VIVEMOS TEMPOS LÍQUIDOS.NADA É PARA DURAR SEGUNDO O SOCIÓLOGO POLONÊS ZYGMUNT BAUMAN

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Zygmunt Bauman: Vivemos tempos líquidos. Nada é para durar

Estamos cada vez mais aparelhados com iPhones, tablets, notebooks, tudo para disfarçar o antigo medo da solidão. O contato via rede social tomou o lugar de boa parte das pessoas, cuja marca principal é a ausência de comprometimento. Este texto tem como base a ideia de líquido, característica presente nas relações humanas atuais, inspirado na obra "Amor Líquido" - sobre a fragilidade dos laços humanos, de Zigmunt Bauman. As relações se misturam e condensam com laços momentâneos, frágeis e volúveis. Em um mundo cada vez mais dinâmico, fluido e veloz, seja real ou virtual.


O sociólogo polonês Zygmunt Bauman é um dos intelectuais mais respeitados da atualidade. Aos 87 anos seus livros publicados venderam mais de 200 mil cópias. Um resultado e tanto para um teórico. Entre eles “Amor liquido” é talvez o livro mais popular de Bauman no Brasil. É neste livro que o autor expõe sua análise de maneira mais simples e próxima do cotidiano, analisando as relações amorosas e algumas particularidades da “modernidade liquida”. Vivemos tempos líquidos, nada é feito para durar, tampouco sólido. Os relacionamentos escorrem das nossas mãos por entre os dedos feito água.
Ele tenta nos mostrar nossa dificuldade de comunicação afetiva. Todos querem relacionar-se, mas chega na hora, não conseguem. Seja por medo ou insegurança. Bauman cita como exemplo um vaso de cristal, na primeira queda, quebra. As relações terminam tão rápido quanto começam, as pessoas pensam terminar com um problema cortando seus vínculos, mas o que fazem mesmo é criar problemas em cima de problemas.
É um mundo de incertezas. E cada um por si. Temos relacionamentos instáveis, pois as relações humanas estão cada vez mais flexíveis. Acostumados com o mundo virtual, e com a facilidade de se “desconectar” as pessoas não conseguem manter um relacionamento de longo prazo. É um amor criado pela sociedade atual (modernidade líquida) para tirar-lhes a responsabilidade de relacionamentos sérios e duradouros. Pessoas estão sendo tratadas como bens de consumo, caso haja defeito, descarta-se ou até mesmo troca-se por versões mais atualizadas.
O romantismo do amor parece estar fora de moda. O amor de verdade foi banalizado, diminuído a vários tipos de experiências vividas pelas pessoas, na qual se referem a estas utilizando a palavra amor. Noites descompromissadas de sexo são chamadas “fazer amor”. Não existem mais responsabilidades de estar amando, a palavra amor é usada mesmo quando as pessoas nem sabem direito seu real significado.
Ainda para tentar explicar a relações amorosas em “Amor Líquido”, Zygmunt Bauman fala da “ Afinidade e Parentesco.” O parentesco seria o laço irredutível e inquebrável é aquilo que não nos dá escolha
A afinidade é, ao contrário do parentesco, voluntária. A afinidade é escolhida. Porém, e isso é importante, o objetivo da afinidade é ser como o parentesco. Entretanto, vivendo em uma sociedade de total “descartabilidade” até as afinidades estão se tornando raras.
Bauman fala também sobre o amor próprio. Afirma que as pessoas precisam se sentir amadas, ouvidas, amparadas ou que sintam sua falta. Segundo ele ser digno de amor é algo que só o outro pode nos classificar, o que fazemos é aceitar essa classificação. Mas com tantas incertezas, relações sem forma, líquidas, na qual o amor nos é negado como teremos amor próprio? Os amores e as relações humanas de hoje são todos muito instáveis. E assim não temos certeza do que esperar. Relacionar-se é caminhar na neblina, sem a certeza de nada. É uma descrição poética da situação.
"Para ser feliz há dois valores essenciais que são absolutamente indispensáveis [...] um é segurança e o outro é liberdade, você não consegue ser feliz e ter uma vida digna na ausência de um deles. Segurança sem liberdade é escravidão. Liberdade sem segurança é um completo caos. Você precisa dos dois. [...] Cada vez que você tem mais segurança você entrega um pouco da sua liberdade. Cada vez que você tem mais liberdade você entrega parte da segurança. Então, você ganha algo e você perde algo".
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O Sociólogo Zygmunt Bauman


Um dos maiores críticos da sociedade contemporânea, Zygmunt Bauman reflete sobre as relações do homem e a diferença entre sociedade e comunidade.

