RELACIONAMENTOS COMO PRÁTICA ESPIRITUAL - ECKHART TOLLE



RELACIONAMENTOS COMO PRÁTICA ESPIRITUAL (Eckhart Tolle)


(Transformando as relações viciadas em relações iluminadas)



Como os seres humanos têm se identificado cada vez mais com a mente, a maioria dos relacionamentos não tem as raízes fincadas no Ser. Por isso se transformam em fonte de sofrimento e passam a ser dominados por problemas e conflitos.
Se os relacionamentos energizam e elevam os padrões da mente egóica e ativam o sofrimento do corpo, como está acontecendo agora, por que não aceitar esse fato em vez de tentar escapar dele? Por que não cooperar com ele em vez de evitar relacionamentos ou continuar a perseguir a ilusão de uma companhia ideal, como uma resposta para os problemas ou um meio de encontrar satisfação?

O conhecimento e a aceitação dos fatos trazem também um certo grau de distanciamento deles.
Por exemplo, quando você sabe que existe desarmonia e retém esse "saber", significa que surgiu um novo fator através do seu saber, e que a desarmonia não poderá se manter inalterada.

QUANDO VOCÊ SABE que não está em paz, o seu saber cria um espaço de serenidade que envolve a falta de paz em um abraço terno e amoroso, e então transforma a falta de paz em paz.
No que se refere à transformação interior, não há nada que você possa fazer a respeito. Você não pode transformar a si mesmo, e é claro que não pode transformar seu companheiro ou qualquer pessoa. Tudo que você pode fazer é criar um espaço para a transformação acontecer, para a graça e o amor penetrarem.
Portanto, sempre que o seu relacionamento não estiver bom, sempre que fizer aflorar a "loucura" em você e em seu parceiro, fique feliz. O que estava inconsciente está vindo à luz. E uma chance de salvação.
SUSTENTE, A CADA instante, o saber de cada momento, em especial o do seu estado interior. Se houver raiva, saiba que é raiva. Se houver ciúme, defesa, um impulso para discutir, uma necessidade de ter sempre razão, uma criança interior reclamando amor e atenção, ou uni sofrimento emocional de qualquer tipo, seja o que for, saiba a realidade do momento e sustente esse conhecimento.
O relacionamento passa a ser o seu sadhana, a sua prática espiritual. Se você notar um comportamento inconsciente no parceiro, prenda-o no abraço amoroso do seu saber, de modo que você não tenha uma reação.
A inconsciência e o conhecimento não conseguem conviver por muito tempo, mesmo que o conhecimento esteja só com uma pessoa e a outra não tenha consciência do que está fazendo. A fornia de energia que existe por trás da agressão e da hostilidade acha a presença do amor absolutamente insuportável. Se você reage à inconsciência do seu parceiro, você também fica inconsciente. Mas, se você ficar alerta à sua reação, nada está perdido.
Nunca antes os relacionamentos foram tão problemáticos e oprimidos por conflitos como hoje em dia. Você deve ter notado que eles não aparecem para nos fazer felizes ou satisfeitos. Se você continuar buscando urn relacionamento como forma de salvação, vai se desiludir cada vez mais. Mas, se aceitar que o relacionamento está aqui para tornar você consciente em lugar de feliz, então o relacionamento vai lhe oferecer a salvação e você estará se alinhando com a mais alta consciência que quer nascer neste mundo.
Para os que se mantiverem apegados aos padrões antigos haverá cada vez mais sofrimento, violência, confusão e loucura.
Quantas pessoas são necessárias para transformar a sua vida em uma prática espiritual? Não se incomode caso o parceiro não queira cooperar. É através de você que a sanidade, ou seja, a consciência, consegue chegar a este mundo. Você não tem de esperar o mundo se curar, ou alguém se tornar consciente, antes de poder alcançar a iluminação. Pode ter de esperar para sempre.
Não acuse o outro de não ter consciência. No momento em que a discussão começar, é sinal de que você passou a se identificar com uma posição mental e a defender não só aquela posição, mas também o seu sentido do eu interior. O ego está no comando, Você acabou de ficar inconsciente. Às vezes, isso pode servir para apontar certos aspectos do comportamento do parceiro. Se você estiver muito alerta, muito presente, pode agir sem o envolvimento do ego: sem culpar, acusar ou fazer o outro se sentir errado.
Se o outro se comportar de modo inconsciente, abandone qualquer julgamento. O julgamento tanto serve para as pessoas confundirem o comportamento inconsciente com quem elas são de verdade quanto para projetar a própria inconsciência sobre a outra pessoa e se enganar por causa disso sobre quem elas são.
Abandonar qualquer julgamento não significa não reconhecer a disfunção e a inconsciência quando se deparar com ela. Significa "ser o saber", e não "ser a reação" e o juiz. Você não vai nem querer reagir ou poderá reagir e ainda assim ser o saber, o espaço no qual a reação é observada e onde ela se permite existir. Em vez de brigar com o escuro, você traz a luz. Em vez de reagir a uma desilusão, você vê a desilusão, mas, ao mesmo tempo, enxerga através dela.
Ser o saber cria um espaço nítido de presença amorosa que permite a todas as coisas e pessoas serem como são. Não existe maior catalisador para que a transformação aconteça. Se você adotar essa prática, o outro não conseguirá ficar com você e permanecer inconsciente.
Se os dois concordarem em fazer do relacionamento uma prática espiritual do casal, tanto melhor. Podem contar ao outro os pensamentos e sentimentos tão logo apareçam, ou assim que uma reação desponte, de forma que não haja tempo para surgir um espaço em que uma emoção não-dita, ou desconhecida, ou uma queixa possam se agravar e se desenvolver.
APRENDA A EXPRESSAR os seus sentimentos sem culpar ninguém. Aprenda a ouvir o parceiro de um modo aberto, sem reservas.

Dê ao parceiro espaço para se expressar. Esteja presente. Acusar, defender, atacar - todos esses padrões destinados a fortalecer ou proteger o ego ou a atender às necessidades dele irão se tornar supérfluos. Dar espaço aos outros - e a si mesmo - é fundamental. O amor não consegue florescer sem isso.
Quando você tiver removido os dois fatores que destroem os relacionamentos - transformado o sofrimento e deixado de se identificar com a mente e as posições mentais - e o seu parceiro tiver feito o mesmo, vocês vão sentir a alegria do desabrochar do relacionamento. Em vez de refletir o sofrimento e a inconsciência, em vez de satisfazer as necessidades mútuas viciadas do ego, vocês vão refletir para o outro o amor que sentem lá no fundo, que surge com a realização da unidade de cada ser com tudo o que existe.
Esse é o amor que não tem opositores.
Se o seu parceiro continua identificado com a mente e com o sofrimento, mas você já se libertou deles, vai ser um grande desafio. Não para você, mas para ele. Não é fácil conviver com uma pessoa iluminada, ou melhor, é tão fácil que o ego acha extremamente ameaçador.
Lembre-se de que o ego precisa de problemas, disputas e "inimigos" para fortalecer o sentido de separação de onde tira a sua identidade. A mente do parceiro não iluminado ficará profundamente frustrada porque não encontrará resistência às suas posições rígidas, o que significa que ela vai se tornar insegura e enfraquecida, além do "perigo" de essas posições desabarem todas juntas, resultando na perda do eu interior.
O sofrimento do corpo pedirá uma resposta, mas não irá obtê-la. Sua necessidade de discussões, dramas e disputas não estará sendo atendida.

* Eckhart Tolle *

Por Jorge Bandeira



RELACIONAMENTOS COMO PRÁTICA ESPIRITUAL


O amor é um estado do Ser.




Não está do lado de fora, está bem lá dentro de nós.


Não temos como perdê-lo e ele não consegue nos deixar.


Não depende de um outro corpo, de nenhuma


forma externa.


DISSOLVENDO o SOFRIMENTO




A maior parte do sofrimento humano é desnecessária. Ele se for¬ma sozinho, enquanto a mente superficial governa a nossa vida. O so¬frimento que sentimos neste exato momento é sempre alguma forma de não-aceitação, uma forma de resistência inconsciente ao que é.


No nível do pensamento, a resistência é uma forma de julga¬mento. No nível emocional, ela é uma forma de negatividade. O sofrimento varia de intensidade de acordo com o nosso grau de resistência ao momento atual, e isso, por sua vez, depende da intensidade com que nos identificamos com as nossas mentes. A mente procura sempre negar e escapar do Agora.


Em outras palavras, quanto mais nos identificamos com as nos¬sas mentes, mais sofremos. Ou ainda, quanto mais respeitamos e aceitamos o Agora, mais nos libertamos da dor, do sofrimento e da mente egóica.


Alguns ensinamentos espirituais dizem que todo sofrimento é, em última análise, uma ilusão, e isso é verdade. A questão é se isso é uma verdade para você. Acreditar simplesmente não transforma nada em verdade. Você quer sofrer para o resto da vida e per¬manecer dizendo que é uma ilusão? Será que essa atitude livra você do sofrimento? O que nos interessa aqui é o que podemos fazer para vivenciar essa verdade, ou seja, torná-la real em nossas vidas.


Enquanto estivermos identificados com as nossas mentes, o que significa dizer enquanto estivermos inconscientes espiritualmente, o sofrimento será inevitável. Refiro-me aqui ao sofrimento emo¬cional, que é também a causa principal do sofrimento físico e da doença. O ressentimento, o ódio, a autopiedade, a culpa, a raiva, a


depressão, o ciúme e até mesmo uma leve irritação são formas de sofrimento. E qualquer prazer ou forte emoção contêm em si a semente do sofrimento. É o inseparável oposto, que se manifestará com o tempo.




Quem já tomou bebidas alcoólicas ou drogas para ficar "alto" sabe que o alto se transforma em baixo, que o prazer se transforma em alguma forma de sofrimento. A maioria das pessoas também sabe, por experiência própria, como uma relação íntima pode se transformar, de modo fácil e rápido, de fonte de prazer em fonte de sofrimento. Vistas de uma perspectiva mais ampla, tanto a polari-dade negativa quanto a positiva são lados de uma mesma moeda, são partes de um sofrimento que está oculto, inseparável do estado de consciência identificado com a mente.


Existem dois níveis de sofrimento: o que você cria agora e o que tem origem no passado que ainda vive em sua mente e no seu corpo. Enquanto não somos capazes de acessar o poder do Agora, vamos acumulando resíduos de sofrimento emocional. Esses resíduos se misturam ao sofrimento do passado e se alojam em nossa mente e em nosso corpo. Isso inclui o sofrimento vivido em nossa infância, causado pela falta de compreensão do mundo em que nascemos.


Todo esse sofrimento cria um campo de energia negativa que ocupa a mente e o corpo. Se olharmos para ele como uma entidade invisível com características próprias, estaremos chegando bem perto da verdade. E o sofrimento emocional do corpo.


