AQUECIMENTO GLOBAL E OS DESAFIOS À HUMANIDADE NO SÉCULO XXI: COMO OCORRE O AQUECIMENTO GLOBAL,E ACONSERVAÇÃO DAS FLORESTAS,QUEM SÃO OS BENEFICIADOS E OS PREJUDICADOS
Como ocorre o Aquecimento Global?
by Kátia Cañellas | Set 9, 2018 | Aquecimento Global, Blog, Clima, Efeito Estufa, Mudanças Climáticas
O aquecimento
global é o aumento da temperatura média global da atmosfera e dos
oceanos. Esse processo desencadeia importantes alterações em praticamente todos
os sistemas e ciclos naturais da Terra. O aumento da temperatura global afeta o
fluxo dos ventos, as correntes marinhas, os ciclos da água, do carbono, do
nitrogênio e de outros compostos, que interferem diretamente no sistema
climático, provocando as mudanças climáticas.
O
sistema climático terrestre muda em resposta a variações de fatores externos,
tais como alterações da radiação solar e da órbita da terra em torno do
Sol; ou de fatores internos que envolvem alterações na composição
química da atmosfera, tais como erupções vulcânicas e altas
concentrações de gases do efeito estufa.
O
processo de aquecimento global que estamos vivenciando na atualidade é causado
pela mudança da composição química da atmosfera provocada pela atividade
humana. Para a maior parte da comunidade científica, com a revolução
industrial, o homem alterou os modos de produção, aumentou o consumo
de bens e o uso de fontes energéticas, principalmente combustíveis
fósseis, lançando na atmosfera bilhões de toneladas de gases estufa.
O efeito estufa e o aquecimento global
Quando
estudamos o sistema terrestre na escola, aprendemos que a atmosfera é
a camada de ar que envolve a superfície da terra, e que ela é um dos elementos
responsáveis pela existência de vida no planeta. Essa é uma visão correta, mas
bastante simplista. Se pesquisarmos um pouco mais, vamos descobrir que a
atmosfera é composta por uma camada de gases, de material particulado e de
vapor dágua. Nitrogênio, oxigênio e argônio constituem os 99,93% dos
gases naturais presentes na atmosfera. Os 0,07% restantes são compostos
de vapor d’água, dióxido de carbono, metano, óxido nitroso, ozônio e
gases artificiais chamados clorofluorcarbonos, que são os que têm
maior impacto sobre o efeito estufa, considerado o grande vilão das
mudanças climáticas. Esses gases de efeito estufa estão naturalmente presentes
na atmosfera, mas sua presença tem aumentado enormemente como resultado da ação
humana, principalmente por quatro razões: a queima de combustíveis
fósseis, o desmatamento florestal, a destruição de ecossistemas marinhos e o
aumento de população, que consome cada vez mais recursos naturais
Entretanto,
apesar de amplamente condenado, o efeito estufa é um processo
natural e fundamental para manter a temperatura média da terra em
condições ideais para a sobrevivência e para o desenvolvimento das
espécies. Ele é responsável por reter parte do calor solar que chega ao
planeta, mantendo assim a temperatura da superfície da terra adequada aos seres
vivos. Sem esse efeito, a temperatura da terra seria de aproximadamente -20ºC,
dificultando a vida no planeta!
A
denominação de efeito estufa se deve à similaridade do
fenômeno que ocorre em uma estufa de plantas, onde um vidro envolve o ambiente.
Esse vidro filtra a passagem da energia solar. Parte dessa energia é refletida
e outra parte é absorvida pelas plantas e pelas superfícies do ambiente. A
energia absorvida se transforma e é reemitida para o ambiente com
características diferentes, sendo a sua maioria em forma de calor. Esse calor
não consegue mais ultrapassar a superfície do vidro, aquecendo o ambiente. É
isso que acontece com a terra.
Para
entender melhor esse fenômeno, dentre os gases presentes na atmosfera, alguns
como o dióxido de carbono, o metano, o óxido nitroso, além
de outras partículas como os aerossóis e o vapor de água, funcionam
como a camada de vidro que envolve a estufa de plantas. Eles são
denominados gases de efeito estufa e se concentram na camada
mais externa da atmosfera, funcionando como uma capa de proteção. Por sua composição
e estrutura, esses gases funcionam como um filtro que controla o fluxo de
energia do sol que incide sobre a atmosfera. Apesar de deixarem passar a
energia vinda do Sol (emitida em comprimentos de onda menores), são opacos à
radiação terrestre, emitida em maiores comprimentos de onda. Essa diferença nos
comprimentos de onda se deve às diferenças nas temperaturas do Sol e da
superfície terrestre.