Nascido na Polônia em 1925, Zygmunt Bauman iniciou sua carreira como sociólogo na Universidade de Varsóvia. Já teve inúmeros artigos e alguns livros censurados. Em 1968 foi afastado da Universidade, o que o fez sair da Polônia em direção ao Canadá, Estados Unidos e Austrália. Mas foi na Grã-Bretanha, em 1971, que encontrou seu novo lar, ao se tornar professor titular da Universidade de Leeds, cargo que ocupou por vinte anos. Lá conheceu o filósofo islandês Ji Caze, que influenciou sua escrita filosófica. Bauman recebeu os prêmios Amalfi (em 1989, por sua obra Modernidade e Holocausto) e Adorno (em 1998, pelo conjunto de sua obra). Atualmente é professor emérito de sociologia das universidades de Leeds e Varsóvia.
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Tem mais de dezesseis obras publicadas no Brasil, dentre as quais Amor Líquido, Globalização: as Conseqüências Humanas e Vidas Desperdiçadas. Bauman tornou-se conhecido por suas análises das ligações entre modernidade (controle sobre a natureza, hierarquização burocrática, regras e normatização, categorização, para impor ordem, diminuir entropia social e insegurança) e holocausto (não simplesmente um evento da história do povo judeu, mas característica da modernidade), e pós-modernidade (renúncia à securança característica da modernidade em favor da liberdade, liberdade de comprar e consumir).
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Zygmunt Bauman é considerado um dos mais importantes filósofos filósofos da nossa época, suas teorias falam acerca do declínio da civilização e sobre como a vida, a política e os padrões culturais mudaram nos últimos 20 anos. De acordo com Bauman os líderes deixaram de ser líderes para serem apenas expectadores. Em entrevista à revista Época, em 2012, ele reflete acerca da sociedade moderna: "Vivemos o fim do futuro. Durante toda a era moderna, nossos ancestrais agiram e viveram voltados para a direção do futuro. Eles avaliaram a virtude de suas realizações pela crescente (genuína ou suposta) proximidade de uma linha final, o modelo da sociedade que queriam estabelecer. A visão do futuro guiava o presente. Nossos contemporâneos vivem sem esse futuro. Fomos repelidos pelos atalhos do dia de hoje. Estamos mais descuidados, ignorantes e negligentes quanto ao que virá."
Zygmunt Bauman é um dos principais críticos da sociedade atual, afirmando que vivemos numa era de total exclusão social, ainda que apoiemos movimentos que proclamam uma ideia contrária. Vivemos em contradição. O filósofo ainda afirma em seus estudos e palestras que a sociedade atual nada tem a ver com o conceito de comunidade. O próprio consumismo desenfreado, a qual a sociedade mundial está inserida, é uma contradição à ideia de comunidade. Para ele, nós contruímos uma sociedade superficial, onde as relações virtuais são mais empolgantes e importantes do que as pessoais. Pois no mundo virtual, podemos viver o que a realidade não nos permite. E é por meio da internet que a sociedade se desintegra no que se refere às relações. Isso a que ele chama de tempos líquidos, as relações e os conceitos que se dissolvem.
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Estamos nos tornando cada vez mais individualistas e dependentes do consumo como fonte de felicidade, diz o sociólogo polonês Zygmunt Bauman.

