O QUE É UM XAMÃ ?

O XAMÃ

Léo Artése


O xamã, não se autoproclama. Ele é chamado para suas tarefas espirituais, passa por treinamentos e então é reconhecido pelas pessoas de sua comunidade.

Nos primórdios da humanidade, os seres humanos, sentiam-se frágeis perante as forças da natureza e temiam aqueles que não pertenciam aos seus clãs, animais, etc.

Para suprir essas carências, surge o xamã como um "organizador do caos" para despertar a consciência. Assim eles recorriam àquele que era concebido como um guerreiro que atuava com armas espirituais, que faziam a ponte entre o mundo dos homens e espíritos.
A palavra xamã tem sua raiz na Sibéria, vinda da palavra "saman", aparentado com o termo sânscrito "sramana" que significa: inspirado pelos espíritos.


O xamã pode ser homem ou mulher.


O termo xamã foi adotado, pela antropologia, para se referir a pessoas de uma grande variedade de culturas não ocidentais, que antes eram conhecidas como : bruxo, feiticeiro, curandeiro, mago, mágico, vidente, sacerdote, pajé, homem da medicina, o terapeuta, o conselheiro, o contador de estórias, o líder espiritual e outros.
Defini-se o xamanismo como um conjunto de crenças ancestrais que estabelecem contato com uma realidade oculta, ou estados especiais (alterados) de consciência, a fim de obter conhecimento, poder, equilíbrio saúde para si mesmo e para as pessoas
O xamã, não se autoproclama. Ele é chamado para suas tarefas espirituais, passa por treinamentos e então é reconhecido pelas pessoas de sua comunidade. A iniciação tem um fundamento nas bênçãos recebidas pelos instrutores que passam uma espécie de "autorização espiritual" para conduzir cerimônias. Isso é honrar o conhecimento e não usurpar, e nem banalizar o processo de iniciação espiritual. Trata-se de um sacerdócio. É uma missão de utilidade pública.
Sua vocação é demonstrada por perturbações no comportamento ( loucura controlada), vem também por transmissão hereditária, por decisão pessoal onde passa por provas (jejuns, recolhimentos, sacrifícios corporais...) ou é eleito pelo clã. Iniciado pelos espíritos tem uma vivencia de morte simbólica para posterior ressureição. Permanece dias em locais isolados sem falar, comer, e, quase sem respirar. Geralmente conta em suas provas, ao regressar de sua viagens que seus ossos foram arrancados, sua carne raspada, tem a cabeça decepada, isto é o coma iniciático. Ele deve morrer em seu corpo terrestre para renascer em corpo astral. Esqueletos de pessoas, pássaros ou animais, são alguns dos ornamentos dos siberianos. Simboliza o tempo do nascimento do xamã - meio homem - meio animal.
Muitas iniciações também envolvem atravesssar brasas ( Manchus), nadar sobre o gelo, beber sangue (goldos). Entre os Iacutes, no alto de uma montanha, com o mestre no território das doenças, ensina-se a reconhecer a doença e curá-las. Para cada parte do corpo ele cospé na boca do outro, que deve engolir o seu cuspe para diagnosticar a doença. Os Buriatas faziam a purificação pela água (batismo) com plantas aromáticas e algumas gotas de sangue de bode, para invocar os ancestrais. 

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Segundo Mircea Eliade uma pessoa torna-se xamã por:

