A TERRA COMO GAIA : A ILUSÃO DA ECONOMIA VERDE - LEONARDO BOFF


     

A Terra como Gaia - Leonardo Boff


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Outro


A vida não está apenas sobre a Terra e ocupa uma pequena parte dela, a biosfera.
A própria Terra, como um todo, se revela como um macroorganismo vivo. Ela possui um equilíbrio tão sutil em seus elementos físico-químicos, como o oxigênio e o carbono, que somente um ser vivo pode ter.
Da mesma forma a salinização dos oceanos, o regime de chuvas e secas, a direção dos ventos e das correntes marinhas – tudo forma um sistema de equilíbrio sutilíssimo que perdura e se renova há milhões de anos, tornando as condições gerais propícias para a vida.
O que as mitologias dos povos originários do Oriente e do Ocidente testemunhavam acerca da Terra como a Grande Mãe – a Mãe dos mil seios para significar sua indescritível fecundidade – vem mais e mais sendo confirmada pela ciência experimental avançada. Ela tomou uma deusa grega, Gaia, como imagem para expressar o fato de a Terra ser viva e mãe de todos os viventes.

A Terra como nave espacial

Terra e humanidade podem ser comparadas a uma nave espacial em pleno vôo. Essa nave tem recursos limitados de combustível, alimentos e tempo de transcurso.
1% dos passageiros viaja na primeira classe com todo o conforto da super abundância de meios de vida.
4% dos passageiros vão de classe econômica com recursos suficientes para todos.
95% dos passageiros se encontram amontoados junto às bagagens passando frio e necessidade.
Esse é o fato real e brutal do estado da Terra.
Reparando-se bem, pouco importa a situação social e econômica dos passageiros. Todos estão dentro da mesma nave e correm a mesma ameaça de vida pelo esgotamento dos recursos disponíveis.
Se não fizerem um acordo de repartir eqüitativamente os recursos escassos, todos poderão ter o mesmo trágico destino. Pouco importa se estão na primeira classe, na classe econômica ou junto às bagagens.
Por que não fazemos esse acordo já, enquanto temos tempo, e assim poderemos continuar a viagem com o suficiente e o decente para todos os seres humanos, bem como para os demais seres vivos da natureza?
Desta vez não há alternativa: ou nos salvamos todos ou todos pereceremos. 


A Terra, objeto de amor

A terra transformou-se atualmente no grande e obscuro objeto do amor humano. Damo-nos conta de que podemos ser destruídos. Não por algum meteoro rasante nem por algum cataclismo natural de proporções inimagináveis. Mas por causa da irresponsável atividade humana.
Duas máquinas de morte foram construídas e podem destruir a biosfera: as armas de destruição em massa e a sistemática agressão ecológica ao sistema Terra.
Como meio para salvação da Terra é invocada a ecologia. Não no seu sentido convencional, como o gerenciamento dos recursos naturais escassos, mas como um novo olhar sobre a realidade, como um novo paradigma de relacionamento com todos os seres – pelo qual consideramos o ser humano parte e parcela da natureza, os seres todos interdependentes e cúmplices na preservação e co-evolução de todos e a própria Terra como um super-organismo vivo, chamada pelos cientistas de Gaia, a Grande Mãe dos antigos, que tudo gera e sustenta.
Estamos aprendendo a amar a Terra como a nossa mãe, aquela que nos deu vida e nos alimenta. 
Leonardo Boff


Respeito a todo ser, à Mãe Terra

Leonardo Boff

Se  reconhecermos, como os povos originários e muitos cientistas modernos, que a Terra é Gaia, Mãe generosa, geradora de toda vida, então devemos a ela o mesmo respeito e veneração que devotamos às nossas mães. Em grande parte, a crise ecológica mundial deriva da sistemática falta de respeito para com a natureza e a Terra.
      O respeito implica reconhecer que cada ser vale por si mesmo, porque simplesmente existe e, ao existir, expressa algo do Ser e  daquela Fonte originária de energia e de virtualidades da qual todos provém e para a qual todos retornam (vácuo quântico). Numa perspectiva religiosa, cada ser expressa o próprio Criador.
      Ao captarmos os seres como valor intrínseco, surge em nós o sentimento de cuidado e de responsabilidade para com eles a fim de  que possam continuar a ser a  co-evoluir.
      As culturas originárias atestam a veneração face à majestade do universo, o respeito pela natureza e para cada um de seus representantes.
      O budismo que não se apresenta como uma fé mas como uma sabedoria, um caminho de vida em harmonia com o Todo, ensina a ter um profundo respeito, especialmente, por aquele que sofre (compaixão). Desenvolveu o Feng Shuy que é a arte de harmonizar a casa e a si mesmo com todos os elementos da natureza e com o Tao.
      O Cristianismo conhece a figura exemplar de São Francisco de Assis (1181-1226). Seu mais antigo biógrafo, Tomás de Celano (1229) testemunha que andava com respeito por sobre as pedras em atenção daquele, Cristo, que foi chamado de “pedra”; recolhia com carinho as lesmas para não serem pisadas; no inverno, dava água doce às abelhas para não morrerem de frio e de fome.
      Aqui temos a ver com um outro modo de habitar o mundo, junto com as coisas convivendo com elas e não sobre as coisas dominando-as.


      
Extremamente atual é a figura do humanista Albert Schweitzer (1875-1965). Elaborou grandiosa ética do respeito a todo o ser e  à vida em todas as suas formas. Era um grande exegeta e famoso concertista das músicas de Bach. Num momento de sua vida, largou tudo, estudou medicina e foi servir  hansenianos em Lambarene no Gabão.
      Diz explicitamente, numa carta, que “o que precisamos não é enviar para lá missionários que queiram converter os africanos, mas pessoas que se disponham a fazer para os pobres o que deve ser feito, caso o Sermão da Montanha e as palavras de Jesus possuam algum valor. Se o Cristianismo não realizar isso, perdeu seu sentido”.
      Em seu hospital no interior da floresta tropical, em Lambarene, entre um atendimento e outro, escreveu vários livros sobre a ética do respeito, sendo o principal este: O respeito diante da vida (Ehrfurcht vor dem Leben).
      Bem diz ele:”a idéia-chave do bem consiste em conservar a vida, desenvolvê-la e elevá-la ao seu máximo valor; o mal consiste em destruir a vida, prejudicá-la e impedi-la de se desenvolver. Este é o princípio necessário, universal e absoluto da ética”.
      Para ele, o limite das éticas vigentes consiste em se concentrarem apenas nos comportamentos humanos e esquecerem as outras formas de vida. Numa palavra: “a ética é a responsabilidade ilimitada por tudo que existe e vive” Dai se derivam comportamentos de grande compaixão e cuidado. Numa prédica conclamava: “Mantenha teus olhos abertos para não perder a ocasião de ser um salvador. Não passe ao largo, inconsciente, do pequeno inseto que se debate na água e que corre risco de se afogar. Tome um pauzinho e retire-o da água, enxugue-lhe as asinhas e experimente a maravilha de ter salvo uma vida e a felicidade de ter agido a cargo e em nome do Todo-poderoso. A minhoca que se perdeu na estrada dura e seca e que não pode fazer o seu buraco, retire-a e coloque-a no meio da grama. ‘O que fizerdes a um desses mais pequenos foi a mim que o fizestes’. Esta palavra de Jesus não vale apenas para nós humanos mas também para as mais pequenas das criaturas”.
      Essa ética do respeito é categórica no momento atual em que a Mãe Terra se encontra sob perigoso estresse.
      Leonardo Boff é autor de Convivência, Respeito, Tolerância, Vozes 2006.


