crouzet afirma que se pode falar de um clero feminino, composto de concubinas do deus ou ainda de reclusas. Escapam-nos a formação que recebiam, bem como se o seu recrutamento se fazia nas camadas mais elevadas da sociedade, por vezes na própria corte. Em princípio, a partir do Império Novo (c. 1550 a 1070 a.C.) e para o santuário do grande deus dinástico Amon em Karnak, a rainha, com o título de mão divina, de esposa ou de adoradora do deus, encontrava-se à frente da hierarquia feminina. Na prática possuía uma suplente, a quem podemos chamar de grande sacerdotisa. Já o arqueólogo Alan W. Shorter informa que a função das sacerdotisas era sobretudo a de produzir música com seus sistros, como acompanhamento das cerimônias. No caso de Amon, divindade de características marcadamente sexuais, tais sacerdotisas eram consideradas suas concubinas, ostentando a esposa do sumo sacerdote o título de Concubina Especial de Amon. Tinha ela responsabilidades rituais, tais como a de liderar as mulheres que tocavam instrumentos no templo, e algumas delas parecem ter concentrado uma certa quantidade de poder. Um documento menciona que uma delas teria conseguido assegurar o rápido fornecimento das rações devidas aos trabalhadores da necrópole de Deir el-Medina quando entraram em greve na época de Ramsés III (c. 1194 a 1163 a.C.). Em outra ocasião, uma dentre tais sacerdotisas tramou o assassinato de um figurão importante e problemático. Por outro lado, a rainha, mulher do faraó reinante, era também considerada esposa da divindade e, consequentemente, recebia o título de Esposa do deus Amon.No entender da egiptóloga Lucia Gahlin havia muito menos mulheres do que homens trabalhando nos templos egípcios, mas certamente existia o título de esposa do deus, tradução literal para o termo egípcio hemet netjer. Essas mulheres atuavam durante os cultos e costumavam ser do alto escalão da sociedade, geralmente casadas com sacerdotes, sendo que suas posições dependiam grandemente do status do próprio marido. No Império Antigo (c. 2575 a 2134 a.C.) e no Império Médio (c. 2040 a 1640 a.C.) aquele título estava mais usualmente associado com o culto de Hátor, deusa da fertilidade. Era uma sacerdotisa a responsável pela administração do patrimônio dessa divindade e até mesmo o cargo de sumo sacerdote daqueles templos podia ser ocupado por mulheres. Também são conhecidas mulheres nessa função suprema servindo aos cultos das deusas Neith e Pakhet. Durante o Império Antigo uma rainha chamada Meresankh ocupou o posto de sacerdotisa suprema do deus Thoth. Desde essa época as mulheres desempenharam nos templos dos deuses e deusas, durante os cultos, funções de cantoras, dançarinas e tocadoras de instrumentos tais como harpas, pandeiros e chocalhos. No início do Império Novo o título de Cantora de Amon era de uso bastante comum e, mais uma vez, eram geralmente as esposas dos sacerdotes que alcançavam tal posição.
Também nos funerais era importante a participação feminina e, durante o Império Antigo, nos rituais do culto funerário do falecido. Duas das carpideiras recebiam os títulos de Grande Milhafre e Pequeno Milhafre e personificavam as deusas Ísis e Néftis. De acordo com a lenda de Osíris, essas deusas haviam tomado a forma de milhafres, uma ave de rapina, quando reuniam os pedaços do corpo daquela divindade para mumificá-lo. Ao que se sabe, pelo menos no decorrer do Império Antigo uma sacerdotisa podia ostentar o título de servidora do ka, sendo sua responsabilidade realizar rituais na capela tumular do defunto.
O mais importante título religioso que uma mulher podia receber era o de Divina Esposa de Amon. Essa posição se tornou, a partir da XVIII dinastia (c. 1550 a 1307 a.C.), de grande significado político. A portadora dessa honraria ficava sediada em Tebas e costumava ser uma das filhas do faráo, que visava assegurar o controle real na área tebana. No decorrer da XXIII dinastia (c. 828 a 712 a.C.) exigia-se que essa sacerdotisa se mantivese celibatária e cabia-lhe adotar uma filha e sucessora. Ela recebia um segundo título de Mão da divindade, provavelmente atribuindo-lhe um papel simbólico no ato da criação. De acordo com uma das versões do mito da criação de Heliópolis, o deus Atum criara as divindades Shu e Tefnut se masturbando. No Período Tardio (c. 712 a 332 a.C.) a ocupante desse cargo tornou-se mais importante do que o Sumo Sacerdote. Ela passou a controlar as vastas propriedades de Amon, empregava grande quantidade de pessoas e tinha acesso a grandes riquezas.
