WILD WILD COUNTRY - UM DEBATE ENTRE AMIGAS SOBRE O DOCUMENTÁRIO DA NETFLIX SOBRE RAJNEECH DEPOIS CONHECIDO COMO OSHO

  Osho e Sheela

OSHO E SHEELA EM RAJNEESHPURAM, NA PRIMEIRA METADE DA DÉCADA DE 1980.


WILD WILD COUNTRY – Um debate entre amig@s sobre o documentário da Netflix sobre Rajneesh (depois conhecido como OSHO), a comuna de Rajneeshpuram no Oregon (Estados Unidos). Sensacionalismo policialesco? Recorte documental de alta qualidade? Ou ambos?

Wild Wild Country é um documentário em seis capítulos da Netflix sobre o controverso guru indiano Bhagwan Shree Rajneesh (Osho), sua antiga assistente pessoal Ma Anand Sheela e seus seguidores mais próximos na comunidade de Rajneeshpuram, criada na primeira metade da década de 1980 ao lado da pequena cidade de Antelope no Condado de Wasco, Oregon, Estados Unidos. Foi lançado em 16 de março de 2018 após estrear no Sundance Film Festival. Dirigido por Maclain Way e Chapman Way e produzido por Juliana Lembi, “Wild Wild Country” suscita debates intensos nas redes sociais e, no entanto, quase a totalidade das reportagens da mídia tradicional se atêm apenas no recorte documental escolhido pelos diretores e numa espécie de sensacionalismo judaico-cristão que define os sannyasins (discípulos de Osho) como fanáticos seguidores de uma “seita”.

Tem sido muito difícil encontrar nas mídias digitais as opiniões, as vozes, as interpretações de quem foi ou de quem é sannyasin. Ainda que o documentário tenha como protagonistas alguns deles (que deixaram a comunidade ou que ainda mantêm o sannyas), não se vê nas reportagens recentes as opiniões de seguidores de Osho. Por isso, decidi compartilhar uma conversa que tive no meu perfil pessoal de Facebook, neste maio de 2018, com amigos e amigas que são ou foram da comunidade.

Eu postei em 17 de maio de 2018 às 2h41:

“Terminei nesta madrugada os 6 longos episódios (mais de 1h10min cada um) da série documental da Netflix ‘Wild Wild Country’ sobre o experimento da comunidade sannyasin no estado do Oregon, na primeira metade dos anos 1980. Fiz, dias atrás, um post muito emocionalmente mobilizado depois de assistir pouco mais de 2 horas (um capítulo e meio). Ainda quero muito ouvir amigas e amigos queridos que integram ou já integraram a comunidade, mas a minha primeira (e ainda precária) conclusão é de que não tem cabimento invalidar essa fantástica série documental sem ter visto até o último minuto do último episódio.Espero pela finalização do livro do homem que foi o advogado pessoal de Bhagwan Shree Rajneesh e o último prefeito da cidade criada no Oregon. Considero desde já (ignorante que era e que sou) Ma Anand Sheela uma das figuras femininas mais notáveis do século XX – num patamar talvez superior ao de Lou Salomé em sua amizade e colaboração com Nietzsche, Freud e Rilke. Com humildade, e como homem que estudou e foi forjado profissionalmente na indústria cultural da televisão, me reconheço tocado e influenciado pela narrativa audiovisual. Mas também tocado pela grande dimensão humana das pessoas que protagonizam esse documentário. Portanto, gente, acho que Wild Wild Country cumpre e cumprirá um papel importante na difusão, mesmo que pelo viés mais polêmico e escandaloso, dos ensinamentos de Osho. E aqui fica um aceno e um convite para falar presencialmente disso a amigos e amigas (Sérgio Katia) que têm neste momento um sentimento ou uma abordagem mais crítica em relação a esse produto de mídia. Nada que leio na mídia digital, por mais elaborado que seja o texto, se aproxima da experiência dos meus amigos e da minha própria experiência de vida com os ensinamentos e as técnicas difundidas por Osho e os sannyasins.”

[Aqui o link]

Depois de alguns breves comentários de queridos amigos simpáticos ao meu post, começa o debate:

