XILOGRAVURAS IMPRIMEM MARCAS DE PERSONALIDADE NA CASA E CONQUISTAM ESPAÇO



Xilogravuras imprimem marcas de personalidade na casa e conquistam espaço

Técnica milenar de xilografia ganha força na decoração de imóveis. Especialistas dão dicas de como usá-la sem exagero em vários ambientes e dar destaque de peça artística.

Técnica milenar de xilografia ganha força na decoração de imóveis. Especialistas dão dicas de como usá-la sem exagero em vários ambientes e dar destaque de peça artística.

O artista plástico Rogério Fernandes faz xilogravura em quadros e em várias tipos de peças para casa, como luminárias, pratos e copos. Preços variam de R$ 35 a R$ 2,5 mil  (Eduardo Almeida/RA Studio)
O artista plástico Rogério Fernandes faz xilogravura em quadros e em várias tipos de peças para casa, como luminárias, pratos e copos. Preços variam de R$ 35 a R$ 2,5 mil

Surgidos a partir de uma matriz de madeira, os traços firmes da xilogravura deixam, como um carimbo, as marcas de tinta no papel. Originada no Oriente, esta arte milenar começou a ter destaque no Brasil através dos folhetos de literatura de cordel do Nordeste e, hoje em dia, atrai a curiosidade de cada vez mais pessoas. Agora, fortalecendo a valorização dos elementos regionais no mundo da decoração, a xilogravura ganhou a casa, e conquista espaço em quadros, estampando almofadas e cerâmicas, ou aplicada em diversos outros tipos de adornos e itens domésticos.

Por abrir o leque de possibilidades múltiplas - já que a mesma figura pode ser impressa diversas vezes pela matriz de madeira -, para o arquiteto Hélio Albuquerque a xilogravura se transforma em uma alternativa muitas vezes mais acessível para quem quer ter uma obra de arte na parede, mas não pode para isso investir uma alta quantia, o que de maneira alguma desqualifica ou desmerece a obra, apenas a torna mais tangível, ressalta o profissional. “A primeira coisa que vem à cabeça ao pensar em xilogravura é seu uso como quadros emoldurados na parede, mas sua aplicação pode ir além. Pode-se ter painéis, tecidos para revestimento, papéis de parede, onde a técnica pode ser usada em grandes formatos. A criatividade não tem fim”, salienta Hélio.

 
 - Eduardo Almeida/RA Studio






Para Albuquerque, uma xilogravura não entra como um elemento único em uma proposta de decoração, uma vez que a harmonia do ambiente está na composição de tudo que ali se encontra. “O primeiro passo é definir o contexto e de onde vai partir o espaço. Daí, os componentes vão surgindo. Com a xilogravura não é diferente. Ela precisa ser pensada de forma voltada ao ambiente. Trata-se de uma escolha e, como tal, deve estar em sintonia com o todo”, frisa. O arquiteto lembra que, com valor agregado ou apenas decorativa, a xilogravura é sempre uma expressão de arte e, assim, tem uma função definida em qualquer lugar onde é inserida.
A designer de interiores Sheila Mundim diz que técnica demanda um projeto de decoração sem exageros para valorizar os produtos (Eduardo Almeida/RA Studio)
A designer de interiores Sheila Mundim diz que técnica demanda um projeto de decoração sem exageros para valorizar os produtos

Na opinião da designer de interiores Sheila Mundim, a harmonia de um conceito de decoração com a utilização de xilogravuras requer ambientes cleans com tons nudes, sem excessos, deixando o destaque voltado para a obra que, por si só, já vem recheada de informações. Segundo Sheila, para se alcançar um resultado mais clássico ou contemporâneo no projeto, é possível carregar na quantidade de adornos, ou eleger pontos estratégicos para sua utilização; apostar em um mobiliário com linhas sinuosas, ou optar por um desenho mais reto; explorar as cores, ou utilizá-las de forma moderada. “Enfim, tomar decisões baseando-se nos estilos e suas características”, acrescenta.
Com traços marcantes, as xilogravuras conferem ao ambiente uma atmosfera descontraída, e ao mesmo tempo notável, segundo Sheila Mundim, descrevendo algo que aconteceu, sempre acompanhadas de uma história. “Apesar de as xilogravuras serem um tanto rebuscadas, as vejo, na decoração, como um elemento chave, pois, além de não interferir significativamente nos ambientes, acabam por produzir harmonia em seu entorno”. Para a designer, o público que aprecia xilogravuras é bastante diversificado. “Acredito que não há idade nem classe para gostar. Todos têm uma história para ser contada”.