Apresenta-se sob duas modalidades: inativo e ativo. O sofri¬mento pode ficar inativo 90 por cento do tempo, ou 100 por cento ativado em alguém profundamente infeliz. Algumas pessoas atra¬vessam a vida quase que inteiramente tomadas pelo sofrimento, enquanto outras passam por ele em algumas ocasiões que envolvem relações familiares e amorosas, lesões físicas ou emo¬cionais, perdas do passado, abandono, etc.


Qualquer coisa pode ativá-lo, especialmente se encontrar


ressonância em um padrão de sofrimento do passado. Quando o sofrimento está pronto para despertar do estágio inativo, até mesmo uma observação inocente feita por um amigo, ou um pen¬samento, é capaz de ativá-lo.








DESFAZENDO A IDENTIFICAÇÃO COM O SOFRIMENTO


O SOFRIMENTO NÃO quer que nós o observemos direta-mente e vejamos o que ele realmente é. No momento em que o observamos, sentimos seu campo energético dentro de nós e desfazemos a nossa identificação com ele, surge uma nova dimensão da consciência.


Chamo isso de presença. Passamos a ser testemunhas ou observadores do sofrimento. Isso significa que ele não pode mais nos usar, fingindo ser nosso eu interior. Então, não temos mais como realimentá-lo. Aqui está nossa mais pro¬funda força interior.


Alguns sofrimentos são irritantes, mas inofensivos, como é o caso de uma criança que não para de chorar. Outros são monstros destrutivos e mórbidos, verdadeiros demónios. Alguns são fisica-mente violentos; outros, emocionalmente violentos. Eles podem atacar tanto as pessoas à nossa volta quanto a nós mesmos, seus hospedeiros. Os pensamentos e sentimentos relativos à nossa vida tornam-se, então, profundamente negativos e autodestrutivos. Doenças e acidentes frequentemente acontecem desse modo. Alguns sofrimentos podem até levar uma pessoa ao suicídio.


Às vezes levamos um choque ao descobrir uma faceta detestável em alguém que pensávamos conhecer bem. Entretanto, é mais im-portante observar essa situação em nós mesmos do que nos outros.


PRESTE ATENÇÃO A qualquer sinal de infelicidade em você, qualquer que seja a fornia, pois talvez seja o despertar do sofrimento. Ele pode se manifestar como uma irritação, um sinal de impaciência, um ar sombrio, um desejo de ferir, sen¬timentos de raiva, ira e depressão ou uma necessidade de criar algum tipo de problema em seus relacionamentos. Agarre o sinal no momento em que ele despertar de seu estado inativo.




O sofrimento deseja sobreviver, mas, para isso, precisa conseguir que nos identifiquemos inconscientemente com ele. Então poderá nascer, nos dominar, "tornar-se nós" e viver através de nós.


Ele retira seu "alimento" de nós. Vale-se de qualquer experiência sintonizada com o seu próprio tipo de energia, qualquer coisa que provoque um sofrimento adicional sob qualquer forma: raiva, destruição, rancor, desgostos, problemas emocionais, violência e até mesmo doenças. Portanto, quando o sofrimento toma conta de nós, cria uma situação em nossas vidas que reflete a própria frequência de energia da qual ele se alimenta. Sofrimento só se alimenta de sofrimento. Não consegue se alimentar de alegria. Acha-a indigesta.


Quando o sofrimento nos domina, faz com que desejemos ter mais sofrimento. Passamos a ser vítimas ou agressores. Queremos infligir sofrimento, ou senti-lo, ou ambos. Na verdade, não há muita diferença entre os dois. E claro que não ternos consciência disso e afirmamos que não queremos sofrer. Mas preste bem atenção e verá que o seu pensamento e o seu comportamento estão programados para continuar com o sofrimento, tanto para você quanto para os outros. Se você estivesse consciente disso, o padrão iria se desfazer, porque desejar mais sofrimento é uma insanidade, e ninguém é insano conscientemente.


O sofrimento, a sombra escura projetada pelo ego, tem medo da luz da nossa consciência. Teme ser descoberto. Sobrevive graças à


nossa identificação inconsciente com ele, assim como do medo inconsciente de enfrentarmos o sofrimento que vive dentro de nós. Mas, se não o enfrentarmos, se não direcionarmos a luz da nossa consciência para o sofrimento, seremos forçados a revivê-lo.




O sofrimento pode parecer um monstro perigoso, mas eu garan¬to que se trata de um fantasma frágil. Ele não pode prevalecer sobre o poder da nossa presença.


QUANDO PASSAMOS A observadores e começamos a deixar de nos identificar, o sofrimento ainda continua a agir por um tempo e vai tentar fazer com que voltemos a nos identificar com ele. Embora não esteja mais recebendo a energia origi¬nada da nossa identificação com ele, o sofrimento ainda tem sua força, como uma roda-gigante que continua a girar mesmo quando deixa de receber o impulso. Nesse estágio, o sofrimento pode até ocasionar dores em diversas partes do corpo, mas elas não vão durar.


Esteja presente, fique consciente. Vigie o seu espaço inte¬rior. Você vai precisar estar presente e alerta para ser capaz de observar o sofrimento de um modo direto e sentir a energia que emana dele. Agindo assim, o sofrimento não terá força para controlar o seu pensamento.


No momento em que o seu pensamento se alinha com o campo energético do sofrimento, você está se identificando com ele e, de novo, alimentando-o com os seus pensamentos. Por exemplo, se a raiva é a vibração de energia que predomina no sofrimento e você alimenta esse sentimento, insistindo em pensar no que alguém fez para prejudicá-lo ou no que você vai fazer em relação a essa pessoa, é porque você já não está mais consciente, e o sofrimento se tornou "você". Onde existe raiva existe sempre um sofrimento oculto.


Quando você começa a entrar em um padrão mental negativo e


a pensar como a sua vida é horrorosa, isso quer dizer que o pensa-mento se alinhou com o sofrimento e você passou a estar incons-ciente e vulnerável a um ataque do sofrimento.




Utilizo a palavra "inconsciência" no presente contexto para sig-nificar uma identificação com um padrão mental ou emocional. Isso implica uma ausência completa do observador.






TRANSFORMANDO O SOFRIMENTO EM CONSCIÊNCIA


Manter-se em um estado de alerta consciente destrói a ligação entre o sofrimento e o mecanismo do pensamento e aciona o pro-cesso de transformação. É como se o sofrimento se tornasse o combustível para a chama da consciência, resultando em um brilho de mais intensidade.


Esse é o significado esotérico da antiga arte da alquimia: a trans¬formação do metal não-precioso em ouro, do sofrimento em cons¬ciência. A separação interior cicatriza, e você se torna inteiro outra vez. Cabe a você, então, não criar um sofrimento adicional.


CONCENTRE A ATENÇÃO no sentimento dentro de você. Reconheça que é o sofrimento. Aceite que ele esteja ali. Não pense a respeito. Não permita que o sentimento se transforme em pensamento. Não julgue nem analise. Não se identifique com o sentimento. Esteja presente e observe o que está acon-tecendo dentro de você.


Perceba não só o sofrimento emocional, mas também a pre¬sença "de alguém que observa", o observador silencioso. Esse é o poder do Agora, o poder da sua própria presença consciente. Veja, então, o que acontece.


A IDENTIFICAÇÃO DO EGO COM O SOFRIMENTO




O processo que acabei de descrever é extremamente poderoso, embora simples. Poderia ser ensinado a uma criança, e tenho a esperança de que um dia será uma das primeiras coisas a serem aprendidas na escola. Uma vez entendido o princípio básico do que significa estar presente observando o que acontece dentro de nós -e "entendemos" isso quando passamos pela experiência -, teremos à nossa disposição a mais poderosa ferramenta de transformação.


Não nego que podemos encontrar uma forte resistência interna tentando nos impedir de pôr um fim à identificação com o sofri¬mento. Isso acontecerá particularmente se tivermos vivido intima¬mente identificados com o sofrimento emocional durante a maior parte da vida e se tivermos investido nele uma grande parte ou mesmo todo o nosso sentido de eu interior. Isso significa que cons¬truímos um eu interior infeliz por conta do nosso sofrimento e acreditamos que somos essa ficção fabricada pela mente. Nesse caso, nosso medo inconsciente de perder a identidade vai criar uma forte resistência a qualquer forma de não-identificação. Em outras palavras, você preferiria viver com o sofrimento — ser o sofrimento - a saltar para o desconhecido, correndo o risco de perder o seu infeliz mas familiar eu interior.


OBSERVE A RESISTÊNCIA dentro de você. Observe o seu apego ao sofrimento. Esteja muito alerta. Observe como é estranho ter prazer em ser infeliz. Observe a compulsão de falar ou pensar a esse respeito. A resistência deixará de existir se você torná-la consciente.


Poderá então dar atenção ao sofrimento, estar presente como testemunha e iniciar a transformação.


Só você pode fazer isso. Ninguém pode fazer por você. Mas, caso tenha bastante sorte para encontrar alguém intensamente cons¬ciente, se puder estar com essa pessoa e juntar-se a ela no estado de presença, isso poderá ser de grande utilidade, acelerando o processo. Se isso acontecer, a sua própria luz logo brilhará mais forte.




Quando colocamos um pedaço de lenha que tenha começado a queimar há pouco tempo perto de outro que está queimando vi-gorosamente e, depois, separamos os dois novamente, o primeiro tronco passará a queimar com uma intensidade muito maior. Afinal de contas, é o mesmo fogo. Ser um fogo dessa natureza é uma das funções de um mestre espiritual. Alguns terapeutas estão aptos a preencher essa função, desde que tenham alcançado um ponto além do nível de consciência e sejam capazes de criar e sus¬tentar um estado dê presença intensa e consciente enquanto estiverem trabalhando com você.


A primeira coisa para lembrar é que, enquanto você construir a sua identidade em função do sofrimento, não conseguirá se livrar dele. Enquanto investir uma parte do seu sentido de eu interior no seu sofrimento emocional, você vai resistir ou sabotar, inconscien-temente, cada tentativa para curar o sofrimento.


Por quê? Porque você quer se manter inteiro e o sofrimento se tornou uma parte essencial de você. Esse é um processo incons-ciente, e o único caminho para superá-lo é torná-lo consciente.






O PODER DA SUA PRESENÇA


PERCEBER, DE REPENTE, que você está ou tem estado preso ao sofrimento pode lhe causar um choque. No momento em que percebe isso, você acabou de romper com a ligação.


O sofrimento é um campo de energia, quase como uma entidade


que se alojou temporariamente no seu espaço interior. É a energia da vida que foi aprisionada, uma energia que não está mais fluindo.




Claro que o sofrimento está ali por causa de certas coisas que aconteceram no passado. Ele é o passado vivo em você. E, se você se identifica com ele, se identifica com o passado. Uma identidade víti¬ma acredita que o passado é mais poderoso do que o presente, o que não é verdade. E a crença de que outras pessoas e o que fizeram a você são responsáveis pelo que você é hoje, pelo seu sofrimento emo¬cional, ou por sua incapacidade de ser o verdadeiro eu interior.


