OS VERDADEIROS REVOLUCIONÁRIOS - KRISHNAMURTI

 

Os verdadeiros revolucionários



Precisamos, sociologicamente, de uma revolução radical e fundamental. Precisamos de uma transformação total. Ora, uma técnica, que representa um método, uma maneira, operará a transformação? Ou é necessário que haja indivíduos — você e eu — que compreendam o problema e estejam, em si mesmos, num estado de revolução? Em tais condições, é revolucionária a influência desses indivíduos na sociedade, porquanto não estão meramente aprendendo uma técnica de revolução, mas eles próprios, revolucionados. Estou sendo claro?
(...) Não é mais importante, mais essencial, que você esteja revolucionado, em vez de apenas procurar uma técnica revolucionária? Mas, por que você não está revolucionado? Por que não há em você o novo processo da vida? Por que não há em você uma nova maneira de considerar a vida, uma chama, um tremendo descontentamento? Por que? Um homem que está completamente insatisfeito, não só com certas coisas, mas inerentemente insatisfeito, não necessita de técnica alguma para ser revolucionário. Ele mesmo é uma revolução, uma ameaça à sociedade, e o chamamos revolucionário. Mas, por que você não é um homem assim? Para mim, o que importa não é a técnica, mas, sim, fazer de você um revolucionário, ajudá-lo a despertar, para perceber a importância da completa transformação. E quando você estiver transformado, poderá então agir, porque haverá aquele constante fluir de seiva nova, que é, afinal de contas, revolução.
Consequentemente, para mim, a importância da revolução interior, da transformação psicológica, é muito maior do que a da revolução exterior. A revolução exterior é mera modificação, que significa continuidade modificada, mas a revolução interior não tem pouso de descanso, não tem parada, está em constante renovação. E é disto que necessitamos no momento atual: um povo completamente descontente e capaz, portanto, de discernir a verdade das coisas. O homem complacente, o homem que se satisfaz com dinheiro, com posições, com uma ideia, é incapaz de perceber a verdade. Só o homem que está descontente, o homem que investiga, que pergunta, que duvida, que observa, só esse homem descobre a verdade; ele é uma revolução em si mesmo e, portanto, nas suas relações. E, consequentemente, aquilo que constitui o seu mundo — ou seja as suas relações com o outro — ele começa a transformar. E influencia, desse modo, o mundo compreendido na esfera de suas relações. Assim sendo, se você meramente procura uma técnica, ou indaga qual é a minha técnica para a nova revolução, isso me parece fora de propósito, ou melhor, parece indicar que você não percebe a importância de estar revolucionado em si mesmo; e, para você ser uma revolução em si mesmo, é necessário que desperte para o ambiente, para o meio em que vive.
Senhores, toda sociedade nova, toda civilização nova, deve ser começada por você. Como foi que começou o cristianismo, o budismo, e todo movimento significativo? Pela iniciativa de uns verdadeiramente inflamados pela ideia e pelo sentimento. Tinham eles os corações abertos a uma vida nova. Constituíam um núcleo, não tinham crença numa determinada coisa, mas tinham em si próprios a experiência da realidade — a realidade daquilo que viam. E o que nos cabe fazer, a você e a mim, é, se posso sugeri-lo, vermos as coisas por nós mesmos e não através de uma técnica. Senhor, você pode ler um poema de amor, mas se você não houver sentido, como experiência, o que é o amor, por mais que você tenha lido, por melhor que tenha aprendido a técnica , não conhecerá o perfume do amor. E como não possuímos esse amor, andamos em busca da técnica. Estamos exaustos e famintos, e estamos, por isso, superficialmente, à procura de uma técnica. Um homem faminto não procura técnica alguma. O que lhe interessa é o alimento e ele não fica à porta do restaurante a aspirar o cheiro da comida. Assim, pois, a quando você pede uma técnica, denota isso que você não tem fome. " "como" não é importante, mas a razão por que você pede esse "como" é muito importante.
Nessas condições, só pode haver revolução, só pode haver a contínua renovação interior, quando você compreender a si mesmo. Você só pode se compreender na vida de relação, e não no isolamento. Visto que nada pode existir no isolamento, a compreensão de si mesmo, o conhecimento de si mesmo, em qualquer nível que seja, só pode ser aprendido na vida de relação. E como a vida de relação é dolorosa e está em movimento constante, desejamos dela fugir e encontrar a realidade fora das relações. Não existe realidade alguma fora da vida de relação. Quando compreendo a vida a vida de relação, esta mesma compreensão é realidade. Por conseguinte, é necessário nos mantermos extraordinariamente vigilantes, despertos, vigilantes a todo momento, abertos a todo desafio e a toda sugestão ou alusão. Mas tal coisa existe um certo alertamento da mente e do coração, mas nós, em geral, vivemos a dormir, vivemos desiludidos e, embora jovens, já temos um pé no túmulo. Por que só pensamos com propósitos de sucesso, com propósitos de ganho, nunca vivemos verdadeiramente; só nos preocupa o fim a que visamos; e porque só andamos a demandar um fim, somos gente sem vida. Por isso, nunca somos revolucionários. Se você estiver interessado diretamente na vida e no vier, e não na ideia relativa ao viver, não poderá então deixar de ser uma revolução em si mesmo. Você mesmo será uma revolução, porque estará enfrentando a vida diretamente, e não por detrás de cortinas de palavras, de preconceitos, intenções e fins. E o homem que enfrenta a vida diretamente é aquele que se acha num estado de descontentamento; e você precisa estar nesse estado de descontentamento, para encontrar a realidade. E a realidade é que liberta, que nos faz livres; é a realidade que liberta a mente de suas ilusões e criações. Mas achar a realidade, estar aberto, significa estar descontente. Você não pode procurar a realidade, ela tem de vir até você; mas, só pode vir quando a sua mente estiver de todo insatisfeita e pronta para recebê-la. Mas, em geral, temos medo de ficar descontentes, pois sabe Deus onde esse descontentamento nos levaria. Por essa razão nosso descontentamento é circundado de segurança, de proteção, de ações sempre cuidadosamente planejadas. E um tal estado mental é incapaz de compreender a verdade. A verdade não é estática, porquanto a verdade está fora do tempo, e a mente não pode acompanhar a verdade, porque a mente é produto do tempo; e aquilo que depende do tempo não pode conhecer, como experiência, o que é o eterno. A verdade se manifesta ao homem que se acha naquele estado de descontentamento, mas não anda em busca de um fim; porquanto, todo aquele que busca um fim está em busca de satisfação; e satisfação, aprazimento, não é a verdade.
Krishnamurti — 16 de janeiro de 1949 — O que te fará feliz?
 
Fonte:http://nossaluzinterior.blogspot.com.br/2013/06/

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