Gastadores e solitários



Com mais de 30 livros publicados no Brasil, o sociólogo polonês Zygmunt Bauman, 88, é um dos mais profícuos e renomados pensadores da contemporaneidade. Para ele, a sociedade enfrenta grave problema: “parece que o caminho para a felicidade passa, necessariamente, pelas compras. E as pessoas querem comprar os produtos e rapidamente descartá-los, substituindo por novos. Isso representa grande desperdício de recursos naturais do planeta”.
Para Bauman, a relação da sociedade com o consumismo é tão intensa, que se tornou comum as pessoas gastarem o dinheiro que não têm, por meio do crédito. São hábitos que convergem para o conceito de “liquidez” da sociedade pós-moderna, principal linha de raciocínio de sua obra.
“É uma metáfora simples. Nosso arranjo social, nos dias de hoje, se comporta como um líquido em um recipiente. Ou seja, não se mantém por muito tempo em um mesmo estado. Está sempre mudando. Enquanto gerações passadas se acostumaram a uma estabilidade de todas as coisas, o homem contemporâneo enxerga as rápidas mudanças nos partidos e movimentos políticos, nas causas, nas instituições que acabam, na moda, tudo muda várias vezes. Tenho 88 anos e já vi vários arranjos sociais”.
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“Na modernidade líquida prevalece o deus do tipo ‘faça você mesmo’. Não um deus recebido, mas inventado individualmente”. Para além do âmbito religioso, o sociólogo afirma, ainda, que nos tornamos os nossos próprios poderes legislativos, executivos e judiciários.
Como contraponto a essa individualização, nos é oferecida a visão da internet como “presságio da visibilidade dos invisíveis, da audibilidade para os mudos, da ação para os incapazes de agir”. Na visão de Bauman, internet é sinônimo de liberdade, e precisaria ser inventada caso ainda não existisse.
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Ele aproveita para ressaltar fenômenos inerentes à vida dois-ponto-zero: “as redes de relacionamento prometiam romper os limites da sociabilidade, mas não o fizeram e não o farão”, diz, após relembrar que por definição biológica nossas relações significativas estão limitadas a 150. Se além desse número as suas contas em mídias sociais somarem outros milhares de contatos, saiba: “são meros voyeurs”.
Isso porque na visão do autor vivemos em uma sociedade confessional, onde fazemos de tudo para aumentar o próprio “valor de mercado” por meio do marketing pessoal na web. “As pessoas são ao mesmo tempo promotores de mercadoria e as mercadorias que promovem”.
E como se pretendesse pôr em prova a teoria, questiona: “será que o sucesso do Facebook não é consequência de ele fornecer uma feira em que a necessidade pode encontrar-se todo dia com a liberdade de escolha?”
Além de individualistas, somos, para Bauman, vítimas da perversidade do mercado financeiro, responsável por nos transformar de consumidores inativos em multidões de gastadores e/ou devedores.
Ao citar o caso específico da população norte-americana, o sociólogo radicado na Inglaterra não mede palavras: “os Estados Unidos são famosos por quebrar recordes em todos os campos, e o da estupidez financeira nao é exceção”. Como exemplo do infame estímulo ao consumismo, menciona a publicidade “sob medida” oferecida pela internet, adaptada de acordo com o perfil de cada usuário (prática comum entre as gigantes da web, como o Google).
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Se os jovens são enxergados como novos mercados prestes a serem explorados, ao mesmo tempo são surpreendidos com a falta de empregos e a desvalorização dos diplomas universitários. Assistem de longe às mudanças na “geografia do trabalho”: empregos migram para países em que “há poucas leis e regulamentos restringindo a liberdade dos capitalistas”.
Diante do cenário, Zygmunt Bauman mostra grande preocupação com a falta de preparo da juventude para enfrentar um mercado em transição, que talvez já esteja na era pós-industrial. Com cautela, ele lança mão das pesquisas: o 1% mais rico dos americanos não é mais formado por donos de indústrias, e sim por financistas, celebridades, designers. “Hoje, a fonte básica de riqueza e poder são conhecimento, inventividade, imaginação, capacidade de pensar e coragem para fazer de modo diferente”, sugere.