A verdade é que o único poder está bem aqui neste momento: o poder da sua presença. Uma vez que saiba disso, perceberá também que só você é responsável pelo seu espaço interior no presente ins¬tante e o passado não consegue prevalecer contra o poder do Agora.


A inconsciência cria o sofrimento. A consciência transforma o sofrimento nela mesma. São Paulo expressa esse princípio univer¬sal de uma forma linda ao dizer: "Tudo é revelado ao ser exposto à luz, e o que for exposto à própria luz se torna luz."


Assim como não se pode lutar contra a escuridão, não se pode lutar contra o sofrimento. Tentar fazer isso poderia gerar um con-flito interior e um sofrimento adicional. Observar o sofrimento já é o bastante. Observá-lo implica aceitá-lo como parte do que existe naquele momento.


TRANSFORMANDO AS RELAÇÕES VICIADAS EM RELAÇÕES ILUMINADAS







RELAÇÕES DE AMOR E ÓDIO


A menos que você acesse a frequência consciente da presença, todos os seus relacionamentos, principalmente os mais íntimos, vão apresentar defeitos profundos. Durante um tempo, eles podem dar a impressão de serem perfeitos, como quando estamos apai¬xonados, mas, invariavelmente, essa perfeição aparente acaba des¬truída por discussões, conflitos, insatisfações, e até mesmo por vio¬lência física e emocional, que passa a acontecer com uma frequên¬cia cada vez maior.


Parece que a maioria dos "relacionamentos amorosos" não leva muito tempo para se tornar uma relação de amor e ódio. O amor pode se transformar em agressões furiosas, em sentimentos de hos¬tilidade ou, num piscar de olhos, em um completo recuo da afeição. Isso é visto como normal.


Se em seus relacionamentos você vivenciou tanto o "amor" quanto o seu oposto - a agressão, a violência emocional, etc. —, então é provável que você esteja confundindo o apego do ego e a dependência com amor. Não se pode amar alguém em um mo¬mento e atacar essa pessoa no momento seguinte. O verdadeiro amor não tem oposto. Se o seu "amor" tem oposto, então não é amor, mas uma grande necessidade do ego de obter um sentido mais profundo e mais completo do eu interior, uma necessidade que a outra pessoa preenche temporariamente. E uma forma de substituição que o ego encontrou, e, por um curto período, ela parece ser mesmo a salvação.


Chega então um momento em que o outro passa a se compor¬tar de um modo que deixa de preencher as nossas necessidades, ou melhor, as necessidades do nosso ego. As sensações de medo, sofri¬mento e falta, que estavam encobertas pelo "relacionamento amo¬roso", voltam a aparecer.




Como acontece com qualquer vício, ficamos muito bem enquanto a droga está disponível, mas chega um momento em que a droga não funciona mais.


Quando essas dolorosas sensações de medo reaparecem, nós as sentimos mais fortes do que antes e passamos a ver o outro como a causa de todas essas sensações. Isso significa que estamos proje-tando no outro essas sensações, por isso nós o agredimos com toda a violência que é parte do nosso sofrimento.


Essa agressão pode despertar o sofrimento do outro, que é induzido a contra-atacar. Nesse ponto, o ego ainda está, incons-cientemente, esperando que a agressão ou a tentativa de manipu-lação seja suficiente para levar o outro a mudar o comportamento, de forma que possa usá-lo, de novo, para encobrir seu sofrimento.


Todo vício surge de uma recusa inconsciente de encararmos nossos próprios sofrimentos. Todo vício começa no sofrimento e termina nele. Qualquer que seja o vício - álcool, comida, drogas legais ou ilegais, ou mesmo uma pessoa -, ele é um meio que usamos para encobrir o sofrimento.


É por isso que, passada a euforia inicial, existe tanta infelicidade, tanto sofrimento nos relacionamentos íntimos. Estes não causam o sofrimento e a infelicidade. Eles trazem à superfície o sofrimen¬to e a infelicidade que já estão dentro de nós. Todo vício faz isso. Todo vício chega a um ponto em que já não funciona mais para nós, e, então, sentimos o sofrimento mais forte do que nunca.


Essa é a razão pela qual muitas pessoas estão sempre tentando escapar do momento presente e buscando algum tipo de salvação no futuro. A primeira coisa que devem encontrar, caso focalizem a


atenção no Agora, é o próprio sofrimento que carregam, e é isso o que mais temem. Se ao menos soubessem como, no Agora, é fácil acessar o poder da presença que dissolve o passado e o sofrimento. Se ao menos soubessem como estão perto da própria realidade, como estão perto de Deus.




Evitar se relacionar como uma tentativa de evitar o sofrimento também não é a resposta. O sofrimento está lá, de qualquer jeito. Três relacionamentos infelizes em alguns anos têm mais probabili¬dade de forçar você a acordar do que três anos em uma ilha deserta ou trancafiado em seu quarto. Mas, se você pudesse colocar uma pre¬sença intensa em sua solidão, isso também funcionaria para você.






TRANSFORMANDO AS RELAÇÕES VICIADAS EM RELAÇÕES ILUMINADAS

NÃO IMPORTA SE você está vivendo só ou com alguém, a cha¬ve do segredo será sempre esta: estar presente e aumentar a pre¬sença concentrando a atenção cada vez mais fundo no Agora.


Para o amor florescer, a luz da presença tem de ser forte o bastante, de modo a impedir que o pensador ou o sofrimento do corpo nos domine.


Saber que cada um de nós é o Ser por baixo do pensador, a serenidade por baixo do barulho mental, o amor e a alegria por baixo da dor, significa liberdade, salvação e iluminação.


Pôr fim à identificação com o sofrimento do corpo é trazer a presença para o sofrimento e, assim, transformá-lo. Pôr fim à iden¬tificação com o pensamento é ser o observador silencioso dos pró¬prios pensamentos e atitudes, em especial dos padrões repetitivos gerados pela mente e dos papéis desempenhados pelo ego.


Se paramos de injetar "auto-suficiência" na mente, ela perde sua


qualidade compulsiva, que é o impulso para julgar e, desse modo, criar uma resistência ao que é, dando origem a conflitos, tragédias e novos sofrimentos. Na verdade, no momento em que paramos de julgar, no instante em que aceitamos aquilo que é, ficamos livres da mente e abrimos espaço para o amor, para a alegria e para a paz.




EM PRIMEIRO LUGAR, paramos de nos julgar, depois paramos de julgar o outro. O grande elemento catalisador para mudar¬mos um relacionamento é a completa aceitação do outro do jeito que ele é, sem querermos julgar ou modificar nada.


Isso nos leva imediatamente para além do ego. Nesse mo¬mento, todos os jogos mentais e toda a dependência viciada deixam de existir. Não existem mais vítima nem agressor, acusador nem acusado.


Esse é também o fim da dependência, da atração pelo padrão inconsciente do outro. Você, então, ou vai se afastar - com amor - ou penetrar cada vez mais fundo no Agora com o outro. E simples assim.


O amor é um estado do Ser. Não está do lado de fora, está bem lá dentro de nós. Não temos como perdê-lo e ele não consegue nos dei¬xar. Não depende de um outro corpo, de nenhuma forma externa.


NA SERENIDADE DO ESTADO DE PRESENÇA, podemos sentir a nossa própria realidade sem forma e sem tempo, que é a vida não-manifesta que dá vitalidade à nossa forma física. Conse¬guimos, então, sentir essa mesma vida lá no fundo de outro ser humano, de cada criatura. Conseguimos enxergar além do véu opaco da forma e da desunião. Essa é a realização da unidade. Isso é amor.


Embora possa haver curtos lampejos, o amor não consegue fio-


rescer, a menos que estejamos permanentemente livres da identifi-cação com a mente e que a presença seja bastante intensa para dis-solver o sofrimento do corpo. Assim, o sofrimento não consegue nos dominar e destruir o amor.








RELACIONAMENTOS COMO PRÁTICA ESPIRITUAL


Como os seres humanos têm se identificado cada vez mais com a mente, a maioria dos relacionamentos não tem as raízes fincadas no Ser. Por isso se transformam em fonte de sofrimento e passam a ser dominados por problemas e conflitos.


Se os relacionamentos energizam e elevam os padrões da mente egóica e ativam o sofrimento do corpo, como está acontecendo agora, por que não aceitar esse fato em vez de tentar escapar dele? Por que não cooperar com ele em vez de evitar relacionamentos ou continuar a perseguir a ilusão de uma companhia ideal, como uma resposta para os problemas ou um meio de encontrar satisfação?


O conhecimento e a aceitação dos fatos trazem também um certo grau de distanciamento deles.


Por exemplo, quando você sabe que existe desarmonia e retém esse "saber", significa que surgiu um novo fator através do seu saber, e que a desarmonia não poderá se manter inalterada.


QUANDO VOCÊ SABE que não está em paz, o seu saber cria um espaço de serenidade que envolve a falta de paz em um abraço terno e amoroso, e então transforma a falta de paz em paz.


No que se refere à transformação interior, não há nada que vo¬cê possa fazer a respeito. Você não pode transformar a si mesmo, e é claro que não pode transformar seu companheiro ou qual¬quer pessoa. Tudo que você pode fazer é criar um espaço para a transformação acontecer, para a graça e o amor penetrarem.


Portanto, sempre que o seu relacionamento não estiver bom, sempre que fizer aflorar a "loucura" em você e em seu parceiro, fique feliz. O que estava inconsciente está vindo à luz. E uma chance de salvação.




SUSTENTE, A CADA instante, o saber de cada momento, em especial o do seu estado interior. Se houver raiva, saiba que é raiva. Se houver ciúme, defesa, um impulso para discutir, uma necessidade de ter sempre razão, uma criança interior recla¬mando amor e atenção, ou uni sofrimento emocional de qual¬quer tipo, seja o que for, saiba a realidade do momento e sus¬tente esse conhecimento.


O relacionamento passa a ser o seu sadhana, a sua prática espi¬ritual. Se você notar um comportamento inconsciente no parceiro, prenda-o no abraço amoroso do seu saber, de modo que você não tenha uma reação.


A inconsciência e o conhecimento não conseguem conviver por muito tempo, mesmo que o conhecimento esteja só com uma pes¬soa e a outra não tenha consciência do que está fazendo. A fornia de energia que existe por trás da agressão e da hostilidade acha a presença do amor absolutamente insuportável. Se você reage à inconsciência do seu parceiro, você também fica inconsciente. Mas, se você ficar alerta à sua reação, nada está perdido.


Nunca antes os relacionamentos foram tão problemáticos e oprimidos por conflitos como hoje em dia. Você deve ter notado que eles não aparecem para nos fazer felizes ou satisfeitos. Se você continuar buscando urn relacionamento como forma de salvação, vai se desiludir cada vez mais. Mas, se aceitar que o relacionamen¬to está aqui para tornar você consciente em lugar de feliz, então o relacionamento vai lhe oferecer a salvação e você estará se alinhan¬do com a mais alta consciência que quer nascer neste mundo.


