A CRIAÇÃO E A DISSOLUÇÃO DE UMA MANDALA DE AREIA,EXEMPLO DA IMPERMANÊNCIA

A criação e dissolução de uma mandala de areia, exemplo da impermanência.

Mandala significa círculo em sânscrito. Aqui, ela designa um diagrama simbólico de uma mansão sagrada, o palácio de uma divindade meditacional, representando todas as qualidades iluminadas. A palavra tibetana para mandala é kyilkhor (tib. dkyil khor), centro-círculo. Cada mandala é associada a uma certa divindade; porém, essas divindades não são “deuses” ou “deusas”, mas budas (tib. sangs rgyas/ sangye), seres iluminados que demonstram sua compaixão, sabedoria e habilidade para liberar todos os seres do sofrimento e levá-los ao despertar.
As mandalas são pintadas como thangkas, representadas tridimensionalmente em madeira ou metal, simbolizadas por montes de arroz, ou construídas com areia colorida sobre uma plataforma. Neste último caso, a mandala é desfeita após algumas cerimônias e a areia é jogada em um rio próximo, para que as bênçãos se espalhem. A dissolução de uma mandala serve também como exemplo da impermanência.
As técnicas de construção de mandalas fazem parte do aprendizado dos monges tibetanos, incluindo a memorização dos textos que especificam os nomes, proporções e posições das linhas principais que definam a estrutura básica das mandalas. Esses textos não descrevem cada linha ou detalhe, mas servem como guias para complementar a ajuda dos monges mais experientes.
A base central segue proporções de 8 x 8, semelhante à arquitetura dos templos indianos tradicionais e dos altares védicos. O ponto cardeal norte é representado à direita, o sul à esquerda, o leste abaixo e o oeste acima. O centro da mandala representa a essência, a natureza búdica, a própria iluminação.
A mandala é desenhada com um pó de mármore, proveniente de pedras encontradas nos rios que descem da cordilheira do Himalaia. O pó, depois de moído, lavado e seco ao sol, é misturado com pigmentos não-tóxicos para formar as principais cores, como amarelo, verde, vermelho e azul.
Um dos momentos mais emocionantes do ritual tibetano é o desmantelamento da mandala, assim que ela está terminada. “Este é o principal ensinamento da mandala de areia: tudo na vida é impermanente, tudo faz parte do ciclo de nascimento, morte e renascimento.” Tenzin conta que, na nossa existência, tudo muda constantemente: o fraco se transforma em forte, a beleza em feiura, a pobreza em riqueza ou a saúde em doença. “Quando desmancho uma mandala e misturo todas as areias estou apenas reproduzindo a vida.”
Confira abaixo, fotos e vídeos da construção e destruição da mandala e trechos de ensinamentos de grandes mestres. 
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Não haveria nenhuma possibilidade de chegar a conhecer a morte se ela acontecesse só uma vez. Mas felizmente a vida não é mais que uma contínua dança de nascimento e morte, um bailado de mudanças. Toda vez que ouço o sussurrar de um ribeirão de montanha, ou as ondas quebrando na praia, ou ainda as batidas do meu coração, escuto o som da impermanência. Essas mudanças, essas pequenas mortes, são nossos elos vivos com a morte. Elas são o pulso da morte, o coração dela batendo, incitando-nos a largar todas as coisas a que somos apegados.
Vamos então trabalhar com essas mudanças agora, durante a vida: esse é o verdadeiro modo de nos prepararmos para a morte. A vida pode ser cheia de dor, de sofrimento e dificuldades, mas todas essas experiências são oportunidades que nos são dadas para nos ajudar a aceitar emocionalmente a morte. É só quando acreditamos que as coisas são permanentes que perdemos a oportunidade de aprender com a mudança.
Se desperdiçarmos essa possibilidade, fechamo-nos e nos deixamos dominar pelo apego. O apego é a fonte de todos os nossos problemas. Uma vez que a impermanência para nós é sinônimo de angústia, agarramo-nos desesperadamente às coisas, mesmo que todas elas mudem. Vivemos com pavor de soltar, com pavor do próprio viver, já que aprender a viver é aprender a soltar. E essa é a tragédia e a ironia da nossa luta pela permanência: ela não só é impossível, como nos traz exatamente a dor que procuramos evitar.
Sogyal Rinpoche no “O Livro Tibetano do Viver e do Morrer“
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A vida é como um piquenique em uma tarde de domingo — ela não dura muito tempo. Só olhar o sol, sentir o perfume das flores ou respirar o ar puro já é uma alegria. Mas se tudo o que fazemos é ficar discutindo onde pôr a toalha, quem vai sentar em que canto, quem vai ficar com o peito ou a coxa do frango…, que desperdício! Mais cedo ou mais tarde o tempo fecha, a tarde cai e o piquenique acaba. E tudo o que fizemos foi ficar discutindo e implicando uns com os outros. Pense em tudo que se perdeu.
Você pode estar se perguntando: se tudo é impermanente, se nada dura, como pode alguém viver feliz? É verdade que não podemos, de fato, agarrar ou nos segurar às coisas, mas podemos usar esse conhecimento para olhar a vida de modo diferente, como uma oportunidade muito breve e rara. Se trouxermos à nossa vida a maturidade de saber que tudo é impermanente, vamos ver que nossas experiências serão mais ricas, nossos relacionamentos mais sinceros, e teremos maior apreciação por tudo aquilo que já desfrutamos.