INÊS BERTI: “Bom isso Henri Figueiredo. Osho foi um mestre que mexeu exatamente nesta ferida judaico-cristã que temos, que diz que um mestre tem que andar de pés descalços e etc e tal. Ele foi controverso sim, e nunca escondeu seu lado humano com todas as fraquezas que isto acarreta. Gostei dos episódios, mas acho que foi apenas a parte folhetim americano que apareceu, nada sobre o imenso legado sobre auto transformação, terapias e meditação que ele proporcionou e que ainda são tabus hoje em dia. Conheci uma pessoa que foi ao Oregon e a visão dela era muito maior que isto. Basta ver o depoimento do Niren (advogado), pra ver como era e é a vida de muita gente antes e depois de conhecer-se melhor através de tudo o que Osho trouxe. Eu e Eduardo Krug estivemos em Poona em 1998 de foi algo muito transformador em todos os sentidos na nossa vida. Eu tb tive um impacto muito negativo quando cheguei lá, mas fui literalmente dobrada ao avesso pra poder me entregar a mim mesma e quebrar este conceitos tão arraigados que temos aqui no ocidente. Todas as terapias que fiz a partir disso foram legados maravilhosos trazidos por ele. Lá em 98 o centro de Poona já tinhas terapias de ponta que agora estão chegando aqui. Osho dizia que a nossa mente ocidental judaica-cristã é muito dura e fechada, assim como nosso corpo, preconceitos, etc. e que é necessário mexer profundamente nisso para que cheguemos à meditação. E tudo que o mundo capitalista proporciona pode ser usado para beneficiar as pessoas de um jeito muito maior que apenas o consumismo material. Lá em Poona, por exemplo, eles recuperaram um lixão imenso e fizeram um super parque que agora tem águas limpas, vegetação recuperada, animais, e é usado pelos visitantes do asharam e aberto a toda a população. Um trabalho lindo de ver e assim muitas outras coisas. Tenho a dizer que fui muito crítica tb em relação a tudo isto, mas tenho que admitir que foram as melhores coisas que me aconteceram na vida e se me sinto uma pessoa melhor e mais conectada devo a esta maravilhosa senda.”

SÉRGIO VELEDA, ao seu melhor estilo, põe lenha na fogueira e sobem as labaredas:

“Sheela era uma psicopata, fria, não gostava de meditar. Mas como os psicopatas, era ousada, empreendedora, vivamente ativa, rebelde. Foi ela com sua determinação quem criou a comuna no Oregon (EUA) e levou Rajneesh para lá. Eles foram além da conta pois uma sensação de que “somos os melhores”, uma clara atitude narcisista coletiva, afrontou uma comunidade careta, pacata, limitada, em um confronto exagerado e desnecessário. Poderia ser de outro modo mas foi excessivamente confrontadora com aquela gente naquele fim de mundo. O projeto de ajuda ao mendigos de rua não foi nem de perto um gesto caridoso, mas intencional, maquiavélico, com um interesse político. Em poucas palavras eu acho que os sannyasins sempre se acharam especiais, do tipo “somos os melhores”. De fato parte disso era verdade, mas não completamente. Os sannyasins alemães que coordenavam o ashram na Índia, no começo, eram muito meticulosos e faziam tudo com grande qualidade. Sheela era exigente e queria o melhor para Rajneesh. Tudo era feito com esmero, qualidade, precisão. Nem mesmo a comunidade de Esalén na Califórnia, que também representou um renascimento cultural, humano e terapêutico chegou a dimensão do trabalho dos sannyasins. Até hj ninguém fez nada parecido. Não estou nem falando no trabalho de vanguarda de Osho, que foi um dos poucos guias que conseguiu fazer uma das melhores síntese entre Oriente e Ocidente, de Freud, Jung, Reich à Buda, Ramana, Lao Tzu… No Brasil eu participei ativamente do movimento nos anos 80. Tomei o discipulado, pratiquei muita meditação ativa, muitos grupos, fortes, de confrontos, que unia Gestalt, Psicodrama, Reich; corpo, sexualidade, meditação, silêncio. Rajneesh era um pai permissivo. Rajneesh falava de um lugar muito alto. Não é possível compará-lo facilmente com algum outro, pois era de uma inteligência rara e uma visão amplificada. Daí que os discípulos no nível inferior de consciência que viviam acabavam por tomar ao seu modo o que dele ouviam. Ficaram conhecidos por uma rebeldia única. Mas tinha muito psicopata no meio. Muito mesmo. Vi, vivi, ouvi, coisas do absurdo e do inimaginável. Mas não eram falsos. E o dizer e fazer a verdade também se tornava agressivo, insensível, psicopático também. Perdão pelo comentário longo Henri Figueiredo. Por fim, acho que merecia esse documentário ser visto de outro ângulo; desde a contribuição dada por Rajneesh ao mundo. Ele ficou tão famoso que virou confusamente literatura de auto-ajuda. Moda mercantil da espiritualidade New Age. Mas o documentário ao nível do Netflix cai no sensacionalismo policialesco. O documentário só é interessante para se saber que existia ao final, e todo mundo sente ao vê-lo, algo maior que não foi contado em termos da contribuição de Osho. Agora falo Osho pois me relacionei com o Rajneesh muitos anos. Faltou algo importante!!!! Que os EUA envenenaram Osho, como no passado já tinham matado Wilhelm Reich na prisão.”