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Com mais de 30 livros publicados no Brasil, o sociólogo polonês Zygmunt Bauman, 88, é um dos mais profícuos e renomados pensadores da contemporaneidade. Para ele, a sociedade enfrenta grave problema: “parece que o caminho para a felicidade passa, necessariamente, pelas compras. E as pessoas querem comprar os produtos e rapidamente descartá-los, substituindo por novos. Isso representa grande desperdício de recursos naturais do planeta”.
Para Bauman, a relação da sociedade com o consumismo é tão intensa, que se tornou comum as pessoas gastarem o dinheiro que não têm, por meio do crédito. São hábitos que convergem para o conceito de “liquidez” da sociedade pós-moderna, principal linha de raciocínio de sua obra.
“É uma metáfora simples. Nosso arranjo social, nos dias de hoje, se comporta como um líquido em um recipiente. Ou seja, não se mantém por muito tempo em um mesmo estado. Está sempre mudando. Enquanto gerações passadas se acostumaram a uma estabilidade de todas as coisas, o homem contemporâneo enxerga as rápidas mudanças nos partidos e movimentos políticos, nas causas, nas instituições que acabam, na moda, tudo muda várias vezes. Tenho 88 anos e já vi vários arranjos sociais”.
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“Na modernidade líquida prevalece o deus do tipo ‘faça você mesmo’. Não um deus recebido, mas inventado individualmente”. Para além do âmbito religioso, o sociólogo afirma, ainda, que nos tornamos os nossos próprios poderes legislativos, executivos e judiciários.
Como contraponto a essa individualização, nos é oferecida a visão da internet como “presságio da visibilidade dos invisíveis, da audibilidade para os mudos, da ação para os incapazes de agir”. Na visão de Bauman, internet é sinônimo de liberdade, e precisaria ser inventada caso ainda não existisse.
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Ele aproveita para ressaltar fenômenos inerentes à vida dois-ponto-zero: “as redes de relacionamento prometiam romper os limites da sociabilidade, mas não o fizeram e não o farão”, diz, após relembrar que por definição biológica nossas relações significativas estão limitadas a 150. Se além desse número as suas contas em mídias sociais somarem outros milhares de contatos, saiba: “são meros voyeurs”.
Isso porque na visão do autor vivemos em uma sociedade confessional, onde fazemos de tudo para aumentar o próprio “valor de mercado” por meio do marketing pessoal na web. “As pessoas são ao mesmo tempo promotores de mercadoria e as mercadorias que promovem”.
E como se pretendesse pôr em prova a teoria, questiona: “será que o sucesso do Facebook não é consequência de ele fornecer uma feira em que a necessidade pode encontrar-se todo dia com a liberdade de escolha?”
Além de individualistas, somos, para Bauman, vítimas da perversidade do mercado financeiro, responsável por nos transformar de consumidores inativos em multidões de gastadores e/ou devedores.
Ao citar o caso específico da população norte-americana, o sociólogo radicado na Inglaterra não mede palavras: “os Estados Unidos são famosos por quebrar recordes em todos os campos, e o da estupidez financeira nao é exceção”. Como exemplo do infame estímulo ao consumismo, menciona a publicidade “sob medida” oferecida pela internet, adaptada de acordo com o perfil de cada usuário (prática comum entre as gigantes da web, como o Google).
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Se os jovens são enxergados como novos mercados prestes a serem explorados, ao mesmo tempo são surpreendidos com a falta de empregos e a desvalorização dos diplomas universitários. Assistem de longe às mudanças na “geografia do trabalho”: empregos migram para países em que “há poucas leis e regulamentos restringindo a liberdade dos capitalistas”.
Diante do cenário, Zygmunt Bauman mostra grande preocupação com a falta de preparo da juventude para enfrentar um mercado em transição, que talvez já esteja na era pós-industrial. Com cautela, ele lança mão das pesquisas: o 1% mais rico dos americanos não é mais formado por donos de indústrias, e sim por financistas, celebridades, designers. “Hoje, a fonte básica de riqueza e poder são conhecimento, inventividade, imaginação, capacidade de pensar e coragem para fazer de modo diferente”, sugere.




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Vivemos o fim do futuro: essa é a conclusão de um dos maiores filósofos contemporâneos.