Discurso na ONU: por que a Terra é nossa Mãe

22/04/2012
Convidado oficialmente, tive a oportunidade  de fazer um pronunciamento durante a 63ª sessão da Assembléia Geral da ONU no dia 22 de abril de 2009 para fundamentar o projeto a ser votado de transformar o Dia Internacional da Terra em Dia Internacional da Mãe Terra. O projeto foi acolhido por unanimidadade pelos 192 representantes dos povos. Eis o texto pronunciado na ocasião.
Senhoras e Senhores, representantes dos povos da Terra.
Desejo começar recordando a séria advertência feita pela Carta da Terra ainda no ano 2000: “Estamos num momento crítico da história da Terra, no qual a humanidade deve escolher o seu futuro…A nossa escolha é essa: ou formamos uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos outros ou então arriscamos a nossa própria destruição e a da diversidade da vida”(Preâmbulo).
Se a atual crise econômico-financeira é preocupante, a crise da não-sustentabilidade da Terra, revelada no dia 23 de setembro de 2008, se apresenta ameaçadora. Os cientistas que estudam a pegada ecológica da Terra chegaram a usar a expressão The Earth Overshoot Day, quer dizer, o Dia da Ultrapassagem da Terra. Exatamente, neste dia 23 de setembro, foi constatado que a Terra ultrapassou em 30% sua capacidade de reposição dos recursos que necessitamos para viver. Agora precisamos mais de uma Terra para podermos  atender as demandas dos seres humanos e aqueles da comunidade de vida.  Mas até quando?
Cumpre garantir previamente a sustentabilidade da Terra, se quisermos fazer face aos aos problemas mundiais que nos afligem como a crise social mundial, a alimentária, a energética e a climática. Agora não dispomos de uma Arca de Noé que pode salvar alguns e deixa perecer a todos os demais. Ou nos salvamos todos ou pereceremos todos.
Neste contexto, recordemos as prudentes palavras do atual Secretário Geral da ONU, Ban-Ki Moon, num artigo mundialmente difundido, escrito em parceria com Al Gore: “não podemos deixar que o urgente comprometa o essencial”. O urgente é resolver o caos econômico e oessencial é garantir a continuidade das condições ecológicas da Terra para que possa nos oferecer tudo o que precisamos para viver.
Para reforçar esta nova centralidade que visa a salvar o essencial e a mostrar nosso amor a todos os humanos e à própria Terra é que se propõe à esta Assembléia Geral da ONU a resolução de celebrar  o dia 22 de abril não mais simplesmente como o Dia Internacional da Terra, mas como o Dia Internacional da Mãe Terra (International Mother Earth Day).
Se esta resolução for acolhida, como espero, aumentará em toda a Humanidade o cuidado, o respeito,  a cooperação, a compaixão e a responsabilidade face ao nosso Planeta e ao futuro do sistema-vida.
Não dispomos de muito tempo nem possuímos suficiente sabedoria acumulada. Por isso, temos que, juntos e rápidos, elaborar estratégias de sobrevivência coletiva.
Em nome da Terra, nossa Mãe, de seus filhos e filhas sofredores e de todos os demais membros da comunidade de vida ameaçados de extinção, vos suplico veementemente: aprovem esta resolução.
Para fundamentar esta aprovação me tomo a liberdade de apresentar-lhes, senhores e senhoras, representantes dos povos, algumas razões que nos concedem chamar a Terra de verdadeiramente nossa Mãe.
Antes de mais nada, falam os testemunhos mais ancestrais de todos os povos, do Oriente e do Ocidente e das principais religiões. Todos testemunham que a Terra sempre foi venerada como Grande Mãe, Terra Mater, Inana, Tonantzin e Pacha Mama.
Para os povos originários de ontem e de hoje, é constante a convicção de que a Terra é geradora de vida e por isso comparece como Mãe generosa e fecunda. Somente um ser vivo pode gerar vida em sua imensa diversidade, desde a miríade de seres microscópicos até os mais complexos. A Terra surge efetivamente  como a Eva universal.
Durante muitos séculos predominou esta visão, da Terra como Mãe, base de uma relação de respeito e de veneração para com ela. Mas irromperam os tempos modernos com os mestres fundadores do saber científico, Newton, Descartes e Francis Bacon, entre outros. Estes inauguraram uma outra leitura da Terra. Ela não é mais vista como uma entidade viva, mas apenas como uma realidade extensa (res extensa), sem vida e sem propósito. Por isso, ela vem entregue à exploração de seus bens e serviços por parte dos seres humanos em busca de riqueza e de bem estar. Ousadamente afirmou alguém: para conhecer suas leis devemos submetê-la a torturas como o inquisidor faz com o seu inquirido até que  entregue todos os seus segredos.
A Terra-mãe que devia ser respeitada, se transformou em Terra selvagem a ser dominada. Ela não passa, segundo eles, de um baú de recursos infinitos a serem utilizados para o consumo humano.
Neste paradigma não se colocava ainda a questão dos limites de suportabilidade do sistema-Terra nem da escassez de seus bens e serviços não renováveis. Pressupunha-se que seriam ilimitados e que poderíamos infinitamente progredir em direção do futuro.
Hoje tomamos consciência de que a Terra é finita e seus bens e serviços, limitados. Já encostamos nos limites físicos da Terra. Um planeta finito não pode suportar um projeto infinito. Os dois infinitos, dos recursos e do futuro, imaginados pela modernidade se revelaram ilusórios. Os bens e serviços não são infinitos nem o progresso poderá ser infinito porque não é universalizável para todos. Se quiséssemos generalizar para toda a humanidade o bem estar que os países opulentos desfrutam – já se fizeram os cálculos para isso – precisaríamos dispor de pelo menos de três Terra iguais a nossa.
A preocupação que sempre orientou a relação  dos modernos para com a Terra foi esta: como posso ganhar mais, no menor tempo possível e com o mínimo de investimento? O resultado desta voracidade gerou um arquipélago de riqueza rodeado por um oceano de miséria.
O PNUD de 2008 o confirma: os 20% mais ricos consomem 82,4% de todas as riquezas mundiais, enquanto os 20% mais pobres tem que contentar-se com apenas 1,6%. É uma injustiça clamorosa e criminosa que uma ínfima minoria monopolise o consumo e controle os processos produtivos de praticamente todos os países. Estes implicam a devastação da natureza, a criação de escandalosas desigualdades e a falta de solidariedade para com as gerações presentes e futuras. E por fim,  a condenação à miséria e à morte prematura das grandes maiorias da humanidade. Nenhuma sociedade poderá revindicar ser humana, justa e pacífica quando assentada sobre tanta iniquidade social e perversa inumanidade.
Não é sem razão que o aquecimento global e os desequilíbrios do sistema-Terra sejam atribuidos principalmente a esse tipo de organização social e econômica, montada pelos seres humanos.
Se queremos conviver humanamente precisamos de um outro estilo de habitar o planeta Terra que tenha como centro a vida, a Humanidade e a Mãe Terra. Para este modelo, a preocupação central é: como viver e produzir em harmonia com os ciclos da Terra, com os ecossistemas e com os outros seres vivos, buscando o “bem viver” das atuais e das futuras gerações. Como viver mais com menos?
