Posted: 30 Jun 2022 11:36 AM PDT
Estudo com cães de rua revela que eles nascem prontos para nos
entender.
A milenar e próxima relação entre cães e humanos já foi objeto de
muitos estudos científicos, que revelam que desde os músculos ao redor dos
olhos até a liberação do hormônio ocitocina facilitam a relação dos cachorros
conosco.
Como muitos destes estudos envolveram animais domesticados, criados em casa e minimamente adestrados, fica a dúvida: será que cães de rua reagem da mesma maneira?
A bióloga Anindita Bhadra, do Instituto de
Educação e Pesquisa Científica de Calcutá, na Índia, vem pesquisando há anos
especificamente populações de cães vivendo ao relento — e busca responder essa
pergunta.
Segundo a autora, os cães de rua são
o maior grupo de cachorros no mundo e seu vínculo com os humanos é marcado por
vários fatores, inclusive sociais e econômicos.
Entenda
o teste
O último trabalho de Bhadra e seus
colaboradores foi publicado no periódico Frontiers in Psychology e testou a
reação dos animais de rua a comandos de humanos
desconhecidos. O teste já havia sido feito em outros estudos, mas sempre com
donos de pets.
Ao se depararem com dois recipientes
de comida, os cães de rua escolheram na maioria dos casos aquele para o qual o
humano apontava.
A equipe realizou nas ruas de
cidades da região indiana de Bengala Ocidental um experimento digno do Ig
Nobel, o prêmio que laureia pesquisas científicas engraçadas, e muitas vezes
estranhas. A primeira fase era de familiarização: uma pessoa mostrava a um
cachorro de rua um pedaço de frango cru, que o animal podia cheirar, e depois
esta carne era posta dentro de um recipiente.
Então, o alimento era posto dentro
de um pote, deixando um segundo receptáculo vazio. Um instrutor então entrava
em cena. Sem saber onde a galinha estava, ele apontava para um dos recipientes
no chão. Detalhe: tudo milimetricamente medido, com distâncias
pré-estabelecidas entre os potes, o instrutor e o cachorro. A equipe também
produziu relatórios e filmagens dos experimentos.
Foram testados 120 animais. Destes,
praticamente metade (59) se aproximou de algum dos potes — os outros ficaram
parados ou saíram em outra direção, o que os cientistas associam com um estado
de ansiedade e possivelmente resultado de experiências negativas anteriores.
Dos que se aproximaram, cerca de 80% (47 cães) foram na direção apontada pelo
instrutor, independentemente do que havia lá.
Houve ainda testes com um grupo
controle de 40 animais, para verificar se outras variáveis podem ter influência
na escolha dos potes, o que não foi confirmado — a influência humana foi
evidente. Por isso, a equipe de Bhadra diz que cachorros já nascem capazes de
entender certas ações humanas, mesmo sem treinamento.
"Achamos bastante animador que
os cães conseguissem seguir um gesto tão abstrato como apontar com a mão",
disse Bhadra em um comunicado à imprensa. "Isso significa que eles
observam os humanos com atenção, inclusive aqueles que veem pela primeira vez,
e usam esta compreensão sobre os humanos para tomar uma decisão. Isto mostra a
inteligência e a adaptabilidade destes animais".
'Empatia'
Direito de imagemGETTY IMAGESImage caption
Ao analisar o grupo de cães que se
afastou dos testes, os pesquisadores destacam que "experiências ao longo
da vida podem ser diferentes e ter um impacto significativo no comportamento
dos cães".
"Cães de rua são encontrados na
maior parte dos países em desenvolvimento e vivem sem supervisão humana direta.
Eles interagem com humanos regularmente e recebem estímulos positivos, como
comida e carinho; e negativos, como agressões (...)", diz o artigo no
Frontiers in Psychology.
Bhadra diz que os resultados da
pesquisa, por ampliarem a compreensão sobre a nossa relação com os animais,
podem melhorá-la.
"Precisamos entender que
cachoros são animais inteligentes que podem coexistir conosco", diz.
"Eles são muito capazes de entender nossa linguagem corporal, e precisamos
lhes dar espaço. Um pouco de empatia e respeito por outras espécies pode
reduzir muito do conflito."
'Melhor
amigo do homem' há milhares de anos
O artigo tem um capítulo de
contextualização, em que os autores lembram que outros animais reagem a gestos
de humanos, como chipanzés, cavalos, elefantes, cabras e gatos.
Os cachorros são possivelmente uma
das primeiras espécies de animais domesticados, entre 10 mil e 30 mil anos
atrás, segundo diferentes interpretações. Descendentes de lobos, adaptaram-se à
convivência com humanos — o que segundo a literatura, não nos trouxe benefícios inicialmente, embora mais tarde eles
tenham começado a ser usados em atividades como
caça e controle de rebanhos.
Como o estudo publicado agora,
outros já haviam demonstrado a capacidade dos cachorros em reagir a diferentes
tipos de gestos de humanos.
Assim, tanto fatores genéticos
quanto experiências ao longo da vida individual podem explicar o comportamento
dos cães.
Já havia sido demonstrado também que
cachorros produzem ocitocina, hormônio relacionado à conexão social nos
mamíferos, na presença de humanos (confira aqui matéria da BBC sobre, em
inglês: https://www.bbcearth.com/blog/?article=six-fascinating-facts-about-the-love-hormone.
Pesquisadores da universidade de
Portsmouth, Inglaterra, publicaram um estudo mostrando também adaptações de
músculos ao redor dos olhos de cães que permitem expressões faciais
particularmente atraentes aos humanos — como um olhar infantil e similar aos
movimentos dos olhos humanos quando tristes.
"Quando os cães fazem esse movimento,
parecem despertar nos humanos um forte sentimento de proteção", explicou
em 2019 Juliane Kaminski, da equipe de Portsmouth.
Fontehttps://www.vega-conhecimentos.com/2020/01/o-melhor-amigo.html?
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