Para os que se mantiverem apegados aos padrões antigos haverá cada vez mais sofrimento, violência, confusão e loucura.




Quantas pessoas são necessárias para transformar a sua vida em uma prática espiritual? Não se incomode caso o parceiro não queira cooperar. É através de você que a sanidade, ou seja, a cons¬ciência, consegue chegar a este mundo. Você não tem de esperar o mundo se curar, ou alguém se tornar consciente, antes de poder alcançar a iluminação. Pode ter de esperar para sempre.


Não acuse o outro de não ter consciência. No momento em que a discussão começar, é sinal de que você passou a se identificar com uma posição mental e a defender não só aquela posição, mas tam¬bém o seu sentido do eu interior. O ego está no comando, Você acabou de ficar inconsciente. Às vezes, isso pode servir para apon¬tar certos aspectos do comportamento do parceiro. Se você estiver muito alerta, muito presente, pode agir sem o envolvimento do ego: sem culpar, acusar ou fazer o outro se sentir errado.


Se o outro se comportar de modo inconsciente, abandone qual¬quer julgamento. O julgamento tanto serve para as pessoas con¬fundirem o comportamento inconsciente com quem elas são de verdade quanto para projetar a própria inconsciência sobre a outra pessoa e se enganar por causa disso sobre quem elas são.


Abandonar qualquer julgamento não significa não reconhecer a disfunção e a inconsciência quando se deparar com ela. Significa "ser o saber", e não "ser a reação" e o juiz. Você não vai nem querer reagir ou poderá reagir e ainda assim ser o saber, o espaço no qual a reação é observada e onde ela se permite existir. Em vez de brigar com o escuro, você traz a luz. Em vez de reagir a uma desilusão, você vê a desilusão, mas, ao mesmo tempo, enxerga através dela.


Ser o saber cria um espaço nítido de presença amorosa que permite a todas as coisas e pessoas serem como são. Não existe maior catalisador para que a transformação aconteça. Se você ado-


tar essa prática, o outro não conseguirá ficar com você e per¬manecer inconsciente.




Se os dois concordarem em fazer do relacionamento uma práti¬ca espiritual do casal, tanto melhor. Podem contar ao outro os pen¬samentos e sentimentos tão logo apareçam, ou assim que uma reação desponte, de forma que não haja tempo para surgir um espaço em que uma emoção não-dita, ou desconhecida, ou uma queixa possam se agravar e se desenvolver.


APRENDA A EXPRESSAR os seus sentimentos sem culpar ninguém. Aprenda a ouvir o parceiro de um modo aberto, sem reservas.


Dê ao parceiro espaço para se expressar. Esteja presente. Acusar, defender, atacar - todos esses padrões destinados a fortalecer ou proteger o ego ou a atender às necessidades dele irão se tornar supérfluos. Dar espaço aos outros - e a si mesmo - é fundamental. O amor não consegue florescer sem isso.


Quando você tiver removido os dois fatores que destroem os relacionamentos - transformado o sofrimento e deixado de se identificar com a mente e as posições mentais - e o seu parceiro tiver feito o mesmo, vocês vão sentir a alegria do desabrochar do relacionamento. Em vez de refletir o sofrimento e a inconsciência, em vez de satisfazer as necessidades mútuas viciadas do ego, vocês vão refletir para o outro o amor que sentem lá no fundo, que surge com a realização da unidade de cada ser com tudo o que existe.


Esse é o amor que não tem opositores.


Se o seu parceiro continua identificado com a mente e com o sofrimento, mas você já se libertou deles, vai ser um grande desafio. Não para você, mas para ele. Não é fácil conviver com uma pessoa iluminada, ou melhor, é tão fácil que o ego acha extrema¬mente ameaçador.


Lembre-se de que o ego precisa de problemas, disputas e "inimi¬gos" para fortalecer o sentido de separação de onde tira a sua iden¬tidade. A mente do parceiro não iluminado ficará profundamente frustrada porque não encontrará resistência às suas posições rígi¬das, o que significa que ela vai se tornar insegura e enfraquecida, além do "perigo" de essas posições desabarem todas juntas, resul¬tando na perda do eu interior.




O sofrimento do corpo pedirá uma resposta, mas não irá obtê-la. Sua necessidade de discussões, dramas e disputas não estará sendo atendida.






DESISTINDO DO RELACIONAMENTO CONSIGO MESMO


Iluminado ou não, no nível da sua identidade com a forma você não está completo. Você é a metade do todo. E isso é percebido como a atração homem-mulher, o movimento em direção à polaridade oposta de energia, não importa qual seja o seu nível de consciência. Mas, nesse estado de conexão interior, você percebe essa atração em algum lugar sob a superfície ou na periferia da sua vida.


Isso não significa que você não se relaciona profundamente com outras pessoas ou com o seu parceiro. Na verdade, você só consegue se relacionar se tiver consciência do Ser. Partindo do Ser, você é capaz de enxergar além do véu da forma. No Ser, homem e mulher são uma unidade. A sua forma pode continuar a ter algumas neces¬sidades, mas o Ser não tem nenhuma. Já está completo e inteiro. Se essas necessidades forem preenchidas, será ótimo, mas não faz diferença para o seu estado interior mais profundo.


Portanto, caso a necessidade de uma polaridade masculina ou feminina não seja preenchida, é perfeitamente possível para uma pessoa iluminada perceber que falta alguma coisa no nível externo


e, ao mesmo tempo, sentir-se totalmente completa e satisfeita no nível interno.




Se você não consegue ficar à vontade consigo mesmo, vai pro-curar um relacionamento para encobrir o seu desconforto. Só que esse desconforto vai reaparecer de alguma outra forma no rela-cionamento, e você, provavelmente, atribuirá a responsabilidade ao seu parceiro.


TUDO O QUE você precisa fazer é aceitar esse momento ple-namente. Você estará então à vontade no aqui e agora e à von¬tade consigo mesmo.


Mas será que você precisa ter um relacionamento com você mes¬mo? Por que não ser apenas você? Quando se relaciona com você mesmo, já se dividiu em dois: "eu" e "eu mesmo", sujeito e objeto. Essa dualidade criada pela mente é a raiz de toda uma complexi¬dade desnecessária, de todos os problemas e conflitos em sua vida.


No estado de iluminação, você é você mesmo - "você" e "você mesmo" se fundem em um só. Você não se julga, não sente pena de si, não se orgulha de si, não se ama, não se odeia, etc. A divisão provocada pela consciência está curada; sua maldição, removida. Não existe um "você mesmo" que seja preciso proteger, defender ou alimentar.


Quando você está iluminado, não tem mais um relacionamento consigo mesmo. Uma vez que tenha aberto mão disso, todos os seus outros relacionamentos serão de amor.


ACEITAÇÃO E ENTREGA




Quando nos rendemos àquilo que é e assim


ficamos inteiramente presentes, •


o passado deixa de ter qualquer força,


A região do Ser, que tinha sido encoberta


pela mente, se abre. De repente surge uma grande


serenidade dentro de você, uma imensa sensação de paz.


E dentro dessa paz existe uma grande alegria.


E dentro dessa alegria existe amor.


E lá no fundo está o sagrado, o incomensurável, o que não pode ser nomeado.






ACEITAÇÃO DO AGORA




A IMPERMANÊNCIA E OS CICLOS DA VIDA


Existem ciclos de sucesso, como quando as coisas acontecem e dão certo, e ciclos de fracasso, quando elas não vão bem e se desin¬tegram. Você tem de permitir que elas terminem, dando espaço para que coisas novas aconteçam ou se transformem.


Se nos apegamos às situações e oferecemos uma resistência nesse estágio, significa que estamos nos recusando a acompanhar o fluxo da vida e que vamos sofrer. É necessário que as coisas acabem, para que coisas novas aconteçam. Um ciclo não pode existir sem o outro.


O ciclo descendente é absolutamente essencial para uma realiza¬ção espiritual. Você tem de ter falhado gravemente de algum modo, ou passado por alguma perda profunda, ou por algum sofrimento, para ser conduzido à dimensão espiritual. Ou talvez o seu sucesso tenha se tornado vazio e sem sentido e se transformado em fracasso.


O fracasso está sempre embutido no sucesso, assim como o sucesso está sempre encoberto pelo fracasso. No mundo da forma, todas as pessoas "fracassam" mais cedo ou mais tarde, e toda con-quista acaba em derrota. Todas as formas são impermanentes.


Você pode ser ativo e apreciar a criação de novas formas e cir-cunstâncias, mas não se sentirá identificado com elas. Você não precisa delas para obter um sentido de eu interior. Elas não são a sua vida, pertencem à sua situação de vida.


Um ciclo pode durar de algumas horas a alguns anos, e dentro dele pode haver ciclos longos ou curtos. Muitas doenças são provo¬cadas pela luta contra os ciclos de baixa energia, que são funda-


mentais para uma renovação. Enquanto estivermos identificados com a mente, não poderemos evitar a compulsão de fazer coisas e a tendência para extrair o nosso valor pessoal de fatores externos, tais como as conquistas que alcançamos.




Isso torna difícil ou impossível para nós aceitarmos os ciclos de baixa e permitirmos que eles aconteçam. Assim, a inteligência do organismo pode assumir o controle, como uma medida autoprote-tora, e criar uma doença com o objetivo de nos forçar a parar, de modo a permitir que uma necessária renovação possa acontecer.


Enquanto a mente julgar uma circunstância "boa", seja um rela-cionamento, uma propriedade, um papel social, um lugar ou o nosso corpo físico, ela se apegará e se identificará com ela. Isso faz você se sentir bem em relação a si mesmo e pode se tornar parte de quem você é ou pensa que é.


Mas nada dura muito nessa dimensão, onde as traças e a fer¬rugem devoram tudo. Tudo acaba ou se transforma: a mesma condição que era boa no passado de repente se torna ruim. A mesma condição que fez você feliz agora faz você infeliz. A pros¬peridade de hoje se torna o consumismo vazio de amanhã. O casa¬mento feliz e a lua-de-mel se transformam no divórcio infeliz ou em uma convivência infeliz.


A mente não consegue aceitar quando uma situação á qual ela tenha se apegado muda ou desaparece. Ela vai resistir à mudança. É quase como se um membro estivesse sendo arrancado do seu corpo.


Isso significa que a felicidade e a infelicidade são, na verdade, uma coisa só. Somente a ilusão do tempo as separa.


NÃO OFERECER RESISTÊNCIA à vida é estar em estado de graça, de descanso e de luz. Nesse estado, nada depende de as coisas serem boas ou ruins.


É quase paradoxal, mas, como já não existe mais uma dependên-


cia interior quanto à forma, as circunstâncias gerais da sua vida, as formas externas, tendem a melhorar consideravelmente. As coisas, as pessoas ou as circunstâncias que você desejava para a sua felici-dade vêm agora até você sem qualquer esforço, e você está livre para apreciá-las enquanto durarem.




