EINSTEIN ERA UM GÊNIO DEMASIADO HUMANO

Einstein era um gênio demasiado humano

Não bastasse ser o maior físico da história, Albert Einstein impressionava todos pelo bom humor, pelo engajamento político e pela incondicional defesa da paz

Durante quatro décadas, o patologista Thomas Harvey manteve, em um pote de vidro, um estranho objeto roubado. Isso lhe custou o emprego, o casamento e a estabilidade. Como um nômade, o ex-médico passou todo esse tempo cruzando os Estados Unidos sem se desfazer do “tesouro”. Apenas em 1997 abriu mão do conteúdo do recipiente. Naquele ano, decidiu que era hora de devolver à família de Albert Einstein algo que havia sido subtraído do gênio: o cérebro dele. Nesta última reportagem da série sobre Albert Einstein, o Estado de Minas relembra como foi sua morte e  alguns trechos importantes de sua trajetória.

Em 17 de abril de 1955, Einstein deu entrada no Hospital de Princeton, em Nova Jérsei, nos EUA, reclamando de dor no peito. Aos 76 anos, o coração do então professor do Instituto de Estudos Avançados da universidade local estava prestes a parar. O cientista trabalhava em um artigo sobre o aniversário do Estado de Israel, fundado sete anos antes, e levou para o hospital o rascunho do texto. Não houve tempo de concluí-lo. Na manhã seguinte, a veia aorta de Einstein rompeu-se, e ele morreu sem intervenções cirúrgicas desnecessárias, do jeito que planejou: “Quando for a hora de partir, farei isso com elegância”.

Harvey era o patologista de plantão e coube a ele autopsiar o corpo do cientista. Sem que ninguém ordenasse ou soubesse, retirou os olhos e o cérebro de Einstein. Os globos oculares foram enviados a um oftalmologista amigo do médico. Mas o órgão símbolo da genialidade ele guardou a sete chaves. Seu objetivo era estudá-lo para tentar descobrir de onde vinha tanta inteligência. Jamais teve a resposta. Einstein, certamente, não se resumia a um punhado de neurônios.

PENSADOR E BRINCALHÃO


A física tornou esse alemão, filho de um casal judeu, uma celebridade. Porém, os talentos de Einstein ultrapassavam o campo das ciências exatas. Ele era pacifista e pensador. Jamais se absteve dos problemas da humanidade para se fechar no mundo dos cálculos. Embora tenha se alçado a celebridade, como verdadeiro sábio que era, não tinha o menor apego por isso. Tanto que, para evitar idolatrias, queria ser cremado e, suas cinzas, espalhadas discretamente. A última coisa que gostaria é que seu cérebro virasse objeto de estudo. Nem tudo, porém, saiu como o físico desejava. Einstein é um ícone. Sua imagem aparece em camisetas, cadernos e outros bens de consumo, transformada na própria idealização de um cientista – um cientista maluco, no melhor sentido que a expressão possa ter. Uma das poses mais famosas da história da fotografia, inclusive, é estampada por Einstein, mas não lecionando ou fazendo cálculos. É a dele fazendo uma careta.

Einstein celebrava o 72º aniversário com amigos de Princeton e, ao voltar para casa, assim que entrou no carro de um amigo, foi abordado pelo fotógrafo Arthur Sasse da célebre agência de notícias UPI. Exausto de ter sorrido para tantas câmeras naquele dia, ao ser solicitado por Sasse, fez uma “pirraça” de brincadeira, colocando a língua para fora. No fim, gostou tanto do resultado que encomendou nove cópias do retrato para uso pessoal.

O trabalho, a história e a personalidade de Einstein o transformaram em mito. Como tal, ficou sujeito a idealizações e lendas que, de tão repetidas, viraram verdades absolutas. Uma delas refere-se ao desempenho escolar do físico. Muita gente jura de pé junto que ele era fraco na escola. Nada mais falso. O boletim de conclusão do ensino médio mostra que Eisntein fechou o ano de 1896 com nota máxima (6) em grego, álgebra, geometria e física. Só não se saiu tão bem em francês. Ainda assim obteve a média. Os bancos escolares, contudo, não eram o local predileto do físico, que passou a vida criticando a escola formal, que, na opinião dele, era uma limitadora da criatividade.