EVÂNIA REICHERT pondera e aponta o que, talvez, seja a grande falha da série documental da Netflix:

“Eu gostei muito de ver. Assistimos tudo, uma parte atrás da outra. Estava certa que em algum momento também seria abordado o inovador trabalho que Osho aportou ao mundo terapêutico, além dos caminhos espirituais propostos por ele. Quando terminou a última parte, senti uma indignação, pois o filme mostrou apenas uma parte da história. Nada, absolutamente nada, foi dito do grande trabalho, muito bem descrito por Sérgio, acima, que nasceu desta incubadora criativa. Se 20% do documentário remetesse a este ponto, seria quase uma obra prima documental. Mas… faltou uma parte importante, essencial, ao meu ver. Para os quem nada sabem do tema, ver esse documentário constrói uma ideia muito equivocada do assunto. Pessoalmente, nunca me envolvi com Osho diretamente, pois na época estava na luta política e cultural. Eu tinha total identidade com Reich, que unia o caminho do autoconhecimento com a sociologia. Reich era um homem de esquerda e libertário em todos os sentidos, pessoais e sociais. Eu não tinha qualquer alinhamento ideológico com os sannyasins, mas compartilhava os mesmos anseios de liberdade criativa, o confronto à caretice pseudo-moralista da época e os inovadores trabalhos psico-corporais. Eu não gostava de muita coisa que via em alguns grupos, em raros momentos de convívio, tais como condutas antiéticas, veneração compulsiva por mestres, mas especialmente não aceitava verdadeiros abusos de toda ordem em nome da “liberdade”. Mas… friso, já na época, eu sabia que nada disso tinha a ver com Osho, mas com as pessoas e seus equívocos e suas projeções e distorções. Mesmo não me enturmando com os grupos que cruzei – talvez pudesse ter sido diferente se cruzasse por outros grupos, em outro lugar – sempre achei genial e ainda hoje muito aprecio o que nasceu deste movimento em termos de recursos terapêuticos, música e arte. Todas as coisas de Osho são bem feitas, revelando genialidade, inteligência, muita criatividade, grande talento, inovação. É uma maravilha o que esse grupo de seguidores de Osho produziu em termos de música, arte e terapias inovadoras. É realmente impressionante. É genial. O fato de nada disso ter sido sequer citado no documentário é um erro grave. Teria sido genial, histórico, de grande contribuição. Faltou pouco, mas esse pouco é o grande feito de Osho.”

INÊS BERTI:

“Também achei isto. Fiquei esperando q documentassem tb a parte mais fundamental do legado dele mas… como digo foi apenas um folhetim policialesco bem a gosto norte-americano.”

KATIA MARKO:

“Concordo com o Sérgio e a Evania em suas análises. Eu não vivi esta época. Fui ler o primeiro livro do Osho em 1991 e me apaixonei. Sou sannyasin desde 2003, a partir da minha experiência terapêutica no Namastê. Vivo há 10 anos com minhas filhas e mais 80 amigos na Comunidade Osho Rachana. E essa é a minha experiência e ligação com o Osho, que sim foi um rebelde que não carregava bandeiras. Ele construía e desconstruía. Era controverso, provocador e colocava o dedo na ferida. Não se identificava a nenhum ‘ismo’. Acreditava profundamente no ser humano e no seu desenvolvimento através do amor! Espero que esse debate sirva para resgatamos o seu verdadeiro legado ao mundo, assim como o de Reich, tão necessários para esse estado de coisas que estamos vivendo no mundo.”

RAMONA BARCELLOS:

“Queridos, obrigada! Estou adorando acompanhar os relatos e pontos de vista de vocês! A questão documental é a que mais refleti no decorrer dos episódios. Eu conhecia pouco da história toda. Então de certa forma com a minha ignorância seria mais fácil cair em certas armadilhas. Por isso permaneci muito atenta aos detalhes e truques de audiovisual (que acabei aprendendo quando trabalhei com audiovisual nessa minha vida profissional nômade) usados pra emocionar, tendenciar e levar o espectador. E de cara isso me incomodou muitoooo pois passei a assistir desconfiada, fica escrachado que estavam “limpando” a imagem de Sheela. Não sei quem exatamente encomendou esse documentário, mas é visível que foi encomendado e com um propósito bem distinto ao de mostrar o trabalho maravilhoso do Osho/Rajneesh. Mas admiro a grandiosidade do que eles (Sheela) fizeram. É grandioso e assustador.”

MARCO FILIPIN:

“Sérgio Veleda, faço minhas suas palavras. Tomei sannyas em 89. Osho virou minha vida é um ser louco e indomável. A frente de todos. Sheela não meditava. Era obstinada pelo poder e ciumenta. Osho disse se ela não estivesse perto dele, seria um novo Hitler.”

KATIA MARKO:

“(…) o Namastê vai exibir o filme “Caminho do Coração” sobre a construção da Comuna do Oregon. https://www.facebook.com/events/1603541766425155/?ti=cl \”

EU CONCLUO neste post:

E você? Já viu o documentário? O que achou deste rápido bate-papo? Espero teu comentário.

E pra não dizer que nada que li me pareceu válido, dou o link de um excelente texto de SUSANA ROMANA sobre a série documental “Wild Wild Country” que, apesar de usar o termo ‘seita’ no título, vale a leitura.

Fonte:https://henrifigueiredo.wordpress.com/2018/05/20/wild-wild-country-um-debate-entre-amigs-sobre-o-documentario-da-netflix-sobre-rajneesh-depois-conhecido-como-osho-a-comuna-de-rajneeshpuram-no-oregon-estados-unidos-sensacionalismo-po/

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