Nascido na Polônia em 1925, Zygmunt Bauman iniciou sua carreira como sociólogo na Universidade de Varsóvia. Já teve inúmeros artigos e alguns livros censurados. Em 1968 foi afastado da Universidade, o que o fez sair da Polônia em direção ao Canadá, Estados Unidos e Austrália. Mas foi na Grã-Bretanha, em 1971, que encontrou seu novo lar, ao se tornar professor titular da Universidade de Leeds, cargo que ocupou por vinte anos. Lá conheceu o filósofo islandês Ji Caze, que influenciou sua escrita filosófica. Bauman recebeu os prêmios Amalfi (em 1989, por sua obra Modernidade e Holocausto) e Adorno (em 1998, pelo conjunto de sua obra). Atualmente é professor emérito de sociologia das universidades de Leeds e Varsóvia.
A revista Época publicou uma entrevista com Bauman que reflete acerca da perda de referências políticas, culturais e morais da civilização e diz que só os jovens, com sua indignação, poderão resistir à banalização.
Confira a entrevista na íntegra aqui.
O filósofo afirma que "durante toda a era moderna, nossos ancestrais agiram e viveram voltados para a direção do futuro. Eles avaliaram a virtude de suas realizações pela crescente (genuína ou suposta) proximidade de uma linha final, o modelo da sociedade que queriam estabelecer. A visão do futuro guiava o presente. Nossos contemporâneos vivem sem esse futuro. Fomos repelidos pelos atalhos do dia de hoje. Estamos mais descuidados, ignorantes e negligentes quanto ao que virá".
Para ele, a decadência da política é causada e reforçada pela incapacidade de as instituições serem politicamente independentes. Elas amarram o poder à política. É o que o homem faz mais hoje do que nunca. Tudo está voltado à política, e tudo depende de algo dentro da política, sendo ela a manipuladora de toda a sociedade em quaisquer situação. "Nossos antepassados conceberam uma ordem que dependia dos serviços do Estado-nação. Mas essa ordem não é mais adequada aos desafios postulados pela contínua globalização de nossa interdependência. Com a separação do poder e da política, a gente se encontra na dupla situação de poderes livres do controle político e da política que sofre o deficit perpétuo do poder. Daí a crise de confiança nas instituições políticas, uma vez que a política investiu nos parlamentos e nos partidos para construir a democracia como atualmente a compreendemos. Mais e mais pessoas duvidam que os políticos sejam capazes de cumprir suas promessas. Assim, elas procuram desesperadamente veículos alternativos de decisão coletiva e ação, apesar de, até agora, isso não ter representado uma alteração efetiva."
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Bauman também reflete acerca da era da informação e como a internet mudou as relações: "As redes sociais eram atividades de difícil implementação entre as comunidades do passado. Nas interações sociais não parece haver esforço de nossa experiência de vida." Para ele, hoje tudo está conectado a alguma coisa, tudo tem um propósito. O propósito de viver bem é mostrar ao outro que estamos bem. As relações virtuais tornaram-se parte primordial da vida, o que é superficial.
"Eu penso que a atratividade desse novo tipo de amizade, o tipo de amizade de facebook, como eu a chamo, está exatamente aí: que é tão fácil de desconectar. É fácil conectar e fazer amigos, mas o maior atrativo é a facilidade de se desconectar. Imagine que o que você tem não são amigos online, conexões online, compartilhamento online, mas conexões off-line, conexões reais, frente a frente, corpo a corpo, olho no olho. Assim, romper relações é sempre um evento muito traumático, você tem que encontrar desculpas, tem que se explicar, tem que mentir com frequência, e, mesmo assim, você não se sente seguro, porque seu parceiro diz que você não têm direitos, que você é sujo etc., é difícil. Na internet é tão fácil, você só pressiona "delete" e pronto, em vez de 500 amigos, você terá 499, mas isso será apenas temporário, porque amanhã você terá outros 500, e isso mina os laços humanos."

Não me delete, por favor.