Também seremos mais pacientes. Vamos compreender que, por pior que as coisas possam parecer no momento, as circunstâncias infelizes não podem durar. Teremos a sensação de que seremos capazes de suportá-las até que passem. E com maior paciência seremos mais delicados com as pessoas a nossa volta. Não é tão difícil manifestar um gesto amoroso quando nos damos conta de que talvez nunca mais estaremos com a nossa tia-avó. Por que não deixá-la feliz? Por que não dispor de tempo para ouvir todas aquelas histórias antigas?
Chegar à compreensão da impermanência e ao desejo autêntico de fazer os outros felizes nesta breve oportunidade que temos juntos, constitui o começo da verdadeira prática espiritual. É esse tipo de sinceridade que efetivamente catalisa a transformação em nossa mente e em nosso ser.
Não precisamos raspar a cabeça nem usar vestes especiais. Não precisamos sair de casa nem dormir em uma cama de pedras. A prática espiritual não requer condições austeras — apenas um bom coração e a maturidade de compreender a impermanência. Isso nos fará progredir.
Chagdud Tulku Rinpoche, em “Portões da Prática Budista“.
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Algumas vezes, quando ensino essas coisas, depois alguém se aproxima de mim e diz: “Tudo isso parece tão óbvio! Eu sempre soube disso. Diga alguma coisa nova”.
Respondo então:
“Você realmente entendeu e realizou a verdade da impermanência? Você de fato a integrou em cada um dos seus pensamentos, respirações e movimentos a tal ponto que sua vida se transformou?
Faça a si mesmo estas duas perguntas:
lembro a cada instante que estou morrendo, e todos e tudo ao meu redor também, e desse modo trato todos os seres a todo momento de forma compassiva? Meu entendimento da morte e da impermanência tem sido tão forte e urgente para mim a ponto de que dedique cada segundo da existência à busca da iluminação?
Se você pode responder ‘sim’ a ambas as perguntas, então você compreendeu de fato a impermanência”.
Sogyal Rinpoche, em “O Livro Tibetano do Viver e do Morrer“
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Não precisamos de uma vidente para nos dizer qual vai ser a nossa experiência no futuro — precisamos apenas olhar para a nossa própria mente.
Se temos um bom coração e a intenção de ajudar os outros, vamos encontrar felicidade continuamente.
Se, ao contrário, a mente estiver preenchida por pensamentos autocentrados e mundanos, ou com raiva e intenções maldosas em relação aos outros, vamos encontrar apenas experiências difíceis.
Chagdud Tulku Rinpoche, em “Portões da Prática Budista“
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É estranho que, ao olharmos para trás em nossas vidas, fica claro que toda nossa experiência — desde anos atrás para até mesmo o último momento — é tudo como um sonho.
Mesmo assim, ao olhar adiante, somos seduzidos de novo e de novo pelo deslumbre de possibilidades — tanto faz se é consumir a próxima refeição, um novo emprego, as próximas férias ou um fantástico novo relacionamento; como se alguma nova experiência fosse finalmente satisfazer todos nossos anseios.
É por ver e relembrar a verdade da impermanência que relaxamos a tensão do apego e do agarrar.
Joseph Goldstein, em “Dharma – O caminho da libertação”
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Manter a visão da vacuidade não é uma desculpa para a indiferença ou a apatia. Ao contrário, nos dá uma razão para nos abrirmos a cada experiência que surge, sem nos apegarmos a ela ou rejeitá-la. Se contemplarmos em profundidade a impermanência e a vacuidade e formos capazes de estabelecer essa visão em todos os tipos de situações, o significado interno da vida é revelado.
Chagdud Khadro
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Nós seres humanos podemos ficar deslumbrados — ou no mínimo nos distrair — com a cerimônia e as cores das práticas culturais budistas. Velas e incenso são coisas exóticas e atrativas; impermanência e ausência de ego não são.
O próprio Sidarta disse que a melhor maneira de cultuar é simplesmente lembrar os princípios sobre a impermanência, o sofrimento das emoções, o fato de que os fenômenos não têm existência inerente e de que o nirvana está além dos conceitos.
Em um nível superficial, o budismo pode parecer ritualista e religioso. Disciplinas budistas como mantos bordôs, rituais, implementos, incenso, flores e até monastérios têm forma — elas podem ser observadas e fotografadas. Nós esquecemos que elas são um meio para um fim. Esquecemos que uma pessoa não se torna um seguidor do Buda executando rituais ou adotando disciplinas como vegetarianismo ou uso de mantos.
Mas a mente humana adora tanto os símbolos e rituais que eles são quase inevitáveis e indispensáveis. Mandalas de areia tibetanas ou jardins zen japoneses são lindos; isso pode nos inspirar e até ser um meio para compreender a verdade. Mas a verdade em si mesma não é nem bonita nem não-bonita.

Dzongsar Khyentse Rinpoche no livro ”O que faz você ser budista?”

Fonte:http://www.budavirtual.com.br/criacao-e-dissolucao-de-uma-mandala-de-areia-exemplo-da-impermanencia/



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