PRESSÃO DE ISRAEL CONCENTRA PALESTINOS NO SUL DE GAZA, E POSSIBILDADE DE ÊXODO PARA SINAI PREOCUPA EGITO

 Palestinos abandonam Khan Younis e chegam a Rafah, na fronteira com o Egito

Pressão de Israel concentra palestinos no sul de Gaza, e possibilidade de êxodo para Sinai preocupa Egito

Cairo teme um fuga em massa após ordens de realocação para áreas cada vez mais próximas da fronteira egípcia, onde a situação é crítica

Por 

Marc Español

 Em El País — Cairo

12/12/2023 11h55  Atualizado há 3 meses

O deslocamento forçado de cada vez mais moradores de Gaza para o sul do território, na fronteira com o Egito, e o rápido agravamento da crise humanitária no enclave palestino vêm causando uma preocupação cada vez maior no governo egípcio. Há receios de que a expansão da ofensiva militar israelense, a política de cerco e as constantes ordens de realocação sejam prelúdio para a expulsão dos moradores para a Península do Sinai — ou que a situação piore a tal ponto que milhares de palestinos tentem desesperadamente cruzar a fronteira. As autoridades egípcias consideram essa uma linha vermelha que, se cruzada, poderia abalar as relações entre os dois países.


Desde o início da ofensiva militar de Israel em Gaza, em outubro, dois grandes fluxos de deslocamentos forçados ocorreram em direção ao sul. Inicialmente, as operações do Exército israelense se concentraram na metade norte do enclave, e autoridades ordenaram que os moradores se deslocassem para o sul. Mas após o término do cessar-fogo entre o Hamas e Israel em 1º de dezembro, a ofensiva terrestre israelense se estendeu para essa metade sul, forçando dezenas de milhares de pessoas, muitas das quais já haviam fugido nas primeiras semanas, a escaparem para regiões cada vez mais próximas do Egito.

Estima-se que 1,8 milhão de pessoas em Gaza, aproximadamente 85% da população de Gaza, estejam deslocadas internamente, o que representa o maior deslocamento de população palestina desde o êxodo maciço causado pelo estabelecimento do Estado de Israel em 1948, de acordo com a agência da ONU para os refugiados palestinos (UNRWA).

A atual ofensiva militar israelense devastou também o norte do enclave, enquanto a situação no sul está se deteriorando rapidamente. A chegada de milhares de deslocados nos últimos dias a cidades como Rafah, próxima ao Egito, vem criando condições de superlotação, de acordo com o escritório da ONU para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA). Isso gera escassez de alimentos e água.

O Ministério da Saúde palestino também alertou que o sistema de saúde no sul está em estado catastrófico, o que, somado ao quase total colapso do sistema de saneamento, pode resultar em breve em mais mortes por doenças do que por bombardeios segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). O secretário-geral da ONU, António Guterres, antecipou em uma carta ao Conselho de Segurança, no sábado, que "a ordem pública se desintegrará completamente em breve".

Proteger o solo egípcio

Preocupado com essa crescente pressão em sua fronteira com Gaza, o Egito comunicou tanto aos Estados Unidos quanto a Israel que está disposto a considerar uma ruptura em suas relações com o Estado judeu se a campanha militar no sul da Faixa de Gaza eventualmente levar os habitantes do enclave palestino a fugirem para o Sinai em busca de refúgio, conforme citado por quatro funcionários americanos e israelenses na quinta-feira pelo site de notícias Axios. O Egito foi o primeiro país árabe a assinar um tratado de paz com Israel em 1979.

O ministro da Defesa egípcio, Mohamed Zaki, uma figura influente e próxima ao presidente Abdel Fatah al-Sisi, afirmou em discurso que as Forças Armadas do país estão preparadas para preservar a segurança e a estabilidade nacionais diante de qualquer agressão no solo egípcio. Ele apontou que a situação é "muito delicada" e poderia causar uma escalada militar não calculada, impondo uma nova realidade no terreno. Diaa Rashwan, diretor do Serviço de Informações do Egito, também reiterou que o deslocamento forçado para o Sinai é uma linha vermelha.

O Egito, junto da Jordânia e da Autoridade Nacional Palestina (ANP), tem expressado preocupação desde o início da ofensiva israelense sobre a possibilidade de Israel expulsar os palestinos da Faixa. Cairo sempre rejeitou a realocação forçada para seu território, pois isso minaria o direito palestino de estabelecer um futuro Estado que inclua Gaza, além de temer que essa movimentação populacional transforme o Sinai em uma base de operações para os movimentos de resistência palestinos. Sisi sugeriu que Israel poderia temporariamente realocar os palestinos para o Deserto de Negev.

O colapso no sul está se acelerando devido à escassa ajuda humanitária que chega à Faixa de Gaza pelo posto fronteiriço de Rafah, ligado ao Egito, devido aos obstáculos e restrições impostos por Israel. Desde o fim do cessar-fogo, estão entrando cerca de 100 caminhões com suprimentos por dia, muito abaixo da média de 500 antes da ofensiva militar, de acordo com dados da Ocha. A quantidade de combustível permitida é mínima, apenas o suficiente para evitar o colapso dos serviços mais críticos. Nos últimos dias, os cortes nas telecomunicações e a intensidade dos ataques estão dificultando ainda mais a recepção de ajuda.

Tanto as Nações Unidas quanto o Egito pediram sem sucesso a Israel para permitir o envio de suprimentos por meio de suas fronteiras, e o promotor do Tribunal Penal Internacional (TPI), Karim Khan, alertou que impedir a entrega de ajuda pode constituir um crime internacional. Conforme o direito internacional humanitário, a evacuação de civis em um contexto de conflito deve ser acompanhada por todas as medidas para garantir condições satisfatórias de segurança, abrigo, nutrição e higiene, conforme indicado pela Ocha.


Fonte:https://oglobo.globo.com/mundo/noticia/2023/12/12/pressao-de-israel-para-concentrar-palestinos-ao-sul-da-faixa-de-gaza-preocupa-o-egito.ghtml

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