Somente esse novo paradigma civilizacional respeita a Mãe Terra e garante sua integridade e vitalidade.
É neste contexto que se resgatou a visão da Terra como Mãe. Já não se trata da percepção ancestral dos povos originários mas de uma constatação científica. Foi mérito de James Lovelock  e de Lynn Margulis nos anos 70 do século passado e antes deles, do russo Wladimir  Vernadski ainda nos idos de 1920, terem comprovado que a Terra é um superorganismo vivo que permanentemente articula todos os elementos necessários para a vida de forma que ela sempre se mostra apta a produzir e a reproduzir vida.
Durante milhões e milhões de anos o  nível de oxigênio na atmosfera, essencial para a vida, se manteve em 21%; o nitrogênio, responsável pelo crescimento, em 79%; e o nível de salinização dos aceanos em 3,4% e assim todos os demais componentes que garantem a subsistência do sistema-vida.
Não somente há vida sobre a Terra. Ela mesma é viva, um superorganismo que se autoregula para manter um equilíbrio favorável à  existência e à persistência da vida. Foi denominada de Gaia, deusa grega, responsável pela fecundidade da Mãe Terra.
Para mostrar como a Terra é realmente viva, aduzamos um exemplo do conhecido biólogo Edward Wilson: “num só grama de solo, ou seja em menos de um punhado de terra, vivem cerca de 10 bilhões de bactérias, pertencentes a seis mil espécies diferentes”(A criação, 2008, 26). Efetivamente, a Terra é Mãe e é Gaia, geradora de toda a biodiversidade.
O ser humano representa aquela porção da própria Terra que, num momento avançado de sua evolução e de sua complexidade, começou a sentir, a pensar e a amar. Com razão, para as linguas neolatinas, homem vem de humus que significa terra fecunda e Adão, na tradição hebraico-cristã se  deriva de adamah que em hebraico quer dizer terra fértil. Por isso o ser humano é a Terra que anda, que ri, que chora, que canta, que pensa, que  ama e que hoje clama por cuidado e proteção.
A visão dos astronautas comprova esta simbiose entre Terra e Humanidade. De suas naves espaciais, exclamavam: “daqui de cima, olhando este resplandescente planeta azul-branco, não há diferença entre Terra e Humanidade; formam uma única entidade; e nós, mais que povos, nações e raças, devemos nos entender como criaturas da Terra, como filhos e filhas da Terra”. Somos a própria Terra consciente e inteligente.
Entretanto, olhando a Terra não de fora e de longe, mas de perto e de dentro, nos  damos conta de que a nossa Mãe se encontra crucificada. Possui o rosto do terceiro e quarto mundo, porque vem sistematicamente agredida e violada.  Quase a metade de seus filhos e filhas padecem fome, estão doentes e são condenados a morrer antes do tempo.
Por isso, significa um sinal de amor concreto para com a Mãe Terra as políticas sociais que muitos países estão realizando em favor dos mais necessitados.  Podemos referir como exemplar o projeto Fome Zero  e a Bolsa Família  do governo do Presidente do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva. Em menos de 8 anos devolveu dignidade a 50 milhões de pessoas que agora podem comer três vezes ao dia e sentir-se cidadãos incluídos.
É nossa obrigação baixar a Terra da cruz, tratá-la, curá-la e ressuscitá-la. Está em nossas mãos um documento precioso, um dos mais belos e inspiradores dos iníncios do século XXI, a Carta da Terra. Ela nasceu da consulta de milhares e milhares de pessoas de 46 paises e de sugestões surgidas de todos os grupos, desde  indígenas, comunidades pobres, igrejas, universidades e centros de pesquisa e outros. Concluída no ano 2000, foi assumida em 2003 pela UNESCO como “instrumento educativo e uma referência ética para o desenvolvimento sustentável”
Carta da Terra compreende a Terra como viva e como nosso Lar Comum. Apresenta pautas concretas, valores e princípios que podem garantir-lhe um futuro de esperança desde que a cuidemos com compreensão, com compaixão e com amor, como cabe à nossa Grande Mãe.
Oxalá, esta Carta possa um dia, não muito distante, ser apresentada, discutida e enriquecida por esta Assembléia Geral e ser incorporada à Carta dos Direitos Humanos. Assim teríamos um documento único sobre a dignidade da Terra com seus ecosistemas e a dignidade de cada ser humano.
Para que tudo isso se torne realidade não nos basta a razão funcional e instrumental da tecnociência. É urgente enriquecê-la com a razão emocional e cordial. É a partir deste tipo de razão  que se elaboram os valores, o cuidado essencial, a compaixão, o amor, os grandes sonhos e as utopias que movem a humanidade para inventar soluções salvadoras.
Esta razão emocional nos fará sentir a Terra como Mãe e nos levará a amá-la, a respeitá-la e a protegê-la contra violências e exterminações. Nossa missão no conjunto dos seres é a de sermos os guardiães e os cuidadores desta herança sagrada que o universo nos confiou.
Para terminar, me permito, Senhor Presidente, uma sugerência. Aprovada esta resolução de celebrar todo o dia 22 de abril como  o Dia Internacional  da Mãe Terra, sugiro que se ponha na cúpula vazia no alto da sala desta Assembleia, um globo terrestre, uma destas imagens belíssimas da Terra,  feitas a partir de fora da Terra. Esta imagem nos suscita sempre um sentimento profundo de comoção, de sacralidade e de reverência. Ao olhá-la, recordamos que ai está nossa única Casa Comum, a  nossa generosa Mãe Terra. Ela continuamente nos olha,  nos acompanha e nos ilumina para buscar os melhores caminhos para ela, para nós, para toda a comunidade de vida e para todos os seres que nela habitam.
Minha sugestão vai ainda mais longe: que  no dia 22 de abril de cada ano, em todos os lugares, nas escolas, nas fábricas, nos escritórios, nos laboratórios, nas empresas, nos parlamentos, se parasse e se fizesse um minuto de silêncio para pensarmos em nossa Mãe Terra e renovarmos nosso agradecimento por tudo aquilo que ela nos propicia e renovarmos nossa propósito de cuidá-la, de respeitá-la e de amá-la como amamos, respeitamos e cuidamos de nossas mães.
Estou convencido de que assim como está a Terra não pode continuar. Ela continuará seu curso evolucionáro mas sem nós.
A solução para a Terra não cairá do céu. Ela será  resultado de  uma coalizão de forças ao redor de valores e princípios éticos e humanitários que poderão devolver-lhe o equilíbrio perdido e sua vitalidade original.
Podemos e devemos transformar a eventual tragédia coletiva numa crise que nos acrisola e purifica. Esta crise nos tornará mais maduros e sábios para vivermos dignamente nesse pequeno e belo planeta pelo curto tempo que  nos for concedido. Assim nos sentiríamos como filhos e filhas da alegria, no seio da Grande Mãe que nos acolhe e nos dá vida.
Muito obrigado pela atenção.
Leonardo Boff
Representante do Brasil e da Iniciativa Carta da Terra.
Edifício das Nações Unidas em Manhattan, 22 de abril de 2009.

