O QUE É VIRTUDE ?



A virtude, no mais alto grau, é o conjunto de todas as qualidades essenciais que constituem o homem de bem. Ser bom, caritativo, laborioso, sóbrio, modesto, são qualidades do homem virtuoso. Infelizmente, quase sempre as acompanham pequenas enfermidades morais que as desornam1 e atenuam. Não é virtuoso aquele que faz ostentação da sua virtude, pois que lhe falta a qualidade principal: a modéstia, e tem o vício que mais se lhe opõe: o orgulho. A virtude, verdadeiramente digna desse nome, não gosta de se estadear.2 Adivinham-na; ela, porém, se oculta na obscuridade e foge à admiração das massas. S. Vicente de Paulo era virtuoso; eram virtuosos o digno cura d’Ars e muitos outros quase desconhecidos do mundo, mas conhecidos de Deus. Todos esses homens de bem ignoravam que fossem virtuosos; deixavam-se ir ao sabor de suas santas inspirações e praticavam o bem com desinteresse completo e inteiro esquecimento de si mesmos.
    
À virtude assim compreendida e praticada é que vos convido, meus filhos; a essa virtude verdadeiramente cristã e verdadeiramente espírita é que vos concito a consagrar-vos. Afastai, porém, de vossos corações tudo o que seja orgulho, vaidade, amor-próprio, que sempre desadornam3 as mais belas qualidades. Não imiteis o homem que se apresenta como modelo e trombeteia ele próprio suas qualidades a todos os ouvidos complacentes. A virtude que assim se ostenta esconde muitas vezes uma imensidade de pequenas torpezas e de odiosas covardias.

     Em princípio, o homem que se exalça,4 que ergue uma estátua à sua própria virtude, anula, por esse simples fato, todo mérito real que possa ter. Entretanto, que direi daquele cujo único valor consiste em parecer o que não é? Admito de boa mente que o homem que pratica o bem experimente uma satisfação íntima em seu coração; mas, desde que tal satisfação se exteriorize, para colher elogios, degenera em amor-próprio.

1 - desornam = tiram os ornatos ou enfeites, desenfeitam. 2 - estadear = ostentar, alardear. 3 - desadornam = tirar os adornos, desenfeitam. 4 - exalça = engrandece, vangloria
Virtude (latim: virtus; em grego: ρετή) é uma qualidade moral particular. Virtude é uma disposição estável em ordem a praticar o bem; revela mais do que uma simples característica ou uma aptidão para uma determinada ação boa: trata-se de uma verdadeira inclinação.
Virtudes são todos os hábitos constantes que levam o homem para o bem, quer como indivíduo, quer como espécie, quer pessoalmente, quer coletivamente.
A virtude, no mais alto grau, é o conjunto de todas as qualidades essenciais que constituem o homem de bem. Segundo Aristóteles, é uma disposição adquirida de fazer o bem,e elas se aperfeiçoam com o hábito.


