SÂNSCRITO - A LÍNGUA SAGRADA








A língua sânscrita, ou simplesmente sânscrito, (संस्कृतम् [sə̃skɹ̩t̪əm]; transcrito saṃskṛtam em IAST) é uma língua da Índia, com uso litúrgico no Hinduísmo, Budismo, e Jainismo. O sânscrito faz parte do conjunto das 23 línguas oficiais da Índia.
Com relação à sua origem, a língua sânscrita é uma das línguas indo-européias, pertencendo, portanto, ao mesmo tronco lingüístico de grande parte dos idiomas falados na Europa. Um dos sistemas de escrita tradicionais do sânscrito é o devanāgarī, uma escrita silábica cujo nome é um composto nominal formado pelas palavras deva ("deus", "sacerdote") e nāgarī ("urbana"), que significa "[escrita] urbana dos deuses". O sânscrito foi registrado ao longo de sua história em diversas escritas, visto que cada região da Índia possui uma escrita e uma tradição cultural particulares. A escrita devanágari (seu nome, em português, é acentuado como proparoxítona) acabou-se tornando a mais conhecida devido a ser a mais utilizada em edições impressas dos textos originais.
É uma das línguas mais antigas da família Indo-Européia. Sua posição nas culturas do sul e Sudeste Asiático é comparável ao latim e ao grego antigo na Europa, influenciando diversas línguas da região. Ela surge em uma variedade pré-clássica chamada de sânscrito védico, sendo o idioma do Rigveda e dos demais vedas, surgindo em torno de 1500 a.C.[1]; de fato, o sânscrito rigvédico é uma das mais antigas línguas indo-iranianas registradas[2]. O sânscrito é também o ancestral das línguas da Índia, como o Pali e a Ardhamgadhi. Pesquisadores descobriram e preservam mais documentos em sânscrito do que há nas literaturas em latim e grego antigo somadas.

História



Manuscrito Devimahatmya em folha de palmeira, na escrita Bhujimol, Bihar ou Nepal, século XI.

O nome do idioma saṃskṛtam é o particípio passado passivo neutro do verbo {IAST|sam√kṛ} 'compor, arranjar, preparar', ele mesmo composto do prefixo sam- 'com, junto de' e (s)kṛ- 'fazer, criar'. No uso moderno, esse adjetivo verbal passou a significar "culto", "refinado". A linguagem chamada de saṃskṛtā vāk "a língua refinada" tem sempre sido, por definição, um idioma elevado, usado para discurso religioso e instruído, e se opõe às linguagens faladas pelo povo, chamadas prácritas. Também é chamado de devabhāṣā, 'língua dos deuses'. A mais antiga gramática do sânscrito conhecida é a Aṣṭādhyāyī ("[gramática] de oito capítulos") de Pāṇini, aproximadamente do século V a.C.. É essencialmente uma gramática descritiva, isto é, uma autoridade que descreve (ao invés de prescrever) o sânscrito, já que contém a descrição dos usos lingüísticos de diferentes regiões da Índia, e as formas já em desuso, mas que ocorrem no sânscrito védico.
O sânscrito pertence à subfamília indo-iraniana da família indo-européia de línguas. Como tal, é parte do grupo Satem de línguas indo-européias, que também inclui o tronco balto-eslávico.
Quando o termo surgiu na Índia, "sânscrito" não era considerado uma linguagem específica separada das outras, mas uma maneira particularmente refinada ou aperfeiçoada de se falar. O conhecimento de sânscrito era uma marca de classe social e educação, e a linguagem era ensinada principalmente para membros de castas mais altas, através de análise profunda dos gramáticos sânscritos como Pāṇini.
O sânscrito, como a linguagem instruída da Índia antiga, assim existiu junto com os prácritos (vernáculos), que se tornariam, eventualmente, as indo-arianas modernas, tal como o hindi, o nepali, o assamês, o marata, o concani, o urdu, o bengali etc.
O sânscrito foi exposto à influência do substrato das línguas dravidianas desde tempos muito antigos[3].

Sânscrito védico


Manuscrito do Rigveda escrito no alfabeto devanagari.

Sânscrito, como definido por Pāṇini, evoluiu da forma mais antiga, a "védica". Estudiosos geralmente distinguem sânscrito védico e sânscrito clássico ou "paniniano" como dialetos separados, ainda que sejam muito similares. Considera-se que o sânscrito clássico tenha descendido do sânscrito védico. O sânscrito védico é a linguagem dos Vedas, uma extensa coleção de hinos, encantamentos e discussões religio-filosóficas que são os textos religiosos mais antigos da Índia e da religião hindu. Lingüistas modernos consideram os hinos do Rigveda saṃhitā os mais antigos, compostos por muitos autores ao longo dos séculos de tradição oral. O fim do período védico é marcado pela composição das Upanishads, que formam a parte final do corpus védico nas compilações tradicionais. A hipótese atual sustenta que a forma védica do sânscrito sobreviveu até a metade do primeiro milênio AC. Foi por volta dessa época que o sânscrito começou a transição de língua materna para segunda língua, usada para a religião e instrução, marcando o começo do período clássico[4].