Cuidar da Mãe Terra e amar todos os seres

leonardo boff,30/03/2014

O amor é a força maior existente no universo, nos seres vivos e nos humanos. Porque o amor é uma força de atração, de união e de transformação. Já o antigo mito grego o formulava com elegância: “Eros, o deus do amor, ergueu-se para criar a Terra. Antes, tudo era silêncio, desprovido e imóvel. Agora tudo é vida, alegria, movimento”. O amor é a expressão mais alta da vida que sempre irradia e pede cuidado, porque sem cuidado ela definha, adoece e morre.

Humberto Maturana, chileno, um dos expoentas maiores da biologia contemporânea, mostrou em seus estudos sobre a autopoiesis, vale dizer, sobre a auto-orgnização da matéria da qual resulta a vida, como o amor surge de dentro do processo evolucionário. Na natureza, afirma Maturana, se verificam dois tipos de conexões (ele chama de acoplamentos) dos seres com o meio e entre si: uma necessária, ligado à própria subsistência e outro espontânea, vinculado a relações gratuitas, por afinidades eletivas e por puro prazer, no fluir do próprio viver.

Quando esta última ocorre, mesmo em estágios primitivos da evolução há bilhões de anos, ai surge a primeira manifestação do amor como fenômeno cósmico e biológico. Na medida em que o universo se inflaciona e se complexifica, essa conexão espontânea e amorosa tende a incrementar-se. No nivel humano, ganha força e se torna o móvel principal das ações humanas.
O amor se orienta sempre pelo outro. Significa uma aventura abraâmica, a de deixar a sua própria realidade e ir ao encontro do diferente e estabelecer uma relação de aliança, de amizade e de amor com ele.

O limite mais desastroso do paradigma ocidental tem a ver com o outro, pois o vê antes como obstáculo do que oportunidade de encontro. A estratégia foi e é esta: ou incorporá-lo, ou submete-lo ou eliminá-lo como fez com as culturas da África e da América Latina. Isso se aplica também para com a natureza. A relação não é de mútua pertença e de inclusão mas de exploração e de submetimento. Negando o outro, perde-se a chance da aliança, do diálogo e do mútuo aprendizado. Na cultura ocidental triunfou o paradigma da identidade com exclusão da diferença. Isso gerou arrogância e muita violência.

O outro goza de um privilégio: permite surgir o ethos que ama. Foi vivido pelo Jesus histórico e pelo paleocristianismo antes de se constituir em instituição com doutrinas e ritos. A ética cristã foi mais influenciada pelos mestres gregos do que pelo sermão da montanha e prática de Jesus. O paleocristianismo, ao contrário, dá absoluta centralidade ao amor ao outro que para Jesus, é idêntico ao amor a Deus. O amor é tão central que quem tem o amor tem tudo. Ele testemunha esta sagrada convicção de que Deus é amor(1 Jo 4,8), o amor vem de Deus (1 Jo 4,7) e o amor não morrerá jamais (1Cor 13,8). E esse amor incondicional e universal inclui também o inimigo (Lc 6,35). O ethos que ama se expressa na lei áurea, presente em todas as tradições da humanidade: “ame o próximo como a ti mesmo”; “não faça ao outro o que não queres que te façam a ti”. O Papa Francisco resgatou o Jesus histórico: para ele é mais importante o amor e a misericórdia do que a doutrina e a disciplina.

Para o cristianismo, Deus mesmo se fez outro pela encarnação. Sem passar pelo outro, sem o outro mais outro que é o faminto, o pobre, o peregrino e o nu, não se pode encontrar Deus nem alcançar a plenitude da vida (Mt 25,31-46). Essa saída de si para o outro a fim de amá-lo nele mesmo, amá-lo sem retorno, de forma incondicional, funda o ethos o mais inclusivo possível, o mais humanizador que se possa imaginar. Esse amor é um movimento só, vai ao outro, a todas as coisas e a Deus.

No Ocidente foi Francisco de Assis quem melhor expressou essa ética amorosa e cordial. Ele unia as duas ecologias, a interior, integrando suas emoções e os desejos, e a exterior, se irmanando com todos os seres. Comenta Eloi Leclerc, um dos melhores pensadores franciscanos de nosso tempo, sobrevivente dos campos de extermínio nazista de Buchenwald:

Em vez de enrijercer-se e fechar-se num soberbo isolamento, Francisco deixou-se despojar de tudo, fez-se pequenino, colocou-se, com grande humildade, no meio das criaturas. Próximo e irmão das mais humildes dentre elas. Confraternizou-se com a própria Terra, como seu húmus original, com suas raízes obscuras. E eis que a “nossa irmã e Mãe-Terra” abriu diante de seus olhos maravilhados um caminho de uma irmandade sem limites, sem fronteiras. Uma irmandade que abrangia toda a criação. O humilde Francisco tornou-se o irmão do Sol, das estrelas, do vento, das nuvens, da água, do fogo e de tudo o que vive e até da morte”.

Esse é o resultado de um amor essencial que abraça todos os seres, vivos e inertes, com carinho, enternecimento e amor. O ethos que ama funda um novo sentido de viver. Amar o outro, seja o ser humano, seja cada representante da comunidade de vida, é dar-lhe razão de existir. Não há razão para existir. O existir é pura gratuidade. Amar o outro é querer que ele exista porque o amor torna o outro importante.”Amar uma pessoa é dizer-lhe: tu não poderás morrer jamais” (G.Marcel); “tu deves existir, tu não podes ir embora”.

Quando alguém ou alguma coisa se fazem importantes para o outro, nasce um valor que mobiliza todas as energias vitais. É por isso que quando alguém ama, rejuvenesce e tem a sensação de começar a vida de novo. O amor é fonte de suprema alegria.

Somente esse ethos que ama está à altura dos desafios face à Mãe Terra devastada e ameaçada em seu futuro. Esse amor nos poderá salvar a todos, porque abraça-os e faz dos distantes, próximos e dos próximos, irmãos e irmãs.

Leonardo Boff é autor de O cuidado necessáro, Vozes 2013.


Pregação pelas matas

Genézio Darci Boff, catarinense de 56 anos, está afastado da Igreja. Seus livros, contrários aos dogmas da Igreja Católica por tratarem de temas polêmicos, lhe renderam o afastamento da Igreja Católica. O ex-frei Leonardo Boff pediu seu próprio desligamento da Ordem dos Franciscanos. Não foi punido e jamais deixou de viver de acordo com sua ideologia.
Boff é contrário à hegemonia da Igreja Católica Apostólica Romana e aposta na teoria do multicatolicismo, como a quebra da "hierarquia da Igreja" e a libertação dos povos. Para o polêmico frei Leonardo Boff, a Igreja não exerce o verdadeiro sentido intimista do cristianismo, por não permitir a reformulação de seus conceitos a partir de experiências populares. Isso seria evidenciado pela abertura às religiões africanas e indígenas, muito discriminadas no atual contexto. A sociedade entende que a umbanda esteja ligada à feitiçaria e seja semelhante à macumba e que igrejas "tribais", como Santo Daime, utilizam práticas não-ortodoxas, como cantilenas indígenas e ingestão de alucinógenos.
O principal ponto de choque entre Boff e a Igreja se resume no celibato clerical. Em várias entrevistas à imprensa nacional, Leonardo Boff admitiu ter sido fiel à castidade. Atualmente casado, Boff se dedica à pregação ecológica. Um de seus livros, o &quo?????t?? ?e?t;Ecologia: Grito da Terra, Grito dos Pobres", tenta unir a religião com o ambientalismo, defende dogmas do budismo e ataca os papas que "teriam contribuído" com um genocídio dos índios.
Polêmico, sensato e ao mesmo tempo agressivo, Boff participa da Conferência Continental das Américas, onde está sendo colocada em discussão a Carta da Terra. O evento acontece em Cuiabá e reúne ambientalistas, ecologistas e jornalistas de vários países da América do Sul. Entenda o posicionamento de Leonardo Boff diante da religião e da preservação ambiental.

