O dilema das redes sociais: a noia da década (Foto: Getty Images)
O Dilema das Redes Sociais: a noia da década
Nosso colunista Caio Braz comenta sobre o mais novo documentário da Netflix
No Twitter e nas rodinhas de conversas, mesmo que via Whatsapp, só se fala no “Dilema das Redes Sociais”, o mais novo documentário da Netflix, dirigido pelo novaiorquino Jeff Orlowski e lançado há algumas semanas no catálogo americano. Será que finalmente devemos abandonar as redes sociais pra recuperar a saúde mental?
O “Dilema das Redes” surge em tom de denúncia com a participação de diversos ex-membros das grandes companhias de tecnologia do mundo, como Google, Facebook, Pinterest – todos homens heteronormativos brancos, por sinal – em uma espécie de delação premiada contra as empresas a qual se dedicaram por anos e acumularam salários voluptuosos, e em tom de arrependimento, afirmam que os algoritmos tem o único propósito de gerar mais lucro para esses oligopólios, e aumentar o nosso tempo de tela.
Você não fica tantas horas online à toa: é uma estratégia de mercado, e você é o produto.
Quanto mais tempo você passar conectado, mais tempo você será impactado por anúncios nas redes sociais e maior o faturamento destas empresas. Mas a grande revelação é o porquê de você passar tantas horas conectado, em um loop infinito, buscando novidades, mensagens, e estímulos que te agradem: a arquitetura dos algoritmos e a relação íntima deles com a neurociência.
Os analistas de tecnologia explicam o bê-a-bá da construção dos algoritmos e como as injeções de dopamina, um dos hormônios responsáveis pela sensação de gratificação e felicidade, estão presentes nas redes e fazem com que a gente não consiga se desvencilhar do vício nelas. Basta pensar qual é a primeira coisa que você faz quando acorda? Confere as redes sociais antes ou durante o primeiro xixi da manhã?
A lógica das redes fortalece a polarização de ideias e o discurso de ódio
"Os algoritmos são como um alfaiate digital”, afirma o cientista pernambucano Silvio Meira, uma das vozes mais importantes da tecnologia no Brasil e no mundo, em entrevista exclusiva à Vogue. "Eles criaram um sistema pra fazer uma capa de bits, como na alta costura, mas em escala industrial, criando uma roupa perfeita que você quer vestir. Você só vê o que gosta, e uma pessoa que tem valores completamente diferentes do seu, mais reacionários, por exemplo, só vê o que gosta também. Todo mundo acredita que está lendo a verdade e replica este conteúdo adiante como se fosse confiável. É a personalização completa dos seus gostos, não exatamente dos fatos.”
As redes não são feitas pra discutir temas, são feitas para nichar
Os ex-funcionários depoentes do documentário revelam que na construção dos algoritmos, baseado na neurociência, descobriu-se que a melhor maneira de se manter uma pessoa conectada a maior parte do seu tempo é entregando um conteúdo que ela já está mais propensa a gostar. Você já percebeu que quanto mais você dá like em um assunto, mais ele aparece nas suas telas? Isso vale para música, política, moda, esportes, qualquer assunto.
Vivemos inundados em um mar de ilusões, como se as nossas subculturas fossem o pensamento dominante: daí a surpresa, por exemplo, na eleição de líderes de extrema direita como Trump e Bolsonaro. Muitos de nós acreditavam que eles não tinham força suficiente para vencer a disputa presidencial porque não apareciam com tanta força em nossas telas. A verdade se revela nas urnas: tem muita gente falando e acreditando em suas narrativas, mas só você não está vendo porque o seu algoritmo te deixa na bolha.
Agora que constataram o problema, isso vai mudar algum dia?
O assunto quente do momento no mundo da tecnologia é a regulamentação. Durante os últimos anos, as empresas de tecnologia nadaram em um mar sem leis que as enquadrassem em regras éticas, como é feito no mundo da publicidade, por exemplo com o CONAR e nos veículos de comunicação como jornais e televisão. O Facebook, antes visto como uma empresa libertária e hoje encarado como um dos grandes vilões do Vale do Silício, criou uma “Suprema Corte” com vinte membros de vários países do mundo para fiscalizar as práticas de privacidade e “readequar”os poderes da plataforma sobre as vidas humanas. Resta saber se dá pra confiar em uma Suprema Corte que é financiada pelo próprio Facebook, o que ainda gera muita desconfiança quanto à sua eficiência.
Fonte:https://vogue.globo.com/lifestyle/noticia/2020/09/o-dilema-das-redes-sociais-noia-da-decada.html
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