Normalmente
as pessoas fazem uma certa confusão entre gases de efeito estufa e
a camada de ozônio. O ozônio é um dos gases que também
compõe a atmosfera. Apesar de estar presente em pequenas quantidades em
comparação com outros gases, cerca de 90% de suas moléculas se concentram entre
20 e 35 km de altitude, criando uma região relativamente homogênia
denominada Camada de Ozônio. Essa camada é essencial à vida na
terra pois o ozônio é o único gás que filtra os raios ultravioleta do tipo B
(UV-B), emitidos pelo Sol e extremamente nocivos aos seres vivos.
Da
energia solar que chega à atmosfera, aproximadamente 30% é refletida para o
espaço. A outra parte da energia (70%) é filtrada pelos gases gases de efeito
estufa, chega ao solo e aquece a superfície. As diferentes superfícies do solo
terrestre (vegetação, edificações, água, pavimentos, carros, entre outros)
reagem de forma variada, absorvendo ou refletindo em maior ou menor grau essa
energia. Entretanto as superfícies que absorvem mais energia, devolvem uma
parte dela ao ambiente em forma de calor. Esse calor, por suas características físicas
(comprimento de onda maior), tem mais dificuldade de ultrapassar a camada de
gases de efeito estufa para voltar ao espaço, e grande parte dele ainda
permanece na atmosfera, mantendo o ambiente aquecido. Assim, a média da
temperatura da superfície da terra em condições normais se mantém em
aproximadamente 15ºC, possibilitando que a vida se forme e se desenvolva.
Como o aquecimento global acontece?
Na
proporção certa, os gases de efeito estufa cumprem seu papel
de manter a temperatura adequada à vida no planeta. O aquecimento global
acontece quando há um desequilíbrio na quantidade desses gases na
atmosfera. Quanto maior for a sua quantidade, mais densa será a camada de
proteção que permite a entrada da energia emitida pelo sol, mas retém o calor refletido
pela terra na atmosfera, aumentando assim a sua temperatura média global.
Fazendo uma analogia, o aumento de gases de efeito estufa na atmosfera funciona
como um cobertor que protege a terra e não deixa sair o calor que ela reflete,
aumentando assim a sua temperatura média.
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O
problema é que pequenas mudanças na temperatura média global podem causar
mudanças importantes e perigosas no tempo e no clima. Para se ter uma idéia, a
diferença de 1 grau Celcius pode representar a diferença entre gelo e água.
Sendo assim, se essa diferença acontecer regularmente por meses em uma região
que depende de um ciclo natural de acumulação de neve no inverno e de
precipitação na primavera, isso pode promover uma grande mudança na
dinâmica do lugar, alterando a vida cotidiana e até mesmo as fontes de renda
das pessoas.
Os
cinco gases originados das atividades humanas que juntos contribuem em
aproximadamente 95% para o aumento do aquecimento global são: o dióxido
de carbono, o metano, os compostos halogenados como CFCs, HCFCs, HFCs, PFCs,
SF6 e NF3, o ozônio troposférico e o óxido nitroso. Eles tem tempos de
permanencia na atmosfera, níveis de contribuição para o aquecimento global e
fontes de emissão variadas.
O dióxido
de carbono, conhecido vulgarmente como gás carbônico é responsável
por 53% do nível de aquecimento global. Sua permanência na
atmosfera é muito alta: 80% do dióxido de carbono emitido demora em torno
de 200 anos para desaparecer, mas os outros 20% podem demorar
até 30.000 anos. Naturalmente ele é produzido pela respiração, na
decomposição de plantas e pelas queimadas naturais nas florestas. Entretanto,
as duas principais fontes desse gás são a queima de combustíveis
fósseis e o desmatamento de florestas. A queima de combustíveis fósseis
(gás natural, carvão mineral e principalmente de petróleo) ocorre na produção
de energia, no uso industrial e nos transportes (automóveis, ônibus, caminhões,
barcos e aviões, entre outros). Os oceânos e as florestas são ecossistemas
naturais capazes de absorver o carbono (chamados sumidouros), porém eles também
estão sendo ameaçados pela ação humana.