Todas essas coisas naturalmente vão acabar, os ciclos virão e irão, mas com o desaparecimento da dependência não há mais medo de perdas. A vida flui com facilidade.


A felicidade que provém de alguma coisa secundária nunca é muito profunda. É apenas um pálido reflexo da alegria do Ser, da paz vibrante que encontramos dentro de nós ao entrarmos no esta¬do de não-resistência. O Ser nos transporta para além das polari¬dades opostas da mente e nos liberta da dependência da forma. Mesmo que tudo em volta desabe e fique em pedaços, você ainda sentirá uma profunda paz interior. Você pode não estar feliz, mas vai estar em paz.






UTILIZANDO E ABANDONANDO A NEGATIVIDADE


Toda resistência interior é vivenciada como uma negatividade. Toda negatividade é uma resistência. Nesse contexto, as duas palavras são quase sinónimas.


A negatividade vai de uma irritação ou impaciência a uma raiva fu¬riosa, de um humor deprimido ou um ressentimento a um desespero suicida. Às vezes, a resistência faz disparar o sofrimento emocional, caso em que mesmo uma situação banal pode produzir uma nega¬tividade intensa, como a raiva, a depressão ou um profundo pesar.


O ego acredita que, através da negatividade, pode manipular a realidade e conseguir o que deseja. Acredita que, através dela, pode atrair uma circunstância desejável ou dissolver uma indesejável.


Se "você" - a mente - não acreditou que a infelicidade funciona, por que a criaria? O fato é que essa negatividade não funciona. Em vez de atrair uma circunstância desejável, ela a interrompe ao nascer. Em vez de desfazer uma circunstância indesejável, ela a mantém no lugar. Sua única "utilidade" é que ela fortalece o ego, e essa é a razão pela qual ele a adora.




Uma vez que você tenha se identificado com alguma forma de negatividade, não vai querer que ela desapareça e, em um nível inconsciente mais profundo, não vai desejar uma mudança positi¬va. Ela iria ameaçar a sua identidade como uma pessoa depressiva, zangada ou difícil de lidar. Você então passa a ignorar, negar ou sabotar aquilo que é positivo em sua vida. E um fenómeno comum. E também doentio.


OBSERVE AS PLANTAS e os animais, aprenda com eles a aceitar aquilo que é e a se entregar ao Agora.


Deixe que eles lhe ensinem o que é Ser.


Deixe que eles lhe ensinem o que é integridade - estar em unidade, ser você mesmo, ser verdadeiro.


Aprenda como viver e como morrer, e como não fazer do viver e do morrer um problema.


As emoções negativas repetitivas podem, às vezes, conter uma mensagem, como ocorre com as doenças. Qualquer mudança que você faça, seja ela ligada ao seu trabalho, seus relacionamentos ou seu meio ambiente, é apenas uma máscara, a menos que se origine de uma mudança no seu nível de consciência. E, até onde isso interes¬sa, só pode significar uma coisa: estar mais presente. Quando você já tiver alcançado um certo grau de presença, não precisará mais da ne¬gatividade para lhe dizer o que é necessário na sua situação de vida.


Mas, enquanto a negatividade estiver lá, utilize-a. Use-a como um tipo de sinalizador, um lembrete para estar mais presente.


SEMPRE QUE SENTIR a negatividade crescer dentro de você, causada ou não por um fator externo, um pensamento ou mesmo nada em particular, olhe para ela como se fosse uma voz dizendo: "Atenção. Aqui e Agora. Acorde. Largue a sua mente. Esteja presente."




Até mesmo a mais leve irritação é significativa e precisa ser conhecida e observada. Do contrário, haverá um aumento cumulativo de reações não-observadas.


Você pode descartá-la assim que perceber que não quer ter esse campo de energia no seu interior e ele não tem nenhum objetivo. Mas certifique-se de que você se livrou completamente dela. Se não conseguir, simplesmente aceite que ela está ali e concentre a sua atenção no sentimento.


UMA ALTERNATIVA PARA descartar uma reação negativa é fazê-la desaparecer ao imaginar a si mesmo se tornando transparente para a causa externa da reação.


Recomendo que você pratique primeiro com as coisas do dia-a-dia. Vamos dizer que você esteja em casa. De repente, vindo da rua, começa a soar um alarme insistente de carro. Surge uma irritação. Qual é o objetivo dessa irritação? Nenhum até aqui. Por que você a criou? Você não a criou. Quem criou foi a mente. Ela teve uma reação totalmente automática, totalmente inconsciente.


Por que a mente a criou? Porque ela sustenta a crença incons¬ciente de que a resistência dela, que você absorve como alguma forma de negatividade ou infelicidade, vai dissolver a condição indesejada. Isso naturalmente é uma ilusão. A resistência que ela cria, nesse caso a irritação ou raiva, é muito mais desagradável do que a causa original que ela está tentando desfazer.


Tudo isso pode ser transformado em prática espiritual.


SINTA-SE FICANDO TRANSPARENTE, sem a solidez de um corpo material. Agora, permita que o barulho, ou o que esti¬ver causando a emoção negativa, passe através de você. Ele não está mais golpeando uma "parede" sólida dentro de você.




Como disse, pratique primeiro com as coisas simples. O alarme do carro, o latido de um cachorro, o choro de uma criança, o barulho do tráfego. Em vez de ter uma parede de resistência dentro de você, que é atingida de modo constante e doloroso pelas coisas que "não deveriam estar acontecendo", deixe que tudo passe através de você.


Alguém diz alguma coisa grosseira para ferir você. Em vez de desencadear uma reação inconsciente e uma negatividade, como uma agressão, uma defesa ou um retraimento, você deixa isso pas¬sar através de você. Não ofereça resistência. É como se não exis¬tisse mais ninguém ali para ser machucado. Isso é perdão. Nesse sentido, você se torna invulnerável.


Pode dizer a essa pessoa que o comportamento dela é inaceitá¬vel, se você escolher fazer isso. Mas essa pessoa já não tem mais o poder de controlar o seu estado interior. Você passa a estar em seu poder - não mais em poder de alguém, nem sob o governo da mente. Quer seja um alarme de carro, uma pessoa grosseira, uma inundação, um terremoto ou a perda de todos os seus bens, o mecanismo de resistência é o mesmo.


Você ainda está procurando lá fora e não consegue escapar do modo de busca. Talvez o próximo seminário lhe traga a resposta, talvez aquela nova técnica. Diria a você:


NÃO BUSQUE A PAZ. Não busque nenhum outro estado além daquele em que você está agora, senão vai criar um conflito interno e uma resistência inconsciente.


Perdoe a si mesmo por não estar em paz. No momento em que você aceitar completamente a sua intranquilidade, ela se


transformará em paz. Qualquer coisa que você aceite comple-tamente vai levá-lo até lá, vai levar você até a paz. Esse é o milagre da entrega.




Quando aceitamos o que é, todo momento é o melhor. Isso é iluminação.


A NATUREZA DA COMPAIXÃO


TENDO ULTRAPASSADO AS fronteiras construídas pela mente, você passa a ser como um lago profundo. Sua situação de vida e o que acontece no mundo exterior são a superfície do lago, às vezes calmo, às vezes cheio de ondas por causa do vento, conforme os períodos e as estações. Lá no fundo, porém, o lago é sempre sereno. Você é esse lago por inteiro, não apenas a superfície, e está em contato com a sua própria profundidade, que permanece absolutamente serena.


Você não reage a uma mudança ao se apegar mentalmente a qualquer situação. A sua paz interior não depende dela. Você se fixa no Ser - imutável, eterno, imortal — e não é mais dependente da satisfação ou da felicidade do mundo exterior, das formas cons-tantemente flutuantes. Você pode desfrutar delas, brincar com elas, criar novas formas, apreciar a beleza de todas. Mas não tem mais necessidade de se apegar a nenhuma delas.


Enquanto você não está consciente do Ser, a realidade dos ou¬tros seres humanos vai causar uma ilusão, porque você ainda não encontrou a sua realidade. A mente vai gostar ou não da forma, não só do corpo, mas também da mente deles. O verdadeiro rela-cionamento só é possível quando existe uma consciência do Ser.


A partir do Ser, você vai perceber o corpo e a mente da outra pessoa como se fosse uma tela, por trás da qual você pode sentir a


verdadeira realidade deles, como você sente a sua. Assim, ao se confrontar com o sofrimento de outra pessoa ou com um compor¬tamento inconsciente, você fica presente e em contato com o Ser e, desse modo, é capaz de olhar além da forma e sentir o Ser radi¬ante e puro da outra pessoa.




No nível do Ser, todo sofrimento é visto como uma ilusão, uma consequência da identificação com a forma. Milagres de cura às vezes acontecem através dessa descoberta, através do despertar da consciência do Ser nos outros - se estiverem prontos.


A compaixão é a consciência de uma forte ligação entre você e todas as criaturas. Na próxima vez que disser "Não tenho nada em comum com essa pessoa", lembre-se de que você tem muitas coisas em comum. Daqui a alguns anos - dois ou setenta, não faz muita diferença -, os dois terão corpos apodrecidos, depois serão pó, depois nada restará. Isso é uma percepção humilde e sensata que não deixa muito espaço para o orgulho.


Isso é um pensamento negativo? Não, apenas um fato. Por que fechar os olhos para isso? Nesse sentido há uma completa igual¬dade entre você e todas as outras criaturas.


UMA DAS MAIS PODEROSAS práticas espirituais é meditar profundamente sobre a mortalidade das formas físicas, inclu¬sive da sua. Isso se chama: morrer antes que você morra.


Vá fundo nisso. A sua forma física está se dissolvendo, é nada. Então surge um momento em que todas as formas mentais ou pensamentos também morrem. Mas você ainda está lá - a presença divina que você é: radiante, completa-mente consciente.


Nada que é real morre de verdade, somente os nomes, as formas e as ilusões.


Nesse nível profundo, a compaixão se torna um remédio no sentido mais amplo. Nesse estado, a sua influência curativa se


baseia não no fazer mas no ser. Todas as pessoas com quem você mantiver contato serão tocadas pela sua presença e afetadas pela paz que você emana, quer elas estejam ou não conscientes disso.




Quando estiver inteiramente presente e as pessoas à sua volta tiverem um comportamento inconsciente, você não vai sentir necessidade de reagir. A sua paz será tão grande e profunda que tudo que não for paz desaparecerá nela, como se nunca tivesse exis¬tido. Isso quebra o ciclo cármico de ação e reação.


Os animais, as árvores, as flores vão sentir a sua paz e reagir a ela. Você ensinará através do ser, através da demonstração da paz de Deus.


Você passará a ser a "luz do mundo", uma emanação da pura consciência, e assim eliminará a causa do sofrimento. Você elimi-nará a inconsciência do mundo.