Sânscrito clássico

Uma forma significante do sânscrito pós-védico é encontrada no sânscrito dos épicos hindus— o Ramayana e o Mahabárata. Os desvios da gramática de Pāṇini nos épicos são geralmente considerados como sendo causados pela interferência dos prácritos, ou por "inovações"[5], e não por serem pré-paninianos." Estudiosos tradicionais de sânscrito chamam tais desvios de ārṣa (आर्ष), ou "dos rishis", o título tradicional dos poetas antigos. Em alguns contextos havia ainda mais "pracritismos" (usos que vêm dos prácritos) que na forma própria do sânscrito clássico. Finalmente, há o "Sânscrito híbrido budista", que é, na verdade, um prácrito ornamentado com elementos sanscritizados. De acordo com Tiwari ([1995] 2004), houve quatro principais dialetos do sânscrito: o paścimottarī (do noroeste, também chamado de setentrional ou ocidental), o madhyadeśī (central, lit., "do meio do país"), o pūrvi (oriental) e o dakṣiṇī (meridional, surgido no período clássico). Os três primeiros são até mesmo registrados nos Brāhmaṇas védicos, de que o primeiro era considerado o mais puro (Kauṣītaki Brāhmaṇa, 7.6).

Estudo na Europa

O estudo de sânscrito na Europa, iniciado por Heinrich Roth (1620–1668) e Johann Ernst Hanxleden (1681–1731), é considerado responsável pela descoberta da família lingüística indo-européia por Sir William Jones, e teve um papel importante no desenvolvimento da lingüística ocidental.
Sir William Jones, falando com a Asiatic Society em Calcutá (atual Kolkata) em 2 de fevereiro, 1786, disse:
A linguagem Sânscrita, seja qual for sua idade, é de uma linda estrutura; mais perfeita que o Grego, mais copiosa que o Latim, e mais precisamente refinada que ambas, ainda compartilha com ambos uma forte afinidade, tanto nas raízes dos verbos quanto nas formas de gramática, que não pode ter sido criada por acidente; é, na verdade, tão forte, que nenhum filólogo poderia examinar as três sem acreditar que tenham nascido de uma fonte comum, que, talvez, nem exista mais.[6]

Sir William Jones

 

Sistemas de transliteração para línguas latinas

A prática de transcrever os caractéres sânscritos para a escrita em alfabeto latino chama-se transliteração. Há várias normas vigentes para a transliteração de outras escritas, como o devanāgarī, para o alfabeto latino.
A transliteração acadêmica, a mais usada na tradução dos textos clássicos para o ocidente, é a IAST (sigla em inglês para "International Alphabet of Sanskrit Transliteration", "alfabeto internacional de transliteração do sânscrito"), que usa diacríticos.
A transcrição ITRANS tem sido muito usada na internet, e é encontrada em vários sites produzidos na Índia, pelo fato de não usarem diacríticos - que não existem na ortografia do inglês, a língua usada em computação. Em lugar deles, dobra-se a letra ou usam-se maiúsculas para indicar a diferença de pronúncia. Isto é possível pelo fato de o devanāgarī não possuir letras maiúsculas.
A transcrição Harvard-Kyoto também é muito utilizada. Foi criada pela Universidade de Harvard e pela Universidade de Kyoto como sistema de transliteração em ASCII para o sânscrito e outras línguas que utilizam o devanāgarī. É utilizada predominantemente em e-mails e textos eletrônicos.

Gramática

Nas línguas vernáculas

A maior influência do sânscrito sentiu-se nas línguas que se desenvolveram a partir do seu vocabulário e base gramatical. O sânscrito é valorizado como repositório de escrituras e a língua das preces hindus, especialmente entre as elites indianas. Comparável ao que é o latim para as línguas europeias e o chinês clássico para as línguas da Ásia Oriental, a influência do sânscrito tem sido grande na maioria das línguas indianas.
Apesar de as preces nas línguas vernáculas serem comuns, os mantras em sânscrito são recitados por milhões de hindus e a maioria das atividades dos templos são conduzidas inteiramente em sânscrito, muitas vezes na forma védica. Nas línguas indianas modernas, enquanto que o hindi e o urdu tendem a ser mais fortemente influenciados pelo persa e pelo árabe, o bengali, o assamês, o concani e o marata mantêm um vocabulário com uma ampla base no sânscrito. O hino nacional, Jana Gana Mana, é escrito numa forma literária de bengali (conhecido como shuddha bhasha), sanscritizado de modo a ser reconhecível, mas ainda arcaico para o ouvido moderno.
A música nacional indiana Vande Mataram, que foi originalmente um poema composto por Bankim Chandra Chattopadhyay tirado do seu seu livro Anandamath, está igualmente numa forma altamente sanscritizada de bengali. O malaiala, o télugo e o canará também combinam uma grande quantidade de vocabulário baseado no sânscrito.