Einstein também não criou a bomba atômica. Pelo contrário. Em 1939, ao saber pelo físico húngaro Leo Szilard que a Alemanha poderia estar fabricando a arma em segredo, o físico alertou o então presidente dos EUA Franklin Roosevelt. Naquela época, Einstein, um inimigo do sistema nazista, já morava na América. “A possiblidade de uma reação em cadeia no urânio não havia ocorrido a ele, mas logo que comecei a falar sobre isso ele viu a consequência que poderia ter”, revelou Szilard mais tarde. Einstein imediatamente escreveu a Roosevelt.

“Alguns trabalhos recentes me levaram a acreditar que o elemento urânio possa ser transformado em uma nova e importante fonte de energia no futuro imediato”, alertou, na mensagem. “Certos aspectos da situação parecem rogar por atenção e, se necessário, ação rápida. Esse fenômeno poderia levar à produção de bombas, e é possível que um novo tipo de bombas extremamente poderosas possa estar em construção… Alguns trabalhos americanos sobre urânio estão sendo repetidos pelo Instituto Kaiser Wilhelm, em Berlim.” Roosevelt respondeu: “Achei essa informação tão importante que convoquei uma junta para investigar”.

ADMIRADOR DE GANDHI


Em abril de 1945, Szilard voltou a procurar Einstein, mas, desta vez, mostrava-se temeroso de que os EUA estivessem fabricando a bomba. O físico escreveu novamente a Roosevelt –, mas  não foi ouvido como queria. Mais tarde, horrorizado com o bombardeio de Hiroshima e Nagasaki, escreveu um pequeno texto.

“Minha participação na produção da bomba atômica consistiu em um único ato: assinei uma carta ao presidente Roosevelt. Essa carta destacava a necessidade de experimentos em larga escala para ter certeza da possibilidade de produção de uma bomba atômica”, diz o texto. “Estava consciente do perigo tenebroso para toda a humanidade caso os experimentos fossem bem-sucedidos. Mas a probabilidade de os alemães estarem trabalhando com chances de sucesso me levou a dar aquele passo. Não vi outro caminho, embora sempre tenha sido um pacifista convicto. Matar em tempos de guerra, me parece, não é melhor que o assassinato comum.” Einstein encerra citando Gandhi, a quem chamou de “o maior gênio político de nosso tempo”, destacando que o indiano travou uma batalha sem nunca pegar em armas.

Exatamente 10 anos depois – em abril de 1955 –, Albert Einstein estampava as manchetes dos principais jornais do mundo. “Dr. Einstein morre aos 76 anos”, anunciava o The New York Times. Naquela manhã, antes do rompimento da veia aorta, ele disse algumas palavras em alemão. Como a enfermeira que estava com ele não falava o idioma, ninguém jamais saberá o último aforismo do gênio. Seu cérebro voltou a Princeton. Diversos cientistas estudaram o órgão, sem nenhuma conclusão importante.


TRAJETÓRIA


» 1879
Nasce em 14 de março, em Ulm, Alemanha. Filho de judeus de classe média, só começa a falar aos 3 anos. Aos 12, se encanta com um livro de geometria

»1895
Descontente com a educação formal, tenta abandonar o ensino médio fazendo um teste para uma  universidade, mas foi reprovado em artes. Vai terminar os estudos em Aarau, na Suíça

» 1896
Entra para a Escola Politécnica Federal, em Zurique. Dois anos depois, apaixona-se pela sérvia Mileva Maric, colega de classe

» 1900
Gradua-se na Politécnica Federal

» 1901
Torna-se cidadão suíço. Encontra-se com Maric no Norte da Itália e ela engravida. No inverno, ele consegue um posto de tutor na Suíça. Maric vai para a casa dos pais esperar o fim da gravidez. Einstein muda-se para Bern

» 1902
Maric dá à luz Lieserl, que é colocada para adoção. Einstein consegue emprego no Escritório de Patentes da Suíça. O pai do cientista morre

