OS VEDAS - AS ESCRITURAS SAGRADAS DO HINDUISMO

 Brahma e

suas 5 cabeças


Os Vedas: um livro aberto



Entenda por que os Vedas, escrituras sagradas mais antigas da história, são ao mesmo tempo origem da unidade e da diversidade das múltiplas correntes do hinduísmo.

Há cerca de 3 500 anos, as comunidades na região do vale do Indo, atual norte da Índia, começaram a organizar um dos sistemas religiosos mais antigos de que temos notícia: o hinduísmo. Suas crenças foram transmitidas oralmente de geração em geração por muitos séculos até serem transcritas nos Vedas, compilação de hinos e preces considerada como o primeiro livro sagrado da história. O conteúdo dessa literatura sagrada, composta de 4 volumes de texto em versos, explica ao mesmo tempo a unidade e a variedade das múltiplas correntes do hinduísmo. Graças a alguns de seus ensinamentos mais importantes, esse conjunto de livros é sagrado para mais de 1 bilhão de pessoas que seguem seitas tão diferentes a ponto de serem monoteístas, politeístas ou panteístas – e ainda assim integrarem a mesma religião.
Os historiadores acreditam que a primeira versão dos Vedas em papel seja do século 2 a.C., quando o povo hindu desenvolveu um sistema de escrita. Segundo a lenda, eles teriam sido organizados por Vyasa, um sábio que seria a encarnação de Vishnu, deus que em todos os ciclos de criação e destruição do Universo elabora as escrituras em 4 livros, para garantir que os cânticos se propaguem e se eternizem. O mesmo Vyasa seria responsável por outros textos sagrados do hinduísmo, como o Mahabharata, ditado por ele a Ganesh, o deus com cabeça de elefante, que teria passado as palavras para o papel. Lendas à parte, os historiadores estimam que os 4 Vedas – RigVeda, Yajurveda, Samaveda e Atharvaveda – teriam sido compilados entre 1500 e 900 a.C. Mas, seja qual for sua origem, é nos textos védicos que estão os principais conceitos e símbolos do hinduísmo, os deuses, lendas e ensinamentos que dão forma e unidade à religião.
“A essência da tradição dos Vedas é o respeito aos ancestrais e a vinculação aos deuses”, afirma Carlos Eduardo Barbosa. “Essas condições pautaram e pautam todas as correntes do hinduísmo. Por isso, esses livros são aceitos como textos sagrados por todos os seguidores de todas as correntes”, afirma o cientista da religião Joachim Andrade, autor de uma tese de doutorado sobre a cultura hindu. Os Vedas foram cruciais no período inicial do hinduísmo, porque ajudaram a aglutinar várias crenças pré-históricas em um mesmo sistema religioso. Mais tarde, no século 9, a religião passou por um processo organizado de unificação, e os textos védicos foram igualmente importantes para garantir a reunião de várias crenças diferentes em um mesmo sistema religioso. Na época, por influência de um sacerdote hindu chamado Adi Shankara, várias correntes do hinduísmo que não acreditavam nos antigos textos sagrados reconduziram os 4 livros ao seu espaço privilegiado nos rituais. Até porque seu conteúdo era aberto o suficiente para cada grupo tirar dele sua própria interpretação e multiplicar ainda mais as correntes hinduístas.
A multiplicação de crenças
