CALEIDOSCÓPIO PATERNO : AS VÁRIAS FACES DA PATERNIDADE CONTEMPORÂNEA

       


CALEIDOSCÓPIO PATERNO
 
         As várias faces da paternidade contemporânea

      
         "Se não se tem um bom pai, é preciso arranjar um."
                                                           Friedrich Nietzsche  

                                        A paternidade, papel estabelecido milenarmente na sociedade ocidental, figura no palco das radicais mudanças que compreendem a nova estrutura da sociedade contemporânea em seu alternativo, processual e movediço background. Para alguns, mais diretos e menos poéticos, não há estrutura: apenas um desalinho das relações humanas e das relações de poder. Por um ou por outro, há de se aventar as intrincadas alterações que a família patriarcal sofre a partir do final da década de 60, quando o trabalho feminino e a consciência da participação da mulher na economia e na reprodução da espécie atingem um novo paradigma.
                                      Quais os fatores que legitimam hoje as relações afetivas e por consequência, as concepções que não mais dependem intimamente do ato sexual e menos ainda, dos antigos laços que davam ao casamento o seu status de núcleo familiar?
                                     Do Pai Provedor, ao Pai Em Estado de Potência (expressão coringa que tomo por empréstimo para indicar o pai que: tanto pode vir a participar da vida da prole, quanto apenas visitá-la, assumir sua guarda ou negá-la; quanto aquele que não se envolve, ou juridicamente é instado a participar com o provimento, o nome e a herança; que configura os casos de reprodução assistida, inseminação heteróloga e fecundação) abriu-se um leque de possibilidades para descrever as várias realidades caracterizadoras da participação do homem genitor - e aqui se deveria definir homem macho genitor? A semântica taramela alguns pontos cegos no campo das palavras e o dicionário engole sem tempo a capacidade de cristalizar os processos reinventados constante e ininterruptamente na rede das relações sociais. Aos linguistas e aos juristas atirem-se as palavras em estado de "fazimento", pois, ainda dependemos nós, os sensíveis e atabalhoados pais, da afeição que se estabelece ou pode estabelecer entre os que nos herdam o gene ou o coração. Os dois?  Não se esqueçam dos pais por opção, obsequiosos homens dispostos a amar e cuidar dos filhos que buscam pelos orfanatos da desilusão. Homens inteiros, íntegros, hercúleos na vontade de educar e disseminar o amor que a procriação lhes nega. Homens nascidos sob a égide da bendita paternidade, emancipados pelo afeto maduro, legítimo e não tipificado.
                                   As imagens do espelho inclinado da vida, o caleidoscópio paterno, apresentam-se em variadas e interessantes combinações. Mas nenhuma delas prescinde da importância e presentificação paterna na formação humana. Amar e educar são premissas que deveriam anteceder e permanecer no estado de guarida em qualquer forma de relação parental.Deveriam, pois sabemos todos das doenças letais que atingem as mesmas relações com o poder da violência, do abuso, do descaso, do abandono.
                                   Adotam-se pais?
                                   No rumo ágil e enérgico que transitam as alterações sociais, há de se pensar nesse prognóstico próximo como um coadjuvante à altura das mudanças em andamento.Pais-pais, mães-pais, pais-mães, mães-mães são vocábulos que até ousam implicar conotações de pilhéria ou crítica. Até ousam! Mas a realidade lhes trava o jogo argumentativo. A família mudou. A estrutura das relações avança para uma realidade que sobrevive aos conceitos massificados em anos de silêncio e justificativas esdrúxulas. Sim, a hipocrisia ainda caiará as almas insepultas, mas dos túmulos abertos brotarão flores e filhos. Ambos desabrocharão, tem-se a esperança latente, para uma sociedade igualitária como desejariam os grandes poetas da escola romântica. Entre versos e prosas em grupos/famílias reunidos por laços de amor, aprenderemos a rogar ao Pai pelos pais de todos os dias, pelos que se foram, mas continuam aqui e por aqueles que jamais virão. Todos eles, absolutamente todos eles, PRESENTES de uma forma ou outra na continuação da espécie humana.
                                   "O menino é o pai do Homem.
"
                                      Fernando Sabino
 
Autora do Texto: Ivane Perotti
 

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