1) vocação espontânea (chamamento ou eleição)
2) transmissão hereditária da profissão xamânica
3) por decisão pessoal ou, mais raramente pela vontade do clã.
Mas independentemente do método de seleção, um xamã só é reconhecido como tal no fim de uma dupla instrução:
1) de ordem extática (sonhos, visões, transes, etc.) e
2) de ordem tradicional (técnicas xamânicas, nomes e funções dos espíritos, mitologia e genealogia do clã, linguagem secreta, etc.). É sobretudo a síndrome da vocação mística que nos interessa. O futuro xamã singulariza-se por um comportamento estranho; procura a solidão, torna-se sonhador, adora vaguear nos bosques ou lugares desertos, tem visões, canta durante o sono, etc
Faziam também parte das iniciações o calor (tenda do suor) e com plantas de poder, que proporcionavam o arrebatamento místico, viagens astris etc. Parte-se de um princípio que neste mundo nada é dado de presente, tem que ser aprendido.Aquele que tem por destino ser xamã experimenta um certo mal estar, um certo tédio pela vida, tédio de viver num mundo demasiadamente seguro, sensibilidade voltada para o misticismo e para as forças do inconsciente.
Trata-se de um sacerdócio. Muitas pessoas querem ser xamãs sem conhecerem as obrigações inerentes a essa função, a entrega. É uma missão de utilidade pública. Várias pessoas se denominam, mas o que determina é o trabalho espiritual. Tem gente que se denomina ator político, técnico de futebol, terapeuta, professor. Tem gente que se denomina espiritualista. Tem gente que se denomina Pai-de-Santo. Enfim, no xamanismo também!
Atualmente existem muitas pessoas que se autodenominam xamãs, que no final das contas aprenderam alguns conceitos, mas nunca foram numa floresta, nunca foram a estados profundos de consciência, não estão inseridos numa comunidade espiritual, mas estão dando aulas.
É uma iniciação séria e não uma prática que se aprende em um final de semana. Um xamã transformou a sua vida, conseguiu a sua cura através de profundos processos de morte e renascimento, lidou com perdas, enfrentou entidades, enfrentou sua própria sombra, e obteve o conhecimento essencial e o reconhecimento de seus instrutores para poder compartilhar com os outros. Lembro também que xamanismo não é só praticas de rituais e cerimônias, e sim uma forma de vida, uma nova visão do mundo, que se aplica, primeiramente no condutor.
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São anos de preparação. Está além dos rituais é um jeito de viver .Ser um xamã é abraçar um sacerdócio, não é um trabalho somente terapêutico, é uma caridade de alto risco, é assumir uma responsabilidade com o Universo de viver em harmonia com a natureza, de ajudar o próximo, de transformar o ambiente em que vive, de ser aparelho de transformações nas pessoas que dele se aproximam. Uma mudança radical, profunda, verdadeira. Ser xamã não é uma profissão, é um dom.
Ninguém, entretanto, precisa ser um xamã para praticar xamanismo. Você pode ir à missa, sem se tornar um padre. Ser xamã Implica em iniciações e transformações de profundo significado que visam preparar o aprendiz para ajudar o próximo, e passar a sua vida nisso. Não são todos os que estão preparados para abrirem suas vidas para se dedicarem verdadeiramente ao outro. Não se aprende a ser xamã em salões de espaços esotéricos. Neles você encontrará as práticas xamânicas, que lhe colocarão em contato com a egrégora, isto, se o condutor for realmente um iniciado e não um oportunista que nunca se entregou a processos de morte e transformação e só fez o caminho das flores sem tocar nos espinhos. No xamanismo também aprendemos a lidar com o Mundo da ilusão.
Perante a sociedade atual em que vivemos é a mesma coisa. Não basta ter conhecimentos médicos, se a sociedade não dá um diploma não é possível exercer a medicina de forma legal. Não basta ter conhecimento sobre as emoções, se não receber um diploma, ou melhor, se não há uma formatura, é possível ser conselheiro, mas não psicólogo ou psiquiatra. Tudo que é sério requer um ritual de passagem, uma iniciação.
Os xamãs carregam o conhecimento espiritual e da vida, passados oralmente, lembrando a sabedoria dos antepassados. Eles conduzem os ritos de passagem, encorajam a comunidade para enfrentar os desafios, aglutinam a consciência comunitária, criando uma identidade grupal. O xamã é um especialista do Sagrado. Ele é capaz de mover-se entre os diversos estados de consciência. O xamã é uma pessoa que trabalha em Estado Alterado de Consciência ( estado extático, transe, estado transcendente - onde a pessoa percebe uma "realidade incomum".) e deve conhecer os métodos básicos para realizar esse trabalho. Os xamãs são grandes conhecedores da floresta e das propriedades das plantas .
O xamã é o especialista do invisível.