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O metano é
o segundo principal gás de efeito estufa, pois contribui com 15% do
aquecimento global. Ele permanece na atmosfera por um médio prazo (12
anos). Os pântanos e oceânos produzem naturalmente esse gás, mas o aumento
significante desse gás na atmosfera se dá principalmente por processos
biológicos que envolvem a decomposição anaeróbica (sem
oxigênio) de organismos, a digestão animal e a queima de biomassa.
Lixões, aterros sanitários, estações de tratamento de efluentes líquidos,
criação de gado, arrozais e reservatórios de hidroelétricas são as fontes de
metano criadas pela ação humana.
Os compostos
halogenados como CFCs, HCFCs, HFCs, PFCs, SF6 e NF3 são responsáveis
por 11% do aquecimento global. Dependendo do tipo de composto,
sua duração na atmosfera varia de alguns meses a dezenas de milhares de
anos. Eles são gerados como resultado da produção de produtos
químicos em diversos setores, como refrigeração e ar
condicionado, equipamentos elétricos e eletrônicos, medicina, metalurgia,
entre outros.
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O ozono
troposférico também tem um efeito de 11% no aquecimento
global, mas ele permanece um curto período de tempo na atmosfera (alguns
meses). Ele é produzido na reação entre os gases monóxido de carbono (CO),
dióxido de nitrogênio (NO₂) e VOCs (compostos
orgânicos voláteis), que são emitidos durante a queima de combustíveis.
O óxido nitroso contribui em 5% para a
intensificação do efeito estufa e consequente aquecimento global. Além de
absorver uma quantidade muito elevada de energia, mantendo o calor na
atmosfera, ele também é o gás que mais causa destruição da camada de ozônio.
Apesar da baixa emissão em relação a outros gases, seu efeito estufa é cerca de
300 vezes mais intenso que o do dióxido de carbono e ele tem um tempo de
permanência na atmosfera muito longo (114 anos). Ele é emitido por fontes
naturais como a ação de bactérias no solo e oceanos. Porém, atualmente um terço
da emissão desse gás deriva de atividades humanas, como um subproduto dos
métodos de fertilização na agricultura (aproximadamente 75%),
da combustão, do tratamento de esgoto e de diversos processos
industriais.
Por
fim, vapor d’água presente na atmosfera em forma de nuvens
também contribui para o efeito estufa, porém sua concentração é extremamente
variável e instável, pois as alterações na temperatura e na pressão do ar
atuam sobre os processos de evaporação, condensação e precipitação.
Assim, apesar de seu fluxo radioativo ser duas vezes maior do que do dióxido de
carbono, fica dificil fazer uma avaliação de sua contribuição para o
aquecimento global.
Aquecimento
global e os desafios à humanidade no século XXI
Ricardo Machado
Dados divulgados em 2013 pelo Banco Credit Suisse
apontam que a riqueza mundial é da ordem de R$ 514,9 trilhões, dinheiro
suficiente para construir casas sustentáveis para toda população mundial.
Porém, a produção de riqueza mundial, ao invés de gerar bem-estar social em
âmbito global, gerou, além da concentração de renda, emissão recorde de gás
carbônico na atmosfera, alcançando, em maio do mesmo ano, o número de 400
partes por milhão, segundo dados do Centro Americano de Controle da Atmosfera –
NOAA (sigla em inglês).
Veja a reportagem como foi publicada na revista.
Com a intensificação do neoliberalismo em escala
mundial a partir dos anos 1970, os efeitos da emissão de poluentes se tornaram
mais visíveis e só se tornaram uma pauta mundial quase duas décadas mais tarde.
Nesse período, foi inaugurado o Painel Intergovernamental sobre Mudanças
Climáticas – IPCC, que desde então vem produzindo, periodicamente, relatórios sobre
o clima global. O mais recente documento — denominado “Mudanças Climáticas
2014: Impactos, Adaptação e Vulnerabilidade” — confirma projeções anteriores e
sustenta que as mudanças climáticas, em decorrência do aquecimento
antropogênico, continuam aumentando.
A próxima rodada de negociações sobre o clima deve
ocorrer na França, entre 30 de novembro e 11 de dezembro de 2015. A expectativa
é traçar metas ambiciosas para manter o aquecimento global da média da
temperatura do planeta em até 2ºC no século XXI, o que significaria um aumento
máximo de 0,3ºC nas próximas oito décadas. Entretanto, a condição atual do
globo já causa mudanças climáticas que afetam a agricultura, a saúde humana, os
ecossistemas, o abastecimento de água, entre outros fatores.
