Conheça
alimentos ultraprocessados e processados
O milho in natura, o enlatado e o salgadinho são exemplos de um mesmo alimento em distintas fases de processamento
Os alimentos processados e
ultraprocessados fazem parte da dieta de muitas pessoas na correria do
dia a dia. A história do processamento de alimentos tem início
a partir da necessidade (datada de muito tempo atrás) que a humanidade tinha de
conservar os alimentos pelo maior tempo possível, de modo a
garantir a sobrevivência em períodos de escassez, como em invernos ou secas
rigorosas.
Os primeiros elementos utilizados para conservar alimentos foram o calor do sol, o fogo e o gelo (em regiões em que as temperaturas eram mais baixas). Porém, a data específica de quando a humanidade iniciou os processos de conservação se perde na historia. Estudos arqueológicos em cavernas da China supõem que os humanos de Pequim, entre 250 mil e 500 mil anos atrás, já utilizavam o fogo para se aquecer e esquentar ou cozinhar carnes e vegetais crus.
Com o passar do tempo, novas técnicas
foram sendo desenvolvidas para conservar os alimentos, como a
pasteurização, a liofilização e a adição de conservantes naturais (sal, açúcar,
azeite, entre outros). Chegamos a um patamar em que as tecnologias utilizadas
pela indústria de alimentos vão muito além da conservação
dos alimentos – hoje temos alimentos disponíveis
que agregam praticidade e satisfação, mas não necessariamente a função de
suprir as necessidades nutricionais humanas.
O que são alimentos processados e
ultraprocessados?
A grande maioria dos alimentos que
consumimos passa por algum tipo de processamento – a definição de processamento
é dada pelo conjunto de métodos que tornem a composição nutricional comestível,
garantam a segurança alimentar e conservem os alimentos por um
determinado período. Muitas vezes, o processamento de um determinado alimento é
indispensável para a garantia de que não haverá intoxicação alimentar ao consumi-lo.
Um exemplo é o processamento do palmito, que precisa ser conservado em salmoura acidificada (pH abaixo de 4,5), com adição de conservantes e passar por tratamento térmico (esterilização, temperatura de 121ºC) para eliminar os esporos da bactéria Clostridium botulinum. A bactéria é produtora de uma neurotoxina que, se não tratada rapidamente, pode ser letal.
Com o advento da industrialização, o
processamento de alimentos cresceu rapidamente e houve uma
grande transformação, graças à ciência dos alimentos e às
novas tecnologias. Diante dessas mudanças, surge a necessidade de um exame
rigoroso dos impactos que todas as formas de processamento têm sobre os hábitos
e padrões de alimentação, e sobre a nutrição, a saúde e o bem estar.
Resultado de uma parceria entre o
Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens FSP-USP) e o
Ministério da Saúde, o Guia Alimentar para a População Brasileira foi lançado
em novembro de 2014, e propõe uma nova classificação dos alimentos,
baseados no grau de processamento, substituindo a classificação da pirâmide
alimentar que foi abolida desde o ano de 2010. O guia é reconhecido
internacionalmente, e foi apontado como “as melhores diretrizes nutricionais do mundo”.
Os alimentos foram divididos em quatro grupos e serão
apresentados a seguir.
Grupo 1 – Alimentos in natura (não
processados) ou minimamente processados
Os alimentos in
natura são obtidos diretamente de plantas ou animais e não sofrem
qualquer alteração após deixarem a natureza. Os alimentos minimamente
processados correspondem a alimentos in natura que
foram submetidos a processos de limpeza, remoção de partes não comestíveis ou
indesejáveis, fracionamento, moagem, secagem, fermentação, pasteurização,
refrigeração, congelamento e processos similares que não envolvam agregação de
sal, açúcar, óleos, gorduras ou outras substâncias ao alimento original.
O objetivo do processamento mínimo é tornar os alimentos mais disponíveis e acessíveis, e muitas vezes mais seguros e mais palatáveis. Os alimentos que fazem parte desse grupo são: grãos, nozes, legumes, frutas e hortaliças, raízes e tubérculos, chás, café, infusão de ervas, águas de torneira e engarrafada – veja outros exemplos
Grupo 2 – Ingredientes culinários e
industriais
O segundo grupo inclui substâncias
extraídas e purificadas pela industria a partir de alimentos in
natura ou obtidos direto da natureza, a fim de produzir
ingredientes culinários para a indústria de alimentos ou para
o consumidor final. Os processos utilizados são: pressão, moagem, refino,
hidrogenação e hidrólise, utilização de enzimas e aditivos. Estes processos são
diferentes daqueles utilizados na obtenção de alimentos minimamente
processados, porque mudam radicalmente a natureza do alimento original.
