O
medo da solidão e desamparo é o que acreditamos ser amor
Vocês sabem o que é o amor? Vocês
amam seus pais, seus irmãos, seus professores, seus amigos? Sabem o que quer dizer
amar? Quando dizem que amam seus pais, o que é que significa isso? Vocês se
sentem seguros com eles, sentem-se à vontade com eles. Seus pais os estão
protegendo, eles lhes dão dinheiro, abrigo, alimento e roupas, e vocês têm, com
respeito a eles, uma sensação de relação íntima, não é verdade? Vocês também
sentem que podem confiar neles — ou talvez não. Provavelmente vocês não falam
com eles tão fácil e alegremente como o fazem com seus amigos. Mas os
respeitam, são guiados por eles, obedecendo-lhes, sentindo que deverão
apoiá-los quando eles forem velhos. Eles, por sua vez, os amam, desejam
protegê-los, guiá-los, ajudá-los — ao menos assim o dizem. Eles desejam
fazê-los casar para que levem uma chamada vida moral e fiquem fora de
problemas, para terem um marido que cuide de vocês, ou uma esposa que cozinhe
para vocês e que crie seus filhos. Isso tudo se chama amor, não é?
Não podemos dizer de imediato que é o
amor, porque o amor não é facilmente explicável por meio de palavras. Isso
não nos vem facilmente. Entretanto, sem amor, a vida é estéril; sem amor, as
árvores, os pássaros, o sorriso dos homens e das mulheres, a ponte do rio, o
barqueiro e os animais não têm sentido. Sem amor, a vida é como um lago vazio.
Num rio profundo há riqueza e muitos peixes podem viver; mas o charco é logo
seco pelo forte calor do Sol, e nada resta, salvo, lama e sujeira.
Para a maioria de nós, o amor é uma
coisa extraordinariamente difícil de entender porque nossas vidas são muito
vazias. Queremos ser amados, e também queremos amar, e por trás dessa palavra
há um medo oculto. Então, não será importante para cada um de nós descobrir o
que é realmente essa coisa extraordinária? E só podemos descobrir isto se
tivermos consciência de como consideramos os outros seres humanos, de como
olhamos para as árvores, para os animais, para um estranho, para o faminto.
Temos que ter consciência de como encaramos nossos amigos, de como consideramos
nosso guru, se tivermos um, de como consideramos nossos pais.
Quando vocês dizem, "Amo meu pai
e minha mãe, amo meu guardião, meu professor", o que isto significa?
Quando vocês respeitam alguém tremendamente, e o consideram, quando acham que
devem obedecer-lhes e esse alguém, por sua vez, espera obediência de
vocês, será isso amor? O amor será apreensivo? Certamente, quando vocês
consideram muito a alguém, também desconsideram muito alguma outra pessoa, não
é? E será isso amor? No amor haverá alguma sensação de consideração ou
desprezo, alguma compulsão para obedecer os outros?
Quando vocês dizem que amam alguém,
não dependem interiormente dessa pessoa? Enquanto forem crianças, naturalmente
dependeram de seus pais, de sua professora, de seus guardiões. Eles precisam
cuidar de vocês, alimentá-los, vesti-los e abrigá-los. Vocês precisam ter a
sensação de segurança, a sensação de que alguém está cuidando de vocês.
Mas o que acontece geralmente? À
medida que vocês crescem, essa sensação de dependência continua a existir, não
é verdade? Já não a observaram em pessoas mais velhas, em seus pais e
professores? Notaram como eles ainda dependem emocionalmente de suas esposas ou
maridos, de seus filhos ou de seus próprios pais? Quando cresce, a maioria das
pessoas ainda continua apegada a alguém; continua a ser dependente. Se não
tiverem alguém em que se apoiar, que lhes dê a sensação de conforto e
segurança, as pessoas se sentem sós, não é assim? Elas se sentem perdidas.