“Os Vedas são textos ritualísticos, e não uma enciclopédia de procedimentos religiosos”, diz Carlos Eduardo Barbosa, especialista em cultura hindu e professor do Instituto de Cultura Hindu Naradeva Shala, em São Paulo. Além disso, todos os textos incorporam um conceito filosófico que está na origem de todo o sistema de crenças hinduísta e permanece vivo na maioria das correntes existentes hoje em dia: o monismo. “Segundo essa filosofia, somos todos partes de uma coisa só, que é uma espécie de inteligência divina”, diz o historiador Edgard Ferreira Neto, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Esse princípio de tolerância a outros credos presente nos Vedas distingue a religião hindu de muitas outras, em que a fé alheia não é vista com bons olhos, e permite uma convivência pacífica entre as correntes que nascem de cada interpretação diferente que ele permite. Carlos Eduardo Barbosa, que já foi à Índia várias vezes, dá um exemplo da unidade que existe entre os hindus, apesar da diversidade de crenças. “Nas ruas, em todos os cantos, você encontra devotos do deus Ganesh, por exemplo, convivendo em harmonia com devotos de Shiva. Pessoas que cultuam divindades diferentes se respeitam mutuamente, pois todos se reconhecem como hindus autênticos, apesar das diferenças.”
E aqui vale dar uma idéia do que é a variedade de crenças do hinduísmo. Em relação aos cultos, existem 4 principais: vaishnavas, shaivas, shaktas e smartas. Entre outras particularidades, cada uma concentra seus rituais de devoção em deuses específicos – no shaivismo, por exemplo, a divindade mais respeitada é Shiva. Outro tipo de classificação leva em conta a filosofia de vida e a interpretação dos textos sagrados. Nesse campo há pelo menos 6 escolas principais: sankhya, yoga, nyaya, vaisheshika, purva mimamsa e vedanta – todas têm, igualmente, suas respectivas subdivisões. “Trata-se de uma religião que incorpora a sabedoria de vários mestres, e que, por isso, abre espaço para inúmeras interpretações”, afirma Joachim Andrade.
A variedade é tão grande que seguidores de crenças monoteístas, politeístas ou panteístas – que acreditam em um deus universal, em vários ou na presença deles em todas as coisas – tomam banho juntos no mesmo rio Ganges, todos debaixo do grande guarda-chuva hinduísta. Os shaivistas adoram Shiva, mas reconhecem a existência de outros deuses, logo, são politeístas. Os vaishnavas gaudias são devotos exclusivos de Krishna, e são considerados monoteístas. Já os vedantas acreditam que todo o Universo e a realidade são expressões de Brahma, princípio infinito, sem passado nem futuro, e se encaixam na categoria dos panteístas. Apesar das diferenças fundamentais, essas correntes têm pelo menos uma coisa em comum: “Todas as correntes aceitam os Vedas como escrituras sagradas”, diz Carlos Eduardo Barbosa.
Para muitos, a descentralização da doutrina é a grande responsável pela sua riqueza. Mas diante de tanta diversidade é natural que surjam correntes que se distanciam e, em alguns casos, acabam se transformando em religiões independentes. É o caso do budismo e do jainismo, que surgiram do seio do hinduísmo antigo e reúnem seguidores até hoje. O budismo surgiu por volta do século 6 a.C., por causa do descontentamento de alguns sábios e sacerdotes com os rituais e sacrifícios difundidos nos Vedas, entre outras características dos textos hindus. O jainismo, que se organizou a partir do século 7 a.C., tem como base doutrinária o princípio da não-violência contra todos os seres vivos como forma de alcançar a elevação espiritual. Outra corrente que ganhou contornos de religião independente foi o sikhismo, que surgiu no século 15 e defende a impossibilidade de encarnação e representação de Deus, entre outros princípios. De uma forma ou de outra, todas beberam da mesma fonte ancestral, antes de assumirem sua própria identidade. Seguindo seus caminhos como religiões independentes, elas também preservaram o ideal de tolerância cultivado nas civilizações do vale do Indo. Numa região em que tantas religiões nasceram, isso provavelmente foi uma condição fundamental para sua existência.