» 1903
Casa-se com Maric em janeiro

» 1904
Nasce o filho Hans Albert

» 1905
Publica quatro dos cinco artigos que o farão famoso no meio acadêmico. É o annus mirabilis, ou ano miraculoso de Einstein

» 1907
Começa a aplicar as leis da gravidade à sua teoria da relatividade

» 1910
Nasce o filho Eduard

» 1911
Muda-se para Praga, onde leciona na Universidade Germânica. É o mais jovem cientista a participar da primeira conferência de física mundial, em Bruxelas

» 1912
Vai para Zurique, onde se torna professor na Politécnica Federal

» 1914
Torna-se diretor do Instituto Kaiser Wilhelm de Berlim e professor da Universidade de Berlim. Começa o processo de divórcio. Em agosto, estoura a Primeira Guerra Mundial

» 1915
Completa a teoria geral da relatividade

» 1917
Adoece com uma crise de exaustão. Publica o primeiro artigo sobre cosmologia

» 1919
Casa-se com Marries Löwenthal. Em 29 de maio, um eclipse solar comprova sua teoria geral

» 1922
Recebe o Nobel de Física

» 1927
Trabalha na fundação da mecânica quântica com Niels Bohr

» 1928
Desenvolve a ideia de uma teoria de campo unificada

» 1933
Muda-se para os Estados Unidos com Löwenthal

» 1936
Löwenthal morre

» 1939
Escreve carta ao presidente Franklin Roosevelt alertando sobre a possibilidade de a Alemanha construir uma bomba atômica

» 1940
Torna-se cidadão americano, sem abrir mão da cidadania suíça

» 1955
Seu cérebro é retirado e fotografado logo após a sua morte, em 18 de abril

Teoria da relatividade de Einstein foi da descrença ao triunfo

Ideias do físico alemão sobre a relatividade enfrentaram resistência de colegas até serem comprovadas em 1919, com observações do espaço feitas a partir do Brasil

O judeu Albert Einstein não era homem de um milagre só. Há quase 100 anos, uma década depois de publicar os artigos que serviram de base para a teoria geral da relatividade, ele apresentou, em uma série de conferências na Academia de Ciências da Prússia, o seu maior triunfo. O que o físico proferiu nas quatro apresentações, ocorridas nas terças-feiras de novembro de 1915, mudaria a ciência para sempre. Passado um século da exposição, ninguém jamais conseguiu contrariar nem sequer uma vírgula do trabalho de Einstein.

Além das turbulências familiares – ele estava separado da primeira mulher e afastado dos filhos –, o alemão sentia-se consumido pela própria ansiedade. Em uma carta ao amigo David Hilbert, matemático que também estava atrás da fórmula da gravidade, ele deixa transparecer o estado de empolgação e nervosismo. “Se minha modificação atual (que não muda as equações) estiver certa, então a gravitação deve desempenhar um papel fundamental na composição da matéria. Minha própria curiosidade está interferindo em meu trabalho!”, revelou, às vésperas de apresentar a segunda palestra da conferência. Até ali, todos os conceitos pareciam se encaixar perfeitamente. Mas faltavam as equações que colocariam a cereja no bolo.

A teoria geral da relatividade não se descortinou à frente de Einstein em um clássico momento de “eureca!”. Na verdade, esse era um problema que ele vinha tentando resolver havia anos. Se, em 1905, o físico matou a charada sobre o movimento a uma velocidade constante, faltava à teoria especial explicar o que ocorria a uma velocidade não linear. Em suas correspondências – boa parte delas digitalizada pela Universidade Hebraica e disponíveis no site http://www.alberteinstein.info –, Einstein revela que, em 1907, imaginou a cena de um corpo caindo de um telhado.

Se a luz viaja a uma velocidade constante, o mesmo não se pode dizer do desafortunado homem que despenca de forma acelerada. Mas, para complicar as coisas, o cientista pensou que, dependendo do referencial, o corpo em queda também pode estar em repouso. Para o resto do mundo, quem está se movendo em direção ao chão é a pessoa que escorregou do telhado. Só que, aos olhos da vítima, ela pode estar parada – e o resto do mundo é que está em queda livre. “Tudo é relativo” se transformou em postulado científico, frase de efeito e estampa de camisetas pop.

