Quem é McKenzie
Wark, filósofa transexual que defende que os hackers são a nova classe
progressista
Australiana afirma que capitalismo dará
lugar ao 'vetorialismo', que explora nossa atividade nas redes sociais e
'extrai valor do nosso desejo de estar com os outros, de compartilhar, e até de
nossas rivalidades'
Por
Ruan
de Sousa Gabriel
— São Paulo
20/02/2024 03h30 Atualizado há 4 dias
Em uma frase que ficou célebre, o crítico cultural britânico Mark Fisher diz que é mais fácil imaginar o fim do mundo que o fim do capitalismo. A filósofa australiana McKenzie Wark discorda. Em livros como “Um manifesto hacker” e “O capital está morto”, recém-lançados no Brasil, ela afirma que o capitalismo vem sendo substituído pelo que chama de vetorialismo, sistema baseado na propriedade e no controle de informações.
Neste novo sistema dominante, saem de cena burgueses e proletários e o palco da luta de classes é ocupado por “vetorialistas” e “hackers”. Os vetorialistas são os donos do “vetor ao longo do qual a informação é recolhida e utilizada”, isto é, da infraestrutura que controla a circulação de dados. Já os hackers, nesse cenário, não são apenas figuras que invadem computadores, mas todos os produtores de propriedade intelectual, como escritores, artistas e cientistas —e, de certo modo, todos que fornecem dados gratuitos nas redes sociais.
Professora da New School, em Nova York, Wark é transexual e descreveu a experiência de circular por raves LGBTQIA+ para escapar da vigilância algorítmica no livro “Raving”, inédito no Brasil. De Palamós, na Espanha, onde participa de residência literária, ela conversou por vídeo com o GLOBO e, além de explicar sua teoria, falou de seu amor pelo poeta Fernando Pessoa.
Vetor do vetorialismo
“A tradição marxista ensina que há diferentes modos de produção que se sobrepõem e se articulam, ainda que um seja o dominante. E se houver um novo modo de produção dominante baseado na propriedade e no controle privados de informação e não de terras e fábricas? E se não vivermos mais no capitalismo, já que a economia da informação trouxe novos meios de controle e exploração? Se for verdade, quais são as novas possibilidades de resistência? É isso que chamo de vetorialismo.”
Trabalho de graça
“No vetorialismo, todos que produzem informação pertencem à mesma classe. Alguns de nós — artistas, escritores, cientistas — são relativamente privilegiados, mas, de uma forma ou de outra, nosso trabalho é explorado. Classe não tem a ver com quanto você ganha, mas com relações estruturais, e as redes sociais se apropriam do trabalho não pago de todos nós. O capitalismo sempre explorou o trabalho, mas o vetorialismo é mais perverso, extrai valor do nosso desejo de estar com os outros, de compartilhar, e até de nossas rivalidades. Transforma informação em mercadoria.”
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