BARDO DA REALIDADE: PREPARE-SE PARA USAR O PERÍODO ENTRE ESSA VIDA E A PRÓXIMA PARA ATINGIR A LIBERDADE COMPLETA

  

O que a pessoa vê após a morte? O que acontece com sua consciência?

BARDO DA REALIDADE

Prepare-se para usar o período entre esta vida e a próxima para atingir liberdade completa

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A morte e a experiência do pós-morte não eram temas tabus ou irrelevantes para o meu professor, Tulku Urgyen Rinpoche. Muito pelo contrário, ele frequentemente falava sobre como utilizar a transição entre esta vida e a próxima enquanto uma oportunidade de liberdade total, sobre como usar o bardo de darmata para a realização, e sobre como nos prepararmos para o momento da morte neste exato instante. Realidade, aqui, não se refere à realidade superficial que experienciamos no dia-a-dia, mas à realidade última, darmata, na qual outros tipos de fenômenos acontecem.

Inicialmente, tais fenômenos não possuem qualquer estrutura ou traços reconhecíveis, constituindo-se, por outro lado, de uma exibição espantosa e tremenda – a viagem de ácido suprema. Não é como o céu aberto em um dia sem nuvens: coisas acontecem nesse espaço, e essas coisas são chamadas de sons, cores, luzes.

Tulku Urgyen dizia que os sons comparam-se à explosão simultânea de 100.000 trovões vindos de todas as direções: de cima, de baixo, de todo lugar. As cores são todas as cores do arco-íris, mas com uma intensidade muito superior àquela que normalmente experimentamos nesta vida. Os raios de luz são como agulhas ou espadas pontiagudas, furando todas as coisas. O bardo da realidade é transparente, completamente puro e infinito.

O bardo da realidade é o momento que temos para ganhar maestria sobre o ponto crucial: gerar destemor e assim reconhecer a natureza da mente, que se manifesta como a auto-radiância da cognoscência.

Tal radiância tem três formas, sons, cores e luzes. Frente à sua manifestação, não tenha medo das exibições pacíficas e iradas que surgem: elas são a expressão de você mesmo. Para a maioria das pessoas, essa exibição desprovida de chão, de centro ou de qualquer limite não é nada familiar e parece, portanto, profundamente assustadora. Não há nada no que se segurar, nada com o qual se relacionar como estando aqui ou lá.

Reconheça que esse é apenas o jogo do bardo, Tulku Urgyen dizia, e não tenha medo, não se apavore, não entre em pânico: não tenha medo das cores, não se apavore com os sons e não entre em pânico diante da intensidade dos raios de luz. Desista completamente do medo. É só o jogo de darmata.

Darmata é a natureza da sua mente, a natureza búdica. Em outras palavras, a exibição é o próprio jogo da natureza búdica, sua essência emergindo e se fazendo ver. A mente despreparada fica aterrorizada diante de sua própria natureza, tal qual um asno que se assusta com o roçar do vento na grama seca, e inutilmente tenta escapar.

Aqui, no bardo da realidade, não há mais ninguém além de você – absolutamente ninguém. Ninguém o persegue: trata-se da sua própria sombra, e a sombra é o jogo de darmata. Esse é o ponto mais importante de darmata: reconhecer que tudo o que você experiencia é você mesmo, e não outra coisa ou outra pessoa.

Assim como a sua mão projeta uma sombra quando colocada em frente à luz, não tenha medo da sombra, saiba que ela não é outra coisa além da sua própria mão. Tal entendimento não é necessariamente fácil, principalmente quando as exibições vêm de todos os lados. A terra, o céu, e tudo ao redor são a auto-radiância da cognoscência. Reconheça tudo isso, relaxe nesse reconhecimento, permaneça firme e, desse modo, a liberação é garantida no bardo de darmata.

Como nos preparamos para a exibição impressionante e avassaladora da experiência do pós-morte? Em primeiro lugar, familiarize-se com uma consciência estável: calma, compassiva e clara.

Então, familiarize-se com sua realidade aberta e sem nenhum chão. Especificamente, pratique na transição entre a vigília e o sono e, posteriormente, ao acordar no estado de sonho. A prática de visualização pode ajudar no bardo de darmata, manifestando-se a partir dos três samadis como uma deidade tântrica.

Há também algo que é conhecido como prática tögal, tanto no dia quanto na noite. Por exemplo: sente-se numa sala completamente escura, ou do lado de fora numa noite chuvosa e sem lua, e veja que as estruturas na percepção, os traços reconhecíveis, são todos criados pelos seus próprios pensamentos.

Há ainda mais, entretanto, e a liberação durante o bardo da realidade depende da sua familiarização com sua própria exibição. Por si só, esse entendimento irá ajudá-lo a se livrar do terror, a relaxar na sua natureza e a conquistar a liberdade última. Sobretudo, cultive a familiarização durante essa vida.


Texto originalmente publicado na seção Insights da revista Levekunst Art of Life em 22/06/2017.

Fonte:https://bodisatva.com.br/bardo-da-realidade/

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