Normalmente, os produtos alimentares do Grupo 2 não são consumidos sozinhos, e têm maior densidade de energia e menor densidade de nutrientes em comparação com os alimentos integrais a partir dos quais eles foram extraídos. Eles são utilizados nas casas, em restaurantes, na preparação de alimentos in natura ou minimamente processados para criar preparações culinárias variadas e saborosas, incluindo caldos e sopas, saladas, tortas, pães, bolos, doces e conservas, e também na indústria para a produção de alimentos ultraprocessados.
O Grupo 2 é composto pelos
seguintes alimentos: amidos e farinhas, óleos e gorduras, sais,
adoçantes, ingredientes industriais, tais como frutose, xarope de milho,
lactose e proteína de soja.
Grupo 3 – Alimentos processados
Alimentos processados são
fabricados pela indústria com a adição de sal, de açúcar ou de outra substância
de uso culinário a alimentos in natura para
torná-los duráveis e mais agradáveis ao paladar. São produtos derivados
diretamente de alimentos e são reconhecidos como versões dos alimentos originais.
São usualmente consumidos como parte ou acompanhamento de preparações
culinárias feitas com base em alimentos minimamente processados.
Alguns exemplos de alimentos
processados são: cenoura, pepino, ervilhas, palmito, cebola e
couve-flor preservados em salmoura ou em solução de sal e vinagre; extratos ou
concentrados de tomate (com sal e ou açúcar); frutas em calda e frutas
cristalizadas; carne seca e toucinho; sardinha e atum enlatados; queijos; e
pães feitos de farinha de trigo, leveduras, água e sal.
Grupo 4 – Alimentos ultraprocessados
Alimentos ultraprocessados,
produtos que estão prontos para consumo, necessitando de aquecimento ou não,
são formulações industriais feitas inteiramente ou majoritariamente de
substâncias extraídas de alimentos (óleos, gorduras, açúcar,
amido, proteínas), derivados de constituintes de alimentos (gorduras
hidrogenadas, amido modificado) ou sintetizadas em laboratório com base em
matérias orgânicas como petróleo e carvão (corantes, aromatizantes, realçadores
de sabor e vários tipos de aditivos usados para dotar os produtos de
propriedades sensoriais atraentes).
As técnicas de manufatura incluem
extrusão, moldagem, e pré-processamento por fritura ou cozimento. O objetivo
do ultraprocessamento é tornar o alimento atraente,
acessível, palatável, apresentar longa vida de prateleira e praticidade. O
Grupo 4 pode ser subdividido em duas categorias:
Lanches e sobremesas:
Pães, barras de cereais, biscoito,
batatas fritas, bolos, doces, sorvetes e refrigerantes.
Produtos que necessitam de
pré-preparo (aquecimento):
Pratos prontos (congelados), massas,
linguiças, nuggets, sticks de peixe, sopas
desidratadas, fórmulas infantis e alimentos para bebês.
O ultimo relatório apresentado pela
Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) “Alimentos e
bebidas ultraprocessados na América Latina: tendências,
impacto sobre a obesidade e implicações para as políticas públicas”, realizado
entre 2000 e 2013 em 13 países latino-americanos (Argentina, Bolívia, Brasil,
Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, Guatemala, México, Peru, República Dominicana,
Uruguai e Venezuela) constatou que houve um aumento na venda per capita de
produtos ultraprocessados, acompanhado do aumento do peso corporal
médio das populações desses países.
Trata-se de um indicador de que estes
produtos são um dos principais fatores das taxas aumentadas de sobrepeso e
obesidade na região. Entretanto, nos países da América do Norte, observou-se um
declínio de 9,8% nas vendas dos alimentos ultraprocessados.
Existe um consenso entre a
Organização Mundial da Saúde (OMS), a Organização das Nações Unidas para a
Alimentação e a Agricultura (FAO) e o Fundo Mundial para Pesquisa em Câncer de
que os principais fatores que promovem o aumento de peso e obesidade e o desenvolvimento
de doenças não transmissíveis (DNTs) são: a elevada ingestão de alimentos com
poucos nutrientes e alto valor energético (alimentos ultraprocessados),
consumo rotineiro de bebidas açucaradas e atividade física insuficiente.
