O ALMOCAFRE E O COMBATE À CORRUPÇÃO - ROBERT THOMAZ

 
 
Definitivamente não existe país com corrupção zero. Países com menos corrupção denotam nações comprometidas com o desenvolvimento e com a justiça. Uma das justificativas é que sua população é mais esclarecida e conhece seus direitos e deveres, sendo mais difícil enganá-la. São nações que há muito empregam o almocafre...?


O almocafre

Durante as férias escolares de julho de minhas filhas fomos passear na bela cidade de Tiradentes, em Minas Gerais. Em visita a um museu deparei-me com o termo que intitula o post.
Almocafre era o termo usado para designar enxada, que era uma das ferramentas básicas utilizadas na mineração do período colonial no Brasil. Sua lâmina era achatada e curva, com a largura diminuindo da base (arredondada) em direção à extremidade pontiaguda. Este formato peculiar permitia que o sedimento, encontrado nos blocos de pedra, fosse facilmente retirado. Anteriormente ele não me era conhecido em minhas andanças literárias, mas na busca de seu significado, veio se adequar a pauta.


Entristece-nos ouvir nos noticiários e, pior ainda, ler nos jornais, revistas e publicações correlatas, os inúmeros atos e fatos que envolvem a corrupção que grassa em nosso país. O termo corrupção, dentre algumas acepções, significa tornar podre, subverter, subornar. É esse mal que torna a nossa vida mais difícil e que muitos desconhecem sua amplitude e maleficência. Sua ação vigorosa desenvolve seus tentáculos pútridos cada vez mais por toda a nossa sociedade e pouco vemos a própria sociedade reagir a isso.
Ocorreram e estão ocorrendo protestos nas ruas de todo o país por conta da corrupção e outros males que assolam a população, entretanto, em termos globais podemos afirmar, sem medo de errar, que o povo brasileiro “engatinha” em termos de se impor politicamente aos desmandos do poder público.


Aceitar e/ou solicitar recursos financeiros para obter um determinado serviço público, como a retirada de multas, é corrupção. Em licitações favorecer determinada empresa, é corrupção. Desviar verbas públicas para os responsáveis pela obra ou para terceiros, é corrupção. Desviar até mesmo dinheiro de um condomínio é corrupção. Sem dificuldade verificamos que esse mal está presente nas três esferas do poder (legislativo, judiciário e executivo). E o seu braço armado, se assim podemos chamar, é o tráfico de influências que vemos vagar, disfarçadamente, pelos corredores do Congresso Nacional e por inúmeros setores da vida pública e privada. Em miúdos, o tráfico de influências nada mais é que um jogo pernicioso e covarde que os corruptos articulam para obter qualquer tipo de vantagem em transações e negócios ilícitos. Que revolta em pensar que algumas vezes fui coagido à corrupção em blitz promovida pela polícia – que deveria dar o exemplo e não são todas – cedendo ao famoso: “para liberar, chefia, é só um troquinho... o senhor entende, são custos operacionais...”. E nem sempre a moeda de troca no fluxo da corrupção é o dinheiro. É muito comum vermos funcionários públicos ou privados cederem à tentação e pedirem presentes e mordomias a seus corruptores, ou ainda, emprego para parentes e amigos, além de outros favorecimentos ilícitos e imorais.

Não precisamos de lente de aumento para perceber que a sociedade permitindo que esse mal se alastre contribui para o aumento de sua camada pobre. A classe pobre depende puramente dos serviços públicos e estes, quando corroídos pela ação de corruptores, não atendem a todas suas necessidades sociais, criando toda ordem de insatisfação e declínio social. É triste, mas no momento que os recursos públicos arrecadados devem ser aplicados, eles são desviados para as mãos dos corruptores e uma parcela muito reduzida é reaplicada na melhoria social. É inegável que o exemplo deveria vir de cima, ou seja, deveria partir da cúpula governamental. Contudo, isso não acontece. Quando um governo não tem transparência em sua administração, em suas ações públicas, ele demonstra que permite e incentiva a prática da corrupção em sua gestão. Definitivamente não existe país com corrupção zero. Países com menos corrupção denotam nações comprometidas com o desenvolvimento e com a justiça. Uma das justificativas é que sua população é mais esclarecida e conhece seus direitos e deveres, sendo mais difícil enganá-la. São nações que há muito empregam o almocafre da probidade, saneando as camadas, todas, de sua sociedade.
A corrupção no Brasil é tão grave que os brasileiros se sentem cercados por autoridades capazes de cometer todo tipo de delito em troca de uma boa propina. E num país com tanta corrupção não nos resta alternativa que seja a de separar o joio do trigo. Devemos mudar, não ceder à tentação exercida pela corrupção e suas influências. Não aceitar a ação coatora do corrupto. Não facilitar sua vida e ascensão. Não permitir que nossos filhos sejam disciplinados pela cultura perniciosa desse mal. É necessário que tenhamos um país melhor, mais íntegro. E o Brasil somente será melhor se aqui usarmos o almocafre da integridade, o almocafre da boa conduta, o almocafre da dignidade, escavando o bloco da corrupção o mais profundo possível, para extirparmos senão o todo, mas a maior parte desse mal que se infiltra na carne de nossa sociedade.       
 
Robert Thomaz

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