Conceitos Unidos


A teoria geral da relatividade atiçou ainda mais a fúria dos newtonianos contra Einstein. Eles estavam indignados com o alemão desde 1905, quando a série de artigos publicados na Annalen der Physik colocava em xeque a visão mecanicista do universo. Nada poderia viajar mais rápido que a luz, disse, contrariando a ideia de que a gravidade era uma força instantânea, como dizia Isaac Newton. Agora, ele defendia que essa misteriosa coisa que impede que se saia voando pelos ares e também atrai todos os corpos para o centro era a curva de um tecido que chamou espaço-tempo.

“Einstein constatou que gravitação e aceleração eram os dois nomes de uma mesma coisa. Ele pegou dois conceitos que todos sempre pensaram ser cenários naturais completamente diferentes e disse que eram equivalentes”, revela Larry Lagerstromd, físico e professor de história da ciência da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos. “Espaço e tempo, energia e massa, aceleração e gravitação, como diz Gerald Holton (professor de Harvard e um dos maiores experts mundiais em Einstein), ele sempre estava confrontando a questão: ‘Por que deveria haver dois fenômenos diferentes com duas teorias diferentes para explicá-los quando, para mim, parecem uma coisa só?’.”

Tudo fazia muito sentido para o gênio alemão, mas faltava algo fundamental, sem o qual suas ideias já controversas entre os pares jamais seriam validadas: a equação. Ao escrever para o amigo matemático, Einstein não poderia imaginar que, em resposta, receberia uma provocação. David Hilbert disse que estava muito perto de chegar a “uma solução para seu grande problema”. “Pelo que entendi de seu novo artigo, a solução que você tem é completamente diferente da minha”, arrematou.

Para a surpresa de Einstein, Hilbert realmente estava disposto a passar à sua frente. Antes da última conferência do físico alemão, o matemático enviou a uma revista científica sua versão das equações da teoria da relatividade. Chamou o artigo de nada menos que “As bases da física”. David Hilbert podia ser um excelente matemático. E, de fato, o era. Mas ele estava errado. Era Einstein quem havia chegado à fórmula correta. Agora não havia mais volta. O judeu de Berlim oficialmente tornava-se o maior físico da história.

“Em 25 de novembro de 1915, Einstein publicou as equações de campo da relatividade geral, as chamadas equações de Einstein. Esse evento marca um dos maiores feitos do cientista, mesmo em comparação aos seus três mais famosos artigos, do ano miraculoso de 1905”, observa Tilman Sauer, diretor do Instituto Teórico do Centro Albert Einstein de Bern, na Suíça. O físico também é idealizador do Projeto Artigos de Einstein, que digitaliza os trabalhos científicos do cientista. “A publicação também representa o fim de um longo e tortuoso caminho que iniciou pouco depois de ele, como um especialista em patentes desconhecido, apresentar a teoria da relatividade. No fim desse caminho ele tinha ascendido na hierarquia acadêmica, chegando a membro da Academia Prussiana de Ciências, em Berlim.”

Confirmação no Ceará


Faltava muito pouco para Albert Einstein ganhar fama não só entre os pares, mas se tornar uma figura pop no mundo todo. A oportunidade veio na forma de eclipse solar. Em 29 de maio de 1919, o dia virou noite na América do Sul e na África, durante seis minutos e 51 segundos. O evento foi observado por pesquisadores da Real Sociedade Astronômica, de Londres, que organizaram expedições para regiões geográficas do hemisfério sul que permitissem uma visualização perfeita do evento. Um desses lugares foi a Ilha do Príncipe, perto da Guiné Equatorial. O outro foi Sobral, no Ceará, então um vilarejo de 2 mil habitantes.