Perfil/ Leonardo Boff
Consciência ecológica

"A nova consciência ecológica e a noção da Terra como grande mãe e Gaia passa por um processo pedagógico pelo qual as pessoas se sensibilizam para esta realidade. Não bastam conceitos. Precisamos de emoções, porque são elas que mobilizam as ações. Gaia é o nome da mitologia grega para expressar a terra como um ser vivo. Ela foi assumida por James Lovelock, cientista da Nasa, que escreveu dois belos livros - 'Gaia - Uma nova visão da terra' e 'Biografia de Gaia'. Ele mostra o equilíbrio sutil de todos os elementos que compõem a terra, equilíbrio este que só um ser vivo pode mostrar. Leia e mude sua cabeça em relação à Terra"
Modelo econômico

"O modelo vigente sacrifica a natureza para criar riqueza. Alguns homens se enriquecem às custas d?????t?? ?e?o empobrecimento das maioria. O novo modelo econômico visaria produzir o suficiente para todos, preservando a capital natural da terra para nós e para gerações futuras. Este propósito exige um outro modelo econômico, que pode incorporar a tecnologia em benefício de todos nós e não só das empresas"

Teologia da Libertação

"Os pobres são 80% da humanidade. A Teologia da Libertação parte dos pobres, sem ficar só nos pobres, pois se abre a todos. Ela convida a todos a serem aliados dos pobres, contra a pobreza e a favor da vida e da liberdade"

Biopirataria

"Para acabar com a biopirataria, basta se deter em um simples ponto: ouvir os povos que lá habitam, seja os indígenas ou os caboclos. Eles conhecem minuciosamente o ecossistema onde vivem e têm sábias lições da dar aos nossos acadêmicos"

Deus

"Minha visão de Deus não é panteísta. A visão panteísta observa que todas as coisas são Deus, que Ele está em tudo. Para mim, entre Deus e as criaturas há uma relação de mútua presença, a que chamamos de panenteísmo"

Destino dos dinossauros

"A seguir o tipo de desenvolvimento que temos, vamos ao encontro possivelmente do pior, quem sabe ao destino dos dinossauros. A capacida?????t?? ?e?de de criação e aprendizado do ser humano pode mudar suas atitudes para com a terra, para assim salvá-la da histórica agressão a que a submetemos"

Amor em tempos de AIDS

"O amor em tempos de AIDS deve ser muito responsável, para não contrair e nem transmitir essa doença. Não pode ser um amor sem história ou simplesmente promíscuo. Deve ser um amor entre pessoas que se conhecem e que tenham sentimentos de amorosidade e de responsabilidade"

Alterações na Igreja em Goiás

"Infelizmente não conheço este bispo e por isso não posso emitir opinião." (sobre a saída de Dom Tomás Balduíno da diocese de Goiânia e a substituição por Dom Eugênio Rixen)

Biodiversidade

"O Brasil detém a maior biodiversidade e a maior rede hídrica do Planeta. Cabe ao Brasil a imensa responsabilidade de preservar esta riqueza natural para toda a Terra e não só para nós. Somos chamados a ser solidários, como todos os seres humanos"

Franciscanos

"Os franciscanos devem atualizar o amor de São Francisco para com todos os seres, incorporando os novos conhecimentos da ciência da terra e da ecologia. Assim, eles tornam São Francisco contemporâneo ao nosso tempo"

Estados Unidos

"Eles são os maiores poluidores da Terra. Por isso, não assinam nenhum documento internacional. Eles são bárbaros e inimigos da mãe Terra"

Igreja x terras

"A Igreja praticamente doou todas as suas terras para fins de utilização de cooperativas dos trabalhadores. Só ficou com terras de cemitérios e dos edifícios religiosos. A igreja poderia ajudar muito mais em uma atitude ecológica, ensinando a mensagem de São Francisco, que via todos os seres - desde a formiga até as estrelas - como irmãos e irmãs. Aquilo que amamos como irmãos, nós não maltratamos, apenas convivemos"

Tecnologia

"Nós assumimos a tecnologia porque ela pode debelar velhos problemas da humanidade e pode nos ajudar a preservar a Terra. Ela pode ser o veneno, mas também o remédio. Praticamente há um consenso de que todo o Universo está em expansão e em evolução. Ele é auto-criativo e nós também. Estamos ainda nascendo"

Anarquismo

"O anarquismo tem muitos elementos positivos, mas funcionaria só em comunidades de tamanho menor. Nelas, seria possível viver uma plena democracia com a máxima liberdade individual. Em grandes sociedades, como instituições, só é possível viver num espírito de flexibilidade ?????t?? ?e?que o anarquismo pode sempre nos legar"

Urbanismo

"Preservar a cidade para os cidadãos e não para os carros é a opção que muitas cidades européias e norte-americanas já tomaram há vários anos. Isto fez com que estas cidades se tornassem exemplos de ecologia social, que Curitiba deveria imitar"

Padre Marcelo Rossi

"Ele conseguiu unir alegria e leveza à fé cristã. Mas isto é muito pouco. Há o risco de ele se transformar na Xuxa da Igreja Carismática: só entretem as crianças, como a Xuxa ou as pessoas infantilizadas. Ele mostra paixão pelo Pai do Céu, mas nenhuma preocupação pelo pão nosso. Jesus nos manda unir o Pai Nosso com o Pão Nosso, senão não estaremos dentro do Evangelho, mas dentro do mercado religioso, de puro consumo, de sentimentos fáceis, e sem compromisso com a justiça e com a melhoria do mundo"

Responsabilidade coletiva face ao futuro da espécie humana – Leonardo Boff



Mãe Terra


 Leonardo Boff – Petrópolis,RJ

Numa votação unânime de 22 de abril de 2009 a ONU acolheu a ideia  durante muito tempo proposta pelas nações indígenas e sempre relegada,  de que a Terra é Mãe. Por isso a ela se deve o mesmo respeito, a  mesma veneração e o mesmo cuidado que devotamos às nossas mães. A partir de agora, todo dia 22 de abril não será apenas o dia da Terra mas o dia da Mãe Terra.
Esse reconhecimento comporta consequências importantes. A mais imediata delas é que a Terra viva é titular de direitos. Mas não só ela, mas também todos os seres orgânicos e inorgânicos que  a compõem; são, cada um a seu modo, também portadores de direitos. Vale dizer, cada ser possui valor intrínseco, como enfatiza a Carta da Terra, independentemente do uso ou não que fizermos dele. Ele tem direito de existir e de continuar a existir nesse planeta e de não ser maltratado nem eliminado.
Essa aceitação do conceito da Mãe Terra vem ao encontro daquilo que já nos anos 20 do século passado o geoquímico russo Wladimir Vernadsky (1983-1945), criador do conceito de biosfera (o nome foi cunhado do geólogo  austríaco  Eduard Suess (1831-1914) chamava de ecologia global no sentido de ecologia do globo terrestre como um todo. Conhecemos a ecologia ambiental, a político-social e a mental.  Faltava uma ecologia global da Terra tomada como uma complexa unidade total. Na esteira do geoquímico russo, recentemente James Lovelock,  com dados empíricos novos, apresentou a hipótese Gaia, hoje já aceita como teoria científica: a Terra efetivamente comparece como um superorganismo  vivo que se autoregula, tese apoiada pela teoria dos sistemas, da cibernética e pelos biólogos chilenos Maturana e Varela e pelo físico quântico Fritjof Capra.
Vernadsky entendia a biosfera como aquela camada finíssima que cerca a Terra, uma espécie de sutil tecido indivisível que capta as irradiações do cosmos e da própria Terra e as transforma em energia terrestre altamente ativa. A vida se realiza aqui.
Nesse todo se encontra a multiplicidade dos seres em simbiose entre si, sempre interdependentes de forma que todos se autoajudam para existir, persistir e coevoluir. A espécie humana é parte deste todo terrestre, aquela porção da Terra que pensa, ama, intervém e constrói civilizações.
A espécie humana possui uma singularidade no conjunto dos seres: cabe-lhe a responsabilidade ética de cuidar, manter a condições que garantam a sustentabilidade do todo.
Como  descrevemos no artigo anterior vivemos gravíssimo risco de destruir a espécie humana e todo o projeto planetário. Fundamos, como afirmam alguns cientistas, o antropoceno: uma nova era geológica com altíssimo poder de destruição, fruto dos últimos séculos que significaram  um transtorno perverso do equilíbrio do sistema-Terra. Como enfrentar esta nova situação nunca ocorrida antes de forma globalizada e profunda?
Temos pessoalmente trabalhado os paradigmas da sustentabilidade e do cuidado como relação amigável e cooperativa para com a natureza. Queremos agora, brevemente, apresentar um complemento necessário: a ética da responsabilidade do filósofo alemão Hans Jonas (1903-1993) com o seu conhecido Princípio Responsabilidade, seguido pelo  Princípio Vida.
Jonas parte da triste verificação de que o projeto da tecno-ciência tornou a natureza extremamente vulnerável a ponto de não ser impossível o desaparecimento da espécie humana. Daí emerge a responsabilidade coletiva, formulada nesse imperativo: aja de tal  maneira que os efeitos  de tuas ações não destruam a possibilidade futura da vida.
Jonas trabalha ainda com outra categoria que deve ser bem entendida para não provocar uma paralisação:  o temor e o medo  (Furcht). O medo aqui possui um significado elementar, um medo que nos leva instintivamente  a preservar a vida e toda a espécie. Há efetivamente o temor de que se deslanche um processo irrefreável de destruição em massa, com os meios diante dos quais não tínhamos temor em construir e que agora, temos fundado temor de que nos podem realmente destruir a todos. Daí nasce a responsabilidade face às novas tecnociências como a biotecnologia e a nanotecnologia, cuja capacidade de destruição é inconcebível. Temos que realmente nos responsabilizar pelo futuro da espécie humana por temor e muito mais por amor à nossa própria vida.
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* Leonardo Boff é autor Do Iceberg à Arca de Noé, Mar de Idéias 2012.