O SIGNIFICADO DA ENTREGA


A qualidade da sua consciência nesse momento é que vai deter-minar o tipo de futuro que você vai viver. Portanto, entregar-se é a coisa mais importante que você pode fazer para provocar uma mudança positiva. Qualquer outra coisa que você fizer será secundária. Nenhuma ação positiva pode surgir de um estado de consciência onde não existe entrega.


Para muitas pessoas, a entrega talvez tenha conotações negati¬vas, como uma derrota, uma desistência, uma incapacidade de se reerguer das ciladas da vida, certa letargia, etc. A verdadeira entre-ga, entretanto, é algo completamente diferente. Não significa su-portar passivamente uma situação qualquer que nos aconteça e não fazer nada a respeito, nem deixar de fazer planos ou de ter confi¬ança para começar algo novo.


A ENTREGA É a sabedoria simples mas profunda de nos sub-metermos e não de nos opormos ao fluxo da vida. O único lugar em que podemos sentir o fluxo da vida é no Agora. Isso significa que se entregar é aceitar o momento presente sem restrições e sem nenhuma reserva.




É abandonar a resistência interior àquilo que é.


A resistência interior acontece quando dizemos "não" para aqui¬lo que é, através do nosso julgamento mental e de uma negativi-dade emocional. Isso se agrava especialmente quando as coisas "vão mal", o que significa que há um espaço entre as exigências ou expectativas rígidas da nossa mente e aquilo que é. Esse é o espaço do sofrimento.


Se você já tiver vivido bastante tempo, certamente saberá que as coisas "vão mal" com muita frequência. É precisamente nesses mo¬mentos que a entrega tem de ser praticada, caso queiramos elimi¬nar o sofrimento e as mágoas da nossa vida. A aceitação daquilo que é nos liberta imediatamente da identificação com a mente e nos religa com o Ser. A resistência é a mente.


A entrega é um fenómeno puramente interior. Isso não quer dizer que não possamos fazer alguma coisa no campo exterior para mudar a situação.


Na verdade, não é a situação completa que temos de aceitar quando falo de entrega, mas apenas o segmento minúsculo chama¬do o Agora. Por exemplo, se você estiver atolado na lama, não tem que dizer: "Está bem, me conformo de estar atolado nessa lama." Resignação não quer dizer entrega.


VOCÊ NÃO PRECISA aceitar uma situação indesejável ou desagradável na sua vida. Nem precisa se iludir e dizer que não tem nada errado em estar atolado na lama. Nada disso. Você tem completa consciência de que deseja sair dali. Então


reduz a sua atenção ao momento presente, sem atribuir a essa situação nenhum rótulo mental.




Isso significa que não existe nenhum julgamento do Agora. Em consequência, não existe nenhuma resistência, nenhuma negatividade emocional. Você aceita a "existência" do momento.


A seguir, toma uma atitude e faz tudo o que puder para sair da lama.


Chamo essa atitude de ação positiva. Funciona muito mais do que uma ação negativa, que decorre da raiva, do desespero ou da frustração. Até que alcance o resultado desejado, você continua a praticar a entrega ao se abster de rotular o Agora.


Vou fazer uma analogia visual para ilustrar o ponto que estou sustentando. Você está andando por uma estrada à noite, com uma neblina cerrada, mas possui uma lanterna potente que corta a neblina e cria um espaço estreito e nítido na sua frente. A neblina é a sua situação de vida, que inclui o passado e o futuro. A lanter¬na é a sua presença consciente, e o espaço nítido é o Agora.


Não se entregar endurece a forma psicológica, a casca do ego, e assim cria uma forte sensação de separação. O mundo e as pessoas à sua volta passam a ser vistos como ameaças. Surgem uma com-pulsão inconsciente para destruir os outros através do julgamento e uma necessidade de competir e dominar. Até mesmo a natureza vira sua inimiga, e o medo passa a governar a sua percepção e a interpretação das coisas. A doença mental conhecida como paranóia é apenas uma forma ligeiramente mais aguda desse esta¬do normal, embora disfuncional, da consciência.


A resistência faz com que tanto a sua mente quanto o seu corpo fiquem mais pesados. A tensão se manifesta em diferentes partes do corpo, que se contrai para se defender. O fluxo de energia vital, essencial para o funcionamento saudável do corpo, fica prejudicado.


Algumas formas de terapia corporal podem ser úteis para restaurar esse fluxo, mas, a menos que você pratique a entrega na sua vida diária, essas coisas só podem lhe proporcionar um alívio temporário, porque a causa, o padrão de resistência, não foi ainda dissolvida.




Existe alguma coisa dentro de você que não é afetada pelas cir-cunstâncias transitórias que constróem a sua situação de vida, e a que você só tem acesso através da entrega. Trata-se da sua vida, do seu próprio Ser, que existe no eterno domínio do presente.


SE A SUA SITUAÇÃO de vida é insatisfatória ou mesmo into¬lerável, somente através da entrega você vai conseguir quebrar o padrão inconsciente de resistência, que permite a perma¬nência dessa situação.


A entrega é perfeitamente compatível com tomar uma atitude, iniciar uma mudança ou atingir objetivos. Mas, no estado de entre¬ga, uma energia totalmente diferente flui naquilo que fazemos. A entrega nos religa com a fonte de energia do Ser, e, se as nossas ações estiverem impregnadas com o Ser, elas se tornam uma alegre celebra¬ção da energia da vida, que nos aprofunda cada vez mais no Agora.


Através da não-resistência, a qualidade da nossa consciência, e, portanto, a qualidade do que estivermos fazendo ou criando, aumenta sem medidas. Os resultados vão falar por si mesmos e reíletir essa qualidade. Podemos chamar isso de "ação de entrega".


NO ESTADO DE ENTREGA, você vê claramente o que precisa ser feito e parte para a ação, fazendo uma coisa de cada vez e se concentrando em uma coisa de cada vez.


Aprenda com a natureza. Veja como todas as coisas se reali¬zam e como o milagre da vida se desenrola sem insatisfação ou infelicidade.


É por isso que Jesus disse: "Olhai os lírios do campo, como eles crescem; não trabalham nem fiam."




SE A SUA SITUAÇÃO geral é insatisfatória ou desagradável, separe esse instante e entregue-se ao que é. Eis aqui a lanterna cortando a neblina. O seu estado de consciência deixa então de ser controlado pelas condições externas. Você não age mais a partir de uma resistência ou de uma reação.


Olhe então para uma situação específica e pergunte-se: "Existe alguma coisa que eu possa fazer para mudar essa situ¬ação, melhorá-la ou me retirar dela?" Se houver, você toma a atitude adequada.


Não se prenda às mil coisas que você vai ter que fazer em algum tempo futuro, mas à única coisa que você pode fazer agora. Isso não significa que você não deva traçar um plano. Planejar talvez seja a única coisa que você possa fazer agora. Mas certifique-se de que não vai começar a rodar "filmes mentais", se projetar no futuro e, assim, perder o Agora. Talvez a atitude que você tomar não dê frutos imediatamente. Até que ela dê, não resista ao que é.


SE NÃO HOUVER nada que possa fazer e você também não puder escapar da situação, use isso para poder ir mais fundo na entrega, mais fundo no Agora, mais fundo no Ser.


Quando você entra nessa eterna dimensão do presente, a mu-dança sempre acontece por caminhos estranhos, sem a necessidade de uma grande quantidade de atitudes da sua parte. A vida se torna proveitosa e cooperativa. Se fatores internos como o medo, a culpa ou a indolência impedem você de tomar uma atitude, eles vão se dissolver na luz da sua presença consciente.


Não confunda entrega com uma atitude do tipo "não ligo mais


para nada". Essas atitudes estão cheias de negatividade na forma de um ressentimento oculto, portanto não se trata de entrega, mas de uma resistência disfarçada.




Ao se entregar, dirija a sua atenção para dentro a fim de verificar se existe algum traço de resistência que tenha ficado no seu interior. Fique bem alerta ao fazer isso, do contrário um resíduo de resistên¬cia pode ficar escondido em algum cantinho escuro, na forma de um pensamento ou de uma emoção desconhecida.


DA ENERGIA DA MENTE PARA A ENERGIA ESPIRITUAL


COMECE POR ADMITIR que é resistência. Esteja lá quando a resistência aparecer. Observe de que modo a sua mente a cria, que nome dá à situação, a você mesmo ou aos outros. Observe o processo de pensamento envolvido. Sinta a energia da emoção.


Ao testemunhar a resistência, você vai verificar que ela não tem nenhum propósito. Ao focalizar toda a sua atenção no Agora, a resistência inconsciente passa a ser consciente, e isso é o fim dela.


Você não pode estar infeliz e consciente. Se há infelicidade, ne-gatividade ou qualquer forma de sofrimento, significa que existe resistência, e a resistência é sempre inconsciente.


Você escolheria a infelicidade? Se não escolheu, como ela apare¬ceu? Qual é o propósito dela? Quem a está mantendo viva?


Você diz que está consciente da sua infelicidade, mas a verdade é que você está identificado com ela e mantém vivo esse processo de identificação, através de um pensamento compulsivo. Tudo isso é inconsciência. Se você estivesse consciente, quer dizer, total¬mente presente no Agora, toda a negatividade iria se dissolver


quase instantaneamente. Ela não conseguiria sobreviver na sua presença. Porque só consegue sobreviver na sua ausência.




Nem mesmo o sofrimento consegue sobreviver muito tempo diante da presença. Você mantém a infelicidade viva quando dá tempo a ela. Esse é o sangue dela. Remova o tempo, concentrando uma percepção intensa no momento presente, e ela morre. Mas você quer mesmo que ela morra? Você já teve mesmo o bastante dela? Quem você seria sem ela?


Até que você pratique a entrega, a dimensão espiritual é algo a respeito do que você já leu, ouviu falar, escreveu, pensou, acreditou ou não. Não faz diferença.


NÃO ATÉ QUE a entrega se torne uma realidade em sua vida.


No momento da entrega, a energia que você desprende e que passa a governar sua vida é de uma frequência vibracional muito maior do que a energia da mente, que ainda governa o nosso mundo.


Através da entrega, a energia espiritual penetra nesse mundo. Ela não gera sofrimento para você, para outros seres humanos ou para qualquer outra forma de vida no planeta.


A ENTREGA NOS RELACIONAMENTOS PESSOAIS


Somente alguém inconsciente vai tentar usar ou manipular os outros, mas a verdade é que somente as pessoas inconscientes podem ser usadas e manipuladas. Se você reage ou se opõe ao com-portamento inconsciente dos outros, também fica inconsciente.


Porém, a entrega não significa uma permissão para que pessoas inconscientes usem você. De jeito nenhum. É possível dizer "não" de modo firme e claro para alguém e, ao mesmo tempo, perma¬necer em um estado de não-resistência interior.


AO DIZER "NÃO" a uma pessoa ou situação, você não deve reagir, mas agir de acordo com um insight, uma firme con¬vicção do que é certo ou errado para você naquele momento.




Permita que isso seja um "não" sem reação, um "não" de alta qualidade, um "não" livre de toda a negatividade e, desse modo, não gere mais sofrimento.