Diante deste cenário, nem mesmo o secretário geral
da Organização das Nações Unidas – ONU, Ban Ki-Moon, acredita que tal objetivo
pode ser alcançado e, por isso, aponta sugestões. “Para diminuir esses riscos,
a redução substancial das emissões globais de gases de efeito estufa deve ser
feita juntamente com estratégias e ações para melhorar a preparação contra os
desastres, bem como para reduzir a exposição a eventos causados pelas
alterações climáticas”, sustentou Ban Ki- Moon, em comunicado divulgado no site
da ONU.
Os desafios contemporâneos que se impõem à
comunidade mundial são complexos e resultam de um aprofundamento da
desigualdade social* nos últimos séculos, que gera impactos em escala global.
Grande parte da riqueza das nações desenvolvidas decorreu de um crescimento
econômico pouco preocupado com os impactos ambientais. Mais recentemente, os
países em desenvolvimento assumiram a mesma matriz racional de geração de
riqueza, baseada em mineração e extração de combustíveis fósseis. Nesta queda
de braço, os maiores perdedores parecem ser as populações miseráveis, que são
as comunidades mais impactadas pelos eventos climáticos extremos, que ocorrem
em todos continentes.
* Leia, em Destaques da Semana, uma síntese da
Conjuntura que debate o livro O capital no século XXI - Le capital au XXIe
Siècle. Paris: Seuil, 2014 — até o momento, sem tradução para o português. A
Editora Intrínseca comprou os direitos para o Brasil.
Fonte: http://www.ihuonline.unisinos.br/artigo/5486-reportagem-da-semana-13
Aquecimento
global e conservação das florestas – quem são os beneficiados e os
prejudicados?
Ricardo Machado
Para o professor Fernando Jardim, o manejo
florestal adequado é a alternativa mais viável à manutenção das florestas
Diante de um contexto de intensas pressões
políticas e econômicas por desenvolvimento, que geram impactos diretos na
questão ambiental e, consequentemente, no clima global, a conservação das
florestas torna-se um imperativo para não agravar ainda mais a situação. “Os
fundamentos técnicos do manejo florestal, estabelecidos na legislação, mas
desenvolvidos a partir das pesquisas florestais e ecológicas, contemplam esse
princípio conservacionista. Qualquer pessoa de bom senso que analisa essa
questão reconhece que a melhor maneira de conservar as florestas em pé e, ao
mesmo tempo, fazê-la produzir bens e serviços é através do manejo florestal”, pontua
o professor Fernando Cristovam da Silva Jardim, em entrevista por e-mail
à IHU On-Line.
No que diz respeito a fenômenos climáticos
extremos, testemunhados no mundo inteiro nos últimos anos, como tufões,
enchentes e secas históricas, o professor considera que a influência do
desmatamento não é significativa, comparada à queima de combustíveis fósseis.
“A despeito da contribuição do desmatamento para o aquecimento global, há
estudos que diminuem essa influência e sugerem que o maior contribuinte para o mesmo
é a queima de combustíveis fósseis dos países desenvolvidos. Por outro lado,
existe a hipótese de que o aquecimento pode ser um fenômeno cíclico,
simplesmente. Mas, ainda assim, potencializado por ações antrópicas”, explica.
Para Fernando Jardim, a principal questão das grandes obras que geram impacto
ambiental, seja na produção de energia ou na exploração de minerais, é que as
populações mais impactadas pelas obras não são as beneficiadas. “Os
megaprojetos são males necessários, desde que a sociedade seja a beneficiada
final. O que é melhor: um apagão energético, os riscos da energia nuclear ou os
danos ambientais da construção de grandes hidrelétricas como Belo Monte?
Todavia, quem se beneficia ou é prejudicado? É justo causar danos ambientais
como os de Tucuruí e os previstos em Belo Monte para os paraenses — os índios
incluídos — e esses cidadãos “pagarem a conta”, sem usufruir dos benefícios, em
favor das regiões mais desenvolvidas do país?”, provoca.
Fernando Cristovam da Silva Jardim nasceu em Belém do Pará e graduou-se em
Engenharia Florestal pela Universidade Federal Rural da Amazônia - UFRA,
realizou mestrado em Manejo Florestal pelo convênio Instituto Nacional de
Pesquisas da Amazônia-INPA/FUA e concluiu o Doutorado em Ciência Florestal pela
Universidade Federal de Viçosa - UFV. Atualmente é Professor Associado da
Universidade Federal Rural da Amazônia e consultor da Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado do Amazonas.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – O Relatório sobre Impactos, Adaptação
e Vulnerabilidade às Mudanças Climáticas, do Painel Intergovernamental sobre
Mudanças Climáticas – IPCC, divulgado recentemente, apontou que o desmatamento
e a degradação ambiental são fatores muito relevantes no aquecimento da
atmosfera terrestre. Que desafios se impõem à conservação ambiental no século
XXI?