A Carta da Terra pode ser melhor compreendida no site http://www.cartadaterra.org.br

Leonardo Boff, filósofo, teólogo e ambientalista
sustentabilidade1
Já se deixou para trás o economicismo do Nobel, Milton Fridman que no Time de setembro de 1970 dizia:” a responsabilidade social da empresa consiste em maximalizar os ganhos do acionistas”.
Mais realista é Noam Chomsky: “As empresas é o que há de mais próximo das instituições totalitárias. Elas não têm que prestar esclarecimento ao público ou à sociedade. Agem como predadoras, tendo como presas as outras empresas. Para se defender, as populações dispõem  apenas de um instrumento: o Estado. Mas há no entanto uma diferença que não se pode negligenciar: enquanto, por exemplo, a General Electric, não deve satisfação a ninguém, o Estado deve regularmente se explicar à população”(em Le Monde Diplomatique Brasil, n. 1,  agosto 2007, p. 6).
Já há décadas que as empresas se deram conta de que são parte da sociedade e que carregam a responsabilidade social no sentido de colaborarem para termos uma sociedade melhor.
Ela pode ser assim definida: A responsabilidade social é a obrigação que a empresa assume de buscar metas que, a meio e longo prazo, sejam boas para ela e também  para o conjunto da sociedade na qual está inserida.
Essa definição não deve ser confundida com a obrigação social que significa o cumprimento das obrigações legais e o pagamento dos impostos e dos encargos sociais dos trabalhadores. Isso é simplesmente exigido por lei.
Nem  significa a resposta social: a capacidade de uma empresa de responder às mudanças ocorridas na economia globalizada e na sociedade, como por exemplo, a mudança da politica econômica do governo, uma nova legislação e as transformações do perfil dos consumidores. A resposta social é aquilo que uma empresa tem que fazer para adequar-se e poder se reproduzir.
Responsabilidade social vai além disso tudo: o que a empresa faz, depois de cumprir com todos os preceitos legais, para melhorar a sociedade da qual ela é parte e garantir a qualidade de vida e  o meio ambiente? Não só que ela faz paraa comunidade, o que seria filantropia, mas o que ela faz com a comunidade, envolvendo seus membros com projetos elaborados e supervisionados em comum. Isso é libertador.
Nos últimos anos, no entanto, graças à consciência ecológica despertada pelo desarranjo do sistema-Terra e do sistema-vida surgiu o tema da responsabilidade socio-ambiental.
O fato maior ocorreu no dia 2 de fevereiro do ano de 2007 quando o organismo da ONU que congrega 2.500 cientistas de mais de 135 países o Painel Intergovernamental das Mudanças Climáticas (IPCC), após seis anos de pesquisa, deu a público seus dados. Não estamos indo ao encontro do aquecimento global e de profundas mudanças climáticas. Já estamos dentro delas.
O estado da Terra mudou. O clima vai variar muito, podendo, se pouco fizermos, chegar  até a 4-6 graus Celsius. Esta mudança, com 90% de certeza, é androgênica, quer dizer, é provocada pelo ser humano, melhor, pelo tipo de produção e de consumo que já tem cerca de três séculos de existência e que hoje foi globalizado. Os gases de efeito estufa, especialmente o dióxido de carbono e o metano são os principais causadores do aquecimento global.
A questão que se coloca para as empresas é esta: em que medida elas concorrem para despoluir o planeta, introduzir um novo paradigma de produção, de consumo e de elaboração dos dejetos, em consonância com os ritmos da natureza e a teia da vida e não mais sacrificando os bens e serviços naturais.
Esse é um tema que está sendo discutido em todas as grandes corporações mundiais, especialmente depois do relatório de Nicholas Stern (ex-economista-senior do Banco Mundial), do relatório do ex-vice presidente dos USA Al Gore, “Uma verdade incômoda” e dos várias Convenções da ONU sobre o aquecimento global. Se a partir de agora não se investirem cerca de 450 bilhões de dólares anuais para estabilizar o clima do planeta, nos anos 2030-2040 será tarde demais e a Terra entrará numa era das grandes dizimações, atingindo pesadamente a espécie humana.
Uma reunião de julho de 2013 da Agência Internacional de Energia (AIE) enfatizava que as decisões tem que ser tomadas agora e não em 2020. O ano 2015 é nossa última chance. Depois será tarde demais e iríamos ao encontro do indizível.
Estas questões ambientais são de tal importância que se antepõem à questão da simples responsabilidade social. Se não garantirmos primeiramente o planeta Terra com seus ecossistemas, não há como salvar a sociedade e o complexo empresarial.
Portanto: é urgente a responsabilidade sócio-ambiental das empresas e dos Estados.

“Prece para o dia da Mãe Terra”