Fonte:http://www.xamanismo.com.br/Universo/SubUniverso1191052266


Trilha para se Tornar um Xamã
As atividades de um xamã dependem muito intimamente da sua capacidade de dominar a audiência com o poder da execução, que deverá ter efeito não só nos assistentes como no próprio xamã. Os xamãs recorrem a muitos adereços e símbolos para representar a sua experiência psíquica e para influenciarem seus pacientes. Inúmeros xamãs se vestem de maneira especial, usando penas de pássaros poderosos, tambores, marakás e sinos, para criar efeitos musicais hipnóticos, bem como uma linguagem poética de encantos e rezas.
O xamã é escolhido pelos espíritos, e na experiência central da iniciação é morto e renascido por eles. A personalidade do xamã enriquece-se através da aquisição de espíritos auxiliares, que lhe dão a possibilidade de viajar através do Cosmo. Por outro lado, os espíritos hostis representam o lado negativo do paciente ou até da própria personalidade do xamã. A morte do xamã pode repetir-se ou ser representada em pequena escala cada vez que ele atua.
O xamã é um neurótico e um psicopata; o xamã é a pessoa mais sã da sociedade, profundamente sensível ao temperamento dos outros; o xamã é um exibicionista, um conspirador e um charlatão. Todas essas características controversas são freqüentemente atribuídas aos xamãs por aqueles que observam, e todas elas envolvem muitas presunções sobre a personalidade e a psicologia do xamã. Considerada a difícil natureza do apelo para se ser xamã, é provavelmente verdade que de fato seja necessário possuir uma personalidade distinta de todos, mas sua natureza poderá variar. As culturas siberianas exigem grande força emocional e física, e dizia-se que o homem que tivesse perdido os dentes já não podia ser xamã. Todavia, entre os Soras uma criança chorona e franzina pode ter a capacidade de ver espíritos e distinguir-se das restantes pela sua vocação.
Nos nativos americanos do norte, os poderes xamânicos estão largamente espalhados. Em certas partes da Amazônia, uma parte da população masculina é constituídas por xamãs, embora alguns possam ser mais poderosos do que os outros e a iniciação equivalha freqüentemente a uma fase essencial no desenvolvimento de uma personalidade de adulto. A busca de visão entre os Norte-Americanos funciona do mesmo modo, e a Dança do Sol combinava-se explicitamente com os ritos anuais da puberdade.
Os poderes especiais do xamã são inerentes a uma pessoa desde o nascimento, caso em que terão de ser trazidos à luz; ou então a pessoa possuirá uma predisposição ou o potencial para vir a ser xamã, e deverá adquirir o poder de qualquer modo. Os dois estados não são sempre claramente diferenciáveis.
Na Mongólia e na Sibéria, o elemento de herança é freqüentemente tornado explícito, e especial a linhagem masculina é importante. O xamã mongol tinha um direito ou qualidade hereditária, designada “udka”, que remontava até a origem celestial de sua linha. A “udka” Tengriin significava a descendência do deus do céu Tengri. A “udka” Ner’jeer significava a descendência de um antepassado que tinha sido atingido por um raio. A “udka” era também a marca do xamanismo como profissão: os ferreiros tinham uma “udka” própria comparável. Na Mongólia, assim como noutras regiões da Ásia com uma história de estados e de impérios, os direitos hereditários dos xamãs e dos governantes eram transmitidos de um modo semelhante.
O poder xamânico também se pode comprar, como em certas partes do Amazonas Superior. Todavia, a maioria das tradições salienta que são os espíritos que escolhem quem é que se vai tornar xamã. A seleção pelos espíritos é crucial. Mesmo com o princípio da hereditariedade, os parentes e descendentes de um xamã serão muito numerosos, e muitas vezes não é perfeitamente claro quem deva receber o dom. Os espíritos do xamã anterior podem vaguear fora de controle, como, por exemplo, entre os Evencos, da Sibéria, procurando novos “hospedeiros” e provocando doenças por todo o lado. Em muitas regiões, o futuro xamã poderá ser contatado em sonhos por espíritos que lhe surgiram que ele ou ela devam tomar seu cargo. Vulgarmente, a pessoa em causa fica seriamente doente, e acaba por perceber as intenções dos espíritos durante esta doença. Poderá ser uma doença como a varíola, que, sem o auxílio da medicina moderna, é geralmente fatal. Mas para os xamãs em perspectiva, a doença conduz uma aceitação do seu novo papel, que lhe permitirá ficar curado, e bem assim curar os outros.