Tentativas de o reviver

O censo indiano de 1991 referiu 49.736 falantes fluentes de sânscrito. Desde os anos 90, os esforços para reviver o sânscrito falado têm aumentado. Muitas organizações como a Samskrta Bharati realizam conferências de sãnscrito falado para popularizar a língua. O Departamento Central de Educação Secundária na Índia tornou o sânscrito uma terceira língua (apesar de ser uma opção para a escola adoptá-la ou não, sendo a outra escolha a língua oficial do estado) nas escolas que coordena. Nestas escolas a aprendizagem do sânscrito é uma opção entre o 5º e o 8º anos. Isto é verdade para a maioria das escolas, incluindo mas não estando limitado às escolas missionárias cristãs, também afiliadas com o Departamento Central de Educação Secundária, especialmente nos estados onde a língua oficial é o hindi. O Sudharma, o único jornal diário em sânscrito têm sido publicado a aprtir de Mysore, na Índia, a partir do ano de 1970.
O sânscrito é além disso falado como língua materna pela população da aldeia de Mattur no Karnataka. As pessoas de todas as castas aprendem o sânscrito a partir da infância e conversam usando a língua.

Dicionários de sânscrito online


Sânscrito (संस्कृतम् saṃskṛtam)
Pronúncia:sə̃skɹ̩t̪əm
Falado em:Ásia
Região:Índia e algumas outras áreas da Ásia Meridional, partes do Sudeste da Ásia
Total de falantes:49 736 (1991)
Família:Indo-europeia
 Indo-ariana
  Sânscrito
Estatuto oficial
Língua oficial de:Índia (uma das línguas oficiais)
Códigos de língua
ISO 639-1:sa
ISO 639-2:san


Notas
  1. Macdonell (2004:?)
  2. Burrow (2001:?)
  3. Hamp, Eric P. (Oct-Dec, 1996). On the Indo-European origins of the retroflexes in Sanskrit. Journal of the American Oriental Society, The. Página visitada em 8 January 2009.
  4. DESHPANDE, Madhav (2007), Samskrita-Subodhini, Quarta Edição, pág. xiv. ISBN ISBN 0-89148-079-X
  5. Oberlies, "A Grammar of Epic Sanskrit", p.XXIX
  6. Traduzido do inglês: The Sanskrit language, whatever be its antiquity, is of a wonderful structure; more perfect than the Greek, more copious than the Latin, and more exquisitely refined than either, yet bearing to both of them a stronger affinity, both in the roots of verbs and in the forms of grammar, than could possibly have been produced by accident; so strong, indeed, that no philologer could examine them all three, without believing them to have sprung from some common source, which, perhaps, no longer exists.

Bibliografia

Introduções
Gramáticas
  • W. D. Whitney, Sanskrit Grammar: Including both the Classical Language and the Older Dialects
  • W. D. Whitney, The Roots, Verb-Forms and Primary Derivatives of the Sanskrit Language: (A Supplement to His Sanskrit Grammar)
  • Wackernagel, Debrunner, Altindische Grammatik, Göttingen.
    • vol. I. phonology [2] Jacob Wackernagel (1896)
    • vol. II.1. introduction to morphology, nominal composition, Wackernagel (1905) [3]
    • vol. II.2. nominal suffixes, J. Wackernagel and Albert Debrunner (1954)
    • vol. III. nominal inflection, numerals, pronouns, Wackernagel and Debrunner (1930)
  • B. Delbrück, Altindische Tempuslehre (1876) [4]
Dicionários
  • Otto Böhtlingk, Rudolph Roth, Petersburger Wörterbuch, 7 vols., 1855-75
  • Otto Böhtlingk, Sanskrit Wörterbuch in kürzerer Fassung 1883–86 (1998 reprint, Motilal Banarsidass, Delhi)
  • Monier Monier-Williams, Sanskrit-English Dictionary (1898, 1899)
  • Manfred Mayrhofer, Kurzgefasstes etymologisches Wörterbuch des Altindischen, 1956-76
  • Manfred Mayrhofer, Etymologisches Wörterbuch des Altindoarischen, 3 vols., 2742 pages, 2001, ISBN 3-8253-1477-4


Fonte:Wikipédia

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