Fernando Jardim - Comprometimento
da sociedade e dos governantes. É muito fácil para governantes de um país
tentar ditar regras de conduta para outras sociedades, sem que eles próprios as
cumpram, como, por exemplo, no caso dos países ditos desenvolvidos, que
assinaram o Protocolo de Kyoto. São os representantes desses países que tentam
impor regras de conservação e preservação de florestas, por exemplo. Nesta
lógica, foi mais fácil mudar o Código Florestal Brasileiro, que era uma lei
muito boa, do que obrigar quem cometeu crimes ambientais, com ou sem
consentimento, a repará-los.
IHU On-Line – Quais são as diferenças entre os
conceitos de “preservação ambiental” e “conservação ambiental”? Qual a importância
deles na problemática ambiental global?
Fernando Jardim - De
uma forma bem simples, pode-se dizer que a preservação é a proibição de
qualquer uso que implique modificações no ecossistema, enquanto a conservação é
a capacidade de usar os recursos do ecossistema de forma racional, garantindo
sua sustentabilidade. No caso das florestas, por exemplo, o conceito de
preservação é completamente utópico diante das demandas da sociedade por
produtos de natureza florestal, apesar de haver áreas de reservas em que isso
possa ser verificado em escala muito reduzida. O ecossistema florestal (a
floresta Amazônica), por sua própria dinâmica, não experimenta a preservação na
sua essência.
IHU On-Line – A partir de uma abordagem científica,
por que a conservação ambiental se torna um elemento-chave no atual contexto
mundial?
Fernando Jardim - Porque
ela expressa a possibilidade de uso das florestas de forma racional e
sustentável, sem a utopia da preservação. Os fundamentos técnicos do manejo
florestal, estabelecidos na legislação, mas desenvolvidos a partir das
pesquisas florestais e ecológicas, contemplam esse princípio conservacionista.
Qualquer pessoa de bom senso que analisa essa questão reconhece que a melhor
maneira de conservar as florestas em pé e, ao mesmo tempo, fazê-la produzir
bens e serviços é através do manejo florestal.
IHU On-Line – Desde o ponto de vista da (não)
conservação ambiental, como podemos explicar que fenômenos climáticos extremos,
que estavam sendo projetados para ocorrerem daqui a duas ou três décadas,
estejam ocorrendo neste momento?
Fernando Jardim - Existe
muita controvérsia sobre essa questão. As projeções através de modelagem
envolvem riscos de erro, às vezes já reconhecidos. A despeito da contribuição
do desmatamento para o aquecimento global, há estudos que diminuem essa
influência e sugerem que o maior contribuinte para isso é a queima de
combustíveis fósseis dos países desenvolvidos. Por outro lado, existe a
hipótese de que o aquecimento pode ser um fenômeno cíclico, simplesmente. Mas,
ainda assim, potencializado por ações antrópicas.
IHU On-Line – Levando em conta o modelo de
desenvolvimento nacional (megaprojetos, Belo Monte, etc.), as políticas
indigenistas e o Código Florestal Brasileiro, de que maneira esses três eixos
geram impactos na questão ambiental no Brasil? Aliás, tais impactos são
positivos ou negativos?
Fernando Jardim - Penso
que é mais uma questão de benefícios/custo. Os megaprojetos são males
necessários, desde que a sociedade seja a beneficiada final. O que é melhor: um
apagão energético, os riscos da energia nuclear ou os danos ambientais da
construção de grandes hidrelétricas como Belo Monte? Todavia, quem se
beneficia ou é prejudicado? É justo causar danos ambientais como os de Tucuruí
e os previstos para Belo Monte para os paraenses — os índios incluídos —
e esses cidadãos “pagarem a conta”, sem usufruir dos benefícios, em favor das
regiões mais desenvolvidas do país? O que você, que me faz essas perguntas,
pensaria se na sua região fosse construída uma hidrelétrica do tamanho de Belo
Monte para atender as demandas energéticas da Amazônia?
IHU On-Line – Como a exportação de commodities
minerais (principalmente para mercados como a China) e a exploração de
combustíveis fósseis (gás de xisto, por exemplo) impactam na preservação
ambiental das reservas naturais do Brasil? Como isso se reflete na problemática
do clima mundial?