DIVERSIDADE

A xilogravura atende de forma vasta a decoração, pois as possibilidades de aplicação são inúmeras, indo desde pequenos detalhes e utensílios até grandes cenários, de acordo com a arquiteta Valéria Alves. Ela pode estar basicamente em todos os ambientes, e ser especificada em adesivos, tecidos, papéis, cerâmicas, vidros, porcelanas, entre outros, ressalta a profissional. “A xilogravura aplicada em tecidos pode se transformar em almofadas, cortinas, luminárias, jogos americanos, etc. Sua utilização em papel ou cerâmica pode revestir paredes, como quadros ou em adesivos, por exemplo. Ela pode fazer parte de um ambiente clássico, rústico ou mesmo contemporâneo, escolhendo bem os tipos de peças”.

Como explica Valéria Alves, a presença da xilogravura na decoração começa com a maior valorização da arte popular brasileira e do que é regional, que vem acontecendo nos últimos anos com maior divulgação e incentivo. “Cada artesão caracteriza seu trabalho de acordo com sua cultura, narrando imagens da vivência pessoal diária”. De acordo com Hélio Albuquerque, não existe uma situação específica para que os elementos da arte e artesanato popular sejam inseridos na decoração, já que os projetos são feitos para se adequar ao gosto do cliente. “Temos que avaliar todo o contexto que envolve esse processo. A origem e os hábitos de um cliente devem ser levados em consideração na hora de decorar”, explica. Hélio acrescenta que é possível decorar com peças regionais sem transformar o ambiente em um conjunto temático. “A arte popular é extremamente rica e possui elementos de absoluto bom gosto, às vezes até muito sofisticados por sua concepção e abordagem. Saber inserir objetos e adornos em uma decoração, sem que se torne um espaço temático, é um trabalho que exige experiência profissional e olhar crítico de quem o faz”, constata.

Valorização cultural

Os elementos regionais, usados com bom senso, humanizam os ambientes, pois trazem aspectos da cultura de uma comunidade, além de reforçarem traços da identidade do morador da casa, segundo as arquitetas Fabianna e Michelle Manzur. “Em geral, dão um toque bem particular, que pode ser rústico, elegante e até divertido. Ambientes neutros e impessoais ganham vida com a peça regional apropriada. Sendo únicas, artesanais, feitas com materiais naturais, elas amenizam as linhas retas do mobiliário e conferem ao ambiente uma sensação de aconchego”, explica Fabianna.

As profissionais acreditam que, quanto mais industrializados vão ficando os objetos de uso diário, mais as pessoas sentem necessidade de terem peças artesanais. “É como se precisassem humanizar o ambiente. Sentem falta de algo que personalize, que conte uma história, seja de uma região, de uma viagem, de um personagem ou que represente algo de si próprio”, esclarece Michelle.


 (Eduardo Almeida/RA Studio)

Em Belo Horizonte, o artista plástico Rogério Fernandes tem um belo trabalho que gira muito em torno da xilogravura. Além dos quadros e gravuras, ele criou toda uma linha de objetos para a casa com inspiração nesta arte, que está disponível para venda em seu ateliê no Sion, região Centro-Sul da capital. Nascido no Piauí, Rogério conta que sempre foi apaixonado pela literatura de cordel. “Ainda criança, meus pais nos levavam para as feiras de domingo, no Nordeste, onde os cordéis eram vendidos. O desenho simples, marcado e estilizado me chamava atenção. Quando cresci e fui estudar gravura, me reencontrei com os cordéis e percebi que o estilo lembrava em muito meus desenhos. Então resolvi fazer uma releitura, juntando o meu estilo de desenho com o movimento cordelista brasileiro”.