“Estamos todos numa solidão e numa multidão ao mesmo tempo.”
Zygmunt Bauman



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O sociólogo polonês Zygmunt Bauman declara que vivemos em um tempo que escorre pelas mãos, um tempo líquido em que nada é para persistir. Não há nada tão intenso que consiga permanecer e se tornar verdadeiramente necessário. Tudo é transitório. Não há a observação pausada daquilo que experimentamos, é preciso fotografar, filmar, comentar, curtir, mostrar, comprar e comparar.
O desejo habita a ansiedade e se perde no consumismo imediato. A sociedade está marcada pela ansiedade, reina uma inabilidade de experimentar profundamente o que nos chega, o que importa é poder descrever aos demais o que se está fazendo.
Em tempos de Facebook e Twitter não há desagrados, se não gosto de uma declaração ou um pensamento, deleto, desconecto, bloqueio. Perde-se a profundidade das relações; perde-se a conversa que possibilita a harmonia e também o destoar. Nas relações virtuais não existem discussões que terminem em abraços vivos, as discussões são mudas, distantes. As relações começam ou terminam sem contato algum. Analisamos o outro por suas fotos e frases de efeito. Não existe a troca vivida.
Ao mesmo tempo em que experimentamos um isolamento protetor, vivenciamos uma absoluta exposição. Não há o privado, tudo é desvendado: o que se come, o que se compra; o que nos atormenta e o que nos alegra.
O amor é mais falado do que vivido. Vivemos um tempo de secreta angustia. Filosoficamente a angustia é o sentimento do nada. O corpo se inquieta e a alma sufoca. Há uma vertigem permeando as relações, tudo se torna vacilante, tudo pode ser deletado: o amor e os amigos.

A crítica de Zygmunt Bauman à pós-modernidade


Zygmunt Bauman é um dos sociólogos mais aclamados da atualidade. Suas críticas e seus livros rendem milhares de reflexões acerca da condição humana na pós-modernidade. Qual é o ponto essencial disso tudo? Há um ponto essencial? Por que Zygmunt Bauman é tão importante para nossa época?
01_bauman.jpg © Zygmunt Bauman, (Wikicommons).

A importância de Bauman vai além de suas aparições na mídia nos últimos anos. Zygmunt Bauman é autor de diversos livros que tentam interpretar o momento cultural e a estrutura social que vivemos atualmente. Declaradamente um crítico da pós-modernidade, os livros de Bauman ultrapassam as esperanças com o presente e fazem dele um campo de lutas mais invisíveis. Lutas e coerções que acabam parecendo liberdade, que parecem livre-escolha.