A virtude na doutrina católica
Segundo a doutrina da Igreja Católica, e especialmente S. Gregório de Nissa, a virtude é "uma disposição habitual e firme para fazer o bem", sendo o fim de uma vida virtuosa tornar-se semelhante a Deus . Existem numerosas virtudes que se relacionam entre si tornando virtuosa a própria vida. No Catolicismo, existem 2 categorias de virtudes:
  • as virtudes teologais, cuja origem, motivo e objeto imediato são o próprio Deus. Os cristãos acreditam que elas são infundidas no homem com a graça santificante, e que elas tornam os homens capazes de viver em relação com a Santíssima Trindade. Elas fundamentam e animam o agir moral do cristão, vivificando as virtudes humanas. Para os cristãos, elas são o penhor da presença e da ação do Espírito Santo nas faculdades do ser humano . As virtudes teologais são três:
    • : através dela, os cristãos crêem em Deus, nas suas verdades reveladas e nos ensinamentos da Igreja, visto que Deus é a própria Verdade. Pela fé, "o homem entrega-se a Deus livremente. Por isso, o crente procura conhecer e fazer a vontade de Deus, porque «a fé opera pela caridade» (Gal 5,6)".
    • Esperança: por meio dela, os crentes, por ajuda da graça do Espírito Santo, esperam a vida eterna e o Reino de Deus, colocando a sua confiança perseverante nas promessas de Cristo.
    • Caridade (ou Amor): através dela, "como amamos a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos por amor de Deus. Jesus faz dela o mandamento novo, a plenitude da lei". Para os crentes, a caridade é «o vínculo da perfeição» (Col 3,14), logo a mais importante e o fundamento das virtudes . São Paulo disse que, de todas as virtudes, "o maior destas é o amor" (ou caridade) . O Amor é também visto como uma "dádiva de si mesmo" e "o oposto de usar" .
  • as virtudes humanas que são perfeições habituais e estáveis da inteligência e da vontade humanas. Elas regulam os atos humanos, ordenam as paixões humanas e guiam a conduta humana segundo a razão e a . Adquiridas e reforçadas por atos moralmente bons e repetidos, os cristãos acreditam que estas virtudes são purificadas e elevadas pela graça divina . Entre as virtudes humanas são constantemente destacadas as virtudes cardeais, que são consideradas as principais por serem os apoios à volta dos quais giram as demais virtudes humanas:
    • a prudência, que "dispõe a razão para discernir em todas as circunstâncias o verdadeiro bem e a escolher os justos meios para o atingir. Ela conduz a outras virtudes, indicando-lhes a regra e a medida", sendo por isso considerada a virtude-mãe humana.
    • a justiça, que é uma constante e firme vontade de dar aos outros o que lhes é devido;
    • a fortaleza que assegura a firmeza nas dificuldades e a constância na procura do bem;
    • e a temperança que "modera a atracção dos prazeres, assegura o domínio da vontade sobre os instintos e proporciona o equilíbrio no uso dos bens criados", sendo por isso descrita como sendo a prudência aplicada aos prazeres .
Para contrariar e opôr-se aos Sete pecados capitais, existe também um outro tipo de organização das virtudes, que é baseada nas chamadas Sete Virtudes: Castidade, Generosidade, Temperança, Diligência, Paciência, Caridade e Humildade.Paciencia,Humildade etc.

A virtude é um traço de caráter que é valorizado socialmente. Uma virtude moral é um traço que tem valor moral associado. A virtude, tem origem na Grécia com a palavra areté, que também pode ser  traduzida como excelência. Foi traduzida para o latim como virtus, que é a sua raíz em português. Vale salientar que nas culturas orientais a noção de virtude surgiu no séc. XX a.C. como a capacidade de realizar ou oferecer vida.
Virtude, segundo Aristóteles, é uma disposição adquirida de fazer o bem. Segundo Joaquim Clotet, é a forma de agir que enobrece a  pessoa, que a aperfeiçoa. O contrário é o vício, que degrada ou destrói a pessoa.
De acordo com Aristóteles, as virtudes se aperfeiçoam com o hábito (Ética a Nicômacos. Brasília: UnB, 1992).
Sócrates propunha que:
"Tudo é conhecimento, inclusive a justiça, a temperança e a coragem - o que tende a demonstrar que certamente é possível ensinar a virtude"
(citado por Shattuck R. Conhecimento Proibido. São Paulo: Companhia das Letras, 1998:20).
Voltaire, em uma carta a Frederico, o grande, em 1737, escreveu que:
"a virtude, o estudo e a alegria são três irmãos que não devem ser separados"
Vauvenargues, em suas Reflexões e Máximas, afirmou:
"A utilidade da virtude é tão evidente que os maus a praticam por interesse."
 .
      • polidez
      • fidelidade
      • prudência
      • temperança
      • coragem
      • justiça
      • generosidade
      • compaixão
      • misericórdia
      • gratidão
      • humildade
      • simplicidade
      • tolerância
      • pureza
      • doçura
      • boa-fé
      • humor
      • amor 
Resumo das Virtudes Morais (Pequeno Tratado das Grandes Virtudes, André-Comte Sponville)

