CONFLITO ENTRE HAMAS E ISRAEL PODE EXPANDIR PARA TODO O ORIENTE MÉDIO? SAIBA A CAPACIDADE MILTAR DE 4 ATORES-CHAVE DA GUERRA

 Tanques de Israel posicionados em Ashkelon, ao norte da Faixa de Gaza

Conflito entre Hamas e Israel pode expandir para todo o Oriente Médio? Saiba a capacidade militar de 4 atores-chave da guerra

Tácticas de guerrilha urbana do Hamas, vasto arsenal do Hezbollah e apoio paralelo do Irã desafiam superioridade militar de Israel

Por 

Andrea Rizzi

 e 

Yolanda Clemente

 El País, — Madri

21/10/2023 00h30  Atualizado 21/10/2023

A espiral bélica desencadeada pelo ataque bárbaro do Hamas contra Israel, no último dia 7, está até agora limitada a um conflito entre o Estado israelense e a Faixa de Gaza. Mas a natureza da disputa e a resposta do governo do premier israelense Benjamin Netanyahu, que provocou uma onda de indignação em relação a medidas como o corte do fornecimento de água, alimentos, medicamentos e eletricidade — incompatíveis com os princípios do direito humanitário internacional — alimentam um incêndio, com sério risco de extensão.

— A região está prestes a afundar no abismo — alertou o rei Abdullah da Jordânia na terça-feira, (17) antes da explosão que atingiu um hospital em Gaza, causando centenas de mortes e acirrando ainda mais os ânimos.


Forças militares da região — Foto: Editoria de Arte
Forças militares da região — Foto: Editoria de Arte

Os possíveis caminhos de expansão do conflito são claros. O principal deles é a entrada do Hezbollah, grupo extremista xiita libanês com muito mais poderio militar que o Hamas e com laços estreitos com o Irã. Outros pontos de risco são as milícias presentes na Síria e no Iraque, que incluem membros do próprio Hezbollah, da Guarda Revolucionária Iraniana ou outros grupos com tropas do Afeganistão ou do Paquistão.

Outras consequências são, obviamente, a eclosão de protestos violentos na Cisjordânia, com a possível desestabilização da Autoridade Nacional Palestina (ANP), além do risco de ações terroristas em todo o planeta. Quanto aos países do mundo árabe, que há muito caminham no sentido da normalização das relações com Israel, o risco não é militar, mas sim da raiva dos cidadãos que pode fazer parte do cálculo de outros atores envolvidos.

Abaixo, uma breve radiografia das capacidades militares de quatro atores-chave no conflito: os dois protagonistas — Hamas e Israel; o que representa o caminho mais provável de expansão, o Hezbollah; e de seu apoiador, o Irã, encorajado por um eixo de confronto cada vez mais explícito com o Ocidente, com a Rússia à frente e a China na retaguarda.

Israel

É a principal potência militar, com clara vantagem sobre os seus adversários em termos de capacidades. Seus gastos anuais com defesa são quase quatro vezes superiores aos do Irã e incomparáveis ​​com os recursos limitados à disposição do Hamas ou do Hezbollah.

Desde a sua fundação, Israel conta com o firme apoio dos Estados Unidos, com um ajuda militar de cerca de US$ 3,8 bilhões anuais (R$ 19 bi). O apoio de Washington tem derivados militares de grande importância: aviões de combate de alta qualidade como o F-35, ou o poderoso sistema de defesa antimíssil Domo de Ferro.

Uma história marcada por conflitos se reflete não só em Forças Armadas com uma enorme experiência de combate, mas também numa sociedade com um considerável grau de preparação para pegar em armas e uma enorme disponibilidade para preencher fileiras caso seja necessário.

Efetivos militares de Israel, Irã, Hamas e Hezbollah — Foto: Editoria de Arte
Efetivos militares de Israel, Irã, Hamas e Hezbollah — Foto: Editoria de Arte

É claro que o fundamento último da superioridade israelense são as armas nucleares. O Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo estima que Israel tenha cerca de 90 ogivas nucleares.

Tudo isto não significa que Israel não apresente limitações e não enfrente riscos muito graves. O ataque do Hamas, assim como o de Yom Kippur, há 50 anos, pegou o país completamente de surpresa, demonstrando falhas na capacidade de obter informação. A perspectiva de ter de gerir duas frentes ao mesmo tempo — a do Hamas, em Gaza e a do Hezbollah, no Líbano — também representa um grande desafio, ainda mais se for acompanhada por um surto de violência na Cisjordânia e por possíveis disputas da Síria.

É claro que o último grau da superioridade israelense são as armas nucleares. As autoridades israelitas não confirmam nem negam que esteja nos seus arsenais, mas os especialistas concordam que sim. O Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo estima que Israel tenha cerca de 90 ogivas nucleares.


Tudo isto não significa que Israel não apresente limitações e não enfrente riscos muito graves. O ataque do Hamas, tal como ocorreu com o ataque de Yom Kippur há 50 anos, pegou o país completamente de surpresa, demonstrando falhas na capacidade de obter informação. A perspectiva de ter de gerir duas frentes ao mesmo tempo – a do Hamas em Gaza e a do Hezbollah no Líbano – representa um grande desafio, ainda mais se for acompanhada por um surto de violência na Cisjordânia e por possíveis escaramuças de Síria.

Hamas

É um ator com capacidades limitadas. Mas, combinadas com a vontade de agir em violação das normas básicas do direito da guerra, são suficientes para infligir sérios danos a Israel em ações ofensivas e certamente também numa operação defensiva em caso de invasão.