Essa dependência que temos em relação aos outros é chamada de amor; mas se
vocês observarem isso de perto, verão que dependência é medo, e não amor.
A maioria de nós tem medo de ficar
só; tem medo de pensar por si, medo de sentir profundamente, de explorar e
descobrir todo o significado da vida. Por isso essas pessoas dizem que amam a
Deus, e elas dependem daquilo que chamam Deus; mas não é Deus, o desconhecido,
é algo criado pela mente.
Fazemos o mesmo com um ideal ou uma
crença. Acredito em alguma coisa, ou entrego-me a um ideal, e isso me dá grande
conforto; mas removam o ideal, removam a crença e eu estarei perdido. Ocorre o
mesmo com o guru. Eu dependo porque quero receber, é então que há a dor do
medo. É também isso o que ocorre quando vocês dependem dos pais ou dos
professores. É natural e é certo que isso ocorra quando vocês são jovens; mas
se continuarem dependendo depois de maduros, isso os tornará incapazes de
pensar, de ser livres. Onde há dependência há medo, e onde há medo há
autoridade, não amor. Quando seus pais dizem que vocês precisam obedecer, que
devem seguir determinada tradição, que devem apenas aceitar um certo emprego ou
só desempenhar uma certa qualidade de trabalho — em nada disso há amor. E não
há amor em seus corações quando vocês dependem da sociedade no sentido de
aceitarem a estrutura da sociedade tal qual ela é, sem discutir.
Homens e mulheres ambiciosos não
sabem o que é o amor — e nós somos dominados por pessoas ambiciosas. Eis aí
porque não há felicidade no mundo e porque é muito importante que vocês, à
medida que crescem, vejam e compreendam tudo isto, e percebam por si mesmos se
é possível descobrir o que é o amor. Vocês podem ter uma boa posição, uma casa
excelente, um maravilhoso jardim, roupas; podem tornar-se primeiros-ministros;
mas, sem amor, nenhuma dessas coisas terá sentido algum.
Portanto, devem começar a descobrir
agora — não esperar até serem velhos, porque então nunca descobrirão — o
que é que realmente sentem em seus relacionamentoscom seus pais, com seus
professores, com o guru. Vocês não podem meramente aceitar a palavra
"amor" ou qualquer outra palavra, mas devem ir além do sentido das
palavras para ver o que é a realidade — sendo a realidade aquilo que realmente
se sente e não o que se supõe sentir. Se vocês efetivamente se sentem
ciumentos, ou irados, dizer "não devo ser ciumento, não devo me irar"
é meramente um desejo, não tem realidade. O que importa é ver, com muita
honestidade e clareza, o que é que estão sentindo no momento, sem trazer à
baila o ideal de como deveriam sentir ou como sentirão em data
futura, pois poderão então fazer algo a respeito. Mas dizer: "Eu devo amar
meus pais,devo amar meus professores" não faz sentido, faz?
Porque seus verdadeiros sentimentos são muito diferentes, e essas palavras se
tornam uma cortina atrás da qual vocês se escondem.
(...) O que importa é ir além da
palavra "amor" para ver se vocês realmente amam seus pais e se seus
pais os amam realmente. Sem dúvida, se vocês e seus pais realmente se
amassem, o mundo seria inteiramente diferente. Não haveria guerras, não haveria
fome, não haveria diferença de classes. Não haveria ricos e pobres. Vejam bem,
sem amor nós procuramos reformar a sociedade economicamente, tentamos corrigir
as coisas; mas enquanto não tivermos amor em nossos corações não poderemos
criar uma estrutura social livre de conflito e de miséria. Aí está por que
temos de esmiuçar essas coisas cuidadosamente; e, talvez, então, venhamos a
descobrir o que é o amor.
Krishnamurti em, O VERDADEIRO
OBJETIVO DA VIDA
Fonte:http://pensarcompulsivo.blogspot.com.br/2014/09/o-medo-da-solidao-e-desamparo-e-o-que.html
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