Na galeria e no ateliê, Rogério produz copos, pratos, luminárias, garrafas, lenços, estandartes, esculturas, moleskines, travessas, camisetas, adornos e até pinguins de geladeira estampados com xilogravuras, para citar apenas alguns exemplos. Os preços variam entre R$ 35 e R$ 2,5 mil. Sobre o processo de produção, ele conta que a matriz é criada na forma tradicional (xilo) ou desenhada em papel, e então é digitalizada e colorizada. “Cada objeto receberá um tratamento e uma produção diferenciada, visando sempre qualidade, durabilidade e estética. A partir do protótipo pronto, defino a quantidade de produção de cada objeto. É importante frisar que eles são criados para pequenas escalas e sua fabricação é limitada. Um produto nunca atinge a marca de mais de 100 reproduções. São objetos assinados e exclusivos, como uma obra de arte, mas com preço de objeto de decoração. Esta é grande vantagem”, acentua o artista.

 

Quando se faz uma matriz de xilogravura, isto é, um entalhe na madeira, esta superfície, além de imprimir um trabalho em papel, sua função inicial, pode virar um lindo tampo de mesa, mesa de centro, aparador ou estante, enumera Rogério Fernandes. Para se ter harmonia no projeto arquitetônico usando xilogravuras, para o artista basta ter senso estético. “A técnica é ilimitada e bem abrangente. Gosto muito de trocar ideia com o decorador ou o arquiteto. Sempre saem resultados maravilhosos quando juntamos experiências, e quem ganha é o cliente e o ambiente, que adquire uma atmosfera minimalista e figurativa ao mesmo tempo”. As peças de Rogério retratam seu próprio universo, sua obra. “O ser humano, a mulher como personagem simbólico principal e o realismo fantástico onde o sagrado e o profano se misturam. Enfim, onde tudo é possível para a imaginação de um artista nordestino com alma de mineiro”.

O jornalista, pesquisador e colecionador de xilogravuras Jeová Franklin conta como a arte despertou a importância da cultura popular no Brasil. Segundo ele, foi em Pernambuco, por causa do interesse do pintor Ivan Marquetti pelas gravuras de J.Borges, que ilustravam os folhetos de cordel, que a xilogravura ganhou os novos formatos que hoje são usados para decorar residências. De acordo com Franklin, a partir deste episódio, em 1970, a xilogravura ganhou repercussão. “Ele [Ivan Marquetti] foi a Bezerros (PE) e falou para o J.Borges que queria as gravuras maiores que a capa de cordel. E foram feitas algumas para o Ivan, que depois levou para o Ariano Suassuna. Ariano, quando viu, ficou entusiasmado e reuniu os jornalistas que estavam no Recife e disse ‘vejam a maravilha da arte popular!’”, relata.

SAIBA MAIS




A designer de interiores Sheila Mundim esclarece que o termo “xilo”, em grego, significa madeira. Xilogravura, assim, é uma matriz de madeira que possibilita a reprodução de uma imagem gravada sobre papel ou algum outro material adequado, de forma muito parecida com um carimbo, explica. A técnica é caracterizada por traços grossos e rudes derivados da própria natureza da madeira, tendo como principal característica a reprodução. O conhecimento acerca da xilogravura vem desde o século 6 e, no Ocidente, ela se firma durante a Idade Média, explica o arquiteto Hélio Albuquerque. No Brasil, a técnica chegou trazida pelos Portugueses, acrescenta Valéria Alves. “Na região Nordeste do Brasil, estão os mais populares xilogravadores, e através da xilogravura foi possível viabilizar o processo de impressão de ilustrações”. Com origem chinesa, esta arte milenar ganhou visibilidade no país por meio dos folhetos da literatura de cordel nordestina, diz Sheila Mundim. “Hoje, desperta o olhar de uma classe média brasileira, em busca de uma obra de arte com preço acessível, que não precisa ser única”.

Fonte:http://estadodeminas.lugarcerto.com.br/app/noticia/decoracao/2013/02/17/interna_decoracao,46963/

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