Um estudo publicado na Science
Direct revelou que os alimentos ultraprocessados envelhecem o cérebro
precocemente e prejudicam a memória.
Diante da elevação do consumo
de alimentos ultraprocessados e seus possíveis impactos na
saúde humana, é necessária a criação de politicas públicas que diminuam o
acesso a esse tipo de alimento. Um exemplo a ser citado foi a
aplicação de taxas em todas as bebidas adoçadas e todos os snacks com
alto teor de açúcar e gordura, pelo governo do México.
Segundo o Guia Alimentar para a População
Brasileira, os alimentos ultraprocessados oferecem
outros impactos negativos, que vão muito além da saúde e da nutrição humana, e,
por isso, o consumo desses alimentos deve ser evitado.
Impacto na cultura
Marcas, embalagens, rótulos e
conteúdo de alimentos ultraprocessados tendem a
ser idênticos em todo o mundo. As marcas mais conhecidas são promovidas por
campanhas publicitárias milionárias e muito agressivas, incluindo o lançamento,
todos os anos, de centenas de produtos que sugerem falso sentido de
diversidade. Diante dessas campanhas, culturas alimentares genuínas passam a
ser vistas como desinteressantes, especialmente pelos jovens. A consequência é
a promoção do desejo de consumir mais e mais para que as pessoas tenham a
sensação de pertencer a uma cultura moderna e superior.
Impacto na vida social
Alimentos ultraprocessados são
formulados e embalados para serem consumidos sem necessidade de qualquer
preparação, a qualquer hora e em qualquer lugar. O seu uso torna a preparação
de alimentos, a mesa de refeições e o compartilhamento da comida
menos importantes. Seu consumo ocorre com frequência e sem hora fixa, muitas
vezes quando a pessoa vê televisão ou trabalha no computador, caminha na rua,
dirige um veículo ou fala no telefone, e em outras ocasiões de relativo
isolamento. A “interação social” usualmente mostrada na propaganda desses
produtos esconde o que realmente ocorre.
Impacto no ambiente
A manufatura, a distribuição e a
comercialização de alimentos ultraprocessados são
potencialmente danosas para o ambiente e, conforme a escala da sua produção,
ameaçam a sustentabilidade do planeta. Isso fica simbolicamente demonstrado nas
pilhas de embalagens desses produtos descartadas no ambiente, muitas não são
biodegradáveis, desfiguram a paisagem e requerem o uso crescente de novos
espaços e de novas e dispendiosas tecnologias de gestão de resíduos. A demanda
por açúcar, óleos vegetais e outras matérias-primas comuns na fabricação
de alimentos ultraprocessados estimula monoculturas
dependentes de agrotóxicos e uso intenso de fertilizantes químicos e de água,
em detrimento da diversificação da agricultura.
A sequência de processos envolvidos
com a manufatura, a distribuição e a comercialização desses produtos envolve
longos percursos de transporte e, portanto, grande gasto de energia e emissão
de poluentes. A quantidade de água utilizada nas várias etapas da sua produção
é imensa. A consequência comum é a degradação e a poluição do ambiente, a
redução da biodiversidade e o comprometimento de reservas de água, de energia e
de muitos outros recursos naturais.
Por fim, o Guia Alimentar para a
População Brasileira sugere quatro recomendações e uma regra de ouro para uma
alimentação saudável e equilibrada.
- Faça dos alimentos in natura e
minimamente processados a base de sua alimentação;
- Utilize óleos, gorduras, sal e açúcar em
pequenas quantidades ao temperar e cozinhar alimentos e
criar preparações culinárias;
- Evite alimentos ultraprocessados;
- A regra de ouro. Prefira sempre alimentos in
natura ou minimamente processados e
preparações culinárias a alimentos ultraprocessados.
Também é bem importante que os alimentos in
natura ou minimamente processados que fazem parte
do seu consumo sejam orgânicos.
Fontes
Os alimentos ultraprocessados estão impulsionando a epidemia de obesidade na América Latina, de acordo com o novo relatório OPAS/OMS; Alimentos e bebidas ultraprocessados na América Latina: tendências, impacto sobre a obesidade e implicações para as políticas públicas; Plano de ação para prevenção da obesidade em crianças e adolescentes; Uma nova classificação de alimentos baseada na extensão e propósito do seu processamento – BDPI USP; Alimentos ultraprocessados são ruins para as pessoas e para o meio ambiente. Guia de Alimentação para a População Brasileira.
Fonte: https://www.ecycle.com.br/alimentos-processados-e-ultraprocessados/
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