O ataque do dia 7 também demonstrou sua capacidade de escapar à vigilância de Israel e de preparar meticulosamente uma ofensiva sem ser detectado ou rapidamente repelido. Na segunda-feira, os especialistas apontaram a considerável capacidade defensiva que o Hamas terá caso Israel decida invadir a Faixa.

As forças israelenses dispõem de tanques de guerra principais de boa qualidade — cerca de 400 Merkava IV, de produção nacional — mas o combate urbano oferece sempre vantagens à defesa, e ainda mais num território com uma densidade como a de Gaza, onde o Hamas vem se preparando ao longo do tempo, criando redes de túneis e outros cuidados logísticos. Possuindo armas antitanque e posicionamento adequado em pontos estratégicos, o seu potencial não deve ser subestimado.

Ameaça subterrânea: túneis do Hamas são preocupação de segurança para Israel — Foto: Arte/O Globo
Ameaça subterrânea: túneis do Hamas são preocupação de segurança para Israel — Foto: Arte/O Globo

Naturalmente, tudo o que diz respeito aos meios de comunicação do grupo terrorista está rodeado de mistério e não existem dados precisos. De acordo com estimativas do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos, publicadas em 2022, o Hamas tinha cerca de 15 mil a 20 mil soldados nas Brigadas al-Qasam. Antes da explosão, possuía um grande arsenal de foguetes de baixa qualidade. Agora é difícil quantificar quantos ainda restaram.

Outros grupos também operam na Faixa de Gaza, como a Jihad Islâmica, acusada por Israel de ter disparado o foguete que atingiu o hospital na terça-feira, enquanto as autoridades de Gaza acusam Israel. Em qualquer caso, mesmo a ajuda de grupos colaterais, a força militar do Hamas é pequena.

Hezbollah

A milícia xiita libanesa é por vezes definida como o irmão mais velho do Hamas, tem mais tropas, um melhor arsenal e grande profundidade estratégica graças ao corredor do Líbano, Síria, Iraque e Irã.

Comparativo dos gastos militares entre Israel e Irã — Foto: Editoria de Arte
Comparativo dos gastos militares entre Israel e Irã — Foto: Editoria de Arte

Seu principal trunfo reside no arsenal de mísseis. Tal como no caso do Hamas, não há transparência nem dados verificados. Segundo o centro de pesquisa israelense Alma, o grupo possui algumas centenas de mísseis de alta precisão, cerca de 5 mil mísseis com alcance superior a 200 quilômetros (sendo o Fateh-110, capaz de atingir cerca de 300 quilômetros), cerca de 65 mil foguetes com alcance de até 45 quilômetros e mísseis de menos de 200 quilômetros, e cerca de 2 mil drones. Uma radiografia do Centro de Estudos Estratégicos Internacionais também sublinha a relevância da Fateh-110.

Durante a guerra de 2006, que durou 34 dias, o Hezbollah disparou cerca de 4 mil foguetes contra Israel, de um arsenal de cerca de 15 mil, segundo estimativas israelenses. E está melhor preparado agora do que estava à época.

Em termos de tropas, a variação vai dos 25 mil combatentes estimados pela revista especializada Jane's, em 2017, aos 100 mil declarados pelo próprio chefe do Hezbollah, Hasan Nasrallah, em 2021, número considerado exagerado pelos especialistas.

Sem dúvida, a sua intensa participação na Guerra da Síria ao lado de Bashar al-Assad, causou enormes baixas nos últimos anos, mas fez com que o grupo extremista também desenvolvesse experiência de combate — o que é sempre um elemento valioso para qualquer força armada. A presença persistente na Síria de células do grupo é uma vantagem potencial.

Irã

Ele é o grande adversário de Israel nas sombras. Depois dos acordos de paz com o Egito, em 1979, e com a Jordânia, em 1994, e do processo de normalização das relações com os países árabes, Teerã é o país que mais representa um desafio ao Estado israelense. Embora um confronto direto seja muito menos provável do que o envolvimento do Hezbollah ou das milícias presentes na Síria, o Irã deve ser levado em conta como apoiador destes grupos e como referência estratégica.

O país tem Forças Armadas com ativos significativos. O seu programa de mísseis aumentou consideravelmente e ele agora possui dispositivos poderosos capazes de atingir Israel. É uma ameaça séria. Além disso, desenvolveu uma indústria de drones eficaz, capaz de produzir o suficiente para desviar parte da produção para outros intervenientes, como a Rússia, e suficientemente eficaz para atingir com sucesso as instalações petrolíferas sauditas há alguns anos.

Embora o país não tenha se envolvido num conflito diretamente desde a década de 1980, na guerra com o Iraque, sua Guarda Revolucionária tem experiência através de projeção regional, contatos e ação em outro conflitos. A experiência, sua capacidade produtiva, sua experiência no fornecimento clandestino de materiais e no aconselhamento estratégico são elementos chave.

O elemento subjacente é, obviamente, a perspectiva nuclear. O colapso do pacto nuclear do qual o governo do ex-presidente americano Donald Trump se retirou, em 2018, levou a uma aceleração das atividades de enriquecimento de urânio e a um abrandamento do regime de controle. É notório que o Irã tem capacidade para atingir o nível de enriquecimento necessário para montar uma bomba e produzir a quantidade necessária em pouco tempo. Contudo, sua capacidade operacional na fabricação de um projétil deste tipo é desconhecida, questão sobre a qual os especialistas discordam.


Fonte:https://oglobo.globo.com/mundo/noticia/2023/10/21/conflito-entre-hamas-e-israel-pode-expandir-para-todo-o-oriente-medio-saiba-a-capacidade-militar-de-4-atores-chave-da-guerra.ghtml

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