Os Iacutos acreditam que um xamã só curava as doenças cujos espíritos tinham provado a carne do xamã durante sua iniciação. Em muitas regiões da Sibéria, as pessoas podem sofrer de uma “doença xamânica” perfeitamente distinta, em que pareçam ficar fora de si, lançando-se nuas pelos campos sem qualquer consideração pela própria segurança, ou passando semanas numa árvore, ou jazendo imóveis no chão. Durante este período, recusam-se a iniciar a difícil vida de um xamã e são perseguidos por espíritos que as obrigam a ceder. Quase sempre o iniciado cede, mas a luta pode ser dura e prolongar-se por alguns anos. Os espíritos ameaçam que, se o candidato mantiver a recusa, ele ou ela continuará a ser torturado por eles próprios, e acabará por ser morto eventualmente. Por conseguinte, o “dom” xamânico e o “controle” dos espíritos são como uma faca de dois gumes: em vez de serem ativamente procurados, são antes impostos contra a vontade do xamã, e além de conceder o poder também provocam angústia para toda a vida. Muitas outras culturas xamânicas encaram da mesma maneira o problema.
Qualquer que seja o modo como o xamã foi inicialmente escolhido, ele ou ela acabará por se adaptar a uma ordem totalmente diferente da vida de todos os dias. Tal como sucede no povo Wayapi, tanto os xamãs como certas árvores são “payé” – isto é, imbuídos de espírito xamânico -, de tal modo os Gaujiros, da Amazônia, dizem que uma pessoa que se torne xamã passa a ser “pulasu” – uma palavra que significa “espírito”.
Para um xamã em perspectiva, o contato inicial com os espíritos deve ser seguido de um período de instrução. A própria doença se torna uma forma de aprendizagem e compreensão, na medida em que o futuro xamã é apresentado aos espíritos auxiliares, a partir do que terá de atuar com decisão, prevenido sobre possíveis inimigos e tornado conhecedor da verdadeira natureza das doenças, e ataques externos a combater.
O primeiro contato com os espíritos toma a forma de um ataque violento, que conduz ao que parece ser a destruição da personalidade do futuro xamã. A isto se segue a reconstrução do xamã, cujos novos poderes não se limitam a um acrescento externo ou uma ferramenta. Na realidade, são uma espécie de visão íntima das coisas, uma perspectiva da natureza do mundo, e, em particular, das formas de sofrimento humanas que ele ou ela acaba de sofrer de modo tão intenso. A interiorização de todas estas experiências levará ao aparecimento de uma nova personalidade, e é esta que se exprime através da destruição da anterior natureza do xamã.
A experiência psíquica do candidato fica expressa pelo desmantelamento do corpo. Ele ou ela poderão ver-se como um esqueleto, um tema largamente encontrado na Ásia e nas Américas. Na Sibéria, cada osso e cada músculo é tomado à parte, contado e voltado a ser reunido com os restantes.
A iniciação não é necessariamente violenta. Na América do Norte, na busca da visão, o caso típico de um jovem dirigir-se a um local ermo para jejuar e orar durante alguns dias, a fim de adquirir um espírito guardião. Este espírito, que muitas das vezes é um animal, diz-lhe o que colocar na sua sacola de remédios (Medicine Bag), e ensina-lhe as canções de cura que lhe permitirão invocar o espírito e procurar proteção em momentos de perigo.
Na iniciação do xamã, o tema da morte completa-se com o renascimento, e o movimento do xamã no espaço cósmico é por vezes especificamente comparado ao regresso ao útero. Além de ser amamentado ao peito de uma mãe-espírito, o xamã siberiano é ainda ocasionalmente embalado num berço de ferro por espíritos, sobre os ramos da árvore do mundo. Entre os esquimós do Alasca, o túnel de passagem para o iglu significa claramente a passagem vaginal para o útero.
São estas imagens que permitem a alguns psicanalistas interpretar a iniciação xamânica como uma regressão infantil. É claro, contudo, que nem todos os retornos ao útero são regressivos, uma vez que o xamã re-emerge como um adulto integrado e excepcionalmente poderoso. Neste aspecto, a iniciação assemelha-se à iniciação efetuada em muitas sociedades por ocasião dos ritos de puberdade, da qual se diz que o adolescente regressou ao útero para renascer, desta vez completamente adulto ou, por outras palavras, como uma pessoa mais completa do que anteriormente… um xamã.
Fonte:http://www.xamanismo.com/

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