Qual a origem do desejo?
Pergunta: Qual a origem do desejo e como posso me livrar
dele?
Krishnamurti: Um jovem está
fazendo esta pergunta. Por que ele deveria libertar-se do desejo? Compreende?
Disseram a ele que ser livre de desejos é uma das maiores virtudes e que, livre
do desejo, ele poderá "realizar" Deus — ou como quer que se chame essa realidade
fundamental; por isso, pergunta: "Qual a origem do desejo e como posso livrar-me
dele?" Mas, a própria ânsia de ficar livre do desejo ainda faz parte do desejo,
não é verdade? É, com efeito, inspirada pelo medo.
Qual a origem, a fonte, o
começo do desejo? Você vê uma coisa atraente e a deseja. Você vê um carro ou um
barco, e desejam possuí-lo; ou desejam alcançar a posição de homem rico ou
tornarem sanyasi. É esta a origem do desejo: ver, tocar, do que provém
uma sensação, e dessa sensação o desejo. Ora, reconhecendo que o desejo causa
conflito, pergunta: "Como posso livrar-me do desejo?" Assim, que deseja
verdadeiramente não é estar livre do desejo, porém estar livre da inquietação,
da ansiedade, do sofrimento causado pelo desejo. Deseja estar livre dos amargos
frutos do desejo e não do próprio desejo. É muito importante compreender isto.
Se pudesse despojar o desejo do penar, do sofrer, do lutar, de todas as ânsias e
temores que o acompanha, de modo que só restasse o prazer, queria então ficar
longe do desejo?
Enquanto houver desejo de
ganho, de realização, de "vir a ser", em qualquer nível que seja, tem de haver,
inevitavelmente, ansiedade, sofrimento, medo. A ambição de ser rico, de
ser isto ou aquilo, só desaparecerá quando perceber o caráter
doentio, a natureza corruptora da própria ambição. No momento em que percebemos
que o desejo de poder, em qualquer forma — o poder de um ministro, de um juiz,
de um sacerdote, de um guru — é essencialmente mau, já não temos o desejo de ser
poderosos. Mas nós não vemos que a ambição corrompe, que o desejo de poder é
mau; pelo contrário, dizemos que serviremos do poder "para fazer o bem" — o que
é puro contrassenso. Um meio errado não pode ser usado par um fim correto. Se o
meio é mau, o fim será mau. O bem não é oposto do mal; só pode tornar-se
existente quando o mal deixou completamente de existir.
Assim, se não compreender o
pleno significado do desejo, seus resultados e consequências indiretas, nenhuma
significação tem o simples tentar livrar-se do desejo.
Krishnamurti – A Cultura e o
Problema Humano
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