Bauman nasceu na Polônia em 1925 e foi professor na Universidade de Varsóvia. Antes disso, havia fugido do nazismo na Segunda Guerra Mundial, quando se mudou para a URSS. Quando voltou para seu país de origem, o autor foi perseguido pelo antissemitismo local, teve artigos censurados, foi expulso de seu cargo e encontrou um novo lar na Universidade de Leeds, na Inglaterra, onde comandou o departamento de sociologia da instituição.
A importância de Bauman está na interpretação da fluidez dos tempos pós-modernos. Bauman é duro neste aspecto, se declara um sociólogo crítico e recusa o rótulo de “pós-modernista”. Para ele, “pós-modernista” é aquele que reproduz a ideologia do pós-modernismo, que se recusa a qualquer tipo de debate, que relativiza a vida ao máximo e que, dentro dessa superrelativização, não consegue estabelecer críticas e nem formar regras para guiar a sociedade. Pós-modernista é aquele que foi construído dentro de uma condição pós-moderna, ele a reproduz e é constituído por ela. É seu arauto, seu representante inconsciente e é este posto que Bauman rejeita e nega fielmente.
02_bauman.jpg © Zygmunt Bauman, (Wikicommons).
A posição do autor é crítica às relações sociais atuais. Se trata de começar com uma categorização nova: modernidade líquida e modernidade sólida. Uma que representa o novo mundo, a pós-modernidade, e o outro que define a modernidade, a sociedade industrial, a sociedade da guerra-fria. Não é difícil de conseguir perceber a relação direta entre a “solidez” das relações da guerra-fria, com dois núcleos de produção dos julgamentos corretos (o capitalista, representado pelos EUA e o comunista, representado pela URSS), com duas opção distintas e antagônicas para serem “escolhidas”, ao contrário do pós-guerra fria, após a queda do Muro de Berlim e com a dissolução de qualquer centro de emissão moral, com a primazia do consumo em detrimento de qualquer ética da parcimônia e etc e etc.
A sociedade líquida é a sociedade das relações fluidas, das relações frágeis, é a sociedade em que a fixidez de uma amizade em que ambas as partes matariam e morreriam pela outra já não existe mais. Não se trata mais de uma sociedade em que os indivíduos sabem o seu destino desde o nascimento, agora estamos imersos em um espaço social onde ~teoricamente~ escolhemos nosso futuro, optamos pelo nosso destino, somos responsáveis pelo nosso fracasso. Não é mais necessário ser asiático para ser um legítimo budista, basta comprar os livros certos e assistir às aulas certas. Ninguém é, e sim está.
A primeiro momento pode-se pensar que a condição pós-moderna é uma condição de liberdade, mas é aí que podemos ver a camisa de força escondida.
O hedonismo pós-moderno, fantasiado de livre-escolha, de “se não gostar do programa, então desligue a televisão”, em que parecemos ser reis de tudo aquilo que chega até nós, é, primeiramente, uma condenação da sociedade. Construímos uma sociedade onde o mal-estar se agravou e se delineou em novas importantes categorias psiquiátricas, como a síndrome do pânico e a depressão.
É nesta sociedade onde as pessoas não conseguem desenvolver ferramentas de socialização eficientes o bastante para uma conversa em um bar. É aqui onde começar uma amizade virtual, até mesmo ter um “amor virtual”, se torna algo fácil e plausível. Nós não nos relacionamos, mas nos conectamos, não pela facilidade da conexão, mas pela facilidade da desconexão. Nos conectamos por que a relação não tem mais a mesma consistência, agora é frágil como uma conexão, e quando não temos qualidade, investimos na quantidade. Aqui o mito da sexualidade libertada é contestada pelo autor. Só há uma nova forma de aprisionamento, uma nova delimitação das relações amorosas, uma nova configuração das maneira de amar.
Sob um ponto de vista macro, Bauman revela que o capitalismo atual não tem mais um grande banco de trabalhadores reservas, mas tem dispositivos de armazenamento e de exclusão mais eficientes. As prisões, ao contrário daquilo que foi dito por Foucault, não é mais o lugar da disciplina, mas é o da vigilância e exclusão total. O preso é um sujeito vigiado e armazenado, mas não para ser disciplinado, ele não é mais útil e nem pode ser. É uma vida desperdiçada, é um lixo humano.
Mas não são somente nas prisões que nós encontramos aqueles que precisam ser eliminados: eles também estão nas favelas e nas ruas, são os desempregados crônicos, aqueles que foram expulsos da esfera do trabalho por estarem “desatualizados”, ou que não têm mais para onde ir, pois não podem mais seguir o fluxo de imigração para países que exploração de mão de obra estrangeira. São os mendigos, os loucos, os pobres, os drogados, aqueles que fogem do padrão da sexualidade, são todos os que estão fora da construção da ordem, são os que realizam o contrário, que desfazem a ordem, que dão indícios de que ela pode ser quebrada ou de que ela não é absoluta.
