Espelhos Partidos
Para
entender a América Latina é preciso voltar no tempo como fiz em um dos meus
livros, “América Latina – em busca do paraíso”. Constatar, tomando emprestada a
expressão do genial pensador espanhol, José Ortega y Gasset, nossa “embriogenia
defeituosa”. E, apesar das diferenças entre a colônia portuguesa e as colônias
espanholas entender que origens coloniais fizeram igualmente de nós sociedades
invertebradas.
Afinal
não tivemos como na “Espanha invertebrada” de Gasset “a comunidade de
propósitos” que faz com que grupos integrantes “convivam não por estar juntos,
mas sim por fazer algo juntos”. Ao mesmo tempo, nossas sociedades desiguais, o
isolamento entre as camadas sociais, a falta de “minorias seletas” que
comandassem o processo emancipatório, a inexistência do espírito associativo
substituído pela vivência do pequeno mundo familiar ou clânico gerarão o
desequilíbrio estrutural cujas manifestações mais graves até hoje sentidas são:
o atraso econômico, a mentalidade do atraso, o autoritarismo, o paternalismo, o
clientelismo, o nepotismo, o patrimonialismo e a corrupção
endêmica.
No
nosso subdesenvolvimento político e econômico somos envolvidos por um sentimento
estranho, a um tempo de altivez e de inferioridade, sendo que preferimos
descarregar nossa frustração em possíveis culpados utilizando, inclusive, a
equivocada fórmula que diz que uns são pobres porque outros são ricos. Assim,
culpamos especialmente os Estados Unidos por nossas mazelas e fraquezas. Só nos
esquecemos de perguntar o que fizemos a nós mesmos.
Fatos
recentes ocorridos em nosso país e na América Latina demonstram que as
características acima apontadas permanecem, pois fazem parte de uma cultura
plasmada ao longo dos séculos. E aqui me refiro à cultura no sentido do complexo
de valores, atitudes e comportamentos.
Um
desses fatos foi a visita da corajosa dissidente cubana, Yoani Sanchez, que
enfrenta a tirania dos irmãos Castro pedindo liberdade e democracia para seu
país. Isto tem um preço na Cuba totalitária e Yoani o tem pagado com prisão e
tortura. Entretanto, suas armas não são as armas assassinas de Fidel Castro, mas
palavras postadas no seu blog.
Pois
bem, a mando do embaixador de Cuba, Carlos Zamora Rodriguez, que contou com o
apoio do governo brasileiro, calunias e difamações foram divulgadas contra a
moça pela REDEPT13. Note-se que hipocritamente petistas costumam falar em
direitos humanos e democracia. Ao mesmo tempo, Yoani foi perseguida por
grupelhos agressivos de perfeitos idiotas brasileiros. Eles foram uma espécie de
milícia fascista à moda Mussolini e Chávez, e exerceram feroz intimidação que
associa truculência, ignorância, fanatismo.
Os
jovens que ajudaram fazer do Brasil um satélite de Cuba são portadores da mesma
idiotice analisada por Plinio Apuleyo de Mendoza, Carlos Alberto Montaner e
Álvaro Vargas Llosa no “Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano”. Essa
“doença”, segundo Mario Vargas Llosa, que fez a apresentação do livro, não é a
congênita, mas tem outra índole: “É postiça, deliberada e eleita, se adota
conscientemente por preguiça intelectual, modorra ética e oportunismo civil”. “É
ideológica e política, mas acima de tudo, frívola, pois revela a abdicação da
faculdade de pensar por conta própria”.
Outro
fato marcante na América Latina foi a morte de Hugo Chávez, típico tiranete
populista latino-americano que levou algum benefício aos pobres através de
caridades oficiais, mas destruiu a economia venezuelana. Chávez, ao se perpetuar
no poder foi uma fraude democrática. Ele subjugou o Legislativo, o Judiciário e
o Exército, impôs a censura dos meios de comunicação, perseguiu seus opositores
de maneira implacável.
Até
sua morte, que não se sabe quando ocorreu realmente foi envolvida numa
rocambolesca e misteriosa farsa a cargo do sucessor por Chávez ungido para dar
continuidade ao governo, Nicolás Maduro. Este mentiu o que pode, inventou
lorotas, falou em mumificação do chefe e ocupou o cargo de presidente
inconstitucionalmente. Agora está em campanha e certamente vai se eleger para
que Chávez continue a governar do além.
O
PT deve ter uma ponta de inveja do companheiro Chávez porque não conseguiu
alcançar a radicalização venezuelana. Porém, está a caminho. Dilma, a sucessora
ungida por Lula é presidente e candidata. Portanto, ela tem a canetae os
recursos materiais das bondades, além dotempo que desejar na mídia. Um poder que
os demais candidatos não dispõem o que dificulta
enfrentá-la.
Ah,
sim, e pela primeira vez foi eleito um Papa latino-americano. Dilma disse que
ele é normal (?), e que Deus é brasileiro. Desconfio que seja argentino, pois
elegeu um Papa da Argentina. Talvez, o diabo seja brasileiro, pois a presidente
em campanha jurou que vai fazer o diabo.
E
assim vamos nós, sociedades em busca de si mesmas, tão parecidas entre si por
serem os fragmentos de um espelho partido.
*Maria Lucia Victor Barbosa é socióloga. www.maluvibar.blogspot.com.br - mlucia@sercomtel.com.br
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