O posicionamento das estrelas não era o que se esperava para o céu daquele dia. Elas estavam um tanto deslocadas. E os valores dos desvios eram compatíveis com os resultados dos cálculos que os astrônomos fizeram, usando o princípio da teoria da relatividade. Quatro anos depois de Einstein apresentar na série de conferências de Berlim, fotografias do eclipse feitas no interior do Ceará comprovavam a distorção da curvatura espaço-tempo provocada pelo campo gravitacional do Sol. No dia seguinte, a manchete do jornal The New York Times decretava: “Todas as luzes entortaram no Céu. A teoria de Einstein triunfa”.


LÍNGUA AFIADA

Como se não bastasse ser um gênio, Albert Einstein tinha outra habilidade: fazer humor. Veja algumas das frases e passagens engraçadas da vida do físico:

» Eternidade
O escritor Walter Isaacson, autor do livro Einstein: sua vida, seu universo, conta que em uma recepção na Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos o físico ouviu uma série de discursos em sua honra proferidos por pessoas como o príncipe Albert I de Mônaco, que era oceonógrafo. O evento parecia não terminar nunca. Einstein, então, cochichou para um diplomata alemão que estava sentado ao seu lado: “Acabo de desenvolver a teoria da eternidade”.

» Poucas ideias
O físico também era modesto. O jornalista e escritor científico Bill Bryson revela em Uma breve história de quase tudo que, certa vez, o poeta francês Paul Valery perguntou a Einstein se o gênio andava com uma caderneta para anotar suas ideias. “Einstein olhou para ele com uma suave, porém genuína, surpresa. ‘Oh, isso não é necessário’, respondeu. ‘É tão raro eu ter uma ideia’.”

» Discreto
Einstein não gostava de publicidade. Certa vez, ele contou a um repórter da revista New Yorker que, quando abordado nas ruas, respondia: “Me desculpe, me perdoe! Sempre sou confundido com o professor Einstein!”. E saía em disparada.


Entenda como Einstein mudou o mundo

Um século atrás, cientista alemão concluía a teoria geral da relatividade, responsável por transformar a maneira como a física enxerga a realidade. A façanha consumiu anos de trabalho do gênio, que apresentou a base de suas ideias em 1905, com a publicação da fórmula e=mc²

Já se passou uma década desde o que ficou conhecido como annus mirabilis, o “ano do milagre”. Em 1905, um rapaz alemão de cabelos muito pretos e cacheados saiu da obscuridade para revolucionar a física, apresentando, em um artigo de apenas três páginas, o conjunto de letras e números mais famoso do mundo. Agora, em 1915, sua aparência está mais próxima da imagem icônica do cientista maluco. Ele ainda é jovem — 36 anos —, mas começa a ficar grisalho. A fórmula e=mc² está consagrada nos círculos acadêmicos e Albert Einstein é um respeitado professor universitário e diretor do Instituto Kaiser Wilhelm, em Berlim.

Seu casamento está destruído. De Zurique, onde a ex-mulher, Mileva Mari, se refugiou com os filhos, os pequenos Hans Albert, 11 anos, e Eduard, 5, enviam cartas suplicando por uma resposta que demora a chegar. Einstein desconfia que Mileva é quem dita as missivas. Além disso, ele está doente do estômago e ocupado demais, terminando um trabalho que vai mudar, para sempre, a compreensão que se tem do Universo.


A essa altura, Einstein é um cientista consagrado entre os pares, mas o grande público desconhece suas ideias. Ele só se tornará uma celebridade mundial em 1919, quando um eclipse solar comprovará a teoria geral da relatividade, concluída quatro anos antes. É sobre esse trabalho que o jovem alemão está debruçado no conturbado momento da separação. Há pelo menos três anos, Einstein persegue uma equação para exprimir um conceito de gravidade jamais postulado pela ciência: a força que rege o fenômeno de curvatura espaço-tempo. E o físico não é o único a buscar essa fórmula. Ele está em uma corrida contra David Hilbert, um matemático alemão que, após acompanhar as ideias de Einstein, resolveu, ele mesmo, solucionar o mistério gravitacional.