Se você não consegue se entregar, aja imediatamente. Fale ou faça alguma coisa para provocar uma mudança na situação, ou se afaste dela. Seja responsável pela sua vida.


Não polua o seu lindo e radiante Ser interior, nem a Terra, com negatividade. Não transmita infelicidade, nem deixe que ela crie um lugar dentro de você.


SE VOCÊ NÃO puder tomar uma atitude - se você estiver na prisão, por exemplo -, então só lhe restam duas opções: resistir ou se entregar. A escravidão ou a liberdade interior, do ponto de vista das condições exteriores. O sofrimento ou a paz interior.


Seus relacionamentos vão mudar profundamente através da entrega. Se você nunca consegue aceitar o que é, conseqüentemente não é capaz de aceitar qualquer pessoa do jeito que ela é. Você está sempre julgando, criticando, rotulando, rejeitando ou tentando mudar as pessoas.


Além disso, se continuar a transformar o Agora em um meio para atingir um fim no futuro, também vai considerar as pessoas com quem se relaciona como um meio para atingir um objetivo. O relacionamento, o ser humano, passa então a ter uma importância secundária para você, ou mesmo nenhuma importância. O que vale é o que você consegue extrair do relacionamento: um ganho mate¬rial, uma sensação de poder, um prazer físico ou alguma forma de gratificação do ego.


DeÍxe-me ilustrar como a entrega pode agir nos relacionamentos.


QUANDO SE ENVOLVER em uma discussão ou um conflito com um sócio, ou um amigo, observe como você se coloca na defensiva quando a sua própria posição é atacada, ou sinta a potência da sua própria agressão ao atacar a posição da outra pessoa.




Observe o apego aos seus pontos de vista e opiniões. Sinta a energia mental e emocional por trás da sua necessidade de ter razão e de mostrar à outra pessoa que ela está errada. Essa é a energia da mente egóica. Você a torna consciente ao reconhecê-la, ao senti-la o mais completamente possível.


De repente, no meio de uma discussão, você descobre que pode fazer uma escolha e resolve abdicar da sua própria reação, só para ver o que acontece. Você se entrega.


Não quero dizer abrir mão da sua reação verbalmente dizendo "está bem, você tem razão", com um ar no rosto que diz "estou acima de toda essa inconsciência infantil". Isso é apenas deslocar a resistência para um outro nível, com a mente ainda no comando, considerando-se superior. Estou falando de abandonar todo o campo de energia mental e emocional que estava disputando o poder dentro de você.


O ego é esperto, portanto você tem de estar alerta, presente, e ser 100 por cento honesto consigo mesmo para verificar se aban¬donou realmente sua identificação com uma posição mental e se libertou, assim, da sua mente.


SE VOCÊ SE sentir leve, livre e profundamente em paz, é sinal de que você se entregou completamente. Observe então o que acontece à posição mental da outra pessoa, já que você não mais a energiza ao oferecer uma resistência. Quando abri¬mos mão da identificação com as nossas posições mentais, começa a verdadeira comunicação.


Não-resistência não significa necessariamente não fazer nada. Significa que qualquer "fazer" se torna não-reação. Lembre-se da profunda sabedoria implícita na prática das artes marciais orientais: não ofereça resistência à força opositora. Submeta-se para superá-la.




Tendo estabelecido isso, "não fazer nada" quando estamos em um estado de intensa presença é um poderoso transformador e curador de situações e de pessoas.


É radicalmente diferente da inatividade, no estado comum da consciência, ou melhor, da inconsciência, que tem raízes no medo, na indolência ou na indecisão. O verdadeiro "fazer nada" implica uma não-resistência interior e um intenso estado de alerta.


Por outro lado, caso haja necessidade de ação, você não vai mais reagir a partir da sua mente condicionada, mas vai responder a uma situação com a sua presença consciente. Nesse estado, a mente é livre de conceitos, incluindo o conceito da não-violência. Então, quem pode prever o que você vai fazer?


O ego acredita que a nossa força reside em nossa resistência, quando, na verdade, a resistência nos separa do Ser, o único lugar de força verdadeira. A resistência é a fraqueza e o medo disfarça¬dos de força. O que o ego vê como fraqueza é o Ser em sua pureza, inocência e poder. O que ele vê como força é fraqueza. Assim, o ego existe num modo contínuo de resistência e desempenha papéis falsos para encobrir a "fraqueza", que, na verdade, é o nosso poder.


Até que haja a entrega, a representação inconsciente de deter-minados papéis se constitui em grande parte da interação humana. Na entrega, não mais precisamos das defesas do ego e das falsas máscaras. Passamos a ser muito simples, muito reais. "Isso é peri-goso", diz o ego. "Você vai se machucar. Vai ficar vulnerável."


O ego não sabe, é claro, que somente quando deixamos de resis¬tir, quando nos tornamos "vulneráveis", é que podemos descobrir a nossa verdadeira e fundamental invulnerabilidade.


TRANSFORMANDO A DOENÇA E O SOFRIMENTO




TRANSFORMANDO A DOENÇA

EM ILUMINAÇÃO


A entrega é a aceitação interior daquilo que é, sem nenhuma condição. Estamos falando sobre a sua vida, neste momento, e não sobre as condições ou circunstâncias da sua vida, não daquilo que eu chamo situação de vida.


As doenças fazem parte da nossa situação de vida. Assim, pos-suem um passado e um futuro. O passado e o futuro formam um contínuo sem interrupção, a menos que o poder redentor do Agora seja ativado através da nossa presença consciente. Como você sabe, por baixo das várias condições que constituem a nossa situação de vida, que existe no tempo, há uma coisa mais profunda, mais essen¬cial: a sua Vida, o seu próprio Ser dentro do eterno Agora.


Como não existem problemas no Agora, as doenças também não existem. Acreditar em um rótulo que alguém confere às nos¬sas condições fortalece-as e constrói uma realidade aparentemente sólida em torno de um desequilíbrio temporário. Isso não só con¬fere realidade e solidez, mas também uma continuidade no tempo que não havia antes.


AO SE CONCENTRAR neste instante e evitar rotular a doença mentalmente, ela se reduz a um dos seguintes fatores: so-frimento físico, fraqueza, desconforto ou invalidez. É a isso que você se entrega, agora. Você não se entrega à ideia da "doença".


Deixe o sofrimento trazer você para o momento presente, para um estado de presença intensa consciente. Use-o para a iluminação.




A entrega não transforma aquilo que é, ao menos não direta-mente. A entrega transforma você. Quando você estiver transfor-mado, todo o seu mundo fica transformado, porque o mundo é somente um reflexo.


A doença não é o problema. Você é o problema, enquanto a mente estiver no controle.


QUANDO VOCÊ ESTIVER doente ou incapacitado, não sinta que fracassou de alguma forma, não sinta culpa de nada. Não culpe a vida por tratar você tão mal, mas também não se culpe de nada. Tudo isso é resistência.


Se você tem uma doença grave, use-a para alcançar a ilu-minação. Use qualquer coisa "ruim" que acontecer na sua vida para alcançar a iluminação.


Retire o tempo da doença. Não dê a ela nenhum passado ou futuro. Deixe-a forçar você para a percepção intensa do momento presente. E veja o que acontece.


Torne-se um alquimista. Transforme o metal em ouro, o sofri-mento em consciência, a infelicidade em iluminação.


Você está gravemente doente e sentindo raiva do que acabei de dizer? Então esse é um sinal claro de que a doença se tornou parte do seu sentido de eu interior e de que, neste momento, você está protegendo a sua identidade e também protegendo a doença.


A circunstância que foi rotulada de "doença" não tem nada a ver com quem você realmente é.


Sempre que acontecer uma desgraça ou alguma coisa de ruim na


sua vida - uma doença, a perda da casa, do património ou de uma posição social, o rompimento de um relacionamento amoroso, a morte ou o sofrimento por alguém, ou a proximidade da sua própria morte -, saiba que existe um outro lado e que você está a apenas um passo de distância de algo inacreditável: uma completa transformação alquímica da base de metal da dor e do sofrimento em ouro. Esse passo simples é chamado de entrega.




Não estou querendo dizer que você vai ficar feliz em uma situ¬ação dessas. Não vai. Mas o medo e o sofrimento vão se transfor¬mar em uma paz interior e uma serenidade que vêm de um lugar muito profundo, do próprio N ao-Manifesto. Essa é a "paz de Deus, que ultrapassa todo o entendimento". Comparada a isso, a felicidade é quase uma coisa superficial.


Com essa paz radiante, vem a percepção - não no nível da mente, mas dentro das profundezas do seu Ser - de que você é indestrutí¬vel, imortal. Isso não é uma crença. E uma certeza absoluta, que não precisa de uma manifestação exterior nem de qualquer prova.


TRANSFORMANDO O SOFRIMENTO EM PAZ


Em situações extremas, pode ser impossível aceitar o Agora, mas sempre temos uma segunda chance na entrega.


NOSSA PRIMEIRA CHANCE é nos entregarmos, a cada instante, à realidade do momento. Sabendo que aquilo que é não pode ser desfeito - porque já é -, dizemos sim àquilo que é ou aceitamos o que não é.


Então fazemos o que tem de ser feito, o que quer que a situação exija.


Se nos submetemos a esse estado de aceitação, deixamos de criar negatividade, sofrimento ou infelicidade. Passamos a


viver em um estado de não-resistência, um estado de graça e de luz, livre das disputas.




Sempre que você for incapaz de realizar isso, sempre que perder essa oportunidade, seja porque não está gerando uma presença consciente o bastante para evitar o surgimento do padrão de resistência habitual, seja porque as circunstâncias são tão extremas que são completamente inaceitáveis, você está criando alguma forma de dor, alguma forma de sofrimento.


Pode parecer que é a situação que está causando o sofrimento, mas não é bem assim: a responsável é a sua resistência.


AQUI ESTÁ a sua segunda chance de entrega: se você não con¬segue aceitar o que está lá fora, aceite então o que está dentro.


Isso quer dizer: não resista ao sofrimento. Permita que ele esteja ali. Entregue-se ao pesar, ao desespero, ao medo, à solidão, ou a qualquer forma que o sofrimento assuma. Abrace o sofrimento.


Veja, então, como o milagre da entrega transforma o sofri-mento profundo em uma paz profunda. Essa é a sua crucifi-cação. Permita que ela seja a sua ressurreição e ascensão ao céu.


Quando a sua dor é profunda, tudo o que se disser a respeito de entrega vai, provavelmente, lhe parecer superficial e sem sentido. Quando o seu sofrimento é profundo, você provavelmente tem um grande anseio de escapar e de não se entregar a ele. Você não quer sentir o que está sentindo. O que pode ser mais normal? Mas não tem escapatória, nenhuma saída.