Fernando Jardim - Parto
do princípio de que os recursos naturais existem para satisfação das
necessidades humanas, com todas as atitudes mitigadoras de danos possíveis, o
que descarta a ideia de preservação. No caso dos combustíveis fósseis, eles não
são renováveis, e preservá-los não faz sentido. A consequência ambiental de seu
uso é só uma questão geográfica: tira daqui para queimar lá. Mas, novamente,
deve-se perguntar quem são os prejudicados/beneficiados no processo. Veja o
exemplo de Carajás : os danos ambientais decorrentes da lavra — desmatamento,
aquecimento local, etc. — são suportados pela sociedade paraense, mas os
benefícios com o Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e
sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de
Comunicação - ICMS é do Estado do Maranhão.
IHU On-Line – Há como superar as soluções
economicistas à questão ambiental (Economia Verde, Créditos de Carbono, gestão
sustentável, etc.) ou estamos diante de um beco sem saída? Por quê?
Fernando Jardim - O
problema envolve a interação de três fatores: econômico x ecológico (ambiental)
x social. As soluções apresentadas na pergunta — Economia Verde, Créditos de
Carbono, gestão sustentável — contemplam aspectos econômico/ambiental. Mas o
problema é de solução difícil porque envolve os interesses de cada um e da
sociedade em geral (o social), traduzido na falta de comprometimento. No caso
das florestas como a Amazônica, a certificação de produtos e processos (Selo
Verde) poderia facilmente racionalizar o problema, mas isso só tem tido
repercussão no mercado internacional. O mercado local, regional e mesmo
nacional não exige produtos certificados e é o maior demandador desses produtos.
IHU On-Line – Se levarmos em conta a média da
pegada ambiental da população dos Estados Unidos, necessitaríamos de 4,5
planetas para dar conta da demanda de cada indivíduo. Dito isto, percebemos que
há implícito nos projetos de desenvolvimento dos países emergentes, como no
caso dos Brics , um desejo de crescimento econômico que passa pelo aumento da
produtividade industrial. Diante deste contexto, como garantir e ampliar a
conservação ambiental atualmente?
Fernando Jardim - “...todo
mundo quer subir, a concepção da vida admite...” já dizia a canção da Clara
Nunes. Os Brics, como o Brasil, também almejam o “status” de desenvolvidos.
Mas, para isso, precisam garantir o suprimento de insumos como energia, água,
matérias-primas, infraestrutura, tecnologia, etc. Todavia, é evidente que isso
exige um custo ambiental que onera a produção e que cada vez mais tem sido
cobrado pela sociedade. No caso da produção madeireira em florestas nativas,
por exemplo, sendo ela baseada na exploração de algumas poucas espécies “nobres”,
há um enorme desperdício de matéria-prima, tanto na industrialização da madeira
como no descarte de milhares de espécies arbóreas sem valor de mercado atual,
que, se tivessem seu uso otimizado com novas tecnologias, diminuiria a pressão
sobre a floresta.
IHU On-Line – Como a conservação ambiental impacta
na vida das pessoas que vivem longe das florestas, por exemplo?
Fernando Jardim - A
conservação garante que a floresta seja mantida em pé, fornecendo produtos
físicos, madeireiros e não madeireiros, e os chamados serviços ambientais, como
a regulação do clima, do ciclo hidrológico, etc. As florestas manejadas são um
exemplo de conservação, pois mantêm e melhoram os serviços para o equilíbrio do
clima regional e global, especialmente pela manutenção do ciclo hidrológico e
pela retenção e fixação de carbono — deixa de ser mero reservatório para ser
sumidouro de Dióxido de Carbono.
IHU On-Line – Deseja acrescentar algo?
Fernando Jardim - Não creio que as florestas tenham sido feitas para
nossa mera contemplação e acredito que a única maneira de garantir sua
manutenção em pé seja através do manejo florestal que é sinônimo de
conservação. Todavia, é necessário que a sociedade e os governantes estejam
comprometidos com essa ideia; estejam dispostos a absorver os custos ambientais
e sociais que a conservação impõe ao uso sustentável das florestas; desenvolvam
usos adicionais para o estoque remanescente de uma exploração madeireira, pois
muitos dos problemas de manejo de florestas tropicais nativas podem ser mais
facilmente resolvidos pelo processamento e comercialização.
Fonte: http://www.ihuonline.unisinos.br/artigo/5490-fernando-jardim-2
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