Leonardo Boff, membro da Comissão Central da Carta da Terra
No dia 22 de abril de 2009, na 63ª Sessão da Assembléia Geral da ONU, foi aprovado por unanimidade o projeto segundo o qual todo o dia 22 de abril não será mais simplesmente o dia da Terra, mas o dia da Mãe Terra. Em razão desta data vale, em agradecimento, fazer a seguinte prece:
Terra minha querida, Grande Mãe e Casa Comum! Vieste nascendo, lentamente, há bilhões  e milhões de anos, grávida de energias criadoras.
Teu corpo, feito de pó cósmico, era uma semente no ventre das grandes Estrelas Vermelhas. Elas depois explodiram e te lançaram pelo espaço ilimitado. Vieste te aninhar como embrião, no seio de uma estrela ancestral, o Sol primevo, no interior da Via-Láctea, transformada depois em Super Nova. Esta também sucumbiu de tanto esplendor e explodiu. E vieste então parar no  seio acolhedor de uma  Nebulosa, onde já, menina crescida, perambulavas em busca de um lar. E a Nebulosa se adensou virando um Sol esplêndido de luz e de calor: o nosso Sol.
Ele se enamorou de ti, te atraiu e te quis em sua casa, como um planeta seu,  junto com Marte, Mercúrio, Venus e outros companheiros. E celebrou um esponsal contigo. De teu  matrimônio com o Sol, nasceram filhos e filhas, frutos de  tua ilimitada fecundidade, desde os mais pequenos como as bactérias, os virus e os fungos até os maiores e mais complexos  como os peixes, os dinossauros, os animais, as aves, as plantas  e todas as formas de vida. E como expressão nobre da história da vida, nos geraste a nós, homens e mulheres, com  consciência, sentimento,  inteligência e  amor.
Como seres humanos  somos aquela porção tua, que num estágio avançado de tua complexidade, começou a sentir, a pensar, a amar, a cuidar e a venerar. Por isso somos a Terra que venera, cuida, ama, pensa e sente.
Embora já adulta,  continuas coevoluindo para dentro do universo rumo ao Grande Atrator que é o seio do Deus-Pai-e-Mãe de infinita ternura. Dele viemos e para Ele retornamos para assistirmos a suprema realização de todas potencialidades escondidas em cada ser e  em cada um de nós e que somente Tu nos podes conceder.
Queremos, ó Deus-Pai-e-Mãe de bondade, mergulhar em Ti junto com a nossa querida Mãe Terra, para comungar de Tua vida feita de amor, de comunicação e de beleza.
E agora, nesse teu dia, nós seres humanos, nos sentimos um sacerdote  universal. Ousamos  realizar o gesto sagrado de Jesus na força de seu Espírito. Como Ele, cheio de unção, te tomamos, oh Mãe Terra,  em nossas mãos impuras, para pronunciar sobre ti a Palavra Sagrada que o universo sempre guardou dentro de si  e que tu , agora,  queres ouvir:
Hoc est corpus meum: Isto é o meu corpo. Hoc est sanguis meus: Isto é o meu sangue”
Oh maravilha: o que era Terra se transformou em Paraíso e o que era vida humana se transfigurou em Vida Divina. O que era pão se fez Corpo de Deus e o que era vinho se fez Sangue Sagrado.
Finalmente, Mãe Tierra, com teus filhos e filhas reunidos ao teu redor, chegaste ao seio infinito do Deus-comunhão conosco e com todos os seres do Universo. Contigo, Mãe generosa, nos sentimos como o Corpo Sacrossanto de Deus  no pleno esplendor de sua glória.
Enfim, depois de tanto peregrinar,  chegamos em casa. Nela   permaneceremos, felizes, para sempre. Pelos séculos dos séculos sem fim.  Amém.

A ilusão de uma economia verde

Tudo o que fizermos para proteger o planeta vivo que é a Terra contra fatores que a tiraram de seu equilíbrio e provocaram, em conseqüência, o aquecimento global é válido e deve ser apoiado.
Na verdade, a expressão “aquecimento global” esconde fenômenos como: secas prolongadas que dizimam safras de grãos, grandes inundações e vendavais, falta de água, erosão dos solos, fome, degradação daqueles 15 entre os 24 serviços, elencados pela Avaliação Ecossistêmica da Terra (ONU), responsáveis pela sustentabilidade do planeta(água, energia, solos, sementes, fibras etc).
A questão central nem é salvar a Terra. Ela se salva a si mesma e, se for preciso, nos expulsando de seu seio. Mas como nos salvamos a nós mesmos e a nossa civilização? Esta é real questão que a maioria dá de ombros.
A produção de baixo de carbono, os produtos orgânicos, energia solar e eólica, a diminuição, o mais possível, de intervenção nos ritmos da natureza, a busca da reposição dos bens utilizados, a reciclagem, tudo que vem sob o nome de  economia verde são os processos mais buscados e difundidos. E é recomendável que esse modo de produzir se imponha.
Mesmo assim não devemos nos iludir e perder o sentido crítico. Fala-se de economia verde para evitar a questão da sustentabilidade que se encontra em oposição ao atual modo de produção e consumo. Mas no fundo, trata-se de medidas dentro do mesmo paradigma de dominação da natureza.
Não existe o verde e o não verde. Todos os produtos contem nas várias fases de sua produção, elementos tóxicos, danosos à saúde da Terra e da sociedade. Hoje pelo método da Análise do Ciclo de Vida podemos exibir e monitorar as complexas inter-relações entre as várias etapas, da extração, do transporte, da produção, do uso e do descarte de cada produto e seus impactos ambientais.
Ai fica claro que o pretendido verde não é tão verde assim. O verde representa apenas uma etapa de todo um processo. A produção nunca é de todo ecoamigável.
Tomemos como exemplo o etanol, dado como energia limpa e alternativa à energia fóssil e suja do petróleo. Ele é limpo somente na boca da bomba de abastecimento. Todo o processo de sua produção é altamente poluidor: os agrotóxicos aplicados ao solo, as queimadas, o transporte com grandes caminhões que emitem gases, as emissões das fábricas, os efluentes líquidos e o bagaço. Os pesticidas eliminam bactérias e expulsam as minhocas que são fundamentais para a regeneração os solos; elas só voltam depois de cinco anos.
Para garantirmos uma produção, necessária à vida, que não estresse e degrade a natureza, precisamos mais do que a busca do verde. A crise é conceptual e não econômica. A relação para com a Terra tem que mudar. Somos parte de Gaia e por nossa atuação cuidadosa a tornamos mais consciente e com mais chance de assegurar sua vitalidade.
Para nos salvar não vejo outro caminho senão aquele apontado pela Carta da Terra: “o destino comum nos conclama a buscar um novo começo; isto requer uma mudança na mente e no coração; demanda um novo sentido de interdependência global e de responsabilidade universal”(final).
Mudança de mente significa um novo conceito de Terra como Gaia. Ela não nos pertence, mas ao conjunto dos ecossistemas que servem à totalidade da vida, regulando sua base biofísica e os climas. Ela criou toda a comunidade de vida e não apenas nós. Nós somos sua porção consciente e responsável. O trabalho mais pesado é feito pelos nossos parceiros invisíveis, verdadeiro proletariado natural, os microorganismos, as bactérias e fungos que são bilhões em cada culherada de chão. São eles que sustentam efetivamente a vida já há 3,8 bilhões de anos.
Nossa relação para com a Terra deve ser como aquela com nossas mães: de respeito e gratidão. Devemos devolver, agradecidos, o que ela nos dá e manter sua capacidade vital.
Mudança de coração significa que além da razão instrumental com a qual organizamos a produção, precisamos da razão cordial e sensível que se expressa pelo amor à Terra e pelo respeito a cada ser da criação porque é nosso companheiro na comunidade de vida e pelo sentimento de reciprocidade, de interdependência e de cuidado, pois essa é nossa missão.
Sem essa conversão não sairemos da miopia de uma economia verde. Só novas mentes e novos corações gestarão outro futuro.