Existem algumas pseudo-saídas como o trabalho, a bebida, as drogas, a raiva, as projeções, as abstenções, etc., mas elas não liber¬tam você do sofrimento. O sofrimento não diminui de intensidade quando você o torna inconsciente. Quando você nega o- sofrimen-


to emocional, tudo o que você faz ou pensa fica contaminado por ele. Você o irradia, por assim dizer, como a energia que se des-prende de você, e outros vão captá-lo subliminarmente.




Se essas pessoas estiverem inconscientes, podem até se ver com¬pelidas a agredir ou machucar você de alguma forma, ou você pode machucá-las em uma projeção inconsciente do seu sofrimento. Você atrai e transmite aquilo que corresponde ao seu estado interior.


QUANDO NÃO EXISTE caminho para fora, existe sempre um caminho através. Portanto, não fuja do sofrimento. Enfrente-o. Sinta-o plenamente. Sinta-o, mas não pense a respeito dele! Fale dele, se necessário, mas não crie uma história na sua mente a respeito dele. Dê toda a sua atenção ao sofrimento, não à pessoa ou ao acontecimento que podem tê-lo provocado.


Não permita que a mente use o sofrimento para criar uma identidade de vítima para você em função dele. Sentir pena de si mesmo e contar a sua história aos outros vai fazer com que você fique paralisado no sofrimento.


Se for impossível se afastar desse sentimento, a única pos-sibilidade de mudança é se mover em direção a ele, do con¬trário nada vai mudar.


Portanto, dê a sua completa atenção ao que você sente e evite dar um nome a isso mentalmente. Ao se dirigir para o sentimen¬to, fique intensamente alerta.


No princípio, pode parecer um lugar escuro e aterrador, e, quando vier o impulso para se afastar, observe-o, mas não se deixe guiar por ele. Permaneça colocando a sua atenção no sofrimento, permaneça sentindo o pesar, o medo, o pavor, a solidão, o que for.


Fique alerta, fique presente, com todo o seu Ser, com cada célula do seu corpo. Ao fazer isso, você está trazendo uma luz para a escuridão. É a chama da sua consciência.


Nesse ponto, você não precisa mais se preocupar com a entrega. Ela já aconteceu. Como? A atenção completa é a aceitação com-pleta, é entrega. Ao dar atenção completa, você está usando o poder do Agora, que é o poder da sua presença.




Nenhum indício de resistência consegue sobreviver nele. A pre¬sença remove o tempo. Sem o tempo, nenhum sofrimento e ne¬nhuma negatividade conseguem sobreviver.


A ACEITAÇÃO DO sofrimento é uma viagem em direção à morte. Encarar o sofrimento profundo, permitindo que ele exista, colocando a sua atenção sobre ele, é entrar na morte conscientemente. Quando tiver morrido essa morte, você perceberá que não existe morte e que não há nada a temer. Só quem morre é o ego.


Imagine um raio de sol que se esqueceu que é uma parte inse-parável do Sol, acredita que precisa lutar pela sobrevivência e, assim, cria e se apega a uma outra identidade diferente da do Sol. Será que a morte dessa ilusão não seria incrivelmente libertadora?


VOCÊ QUER TER uma morte fácil? Prefere morrer sem sofri-mento, sem agonia? Então, morra para o passado a cada instante e permita que a luz da sua presença apague o pesado e limitado "eu" que você pensou que era "você".


O CAMINHO DA CRUZ - A ILUMINAÇÃO ATRAVÉS DO SOFRIMENTO


O caminho da cruz é o velho caminho para a iluminação, e até recentemente era o único caminho. Mas não o rejeite nem subes¬time sua eficácia. Ele ainda funciona.


O caminho da cruz é uma inversão completa. Significa que a pior coisa na sua vida, a sua cruz, se transforma na melhor coisa que já aconteceu, ao forçar você para a entrega, para a "morte", ao forçar você a se tornar nada, a se tornar como Deus, porque Deus também é coisa nenhuma.




A iluminação através do sofrimento, o caminho da cruz, signifi¬ca ser levado para o reino dos céus, esperneando e gritando. Você finalmente se entrega porque já não suporta mais sofrer, embora o sofrimento possa durar um tempo até que isso aconteça.


A ILUMINAÇÃO ESCOLHIDA conscientemente significa aban¬donar nossos apegos ao passado e ao futuro e fazer do Agora o ponto principal da nossa vida.


Significa escolher permanecer no estado de presença e não no tempo.


Significa dizer sim àquilo que é.


Você já não precisa mais sofrer.


De quanto tempo você precisa para ser capaz de dizer: "Não vou mais criar dores, nem sofrimentos"? Quanto você ainda tem de sofrer antes de fazer essa escolha?


Se você pensa que precisa de mais tempo, você terá mais tempo - e mais sofrimento. O tempo e o sofrimento são inseparáveis.


O PODER DE ESCOLHER


Uma escolha sugere uma consciência, um alto grau de cons¬ciência. Sem ela, não há escolha. A escolha começa no instante em que nos desidentificamos da mente e de seus padrões condiciona¬dos, o instante em que nos tornamos presentes.


Até alcançar esse ponto, você está inconsciente, espiritualmente


falando. Significa que você foi obrigado a pensar, sentir e agir de deter¬minadas maneiras, de acordo com o condicionamento da sua mente.




Ninguém escolhe o problema, a briga, o sofrimento. Ninguém es-colhe a doença. Eles acontecem porque não existe presença suficiente para dissolver o passado, ou luz suficiente para dispersar a escuridão. Você não está aqui por inteiro. Você ainda não acordou. Nesse meio tempo, a mente condicionada está governando a sua vida.


Do mesmo modo, se você é uma das inúmeras pessoas que têm assuntos mal resolvidos com os pais, se ainda guarda ressentimen¬tos por alguma coisa que eles fizeram ou deixaram de fazer, então você ainda acredita que eles tiveram uma escolha e poderiam ter agido diferentemente. Sempre parece que as pessoas fizeram uma escolha, mas isso é ilusão. Enquanto a sua mente, com os seus padrões de condicionamento, dirigir a sua vida, enquanto você for a sua mente, que escolhas você tem? Nenhuma. Você não está nem ligando. O estado identificado com a mente é altamente defei¬tuoso. E uma forma de insanidade.


Quase todas as pessoas estão sofrendo dessa doença em vários graus. No momento em que você perceber isso, não haverá mais ressentimento. Como você pode se ressentir com a doença de alguém? A única resposta adequada é compaixão.


Se você é governado pela mente, embora não tenha escolha, vai sofrer as consequências da sua inconsciência e criar mais sofrimen¬to. Você vai carregar o fardo do medo, das disputas, dos problemas e do sofrimento. Até que o sofrimento force você, no final, a sair do seu estado de inconsciência.


NÃO PODEMOS PERDOAR a nós mesmos ou aos outros enquanto extrairmos do passado o nosso sentido do eu inte¬rior. Somente acessando o poder do Agora, que é o seu próprio poder, pode haver um verdadeiro perdão. Isso tira a força do passado e você percebe, profundamente, que nada


que você fez ou que os outros lhe fizeram poderia atingir, nem de leve, a radiante essência de quem você é.




Quando nos rendemos àquilo que é e assim ficamos intei¬ramente presentes, o passado deixa de ter qualquer força. Não precisamos mais dele. A presença é a chave. O Agora é a chave.


Como a resistência é inseparável da mente, o abandono da resistência - a entrega - é o fim da atuação dominadora da mente, do impostor fingindo ser "você", o falso deus. Todo o julgamento e toda a negatividade se dissolvem.


A região do Ser, que tinha sido encoberta pela mente, se abre.


De repente, surge uma grande serenidade dentro de você, uma imensa sensação de paz.


E, dentro dessa paz, existe uma grande alegria.


E, dentro dessa alegria, existe amor.


E lá no fundo está o sagrado, o incomensurável, o que não pode ser nomeado.


FONTES DE CONSULTA RECOMENDADAS



O Poder do Agora, de EckhartTolle (Sextante, 2002).


Freeing Yourselfjrom Your Identification with YourMind. Um vídeo de Eckhart Toüe (Namaste Publishing, 2001).


AsYou Think, de James Allen (New World Library, 1998). Um clássico sobre transformação.


The Bhagavad Gita:A Walkthrough for Westerns, de Jack Hawley (New World Library, 2001). O livro clássico da espiritualidade, tão poderoso e atual como O Poder do Agora.


A Visualização Criativa Pode Mudar a Sua Vida, de Shakti Gawain (Sextante, 2002). Outro clássico que já mostrou a milhões de pessoas como melhorar suas vidas e o mundo.


As Sete Leis Espirituais do Sucesso, de JDeepak Chopra (Best Seller, 1996). Um trabalho brilhante, simples, mas poderoso.


CONHEÇA OS 20 CLÁSSICOS DA EDITORA SEXTANTE


O Código Da Vinci, Anjos e Demónios e Fortaleza Digital, de Dan Brown


Pais brilhantes, professores fascinantes, Nunca desista de seus sonhos e


Você é insubstituível, de Augusto Cury


O monge e o executivo, de James C. Hunter


Um dia "daqueles", de Bradley Trevor Greive


Por que os homens fazem sexo e as mulheres fazem amor?, de Allan e Barbara Pease


Os 100 segredos das pessoas felizes, de David Niven


Enquanto o amor não vem, de lyanla Vanzant


A última grande lição e As cinco pessoas que você encontra no céu, de Mitch Albom


A Dieta de South Beach, de Arthur Agatston


O ócio criativo, de Domenico De Masi


Não leve a vida tão a sério, de Hugh Prather


O caminho da tranquilidade, de Sua Santidade, o Dalai-Lama


Muitas vidas, muitos mestres, de Brian Weiss


Histórias para aquecer o coração, de Jack Canfield e Mark V. Hansen


Aprendendo a silenciar a mente, de Osho


"O Poder do Agora é um dos melhores livros que surgiram nos últimos tempos. Cada frase transmite verdade e poder."




Deepak Chopra, autor de As sete leis espirituais ao sucesso


Praticando o Poder do Agora é um manual que ensina a "viver o momento presente", princípio básico que Eckhart Tolle apresenta em O Poder do Agora, um dos maiores fenómenos da literatura espiritual da atualidade, com 2 milhões de livros vendidos em todo o mundo.


Este livro é uma excelente introdução aos ensinamentos do autor, reunindo trechos cuidadosamente selecionados de O Poder do Agora. Ao mesmo tempo, é um guia essencial para quem já conhece sua filosofia porque traz técnicas, exercícios e meditações para alcançar a felicidade, a paz interior e a iluminação.


Tolle conduz os leitores a uma nova maneira de pensar (ou melhor, de não pensar), eliminando a espera, o medo e a preocupação com o passado e o futuro.


Se você nunca esrá satisfeito com a sua vida do jeito que ela é, comece a ler este livro agora. E veja o que acontece.


Por Eckhart Tolle - Livro Praticando o Poder do Agora- http://www.eckharttolle.com/


Fonte:http://vivaomomentopresente.blogspot.com.br/p/relacionamentos-como-pratica-espiritual.html

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