1 - A polidez
Polidez e moral; o canalha polido; o que se faz e o que se deve fazer (Kant); tornar-se virtuoso: a polidez como aparên­cia de virtude, de que as virtudes provêm; alcance e limites da polidez; que a polidez não é uma virtude moral, mas uma qualidade; que ela, ainda assim, é necessária ao homem vir­tuoso.
2 - A fidelidade
O devir como esquecimento, o espírito como memória e co­mo fidelidade; a fidelidade, virtude da memória; que ela não vale em absoluto ou por si mesma, mas em função de seus objetos; o dever de fidelidade; fidelidade e pensamento; fide­lidade e moral; fidelidade e amor.
3 - A prudência
A prudência, virtude cardeal; sua crítica pelos modernos; a prudência (phronésis, prudentia) nos antigos; atualidade da prudência; a prudência e o tempo: que ela leva em conta o futuro, mas só existe no presente; prudência e moral.
4 - A temperança
O prazer; a temperança como arte de desfrutar e como liber­dade; a temperança em Epicuro e em Montaigne; que a temperança não se reduz à higiene; dificuldade da temperança; a temperança como poder, isto é, como virtude.
5 - A coragem
Que a coragem é admirada em toda parte, mas que isso não prova nada; a ambigüidade da coragem: ela também pode servir para o pior; qual coragem é moralmente estimável e por quê; a coragem como traço de caráter e como virtude; a coragem, condição de toda virtude; coragem e verdade: que a coragem não é um saber mas uma decisão, não uma opi­nião mas um ato; coragem e razão: a coragem intelectual; a coragem e o tempo: que a coragem não diz respeito apenas ao futuro; a coragem do desespero; a coragem e a esperança; coragem e comedimento; limites da coragem: que o destino é o mais forte.
6 - A justiça
Que a justiça é a única das quatro virtudes cardeais que tem valor absoluto; que ela não pode se reduzir à utilidade; a jus­tiça como igualdade e como legalidade (Aristóteles); a justiça como virtude: que ela não poderia se reduzir ao respeito da lei; o justo e a justiça; o princípio da justiça: a igualdade dos homens entre si; o critério da justiça: pôr-se no lugar do outro; a idéia de contrato social; a "posição original" de Rawls; a justiça e o eu; a justiça e o amor; justiça, natureza e sociedade; crítica de Hume: a justiça e a abundância, a justi­ça e a violência, a justiça e a fraqueza; justiça, doçura e com­paixão; a justiça, a força e as leis; a eqüidade; que o comba­te pela justiça não terá fim.
7 - A generosidade
A generosidade, virtude do dom; justiça, solidariedade e ge­nerosidade; o egoísmo: "que o coração do homem é oco e cheio de lixo" (Pascal); generosidade, magnanimidade e libe­ralidade;generosidade e liberdade: Descartes; a generosidade e o amor; generosidade e força de alma (Spinoza); a genero­sidade como desejo de amor: ser generoso é esforçar-se por amar e agir em conseqüência disso; moral da generosidade:
"Agir bem e manter-se em alegria" (Spinoza); a generosidade, sua origem e seus contrários; os diferentes nomes da genero­sidade.
8 - A compaixão
Que a compaixão não tem prestígio; simpatia e compaixão: a compaixão como simpatia na dor ou na tristeza; crítica da compaixão nos estóicos e em Spinoza; que a compaixão é melhor, no entanto, que seu contrário; commiseratio e mise­ricórdia em Spinoza: mais vale um amor entristecido do que um ódio alegre; compaixão e caridade; a compaixão em Schopenhauer e em Rousseau; compaixão e crueldade (Han- nah Arendt); compaixão e piedade; a compaixão como senti­mento e como virtude; o amor e a compaixão: Cristo e Buda.
9 - A misericórdia
A misericórdia, virtude do perdão; que o perdão não é esquecimento; misericórdia e compaixão: que são duas virtudes diferentes mas solidárias; a misericórdia e o amor; a miseri­córdia, virtude intelectual; misericórdia e liberdade; as duas maneiras de perdoar: o perdão como graça ou como verda­de; a misericórdia como vitória sobre o ódio; podemos per­doar tudo?; misericórdia e combate; misericórdia para todos e para nós mesmos.
10 - A gratidão
Que a gratidão é a mais agradável das virtudes, mas não a mais fácil; gratidão, generosidade e amor; gratidão e humil­dade; o ser como graça; a gratidão, alegria da memória: é o amor do que foi (Epicuro); gratidão e trabalho do luto; a gra­tidão como virtude: que ela exclui a complacência e a cor­rupção; gratidão e caridade; a gratidão como felicidade de
11 - A humildade
A humildade, virtude humilde; a humildade em Spinoza; que a humildade não é a baixeza; o valor da humildade: sua crítica em Kant e Nietzsche; humildade e verdade; humilda- de e caridade; a humildade, virtude religiosa: que ela pode, no entanto, conduzir ao ateísmo.
12 - A simplicidade
Simplicidade do real: seu contrário não é o complexo mas o duplo ou o falso; a simplicidade como virtude; simplicidade e bom senso; que a simplicidade não é a sinceridade (Fénelon); simplicidade e generosidade: a generosidade é o contrário do egoísmo, a simplicidade o contrário do narcisis­mo ou da pretensão; que toda virtude, sem a simplicidade, não teria o essencial; a simplicidade e o tempo: que ela é virtude do presente; a simplicidade e o eu; simplicidade, sabedoria e santidade.
13 - A tolerância
Podemos tolerar tudo?; que o problema da tolerância só se coloca nas questões de opinião; que uma tolerância univer­sal seria moralmente condenável e politicamente condena­da; o "paradoxo da tolerância" (K. Popper); a "casuística da tolerância" (V. Jankélévitch); o intolerável; o totalitarismo; to­lerância e amor à verdade; tolerância e liberdade; o proble­ma do dogmatismoprático: o exemplo de João Paulo II; valor e verdade; tolerância, respeito e amor; que a tolerân­cia é uma pequena virtude, mas necessária.
14 - A pureza
A pureza como evidência e como mistério; as meninas; que toda existência é impura; o puro e o sagrado; do bom uso da purificação; pureza, sexualidade, amor; o "puro amor" (Fénelon);pureza e desinteresse; o "amor casto" segundo Simone Weil: que é um amor que não se dirige para o futu­ro; pureza e trabalho do luto; pureza e transgressão: Eros, Pbilia e Agapé; o amor sem cobiça; a beatitude e os "apeti­tes sensuais" (Spinoza).
15 - A doçura
A doçura, virtude feminina; doçura, generosidade e pureza; o problema da passividade; doçura e caridade; a doçura nos antigos; o problema da nâo-violência; temos o direito de matar?; doçura e guerra; doçura e humanidade.
16 - A boa-fé
Boa-fé e verdade; a boa-fé como sinceridade transitiva e reflexiva; que a boa-fé não prova nada, mas é necessária em toda virtude;deve-se dizer tudo?; a boa-fé em Montaigne; o verídico segundo Aristóteles; toda mentira é condenável?; o rigorismo de Spinoza e de Kant; mentir de boa-fé?; deve-se dizer a verdade ao moribundo?; boa-fé e compaixão; não mentir a si mesmo; a má-féem Sartre; o amor à verdade: a boa-fé e o espírito.
17 - O humor
Em que o humor é uma virtude; o humor e a seriedade; o riso de Demócrito segundo Montaigne; o humor e a ironia; o humor e a humildade; humor e sabedoria; que o humor tem algo de libertador e cie sublime (Freud); de novo sobre o humor e a ironia; o humor e o sentido; o humor, a ética e a religião (a propósito de Kierkegaard); o humor como desi­lusão alegre e como virtude.
18 - O amor
Que o amor não é um dever (Kant); amor, moral e polidez: que a moral é um simulacro de amor, assim como a polidez é um simulacro de moral; o amor ao amor; o alfa e ômega de nossas virtudes.
Eros
O amor segundo Platão: do sonho da fusão (o discurso de Aristófanes, no Banquete) à experiência cla falta (o discurso de Sócrates); amor e solidão; o amor ávido; a paixão: que ela só pode durar na infelicidade; parto e criação; amor e transcendência; que Eros é um deus ciumento; sofrimento da paixão, tédio dos casais; a paixão e a morte; o fracasso.