Na figura desta página vemos uma estátua de Karomama, Divina Adoradora de Amon, datada da XXII dinastia (c. 945 a 712 a.C.). Foto cortesia e © de Jon Bodsworth.
Os RituaisOs RituaisOs RituaisOs RituaisOs RituaisOs RituaisOs RituaisOs RituaisOs RituaisOs Rituais
|

A maioria dos sacerdotes tinha muito pouco contato com a estátua de culto da divindade, o ponto focal de qualquer templo, embora paramentá-la fosse a atividade mais importante do templo, executada pelos sacerdotes de categoria superior. O ritual seguido pela maioria dos templos estava baseado naquele adotado pelo templo do deus-Sol em Heliópolis desde tempos remotos. Nele a imagem de culto era defumada, lavada, untada, vestida e, finalmente, presenteada com uma refeição. Uma enorme variedade de alimentos, a qual incluia carne de gado, peixe, pato, pão, frutas e legumes, era ofertada aos deuses e ao espírito dos mortos. Depois que a divindade houvesse consumido a essência espiritual da comida, os restos materiais eram divididos entre os sacerdotes. Baseado em um papiro que atualmente de encontra no Museu de Berlim e nas esculturas existentes nos templos, o arqueólogo Alan W. Shorter nos descreve a liturgia do deus Amon-Rá em Karnak. Ele escreve: Primeiro, o celebrante entra no santuário e acende uma chama em seu turíbulo. O turíbulo egípcio não era do tipo oscilante, consistindo numa comprida peça de metal em forma de braço, em cuja mão havia um pequeno recipiente de barro para o incenso. Recitando as palavras da liturgia, o celebrante avançava na direção do relicário contendo a imagem do deus e, ao concluir a purificação preliminar do santuário e de si próprio, passava a romper as cordas de papiro e o lacre de barro que protegiam as fechaduras do relicário. Após retirar as fechaduras, abria com violência as portas de madeira, contemplava o deus face a face e recitava:
Estão abertas as duas portas do céu! Estão descerradas as duas portas da terra! Geb vos saúda, dirigindo-se aos deuses que o assistem de seus assentos:"Os céus se abriram, a companhia dos deuses resplandece! Amon-Rá, Senhor de Karnak, seja louvado em seu grande assento! O Grande Nove seja louvado em seus assentos! A beleza deles é tua, ó Amon-Rá, Senhor de Karnak!"
Dominado pelo esplendor de Amon, — prossegue Alan Shorter — o celebrante se lançava ao chão e, de bruços, beijava-o diante do relicário. Erguendo-se de novo, entoava um hino de louvor e, então, ofertava à estátua uma essência de mel e a defumava com incenso. A parte preliminar da cerimônia estava concluída; agora, após tirar a estátua do relicário e depositá-la sobre um montinho de areia, o sacerdote dava início à parte mais importante da liturgia, o aviamento propriamente dito do deus. Primeiro, lavava a imagem com água dos vasos sagrados, exclamando:
Purificado, purificado está Amon-Rá, Senhor de Karnak! Receba de Hórus a água de seu olho; que seja dado seu olho, que lhe seja dada sua cabeça, que lhe sejam dados seus ossos e lhe seja firmada sua cabeça sobre seus ossos na presença de Geb!
O sumo sacerdote tornava a perfumar a imagem com incenso e, então, cobria-lhe a cabeça com uma touca branca e a enfeitava com vestes verdes e vermelhas, coroando-a com o seu diadema especial, colocando cetros em suas mãos, braceletes em seus braços e tornozeleiras em suas pernas. A seguir, a estátua era untada com ungüento e suas pálpebras pintadas, primeiro com cosméticos verdes e, logo a seguir, pretos. O celebrante recolocava então a estátua no relicário e dispunha uma farta provisão de alimentos e bebidas sobre uma mesa à sua frente, tornando a queimar incenso em seu turíbulo, provavelmente para que a essência espiritual do alimento fosse transferida ao deus pela fumaça. Encerrada a liturgia, as portas do relicário eram fechadas e trancadas, e o celebrante, após apagar as marcas de suas próprias pegadas no piso, deixava o santuário
Fonte:https://www.fascinioegito.sh06.com/
 |
|
|
Comentários
Postar um comentário