Acredito que é cada vez mais explícito que as mudanças climáticas estão acontecendo. Em alguma medida, todos estamos ouvindo falar ou vivenciando desastres provocados por elas, de incêndios florestais e tempestades severas a ondas de calor intenso, inundações e uma série de fenômenos que não víamos até algum tempo atrás. Situações envolvendo Rio Grande do Sul, São Paulo, Amazonas, Pantanal, para ficarmos apenas no Brasil, têm sido manchetes constantes da nossa imprensa.
São mudanças que afetam a todos, mas ainda mais as crianças. Elas são especialmente vulneráveis aos danos ambientais, uma vez que ainda estão em crescimento e têm maior exposição ao ar, ao calor, aos alimentos e à água com base no peso e superfície corpórea.
Como as mudanças climáticas estão moldando a saúde das crianças e quais estratégias estão sendo desenvolvidas? Recentemente, a fundação que presido discutiu esse tema no 7º Congresso Sabará-PENSI de Saúde Infantil, com a presença dos professores Carlos Nobre, um dos principais climatologistas do país, e Marcelo de Paula Corrêa, especialista em medida cumulativa de influências ambientais e respostas biológicas associadas, ao longo da vida, da Universidade Federal de Itajubá.
Carlos Nobre nos alerta dos desafios que as futuras gerações enfrentarão devido às mudanças climáticas, destacando que uma criança nascida em 2020 deverá vivenciar cerca de 30 ondas de calor ao longo da vida, quantidade significativamente superior à das gerações passadas. Ressalta que a temperatura do ar nunca superou a temperatura do nosso corpo, e quando a temperatura do planeta fica muito quente, causa estresse. Não temos condições de nos adaptarmos se isso acontecer. O cientista nos provoca: o que vivemos não se deve chamar de “mudança climática”, mas de “emergência climática”, pois os efeitos estão acontecendo rápido demais.
Mas como mitigar um risco que tem se avizinhado de forma cada vez mais grave, em especial para os pequenos e as pequenas? A necessidade de adaptação e mitigação, por meio da proposta “Amazônia 4.0”, é a sugestão do estudioso. A proposta promove um modelo de bioeconomia sustentável para proteger a Amazônia e fomentar o desenvolvimento tecnológico. Temos que parar o desmatamento e o fogo, pois a degradação dessa floresta, e de todas as florestas tropicais, pode gerar uma ou duas pandemias por década no mundo. A Organização Mundial da Saúde prevê até 250 mil mortos por ano entre 2030 e 2050 devido aos impactos das mudanças climáticas.
Pensando na saúde, Nobre apontou que os desafios vão desde a implementação de um programa de monitoramento da qualidade do ar em áreas urbanas até a necessidade de iniciar uma discussão sobre a importância da inserção da “saúde em todas as políticas”. Cita, por exemplo, o desenvolvimento de um programa de vigilância dos efeitos das queimadas para crianças menores de 5 anos e idosos durante o período de queimadas na Amazônia Legal.
Para ele, o Brasil tem todas as condições de ser o primeiro país a zerar as emissões de carbono — o plano do governo federal é zerar o desmatamento em 2030, e aí precisaremos criar um projeto de restauração florestal. A restauração urbana melhorará muito a saúde, com fazendas sustentáveis e um agronegócio inteligente e rentável. O professor Marcelo de Paula Corrêa reforça essa percepção de que as mudanças climáticas e a poluição afetam a saúde, em especial dos pequenos — de modo que políticas públicas e ações preventivas nesse sentido são urgentes.
Chamo a atenção para o sentido de urgência presente na fala dos dois cientistas. Vivemos graves problemas de ordem climática, mas temos soluções para eles — desde que ajamos logo. Cabe a nós, sociedade civil e poder público, atuarmos de forma conjunta para mudar a atual situação e não ficar apenas no discurso. Nossos filhos e netos — e os filhos e netos deles, assim como o planeta Terra — agradecerão.
Fonte:https://oglobo.globo.com/blogs/receita-de-medico/post/2024/12/emergencia-climatica-e-a-saude-dos-filhos-dos-nossos-filhos.ghtml
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