Philia
Crítica do platonismo: que o amor não se reduz à falta; o prazer e aação; o desejo como potência, o amor como ale­gria (Spinoza); outra definição do amor; amor e gratidão; a amizade segundo Aristóteles; que philia e erôs podem andar juntos; o marido e o príncipe encantado; os casais felizes; a paixão e a amizade; a família; amor de cobiça e amor de benevolência; a ascensão do amor e pelo amor; a mãe e o filho.

Agapé
Que nem erôs nem philia bastam; de novo sobre o amor e a moral; o amor dos pais; que o amor a si é primeiro; limi­tes da amizade; a caridade: "amar seus inimigos"; amor, cria­ção e descriação segundo Simone Weil: o amor como retira­da; que a caridade é o contrário da violência e da afirmação de si; a "agapé cristã" (A. Nygren e D. de Rougemont); erôs, philia e agapé; que resta da caridade se Deus não existe?; a philantropia entre os gregos, o amor em Spinoza, a descria­ção em Simone Weil; de um bom uso da pulsão de morte?; caridade, justiça e amor a si: a caridade como amor liberta­do do ego; a caridade como valor: o amor comanda, mesmo em sua ausência; as três virtudes teologais (a fé, a esperan­ça e a caridade): que apenas a caridade tem um sentido em Deus ou no ateísmo; que ela talvez só exista na medida em que nos falta.

As três maneiras de amar, ou as três gradações do amor: a falta, a alegria, a caridade; caridade, compaixão e amizade; as virtudes e o amor.

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