Enquanto os dois quebram a cabeça com cálculos improváveis para o resto da humanidade, é bom voltar no tempo e se acomodar em Berna, capital da Suíça, onde um Einstein de 26 anos trabalha no escritório de patentes, enquanto conclui seu doutorado em física. Depois de publicar a tese Uma nova determinação de dimensões moleculares — dedicada ao amigo e matemático suíço Marcel Grossmann —, Einstein enviou quatro manuscritos à revista científica Annalen der Physik (Anais de Física), sendo que três deles foram publicados ainda em 1905. Esse é um dos periódicos mais antigos de que se tem notícia, inaugurado em 1799 — e ainda em circulação, editado atualmente pela Wiley.
O fascículo 6 do volume 322 da Annalen der Physik traz o primeiro deles: Uma visão heurística a respeito da produção e da transformação da luz. No texto, Einstein propõe que a radiação eletromagnética consiste de fótons, uma partícula elementar. A teoria explicava o efeito fotoelétrico, descoberto por Henrich Hertz no século anterior, mas somente elucidado pelo físico alemão. Por trás desse fenômeno, estão, por exemplo, os sistemas automatizados de iluminação, as portas que abrem e fecham sozinhas e os alarmes que ligam e desligam sem precisar que alguém aperte um botão. De imediato, o texto não despertou comoção entre cientistas, que, na verdade, torceram o nariz para sua teoria. Mais tarde, ela forneceria a base da hoje tão badalada física quântica. Embora o prêmio Nobel, que ele recebeu em 1921, seja pelo conjunto da obra, esse trabalho, em particular, pesou na escolha do nome de Einstein.


Em seguida, ainda no mesmo volume da revista, foi publicado Sobre a eletrodinâmica dos corpos em movimento. Nesse artigo, Einstein delineia os princípios da relatividade especial, que versa sobre “objetos integrantes de diferentes sistemas coordenados movendo-se em velocidade constante relativa para cada um”. Em outras palavras, o clássico exemplo de uma pessoa dentro do trem, observada por outra, do lado de fora. Com o trabalho, o físico oferece uma nova interpretação sobre a concepção do espaço e do tempo. Pouco depois, também no volume 322, é publicado A inércia de um corpo depende de seu conteúdo energético?. Pela primeira vez, o mundo vê a fórmula e=mc².

Início

Einstein não foi um sucesso imediato. “Por oito anos, ele foi consumido pela tensão entre a gravidade newtoniana e a estrutura espaço-tempo da relatividade especial. No início, ninguém valorizou o seu trabalho. De fato, ‘um antigo amigo’, Max Planck (físico alemão, considerado o “pai da física quântica”), aconselhou-o a parar de perseguir essa ideia, ‘porque, em primeiro lugar, você não terá sucesso, e, mesmo se tiver, ninguém vai acreditar em você’”, relata o físico indiano Abhay Vasant Ashtekar, diretor do Instituto de Física Gravitacional e Geometria da Universidade de Pensilvânia e autor do livro Revisiting the foundations of relativistic physics (Revisitando as fundações da física relativística, sem tradução no Brasil). Felizmente, Einstein ignorou o conselho e revolucionou a ciência.

“O nome de Einstein, de fato, tornou-se sinônimo de ciência. Se você perguntar a uma criança como um cientista se parece, ela vai desenhar um ‘doido’ com cabelo branco e espetado”, observa Brian Schwartz, professor de física da Universidade de Nova York. “O ‘ano do milagre de Einstein’, de muitas formas, inaugurou a era moderna, com seus pontos de vista discordantes e chocantes para as verdades estabelecidas”, diz. “Em 1905, Sigmund Freud também publicou seu ensaio Chistes e suas relações com o inconsciente; Pablo Picasso mudou da fase azul para a rosa; James Joyce completou seu primeiro livro, Dublinenses. Ainda assim, ninguém repensou as verdades universais de forma tão profunda quanto Eisntein”, decreta o escritor científico Richard Panek, autor do livro The 4% Universe (O Universo 4%, sem tradução no Brasil).

Fonte:http://www.em.com.br/app/noticia/tecnologia/2015/01/14/interna_tecnologia,607768/um-genio-demasiado-humano.shtml

Comentários