Divinas tetas

Na história do culto ao gado, bois podiam ser sacrificados. Vacas leiteiras, não
No ocidente, o culto às vacas é tido como um dos principais símbolos do hinduísmo. E, de fato, o animal tem um status diferenciado na maioria das correntes da religião hindu. A origem dessa adoração remonta ao período em que os Vedas foram compostos, a partir de 1.500 a.C. “Uma das explicações é o fato de os habitantes da antiga Índia serem pastores nômades, que dependiam do gado para a sobrevivência e, portanto, precisavam proteger seus rebanhos”, diz o especialista Carlos Eduardo Barbosa. Ainda assim, no entanto, os animais eram sacrificados em rituais – mas as vacas leiteiras eram poupadas. Esse salvo-conduto das fêmeas é citado em algumas passagens do próprio Rigveda, do Mahabharata e de um importante código de conduta dos hindus, o Manu-smirti (também conhecido como As Leis de Manu), escrito a partir de 200 a.C.. Com o tempo, as vacas foram ganhando importância e, cada vez mais, passaram a ser associadas às principais divindades do hinduísmo. Hoje, em algumas seitas, a agressão contra o animal equivale a um atentado contra um sacerdote.

Fonte:Texto André Santoro e André Victor Sartorelli-http://super.abril.com.br/religiao/vedas-livro-aberto

Algumas reflexões sobre os Vedas

Do irreal conduz-me ao Real.Das trevas conduz-me à Luz.Da morte conduz-me à Imortalidade.
Este Mantra é a chave que nos abre a porta para começar um estudo sério sobre os Vedas.
Estaremos já prontos para isso?
Em sua busca pela verdade, todo estudante da Sabedoria Divina sente, em um determinado momento de sua vida, um chamado para estudar os Vedas. O caminho a seguir é absolutamente individual, e durante o percurso haverá momentos de exaltação espiritual, até que o Sadhaka (aspirante) se torne totalmente uno com o objeto do seu estudo.
Os Vedas são considerados, por todos os eruditos Orientais e Ocidentais, como a mais antiga de todas as escrituras do mundo e a mais sagrada das obras sânscritas conhecidas.
Foram escritos em um sânscrito tão antigo, tão diferente do idioma atual, que não existe outra obra semelhante na literatura de esse "irmão mais velho de todos os idiomas conhecidos", segundo o professor Max Mulher. Somente os Pandits Brahmanes mais instruídos podem ler a obra em sua forma original.
Diz-se que os Vedas foram ensinados primeiro em sua forma oral, durante muitos milhões de anos e que somente mais tarde foram compilados às margens do lago Manasa-Sarovara, situado para além do Himalaia (em sânscrito "hyma alaya" - morada das neves), no Tibet.
É sumamente importante citar aqui o testemunho de Swani Vivekananda a respeito do assunto:
"Os Vedas não devem sua autoridade a ninguém; constituem uma autoridade em si mesmo, com o conhecimento eterno de Deus. Nunca foram escritos, nunca foram criados, porque existiram através do tempo; como a criação, e são infinitos e eternos, sem começo e sem fim. A estes conhecimentos deu-se o nome de Vedas."
Com essas considerações preliminares, já temos material suficiente para começar nossas reflexões sobre este tema tão inspirado.
O termo Vedas provém do sânscrito, cuja raiz "vid" significa "conhecer a Sabedoria Divina", por isto os Vedas são traduzidos como Sabedoria Divina ou Suprema.
Os Vedas são, atualmente, em número de quatro, denominados da seguinte forma: 1o Rig Veda; 2o Yajur Veda; 3o Sãma Veda; e 4o  Atharva Veda.
O Manu e mesmo outros legisladores hindus falam apenas dos três primeiros. Eram eles os que existiam na época da composição do Bhagavad-Gita. O quarto, Atharva Veda é, relativamente, mais moderno.
Cada Veda possui três divisões principais, a saber: a) Sanhitas; b) Brahmanas, e c) Aranyakas.
Para tornar possível uma compreensão mais ampla do que cada uma dessas divisões trata, apresentamos a seguir uma síntese dos seus conteúdos:
Sanhitas - Coleções de hinos, fórmulas e ladainhas.
Brahmanas - Contém textos em prosa sobre matéria teológica ou doutrinária; descrições dos rituais de sacrifícios e suas aplicações.
Aranyakas - Ensinamentos dirigidos àqueles que adotam uma vida de reclusão, para consagrar-se à meditação.
Upanishads - É a porção filosófica dos Vedas; em sua maioria estão constituídos dos diferentes capítulos dos Aranyakas.