“Desenvolvimento sustentável: crítica ao modelo padrão”

Leonardo Boff
Teólogo e filósofo
                                  
Os documentos oficiais da ONU e também o atual borrador para a Rio+20 encamparam o modelo padrão de desenvolvimento sustentável: deve sereconomicamente viável, socialmente justo e ambientalmente correto. É o famoso tripé chamado de Triple Botton Line (a linha das três pilastras), criado em 1990 pelo britânico John Elkington, fundador da ONG SustainAbility. Esse modelo não resiste a uma crítica séria.
Desenvolvimento economicamente viável: Na linguagem política dos governos e das empresas, desenvolvimento equivale ao Produto Interno Bruto (PIB). 
Ai da empresa e do pais que não ostentem taxas positivas de crescimento anuais! Entram em crise ou em recessão com conseqüente diminuição do consumo e geração de desemprego: no mundo dos negócios, o negócio é ganhar dinheiro, com o menor investimento possível, com a máxima rentabilidade possível, com a concorrência mais forte possível e no menor tempo possível.
Quando falamos aqui de desenvolvimento não é qualquer um, mas o realmente existente que é aquele industrialista/capitalista/consumista. Este é antropocêntrico,  contraditório e equivocado. Explico-me.
É antropocêntrico  pois está centrado somente no ser humano, como se não existisse a comunidade de vida (flora e fauna e outros organismos vivos) que também precisa da biosfera e demanda igualmente sustentabilidade. Écontraditório, pois, desenvolvimento e sustentabilidade obedecem a lógicas que se contrapõem. O desenvolvimento realmente existente é linear, crescente, explora a natureza e privilegia a acumulação privada. É a economia política de viés capitalista.
A categoria sustentabilidade, ao contrário, provém das ciências da vida e da ecologia, cuja lógica é circular e includente. Representa a tendência dos ecossisstemas ao equilíbrio dinâmico, à interdependência e à  cooperação de todos com todos. Como se depreende: são lógicas que se auto-negam: uma privilegia o indivíduo, a outra o coletivo, uma enfatiza a competição, a outra a cooperação, uma a evolução do mais apto, a outra a co-evolução de todos interconectados.
É equivocado, porque alega que a pobreza é causa da degradação ecológica. Portanto: quanto menos pobreza, mais desenvolvimento sustentável haveria e menos degradação, o que é equivocado. Analisando, porém, criticamente, as causas reais da pobreza e da degradação da natureza, vê-se que resultam, não exclusiva, mas principalmente, do tipo de desenvolvimento praticado. É ele que produz degradação, pois delapida a natureza, paga baixos salários e gera assim pobreza.
A expressão desenvolvimento sustentável representa uma armadilha do sistema imperante: assume os termos da ecologia (sustentabilidade) para esvaziá-los. Assume o ideal da economia (crescimento) mascarando, a pobreza que ele mesmo produz.
Socialmente justo: se há uma coisa que o atual desenvolvimento industrial/capitalista não pode dizer de si mesmo é que seja socialmente justo. Se assim fosse não haveria 1,4 bilhões de famintos no mundo e a maioria das nações na pobreza. Fiquemos apenas com o caso do Brasil. O Atlas Social do Brasil de 2010 (IPEA) refere que cinco mil famílias controlam 46% do PIB. O governo repassa anualmente 125  bihões de reais ao sistema financeiro para pagar com juros os empréstimos feitos e aplica apenas 40 bilhões para os programas sociais que beneficiam as grandes maiorias pobres Tudo isso denuncia a falsidade da retórica de um desenvolvimento socialmente justo, impossível dentro do atual paradigma econômico.
Ambientalmente correto: O atual tipo de desenvolvimento se faz movendo uma guerra irrefreável contra Gaia, arrancando dela tudo o que lhe for útil e objeto de lucro, especialmente, para aquelas minorias que controlam o processo. Em menos de quarenta anos, segundo o Índice Planeta Vivo da ONU (2010) a biodiversidade global sofreu uma queda de 30%. Apenas de 1998 para cá houve um salto de 35% nas emissões de gases de efeito estufa. Ao invés de falarmos nos limites do crescimento melhor faríamos  falar nos limites da agressão à Terra.
Em conclusão, o modelo padrão de desenvolvimento que se quer sustentável, é retórico. Aqui e acolá se verificam avanços na produção de baixo carbono, na utilização de energias alternativas, no reflorestamento de regiões degradadas e na criação de melhores sumidouros de dejetos. Mas reparemos bem: tudo é realizado desde que não se afetem os lucros, nem se enfraqueça a competição. Aqui a utilização da expressão “desenvolvimento sustentável”possui uma significação política importante: representa uma maneira hábil de desviar a atenção para a mudança necessária de paradigma econômico se quisermos uma real sustentabilidade. Dentro do atual, a sustentabilidade é ou localizada  ou inexistente.

“As igrejas são cúmplices da devastação ambiental”

Leonardo Boff, um dos expoentes da Teologia da Libertação, é um intelectual de posições firmes. Foi assim ao enfrentar o processo do Vaticano que resultou no “silêncio obsequioso” do teólogo em 1984. Está sendo agora com seus escritos e posições sobre ecologia. Confira abaixo trechos da entrevista que fiz com Boff, hoje afastado das funções sacerdotais, e publicada no Diario de Pernambuco.
CUMPLICIDADE
Só recentemente o papa (Bento 16) falou da importância e da contribuição que a Igreja dá à ecologia. Mas é muito superficial. A instituição não se dá conta que é cúmplice da crise ecológica porque, durante séculos, sua evangelização foi dizer que o homem é o rei do universo, que está acima da natureza.
DÉBITO
Todas as igrejas abraâmicas – judeus, cristãos e muçulmanos, cuja raiz é a mesma – têm um déficit com respeito à ecologia.
NATUREZA
A natureza fala. Vemos isso nos eventos estremos: enchentes, secas,terremotos, vulcões, mas não escutamos porque nos julgamos fora da natureza. Pior, acima da natureza.
CAPITALISMO
O capitalismo como tal e o ideal moderno, que vem do século 16, do progresso, do desenvolvimento ilimitado,  são profundamente antiecológicos porque partem de dois pressupostos falsos: que os recursos são infinitos e podemos levar esse progresso infinitamente para o futuro. Mas hoje nos damos conta que um planeta finito não suporta um projeto infinito.
AQUECIMENTO
Acho que passamos do ponto crítico e vamos ao encontro de uma grance catástrofe social e ambiental. Vamos sofrer muito, com o risco de que grande parte da humanidade desapareça. Porque pesa uma grande ameaça sobre a humanidade, a de um aquecimento global abrupto, como falam cientistas norte-americanos há cinco anos. Não vamos ao encontro do aquecimento, estamos dentro. Só que ele ainda é progressivo, lento.
CEGUEIRA
Os governos brasileiros, especialmente o PT, não têm acumulação suficiente ecológica. O PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) não insere o item ecologia. Insere o item impacto ecológico porque a lei exige, mas não como o projeto se relaciona com a natureza, como vai integrar as pessoas e como vai ser a biodiversidade. Isto porque há uma insuficiência teórica dos nossos governos. Diria, uma verdadeira cegueira.

Governos brasileiros, segundo Boff, são cegos para a ecologia

O teólogo Leonardo Boff, com agenda no Recife até quarta-feira, criticou os governos brasileiros no tratamento dado ao meio ambiente.
As críticas incluem as gestões federal, estaduais e municipais.
Boff afirma que há “uma verdadeira cegueira” dos governos quanto à questão ecológica e que, por isso, pagaremos caro nos próximos anos.
Como exemplo da “cegueira”, ele aponta o Programa de Crescimento Acelerado (PAC) do governo federal, iniciado na administração do presidente Lula.
Nas obras do PAC, segundo Boff, o item ecologia não é inserido.
O que se coloca nos projetos, a seu ver, seria por exigência da lei, mas sem a devida preocupação com a natureza e a integração das pessoas aos grandes projetos.
“Isso é uma insuficiência teórica dos nossos governos”, avaliou o teólogo, que hoje pela manhã participou de uma conferência em Boa Viagem.


VÍDEO-Texto principal de Leonardo Boff, 

Editado para esta apresentação por inspiração da Federação Galáctica ao Viajante das Estrelas. A Gaia a Mãe Terra, a Federação Galáctica, a Brahma Kumaris e a Leonardo , meu eterno Amor e Gratidão com Amor pela humanidade e por toda manifestação de vida.

Imagens reeditadas por Sergio Carvalho.
Produzido por Sergio Carvalho

Musica:- Frederic Delarue - Musical Rapture - A Healing Gift to Humanity


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