Mas há uma nova forma de exclusão, a forma que advém particularmente da globalização: a exclusão do não-consumidor. Aquele que não consome já não é parte do esforço de construção da ordem, já que a ordem tem lugar cativo para os grandes consumidores, para os gastadores compulsivos e para aqueles que querer “exercer sua liberdade” por meio do consumo de serviços e produtos que demonstrem suas escolhas em todas as esferas da vida. Os que não consomem não podem ficar no espaço social.
03_bauman.jpg © Zygmunt Bauman, (Wikicommons).
Um exemplo pode ser visto na própria arquitetura das cidades. Para Bauman, as cidades são projetadas para serem o antro da diversidade, mas, ao mesmo tempo, um dispositivo de exclusão eficiente: os ferros pontiagudos que são colocados em frente aos prédios de grandes corporações são um exemplo de tática de exclusão, evitando que mendigos fiquem nestes lugares.
O não-consumidor é o novo estranho, o ambivalente, aquele que não pode ser localizado em nosso mapa cognitivo, que, na verdade, atrapalha seu funcionamento, que mostra suas condições errantes, sua incapacidade de abarcar o todo. Esses estranhos são absorvidos e “domesticados”, ou completamente eliminados. O novo racismo não é o da caça e da morte do estranho, mas é o da separação e da “culturalização” da essência.
Agora não se trata de uma essência biológica, mas de uma essência cultural. Os novos racistas imputam uma cultura fixa a cada grupo específico e promovem a separação total destas, as hierarquizam de maneira que o branco “tem a cultura superior”. Bauman diz que a tática de absorver e domesticar não é menos autoritária que a prática dos regimes totalitários de morte e exclusão. Para ele, a destruição daquilo que é a identidade do sujeito é um movimento autoritário e forçoso de eliminação do sujeito. Como não se pode mais matar, então é necessário ter ambientes certos para a absorvê-lo e reeducá-lo, como a escola, a igreja, ou as prisões e as favelas. É necessário normatizar o estranho.
04_bauman.jpg Zygmunt Bauman, "Vidas Desperdiçadas".
05_bauman.jpg Zygmunt Bauman, "Modernidade Líquida".
Em nossa época, o medo se espalha como uma malha infinita. Os meios de comunicação tem um papel privilegiado, pois transmitem os objetos do medo de forma mais rápida e brusca que o próprio objeto poderia se transmitir, vide a Al-Qaeda após o 11 de setembro. É na televisão onde os programas telejornalísticos banalizam os medos e, ao mesmo tempo, fazem vibrar o alarme da “violência local” e da “violência global”.
O controle dos medos também é um assunto em pauta. Bauman diz que uma das formas de exercer o poder eficientemente é controlando as incertezas. O grupo que controla as incertezas, que detém o controle da decisão e que, por sua vez, prevê todos os movimento sem ser previsto por nenhum outro grupo, este grupo consegue, também, decidir em quais momentos a sociedade deve ter medo (como nos Estados de Sítio eternos) e quando deve ficar calma e pacífica, como nas tentativas neoliberais de acalmar a tensão entre os miseráveis garantindo que poderão ascender na hierarquia social, desde que trabalhem o bastante para isso. Basicamente, Bauman diz que a sociedade atual não garante a manutenção do sujeito em sua posição social, não garante seu sustento e também não garante sua integridade física. Vivemos em uma sociedade onde ontem estávamos no topo na hierarquia, mas hoje estamos de volta à base; onde ontem tínhamos empregos, mas hoje podemos não ter mais (e é normal não ficarmos no mesmo); e onde as tecnologias de proteção individual e vigilância aumentam em disparada.
A importância de Bauman e de outros intelectuais que renovaram a crítica à contemporaneidade é de poder entender de maneira nova e atualizada a dinâmica da sociedade atual. Bauman trata de temas mais ou menos globais e coletivos, que se expressam também na vida individual. Não se trata só de falar sobre as “relações frágeis”, mas de entender que elas não assim “do nada”, de repente, mas que são fruto de uma época, de um dado momento histórico.
Ninguém está fora desta fragilidade. Não é uma questão de escolha ou de autopoliciamento. Bauman diz isso bem ao fazer a distinção entre segurança e proteção. Para Bauman, segurança é aquilo que constitui o sujeito, a segurança (e a insegurança) são inscritas no sujeito em toda sua socialização. É algo que forma o sujeito. Isso significa que a segurança tem a ver com algo que nós não escolhemos, mas que é a base para nós escolhermos outras coisas. Somos inseguros quando checamos o celular de nossos parceiros para saber se estão nos traindo. Já a proteção tem a ver com aquilo que você compra ou acumula para guardar a integridade física. Proteção são câmaras, coletes à prova de balas, bunkers e etc e etc.
O autor deixa claro que não se resolve problemas globais com soluções locais. Isso também pode ser entendido como um aviso de que não resolve a insegurança individualmente, mas sim, coletivamente e globalmente. A futilidade, o consumismo e a incerteza são constitutivos e devem ser combatidos sabendo que eles fazem parte de nós, não tentando nos afastar deles, em busca de uma salvação individual.



Fonte:
© obvious: http://obviousmag.org/archives/2014/03/o_filosofo_zygmunt_bauman.html#ixzz3GikbMBOY


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