Todos os Vedas estão classificados em duas grandes divisões: exotérica e esotérica, sendo a primeira chamada de Karma-Kanda, divisão de seções e obras que tratam da realização dos rituais; a segunda é chamada de Jnana-Kanda, divisão do conhecimento Divino ou espiritual. Os Upanishads estão compreendidos nesta última classificação e concordam com o exposto anteriormente. Ambas das seções são consideradas Sruti ou tradição sagrada, recebida por revelação.
Os Upanishads, também chamados Vedanta (final dos Vedas), tal como os encontramos hoje em dia, são em número de 223 e eles não são apenas um reservatório da filosofia mais antiga da Índia, mas também representam toda a sabedoria acumulados por santos, sábios e videntes do passado.
Além disso, constituem um registro gráfico de inúmeras formas de meditação (Upasanas: práticas, exercícios) sobre o Homem, Deus e o Universo.
Foi Sri Shankaracharya quem escreveu os comentários dos principais Upanishads, Os nomes de:
  • Indra (o Deus do firmamento, Rei dos deuses siderais e representação de fortaleza);
  • Varuna (Deus da água e Deus marinho, que preside a noite);
  • Agni (Deus do fogo);
  • Vãyu (Deus soberano do ar e da tormenta);
  • Soma (a Lua, símbolo da sabedoria secreta);
  • Adityas (um dos Deuses planetários e personificação do sol);
  • Mitra (um dos 12 Adityas, personificação do sol e regente do dia);
  • Aryaman (Chefe dos Pitris ou antepassados, um dos Adityas; deidade que preside o olho e o Sol);
  • Brihaspati (o Guru manifesto e sacerdote dos Deuses; nome de um Rishi)
  • e muitos outros Deuses mais foram usados em muitos trechos dos Vedas e são apenas nomes diferentes do ser Eterno Uno.
Um simples estudo superficial dos Vedas pode mostrar-nos a unidade subjacente a esta multiplicidade de nomes desses Deuses e o que representa cada um; mas quem puder ler nas entrelinhas dos textos védicos irá compreendê-los como atributos diferentes do mesmo Ser Supremo.
Talvez em nenhum outro lugar seja possível encontrar a idéia da unidade na multiplicidade com uma expressão mais eloqüente do que nas passagens dos diversos Vedas que foram aqui mencionados. Como exemplo, citamos o Rig Veda 1. 64.46, que diz: "A verdade é uma só, os sábios a designam por vários nomes".
Outras características das orações encontradas nos Vedas é a amplitude do seu chamado e a universalidade da sua expressão. Tais versos são preces não apenas para o bem de uma só pessoa ou da uma sociedade, da uma classe social ou da uma comunidade em particular, mas também estão dirigidas para a Humanidade como um todo e sem nenhuma distinção, ou seja, abrangem todo o universo dos seres conscientes.
A utilização dessas preces ou orações é como um procedimento definido para enviar correntes de pensamentos nobres e elevados para todos os planos de existência nos Universos, os quais incluem desde os Deuses e os homens, até as aves e bestas, ervas e árvores; essas preces se destacam pela amplidão da fraseologia e seu caráter onisciente.
Em sentido geral, pode-se afirmar que as orações ou preces constituem parte importante da vida espiritual de todo aspirante que deseja palmilhar o Caminho da Santidade. Elas não apenas aliviam os sofrimentos e mal estares da mente, mas também a tornam mais receptiva e sensível ao mesmo tempo.
Não é necessário colocar demasiada ênfase na questão da necessidade que todas as pessoas têm de fazer orações. Existem apenas duas classes de pessoas que não sentem essa necessidade: aquelas que conseguiram compreender a Deus e se tornaram unos com Ele, e aquelas que não se interessam por Deus para nada. Entre essas duas alas extremas da Humanidade, estamos nós. Cada um deve sentir a necessidade de incorporar a prece à sua vida diária.
Não queremos estender-nos demasiado, e finalizamos esta breve  reflexão com a citação de um dos Vedas, o RIg Veda Brihadaranyaka Upanishad - Cap. l 3. 28 (transliteração do sânscrito para o inglês e tradução para o português).
From untruth (1) ("O Lord"!) lead me to Truth (2) Do incerto (Oh! Senhor!) conduz-me à Verdade.
(1) o incerto - o inexistente, o irreal.
(2) A verdade - a existência eterna, o Real,

From darkness (of ignorance) lead me to Light (of Knowledge).
Das trevas (da ignorância) conduz-me à Luz (do conhecimento).

From death lead me to immortality.
Da morte conduz-me à imortalidade.

Assim, podemos traduzir estas orações, que constituem um poderoso Mantra, da forma como está grafado no inicio do livro Aos pés do Mestre, de J. Krishnamurti, Editora Teosófica, 2000.

Fonte:Alfredo Puig Figueroa , ex-presidente da Sociedade Teosófica no Brasil.

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